domingo, 16 de janeiro de 2022

O estado da corrida eleitoral para 30 de janeiro

 

Os partidos usam, tanto os debates televisivos e radiofónicos como as redes sociais, para fazerem campanha eleitoral. Não obstante, mais visível que a apresentação de propostas programáticas e pragmática que os distinguem ou aproximam, o que ressalta é a desqualificação dos adversários e os remoques sobre o passado.

Em campanha condicionada pela pandemia da covid-19, as forças políticas que tentam eleger deputados para a Assembleia da República (AR) no próximo dia 30, além dos debates televisivos e radiofónicos entre pares de líderes partidários supostamente divergentes e debates com todos os líderes dos partidos atualmente com assento parlamentar, intensificam a sua presença nas redes sociais: Facebook, Instagram, passando algumas pelo Linkedln, WhatsApp, Telegram, TikTok, com destaque para o Twitter, onde a atividade de partidos e dirigentes é intensa.

Sob o lema “Juntos Seguimos e Conseguimos”, o PS nas redes sociais centra-se na figura de Costa e no objetivo da maioria absoluta: desde vídeos explicativos com o secretário-geral a destaque de frases dos debates ou imagens com propostas programáticas. E o ‘site’ oficial de campanha “António Costa 2022” disponibiliza o programa eleitoral completo e faz o balanço da governação de 2015 a 2021, podendo-se consultar, por áreas, medidas do Governo nos últimos 6 anos.

Por seu turno, o PSD, sob o mote “Novos Horizontes para Portugal”, divulga nas redes a agenda de Rio, trechos de debates, destacando declarações do líder em ações de campanha. E criaram os socialdemocratas um ‘quiz’ para os indecisos com o título “Escolhe o teu primeiro-ministro”, no qual o utilizador responde a questões para saber se a sua escolha é Rio ou Costa. As questões vão desde “onde preferias gastar quatro milhões de euros?” às opções “TAP” ou “SNS”, bem como outras mais provocadoras do tipo “contratavas mais médicos de família ou mais ministros da mesma família?”. E, no Youtube, tem a rubrica “As Histórias Socialistas”, protagonizada pelo cabeça de lista por Portalegre, que, em caricatura, conta histórias sobre a governação do PS.

Sob o lema “Razões fortes, compromissos claros”, o BE, recorre às redes sociais para publicar as medidas explicadas por área ou partilhar intervenções da coordenadora. E fez um “Fact Check” a alguns debates, nomeadamente com Rio, Costa ou André Ventura e está presente no TikTok, para vídeos curtos, no qual partilha conteúdos com algum humor. Já a CDU (que junta PCP e PEV) tem no Instagram rubricas, como “Mitos e Mentiras” e “Faz uma pergunta ao teu candidato”, em que vários dirigentes respondem a perguntas dos utilizadores. Nas redes sociais destacam-se frases do secretário-geral e mais recentemente dos dirigentes João Oliveira e João Ferreira, que substituem o líder durante a recuperação duma operação urgente.

O PAN quer “Agir, Já!”, investindo, em redes como o Instagram, na divulgação das datas dos debates, intervenções de Inês Real e a rubrica “As principais conquistas do PAN”, desde que conseguiu eleger para a AR. O programa eleitoral está no ‘site’, disponível em versão “mini” para ler em 5 minutos. Já o CDS-PP, liderado por Francisco Rodrigues dos Santos, apresenta-se a estas eleições “Pelas Mesmas Razões de Sempre” e, depois dos vídeos com humor de Natal e Ano Novo, aposta na divulgação de entrevistas, debates, intervenções do líder e tem disponível no ‘site’ o compromisso eleitoral. O Chega partilha intervenções de Ventura e propostas do programa, bem como uma aplicação que pode ser descarregada para o telemóvel, que agrega informação sobre o partido como notícias, atividades, eventos ou conteúdos multimédia. A Iniciativa Liberal, muito ativa nas redes sociais, utiliza o Instagram ou Twitter para partilhar trechos de entrevistas e debates com o presidente, Cotrim de Figueiredo, por vezes ilustrados com músicas em tom humorístico, algo que também é feito no TikTok. Tem conta em quase todas as redes sociais, em que partilha o seu programa, também disponível no ‘site’ do partido em versão de sumário ou completo. E o Livre, sob o lema “Bota Acima, não Abaixo” está presente no Instagram, Twitter ou TikTok, com vídeos explicativos de propostas do partido, como a do Rendimento Básico Incondicional, ou respostas a perguntas de utilizadores.

