terça-feira, 9 de agosto de 2022

Poupança de energia “é vital para a segurança energética da” UE

 

No momento em que entrou em vigor a meta voluntária para diminuir o consumo de gás na União Europeia (UE), a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, veio defender que a poupança de energia “é vital para a segurança energética”.

Assim, a 9 de agosto, na rede social Twitter, escreveu: “O nosso plano de emergência para reduzir a procura de gás em toda a UE está agora em vigor e vários Estados-membros já tomaram medidas valiosas e voluntárias em direção ao nosso objetivo: em conjunto, pretendemos reduzir a utilização de gás em pelo menos 15%”.

A líder do executivo comunitário encareceu a relevância da poupança de energia quando se teme corte no abastecimento russo à UE. Com efeito, a meta para reduzir voluntariamente 15% do consumo de gás na UE, em vigor até à primavera de 2023, visa aumentar o armazenamento nos Estados-membros e criar uma ‘almofada’ ante uma eventual rutura no fornecimento da Rússia.

A UE receia que a Rússia interrompa o fornecimento de gás à Europa no outono e no inverno, após as acentuadas reduções no abastecimento a vários Estados-membros nos últimos meses, pois o gasoduto de fornecimento do gás russo (o Nord Stream 1) à Europa está a funcionar a 20%.

A quatro de agosto, a Rússia suspendeu os fluxos de petróleo pelo braço sul do oleoduto Druzhba, que passa pela Ucrânia e serve a Europa, nomeadamente a Hungria, a Eslováquia e a República Checa. Em causa está a impossibilidade de a Transneft pagar o imposto de trânsito à empresa ucraniana que gere o oleoduto, a Ukrtransnafta. Os bancos europeus, impossibilitados de receber transferências de bancos russos, devido a sanções aplicadas pela UE, não podem tomar estas decisões sem antes consultarem o regulador europeu. E o contrato entre as duas empresas obriga ao pré-pagamento a 100% de uma taxa sobre os fluxos de petróleo.

A entrada em vigor do regulamento aprovado pelo Conselho Europeu e publicado a 1 de agosto em Jornal Oficial da UE, surge na sequência do acordo político alcançado no final de julho em Bruxelas, em que os 27 chegaram a um compromisso em torno da proposta apresentada pela Comissão Europeia para a redução de 15% do consumo do gás entre o corrente mês de agosto e 31 de março de 2023, mas com novas exceções para abranger a situação geográfica ou física dos países. O compromisso foi adotado formalmente pelo Conselho da UE no dia 5 de agosto, por maioria qualificada, com os votos contra da Hungria e da Polónia.

Porque o compromisso não obteve a unanimidade, a meta que pode diferir entre países, para o que foram introduzidas isenções e derrogações para ter em conta as situações particulares dos Estados-membros.

Nos termos do respetivo comunicado oportunamente divulgado, o Conselho concordou que os Estados-membros que não estejam interligados com as redes de gás de outros Estados-membros estão isentos de reduções obrigatórias de gás, pois não poderiam libertar volumes significativos de gás em benefício de outros Estados-membros, do mesmo modo que “os Estados-membros podem limitar o seu objetivo de redução para adaptar as suas obrigações de redução da procura se tiverem interconexões limitadas a outros Estados-membros e poderem mostrar que as suas capacidades de exportação e as suas infraestruturas domésticas de GNL [gás natural liquefeito] são utilizadas para redirecionar ao máximo o gás para outros Estados-membros”.

Portugal, por exemplo, como informou o ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, “enquadra-se nos países que poderão, por ter fracas interconexões, ver a sua meta reduzida em oito pontos percentuais face ao objetivo inicialmente definido, caso venha a ser criada uma obrigação de redução de gás”. Além disso, o país “pode deduzir um conjunto de circunstâncias” em que se encontra, “como a produção de energia elétrica na segurança do sistema ou a necessidade de utilização do gás como matéria-prima em indústrias ou setores indispensáveis”.

Não obstante, o regulamento agora em vigor, prevê a possibilidade de desencadear um ‘alerta da União’ perante escassez, cenário em que a diminuição da procura de gás se tornaria obrigatória.

Assim, o Conselho especificou que “o executivo comunitário apresentará uma proposta para desencadear um “alerta da União” em caso de risco substancial de grave escassez de gás ou de procura de gás excecionalmente elevada, ou se cinco ou mais Estados-membros que tenham declarado um alerta a nível nacional solicitarem à Comissão que o faça”.

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A Comissão Europeia propôs, em meados de julho, a meta para redução do consumo de gás UE de 15% até à primavera, admitindo avançar com uma diminuição obrigatória da procura ante uma situação de alerta. O objetivo era que, até 31 de março de 2023, os Estados-membros reduzissem em 15% os seus consumos de gás natural, face à média histórica nesse período, considerando os anos de 2017 a 2021, de modo a aumentar o nível de armazenamento europeu e criar uma almofada de segurança para situações de emergência. Na verdade, as tensões geopolíticas devido à guerra na Ucrânia têm afetado o mercado energético europeu, já que a UE importa 90% do gás que consome, sendo a Rússia responsável por cerca de 45% das importações, em níveis variáveis entre os Estados-membros. No entanto, em Portugal, em 2021, o gás russo representou menos de 10% do total importado; e, neste ano, a GALP garantiu não precisar de importar gás russo.

O Conselho indica agora que “o regulamento é uma medida excecional e extraordinária, prevista por um período de tempo limitado, será aplicável durante um ano, e a Comissão levará a cabo uma revisão para considerar a sua prorrogação à luz da situação geral do aprovisionamento de gás da UE, até maio de 2023”.

