domingo, 14 de agosto de 2022

Jozef Tomko, um cardeal “chamado para servir”

 

Na manhã do passado dia 11 de agosto, no Vaticano, celebraram-se as solenes exéquias do cardeal eslovaco Jozef Tomko, Prefeito Emérito da Congregação para a Evangelização dos Povos e Presidente emérito do Pontifício Comité para os Congressos Eucarísticos Internacionais, que faleceu, aos 98 anos de idade, no dia 8 do mesmo mês.

Foi criado cardeal pelo Papa São João Paulo II em 1985 e, desde a morte do cardeal Albert Vanhove, a 29 de julho de 2021, Tomko era o membro vivo mais velho do Colégio dos Cardeais.

Presidiu à missa fúnebre, no Altar da Cátedra da Basílica de São Pedro, o cardeal Giovanni Battista Re, decano do Colégio cardinalício, que fez a homilia em homenagem ao purpurado falecido. Francisco, também presente, presidiu ao rito da Ultima Commendatio e da Valedictio.

Na sua homilia, o cardeal Re lembrou que “toda a longa e intensa vida útil do cardeal Tomko foi consagrada ao serviço de Deus e dos seus irmãos e quase inteiramente dedicada ao serviço na Cúria Romana”. Tendo, ao longo dos anos, desempenhado inúmeros cargos, sempre se considerou um “chamado para servir”. Com ele desaparece uma figura que fez honra à Cúria pela sólida fé que o caraterizava, pela genuína espiritualidade, pelo animado sensus Ecclesiae e pelo grande equilíbrio nos seus julgamentos, na sua calma, bom senso, amabilidade e gentileza.

No termo da homilia, o cardeal Re afirmou:

“Em oração, confiamos este nosso irmão a Deus, para que, na imensidade do seu amor, lhe dê aquela alegria e paz, que ganhou pelo seu serviço fiel e generoso à Igreja, ao Papa e à Santa Sé”.

E, considerando que ouvimos no Evangelho “credes em Deus, crede também em mim; vou preparar-vos um lugar, e quando eu me for e vos tiver preparado um lugar, virei novamente e vos levarei comigo, para que, onde eu estiver, estejais vós também”, frisou que são palavras pronunciadas na Última Ceia, quando os apóstolos estavam prestes a enfrentar o aparente fracasso de Jesus com a morte de cruz. E, atido ao desafio do Mestre “Tendes fé em Deus, tende fé também em mim”, declarou que “também nós nos agarramos a estas palavras ao oferecer a Santa Missa pelo falecido cardeal, pedindo a Deus que nos conceda, também a nós, completar a nossa jornada terrena em fidelidade e em zelo inabalável no serviço da Igreja e dos nossos irmãos, de que o Cardeal Tomko nos deixou um testemunho edificante”.

No seu testamento espiritual, de 26 de fevereiro de 2007, Tomko afirma que o seu ministério como prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos “tinha tomado posse do seu coração” e explicita: “Sentia este serviço como uma contribuição para a construção e crescimento do Corpo Místico da Igreja e amava as jovens igrejas missionárias com toda a sua beleza e fragilidade: as celebrações, os bispos e os missionários, os seminaristas, as religiosas, o povo muitas vezes pobre. Foi muito lindo labutar e sofrer por esta Igreja missionária viva!”

Após ser internado no Hospital Gemelli, a 25 de junho, devido a uma lesão na vértebra cervical, passou seis semanas no hospital e, desde o dia 6 de agosto, continuava o tratamento em casa com a assistência de um enfermeiro do Vaticano. Durante a estadia no hospital, recebeu a visita do Cardeal Secretário de Estado Pietro Parolin.  

No passado dia 30 de abril, o Papa encontrou-o na Sala Paulo VI por ocasião do encontro com os participantes da peregrinação eslovaca e, no seu discurso, disse: “Saúdo cordialmente o cardeal Jozef Tomko, cuja presença nos faz sentir que a Igreja é uma família que sabe honrar os idosos como um dom. Mas eu tenho uma dúvida, ele parece mais jovem do que eu!”

Ao anunciar a sua morte, a Conferência Episcopal Eslovaca convidou os fiéis a rezar pelo cardeal, anunciando que o enterro seria realizado após a cerimónia fúnebre, em Roma, na Catedral de Santa Elisabeth em Košice. 

Após a morte do Cardeal Tomko, o Colégio dos Cardeais fica constituído da seguinte forma: 206 cardeais, dos quais 116 são eleitores e 90 não eleitores.

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Jozef Tomko nasceu em Udavské, na arquidiocese eslovaca de Košice, a 11 de março de 1924.

Estudou na Faculdade Teológica de Santos Cirilo e Metódio, em Bratislava, entre 1943 e 1944. No outono de 1945, foi enviado para Roma, para estudar no Pontifício Ateneu Lateranense e na Pontifícia Universidade Gregoriana, tendo obtido o doutoramento em teologia, direito canónico e ciências sociais, com a dissertação De Sancti Spiritus habitatione secundum B. Petrum de Tarantasia, em 1951. Depois de 1948, por causa do Golpe de Praga, a que se seguiu a perseguição do governo comunista, não conseguiu retornar à Tchecoslováquia.