***

Costa, não cedendo um milímetro a Rui Rio, mantém-se favorito na luta pela liderança do próximo governo. Os portugueses continuam a considerá-lo o mais competente, solidário, influente e, agora, o mais honesto, de acordo com sondagem da Aximage para o DN, JN e TSF, segundo a qual seria melhor primeiro-ministro (49%) que o seu rival (24%). Tem potencial de voto (soma dos que votariam de certeza e dos que poderiam votar) de 70 pontos percentuais, mais 14 do que Rio. Abaixo deste alguns degraus, mas destacada do resto do pelotão, vem Catarina Martins.

O trabalho de campo da sondagem decorreu de 6 a 12 de janeiro, não refletindo, assim, o debate televisivo do dia 13 entre os dois principais candidatos a primeiro-ministro. O que a primeira parte do inquérito desvenda é o mercado eleitoral a que cada candidato pode aspirar (potencial de voto) e o que lhe está vedado (taxa de rejeição), incluindo as preferências dos abstencionistas e indecisos. Costa e Rio são os únicos líderes que têm potencial de voto superior à taxa de rejeição, isto é, são quem revela maior margem de progressão para as próximas semanas de campanha eleitoral, a suficiente para qualquer um ter legítima aspiração à vitória. Mas as semelhanças ficam por aqui.

O líder do PS supera o do PSD no potencial de voto e revela vantagem ainda maior na firmeza de voto: mais 16 pontos. Nesta categoria, Rio pouco se distingue dos líderes dos partidos mais pequenos (tem só 3 pontos de vantagem sobre Ventura e 4 sobre Catarina Martins e Jerónimo de Sousa). Acresce que o mercado eleitoral que ora fechado para o socialdemocrata é superior em 9 pontos ao do socialista (35% nunca votariam no presidente do PSD, contra 26% que rejeitam o secretário-geral do PS).

No respeitante à taxa de rejeição, é Ventura que vai no fim: 67% dos portugueses afirmam que nunca votariam nele. Não muito longe estão Jerónimo de Sousa (62%) e Rodrigues dos Santos, (61%). Ao invés, pela positiva, destaca-se Catarina Martins (com 38% de potencial de voto), 8 pontos acima do comunista (30%) ou Cotrim de Figueiredo (29%) e Inês Sousa Real (27%).

Porém, faltavam três semanas para as eleições quando a sondagem começou a ser realizada. Nada é dado como adquirido, mas há outros sinais de que Rio não estava a desalojar Costa da liderança da corrida. A Aximage voltou a pedir aos portugueses que avaliassem uma série de atributos pessoais e o resultado é quase igual ao de dezembro passado.

O socialista leva 31 pontos percentuais de vantagem na competência, 27 na solidariedade ou proximidade às pessoas, 67 na influência e até ultrapassa o socialdemocrata na honestidade, quando, há um mês, Rio liderava por um ponto (agora perde por dois), embora se repita a resistência dos eleitores a catalogar um político como honesto: metade recusa opinar (dado comum a outros políticos e outras eleições). A pari, a confirmar a tendência, repete-se Costa no topo: é o candidato em quem os portugueses mais confiam para primeiro-ministro (com a vantagem de 26 pontos sobre Rio) e o que, para os inquiridos, daria um melhor chefe de Governo (um pouco mais do dobro dos votos de Rio).