A proposta teve a oposição inicial de países como Portugal e Espanha, pelo que foram depois introduzidas exceções ao documento para ter em conta especificidades como elevada dependência da produção de eletricidade a partir do gás, falta de sincronização com a rede elétrica europeia ou ainda falta de interconexão direta no gás.

A ideia é que, num inverno normal, haja uma redução de 30 mil milhões de metros cúbicos no gás consumido na UE, diminuição que passaria para 45 mil milhões de metros cúbicos num inverno longo e frio. Para isso, todos os consumidores, administrações públicas agregados familiares, proprietários de edifícios públicos, distribuidores de energia e empresas devem adotar medidas para reduzir o consumo de gás; e a Comissão acelerará os esforços para diversificar o aprovisionamento, incluindo a aquisição conjunta de gás, aumentando assim as possibilidades de obter fornecimentos alternativos de gás.

A fim de ajudar os Estados-Membros a reduzir a procura de gás, a Comissão adotou um plano europeu de redução que enumera as medidas, os princípios e os critérios para alcançar tal objetivo. O plano, centrando-se na substituição do gás por outros combustíveis e na poupança global de energia em todos os setores, visa a salvaguarda do abastecimento das famílias e de utilizadores cruciais, como os hospitais, e das empresas que fornecem produtos e serviços essenciais à economia e às cadeias de abastecimento, bem como à competitividade da UE. E dá orientações que os Estados-Membros terão em conta ao planearem as restrições a impor ao consumo de gás.

Antes de imporem limitações ao consumo, os Estados-Membros deverão esgotar as possibilidades de substituição de combustíveis, de regimes de poupança não obrigatórios e de fontes de energias alternativas. Sempre que possível, a prioridade deve ser atribuída à transição para as energias renováveis ou a opções mais limpas e com menores emissões carbónicas ou poluentes. Todavia, pode ser necessária uma transição temporária para o carvão, o petróleo ou a energia nuclear, desde que se previna uma dependência do carbono a longo prazo.

Outro pilar importante da poupança de energia é a redução dos sistemas de aquecimento e de arrefecimento. Por isso, a Comissão insta os Estados-Membros a lançarem campanhas de sensibilização do público para reduzir a utilização dos sistemas de aquecimento e arrefecimento e a implementarem a comunicação da UE, que prevê inúmeras alternativas para realizar poupanças a curto prazo. O plano de redução da procura de gás ajuda os Estados-Membros a identificar e a priorizar (nos respetivos grupos de consumidores “não protegidos”) os clientes ou instalações mais vulneráveis, com base em considerações económicas gerais e nos seguintes critérios: importância societal – setores como saúde, alimentação, segurança, refinarias, defesa e prestação de serviços ambientais; cadeias de abastecimento transfronteiras – setores ou indústrias que fornecem bens e serviços essenciais para o bom funcionamento das cadeias de abastecimento da UE; danos causados a instalações – para garantir que podem retomar a produção sem atrasos significativos, reparações, aprovação regulamentar ou outros custos; possibilidades de redução da procura de gás e de substituição de produtos ou componentes – em que medida as empresas podem mudar para componentes ou produtos importados e em que medida a procura dos mesmos pode ser satisfeita pelas importações.

O plano tem antecedentes. Com efeito, na sequência da invasão russa da Ucrânia, a Comissão adotou o plano REPowerEU para anular a dependência da UE dos combustíveis fósseis provenientes da Rússia, com medidas para diversificar os fornecedores de energia, assegurar a poupança de energia e a eficiência energética e acelerar a implantação de energias renováveis. E a UE adotou legislação que exige que o armazenamento subterrâneo de gás da UE fique abastecido até 80 % da sua capacidade total até 1 de novembro de 2022.

A Comissão criou a Plataforma Energética da UE, para agregar a procura de energia a nível regional e facilitar a aquisição conjunta de gás e de hidrogénio verde, assegurar a melhor utilização das infraestruturas, de modo que se canalize o gás para onde é mais necessário, e criar interligações com os parceiros internacionais de aprovisionamento. Já foram criados cinco grupos regionais de Estados-Membros no âmbito dessa plataforma, bem como um grupo de trabalho específico da Comissão para apoiar o processo. A UE já tem conseguido diversificar e reduzir a dependência das importações de gás da Rússia, graças ao aumento das importações de gás natural liquefeito e do recurso a gasodutos de outros fornecedores. 

Porém, já antes da invasão russa da Ucrânia, a UE começou a construir um sistema energético não poluente e interligado, centrado no aumento da quota das energias renováveis produzidas internamente, na eliminação progressiva dos combustíveis fósseis importados e na criação de ligações e de solidariedade entre os Estados-Membros. Ora, ao eliminar a dependência das fontes de combustíveis fósseis e reduzir o consumo de energia da UE graças a uma maior eficiência energética, o Pacto Ecológico Europeu e o pacote Objetivo 55 reforçam a segurança do aprovisionamento da UE. Assim, o plano REPowerEU procura acelerar a instalação de energias renováveis e a realização de investimentos no domínio da eficiência energética. Mais de 20 % da energia da UE já provém de energias renováveis e a Comissão propôs mais do que duplicar este valor (para, pelo menos, 45 %) até 2030.

Importa, ainda, referir que países como Portugal, devido à seca severa e até extrema, têm de forçar a poupança de água, tão escassa, e de que ainda depende muita da produção de energia elétrica. Por outro lado, a Comissão Europeia espera que o complexo de Sines venha a veicular gás para a Europa, juntando-se aos outros fornecedores, que não a Rússia: Norte de África e Arábia Saudita.

2022.08.09 – Louro de Carvalho

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