Recebeu a ordem de presbítero, a 12 de março de 1949, em Roma, das mãos de Lugi Traglia, arcebispo-titular de Cesareia da Palestina e vice-gerente da Diocese de Roma. Prestou serviço pastoral na diocese de Roma e na de Porto e Santa Rufina, sendo camareiro privado supernumerário, prelado de honra de Sua Santidade, membro do corpo docente da Pontifícia Universidade Gregoriana e subsecretário da Congregação para os Bispos, de 1974 a 1979. Porém, durante 15 anos (1950-1965), foi vice-reitor do Pontifício Colégio Nepomuceno, em Roma, e do internato adjacente para padres de vários países, incluindo países de missão e da América Latina.

Foi cofundador de uma revista religiosa e do Instituto dos Santos Cirilo e Metódio de Roma.

Eleito arcebispo-titular de Dóclea e nomeado secretário-geral do Sínodo dos Bispos em 12 de julho de 1979, recebeu a ordenação episcopal a 15 de setembro, festa de Nossa Senhora das Dores, Padroeira da Eslováquia, na Capela Sistina, das mãos do Papa São João Paulo II, assistido por Eduardo Martínez Somalo, arcebispo-titular de Tagaste, substituto do Secretário de Estado, e por Andrew Gregory Grutka, bispo de Gary, nos Estados Unidos. Foi nomeado pró-prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos em 24 de abril de 1985. Foi criado cardeal-diácono no Consistório de 25 de maio de 1985, pelo Papa São João Paulo II, recebendo o barrete cardinalício e a diaconia de Jesus Bom Pastor em Montagnola. Nomeado prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos e grão-chanceler da Pontifícia Universidade Urbaniana, trabalhou neste múnus de 27 de maio de 1985 a 9 de abril de 2001 (16 anos). Tornou-se cardeal-presbítero, optando pelo título de Santa Sabina, em 29 de janeiro de 1996. Em 1998, foi nomeado presidente da Assembleia Especial para a Ásia do Sínodo dos Bispos.

Em 23 de outubro de 2001, foi nomeado presidente do Pontifício Comité para os Congressos Eucarísticos Internacionais, resignando do cargo em 1 de outubro de 2007.

Foi membro da Comissão de Cardeais para investigar a divulgação de documentos reservados e confidenciais na televisão, em jornais e em outros meios de comunicação, em 24 de abril de 2012. A sua última atividade pública como cardeal ocorreu a 28 de junho de 2014, quando foi o enviado papal especial para o 25.º aniversário da liberdade recuperada da Eparquia Greco-Católica de Mukachevo, programada no Seminário Maior de Uzhlorod, na Ucrânia.

No seu tempo de cardeal o correu conclave de 2005, para a eleição de Bento XVI, e no de 2013, para a eleição de Francisco, mas não participou por já ter ultrapassado os 80 anos de idade.

Durante os seis anos em que foi Secretário-geral do Sínodo dos Bispos, preparou e supervisionou a realização de dois Sínodos Gerais Ordinários (1980 e 1983) e o Sínodo Particular dos Bispos da Holanda (1980). Também empreendeu a preparação do Sínodo Extraordinário convocado para o outono de 1985 por ocasião do 20.º aniversário do encerramento do Concílio Vaticano II e do Sínodo Ordinário de 1987 sobre a vocação e missão dos leigos, iniciando, com a publicação dos “Lineamenta”, uma ampla consulta na Igreja católica.

A sua atividade ao lidar com os problemas religiosos de seus compatriotas eslovacos deu frutos tangíveis. Cofundou uma revista religiosa e o Instituto dos Santos Cirilo e Metódio em Roma. Visitou várias vezes as comunidades eslovacas nos Estados Unidos, no Canadá e em vários países europeus. A sua atividade cultural também foi intensa, com inúmeras publicações sobre temas que vão da teologia ao direito, da história à espiritualidade.

Foi enviado pela Santa Sé a várias reuniões de bispos: em 1970, à Conferência Pan-Asiática de Bispos em Manila; em 1973, à Assembleia Plenária dos Episcopados da Oceânia em Sydney; em 1979, à Conferência de Puebla; em 1980, às celebrações do 25.º aniversário de fundação do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM) no Rio de Janeiro; em 1981, à reunião do SECAM em Yaoundé.

Estes encontros e as numerosas visitas que fez a diferentes países junto com as Assembleias Sinodais permitiram-lhe adquirir um profundo conhecimento da realidade de muitas Igrejas particulares e experimentar uma colegialidade efetiva e afetiva. Assim, a Providência preparou-o para alargar o coração à dimensão da Igreja universal e para liderar a Congregação para a Evangelização dos Povos, tarefa que lhe foi confiada por São João Paulo II, a 24 de abril de 1985, com a nomeação como pró-prefeito.

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O cardeal Tomko foi um dos príncipes da Igreja com uma vida espiritual, académica, administrativa, pedagógica e pastoral mais ativa nos últimos tempos – um perfil e uma ação a não esquecer.

2022.08.13 – Louro de Carvalho

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