O líder do PS repete que a confiança nos parceiros se perdeu. E, até ver, a afirmação não fez ricochete: Costa continua a seduzir os portugueses que, em 2019, votaram nos partidos à sua esquerda, com potencial de voto acima dos 80 pontos percentuais entre os eleitores do BE, CDU e Livre. Em termos geográficos, sobressai a região Sul (82% de potencial de voto) e Lisboa, por via dos sólidos 35% na firmeza de voto, valor superado só nos eleitores com 65 ou mais anos (43%), sendo os seus piores resultados na AMP (Área Metropolitana do Porto – (31% de taxa de rejeição). E mantém maior popularidade no eleitorado feminino. Em contrapartida, é na AMP (65%) e no Norte (64%) que Rio regista maior potencial de voto, com a região urbana a ganhar vantagem se nos ativermos à firmeza de voto (14%, a mais elevada nos segmentos geográficos). Tem maior potencial nos homens que nas mulheres e maior taxa de rejeição no feminino. E, em diferentes faixas etárias, tem resultados mais prometedores entre os mais jovens e os mais velhos (59% em ambos os casos). Porém, a firmeza de voto cresce linearmente à medida que o eleitorado envelhece. Ao contrário de Costa, que não merece tanta indulgência entre quem votou no PSD em 2019, Rio tem mais potencial (51%) que rejeição de voto (49%) em antigos eleitores socialistas.

A líder bloquista regista potencial de voto superior à taxa de rejeição em dois segmentos: entre os do Sul do país (46%) e entre os mais jovens (46%). Os piores resultados são a Norte (taxa de rejeição de 60%) e nos eleitores com 65 ou mais anos (72%). O potencial de voto decresce à medida que o eleitor envelhece, registando-se o sentido inverso na taxa de rejeição. Tem mais popularidade em mulheres que em homens. Jerónimo de Sousa retirou-se da campanha eleitoral, devido a intervenção cirúrgica de urgência, cujos efeitos não entram nas contas da sondagem, havendo um segmento em que o potencial de voto é superior à taxa de rejeição: nos eleitores da CDU de 2019 (83%). E, no atinente às escolhas partidárias, quase um terço dos que votaram no PS (31%) admitem que poderiam votar no comunista, não partilhando da desconfiança apregoada por Costa. Os melhores resultados registam-se na AMP (39% de potencial de voto) e entre os mais jovens (40%). Os piores na região Centro (72% de rejeição de voto) e entre os eleitores mais velhos (76%).

Cotrim de Figueiredo morde os calcanhares do secretário-geral comunista no potencial de voto: soma 29% (um ponto menos que Jerónimo), mas com taxa de rejeição (53%) inferior à do líder do PCP (62%), o que se explica por falta de notoriedade: 18% dizem não o conhecer. Cotrim de Figueiredo só tem potencial de voto (38%) superior à taxa de rejeição (37%) nos eleitores dos 18 aos 34 anos, diminuindo o potencial à medida que o eleitor envelhece e crescendo rejeição de voto para chegar aos 76% nos que têm 65 ou mais anos. O desequilíbrio de género em favor dos homens explica-se parcialmente pelo maior desconhecimento feminino.

Inês Real consegue, como o liberal que a precede, um saldo positivo entre os eleitores mais jovens (38% de potencial e 35% de rejeição), uma popularidade mais evidente entre os mais novos, tendo como espelho taxa de rejeição elevada entre os mais velhos (82% nunca votaria em Inês Real). Tendo um pendor mais feminino, consegue o melhor resultado regional na AMP (36% de potencial) e o pior no Norte (65% de rejeição). Só atrai o eleitorado do partido (96%) e consegue 29% de potencial de voto entre os eleitores socialistas e liberais de 2019.

O líder centrista é o único líder na corrida eleitoral que não é capaz de saldo positivo em nenhum dos segmentos da amostra. Não está a conseguir convencer nem sequer os que votaram no partido em 2019: 56% de rejeição de voto e apenas 44% de potencial de voto. Apesar de tudo, consegue gerar simpatia entre os eleitores dos restantes partidos à direita, com potencial a rondar os 40 pontos percentuais. Em termos regionais, o resultado mais prometedor está no Porto (38% de potencial) e o pior em Lisboa (64% de rejeição). E melhora o potencial quanto mais jovem o eleitorado e aprofunda a taxa de rejeição à medida que o eleitor envelhece (86% nos de 65 ou mais anos).

André Ventura, que adotou a postura beligerante ao longo dos debates, destaca-se dos restantes pela taxa de rejeição: 67% nunca votaria nele, com destaque para as mulheres (mais 7 pontos percentuais que os homens) e os eleitores com 65 ou mais anos (88%). O Centro destaca-se pelo potencial de voto (31%), mas também pelo facto de a firmeza de voto chegar aos 14% nesta região (com a exceção de Costa só Rio iguala este valor, mas na AMP). Os homens e os dois escalões mais jovens são os segmentos mais favoráveis a Ventura, bem como, ao nível partidário.

Rui Tavares, fundador do Livre, é o que parte em pior posição, entre os 9 principais candidatos. Tem o potencial de voto mais baixo (20%) e parcela grande do mercado eleitoral fechada por via da rejeição (53%) e desconhecimento dos eleitores (25%), apesar da participação em 8 debates. Tem o potencial mais elevado nos jovens (26%) e a rejeição mais elevada nos mais velhos (71%). A mais prometedora é a região do Porto (27%); e o resto do Norte apresenta a maior rejeição (63%).

***

Entretanto, o debate televisivo entre Costa e Rio parece ter posto equilíbrio entre as propostas oferecidas pelas formações partidárias que os dois contendores, pelo menos aparentemente, representam. Na verdade, Rio foi mais provocador, claro nalgumas opções, quiçá um tanto irrealista ou demasiado confiado em que as coisas corram bem, caso contrário arrisca-se a não concretizar as medidas que enunciou, e apostado no papel do setor privado, sem desprimor para o setor público; e Costa manteve-se no acento da evolução na continuidade, sublinhando as virtualidades do seu consulado e prometendo rendibilizar os aspetos ditos positivos e audazes da sua governação, corrigir o que esteve mal, lançar com sustentabilidade as reformas que se impõem pelo advento e persistência da pandemia, reforçar o papel do setor público, embora sem desprimor para o setor privado, mormente para o setores social e solidário. A educação foi tema ausente do debate. Vá lá que Rio não se ensarilhou como no cado da prisão perpétua com André Ventura!

***

Ora, se António Costa está realmente convicto de que o seu programa é o melhor, se os partidos à sua esquerda e à sua direita constituem um perigo para o país – a última sondagem realizada pelas mesmas entidades acima referidas acentua a vantagem do PS sobre o PSD a do Chega sobre o BE – deve confiar mais nos portugueses, como diz confiar sabendo que eles é que devem dizer como querem ser governados. Sem fazer juízos muito audazes sobre o debate entre ele e Rio, pergunto-me porque usou aquele gesto estapafúrdio e piroso de, à despedida do ecrã, nos acenar com o chumbado OE 2022, como fizera em momento anterior, como se fora um logótipo como por exemplo o do “The Voice Portugal”? Quererá que os eleitores consagrem, sem retoques, o documento que os parlamentares rejeitaram por maioria?

Efetivamente, prometer que, se o PS for Governo, logo que passe o Programa do Governo na AR, apresentará para aprovação a proposta de OE 2022 que foi rejeitada significa que ou consegue maioria absoluta, sozinho ou com o PAN e o Livre, ou se sujeita a nova dissolução da AR passados seis meses. Entretanto, diz que falará com todos. Para quê?

De gestos pirosos não tem necessidade o eleitorado nem o país.

2022.01.15 – Louro de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário