segunda-feira, 7 de outubro de 2024

Vantagem dos painéis solares verticais de dupla face

 

Uma das fontes renováveis de energia elétrica em expansão é a que recorre à instalação de painéis fotovoltaicos, o que representa uma forma de produção democratizada de energia elétrica, por ser acessível a muitas bolsas pessoais e empresariais.  

Entretanto, a proliferação de painéis solares pode trazer fortes impactos ambientais, por exemplo a nível visual e a nível das produções agrícolas e hortícolas.  

Porém, as novas tecnologias não só aumentam a eficiência e durabilidade das células e módulos fotovoltaicos, como estão a mudar, de forma tangível, a sua relação com o ambiente. Hoje, sobre a terra e sobre o mar ou sobre as águas de albufeira, já vemos estruturas gigantes de painéis a captar energia. Não é bonito de ver e virá um dia em se evidenciam as consequências nefastas, se não se pensar o modo de estabelecer a sintonia entre a Natureza e a tecnologia humana.

Há já uma alternativa interessante nesta tecnologia. Com orientação vertical dos módulos de Este para Oeste, é possível alcançar picos de energia de manhã e ao final da tarde, diminuindo a carga dos sistemas fotovoltaicos nas redes elétricas, o que significa também a necessidade de menos capacidade de armazenamento de energia.

Por outro lado, como se vê, os parques solares oblíquos não permitem que nada cresça debaixo das estruturas, deixando muitos hectares de terreno sem qualquer outra utilidade. Durante uma vida útil, a instalação solar padrão tem sido uma instalação com painéis virados a Sul e inclinados num ângulo entre 20ºC e 35ºC (graus celsius), para assegurar a maior produção de energia possível, um esquema que teve e continua a ter consequências diretas na gestão da energia.

Porém, há quem aproveite a instalação dos painéis para cobrir espaços, permitindo abrigo contra o calor de verão e contra a intempérie invernal, que poder surgir em qualquer momento do ano. Isso acontece, por exemplo, no Instituto Português de Oncologia do Porto (IPO), cujo espaço exterior, aplicados os painéis, permite o estacionamento de veículos ao abrigo do calor e da chuva.  

A maior parte da eletricidade é produzida durante as horas centrais do dia, especialmente no verão, o que aumenta a necessidade de sistemas de armazenamento para compensar as flutuações durante o dia ou a estação. Todavia, é possível obter uma flexibilização da rede, manter a produção agrícola rendível e aumentar a produtividade energética. Isso conseguir-se-á com painéis solares verticais. Assim, num futuro não distante, será possível ter campos de cultivo a partilhar o seu espaço com filas de painéis solares verticais.

De acordo com um grupo de investigação de Leipzig, existe uma abordagem que pode fazer avançar a implantação de fotovoltaicos, sem reduzir a flexibilidade da rede.

Segundo Sophia Reker, da Universidade de Ciências Aplicadas de Leipzig, os módulos fotovoltaicos bifaciais podem aproveitar a energia solar de ambos os lados. Se forem instalados numa orientação Este-Oeste, a maior parte da eletricidade é produzida de manhã e à tarde. Isto reduzirá a necessidade de armazenamento de eletricidade e, em simultâneo, minimizará a quantidade de terra necessária para a produção de eletricidade. A questão que se coloca é se estes painéis fotovoltaicos verticais são rentáveis.

Para responder a essa dúvida, a investigação avaliou o impacto das diferentes orientações do painel na distribuição do rendimento energético, utilizando o Sistema de informação Geográfica Fotovoltaica (PVGIS) do Centro Comum de Investigação da Comissão Europeia. E os cientistas descobriram que, no caso dos painéis solares verticais de dupla face, apesar de diminuir a potência instalada por área num fator de 4 a 5, a dupla utilização do terreno (eletricidade e produção agrícola) permitiria um grande potencial técnico na gama de terawatt-hora por ano.

Em detalhe, Sophia Reker e os colegas modelaram um sistema energético para a Alemanha, em conformidade com os objetivos alemães de proteção climática, assumindo um aumento das instalações fotovoltaicas dos atuais 58 GW (Gigawatts) para 400 GW, em 2030.

Os investigadores mostraram como a necessidade de armazenamento diminui, se a maior parte da nova capacidade fotovoltaica for instalada verticalmente com uma orientação Este-Oeste. “Poder-se-ia demonstrar que os sistemas fotovoltaicos verticais permitem uma menor capacidade de armazenamento ou uma menor utilização de centrais elétricas alimentadas a gás. Sem qualquer opção de armazenamento, é possível uma redução das emissões totais de dióxido de carbono (CO2) de até 10,2 Mt/ano”, referiu a investigadora Sophia Reker.

Parecerá contraintuitivo, para alguém, não inclinar os painéis solares, para ficarem diretamente virados para o sol, já que as instalações são, geralmente, inclinadas, para se alinharem com a latitude em que os edifícios estão localizados. Porém, como vimos, estudos recentes mostram que os painéis fotovoltaicos (PV) verticais bifaciais podem superar os modelos tradicionais em termos de produção de energia. E, nesse sentido, os cientistas da  Organização Neerlandesa para a Investigação Científica Aplicada (TNO) analisaram a razão deste facto. Não é porque os painéis solares bifaciais têm dois lados idênticos mas opostos, mas porque os painéis fotovoltaicos tradicionais inclinados tendem a sobreaquecer quando a luz solar é demasiado forte.

As temperaturas de funcionamento mais baixas correspondem a um melhor desempenho”, explica Bas van Aken, cientista da TNO, acrescentando: “Os painéis fotovoltaicos perdem cerca de 1% do desempenho por cada 2ºC a 3ºC que aquecem. Os sistemas fotovoltaicos de telhado inclinado podem facilmente aquecer 50ºC, enquanto os sistemas fotovoltaicos de campo aberto registam painéis que chegam a aquecer 25ºC a 30ºC mais do que o ar ambiente.”

Os painéis solares verticais podem produzir até 20% mais energia, o que os torna valiosos em climas com invernos rigorosos e escuros, onde é crucial maximizar a produção de energia durante os dias mais curtos.

Em suma, aproveitar a energia solar poderá exigir uma reestruturação dos painéis de forma que não ocupem área que fica inutilizada de terrenos, muitos deles com potencial de cultivo.

Nestes termos, em 2022, a Alemanha já esperava que, no seu futuro sistema energético, a energia eólica e solar cobrirá, diretamente, toda a procura de eletricidade durante mais de metade do ano.

Os módulos fotovoltaicos inclinados típicos voltados para o Sul produzem um pico forte por volta do meio-dia, em dias ensolarados. Nos módulos fotovoltaicos verticais voltados de Leste-Oeste, os picos de rendimento energético são deslocados para as horas da manhã e da tarde. Tais sistemas podem ser aplicados em complexos agrofotovoltaicos com rendimento energético por capacidade instalada semelhante aos sistemas fotovoltaicos convencionais. Embora a potência instalada por área seja quatro a cinco vezes menor, a dupla utilização do solo com agricultura permite um potencial técnico na ordem dos terawatts-hora por ano, o que é comparável a metade de toda a procura de energia primária alemã. Num modelo de simulação baseado no programa EnergyPLAN para a Alemanha 2030, com 80% de redução de CO2, em relação a 1990, é investigado o efeito de diferentes orientações de centrais fotovoltaicas.

No modelo encontra-se percentagem ótima de cerca de 80% de sistemas fotovoltaicos verticais, sem quaisquer armazenamentos de eletricidade, e 70%, com possibilidades de armazenamento de eletricidade. Pode demonstrar-se que os sistemas fotovoltaicos verticais permitem menores capacidades de armazenamento ou menor utilização de centrais elétricas a gás. Sem quaisquer opções de armazenamento, é possível reduzir as emissões globais de CO2 em até 10 Mt/ano.

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Neste quadro de novas tecnologias, o estádio nacional de futebol da Noruega já tem uma atração menos conhecida: 1242 painéis solares que se estendem pelo telhado. Não se trata dos painéis tradicionais de telhado plano. Os minipainéis solares, de forma quadrada, têm duas caraterísticas principais que os distinguem dos que se veem normalmente nos edifícios: são bifaciais, o que significa que têm dois lados ativos, e são instalados verticalmente.

Em junho de 2024, o Estádio Ullevaal, em Oslo, acolheu, num telhado, a maior instalação vertical de painéis solares do Mundo, colocando o estádio na vanguarda da inovação em matéria de energias renováveis. À primeira vista, os painéis parecem frágeis, e poder-se-ia ter receio de os pisar. Todavia, durante uma visita ao estádio, ficou a saber-se que são incrivelmente eficientes na produção de energia solar.

O Estádio Ullevaal tem o objetivo ambicioso de produzir pelo menos 250 mil quilowatts-hora (kWh) de eletricidade por ano, o que equivale à energia necessária para abastecer 71 casas durante um ano inteiro. Estes módulos solares verticais bifaciais são a única solução capaz de atingir estes valores, nomeadamente, nas regiões mais frias e menos soalheiras. Se o objetivo for atingido, o estádio alargará a sua instalação a outros lados da cobertura.

No estádio, os painéis estão virados diretamente para o sol, com o sistema fotovoltaico orientado no sentido Norte-Sul para captar a luz durante as horas de ponta, ao início da tarde. “Escolhemos esta orientação, porque queremos produzir mais energia no inverno, quando os preços da eletricidade são mais elevados”, afirma Lise Kristin Sunsby, gestora imobiliária do estádio.

O estádio utiliza painéis verticais desenvolvidos pela empresa norueguesa Over Easy Solar, que testou a sua invenção noutros edifícios na Noruega, antes de obter o contrato para cobrir o telhado do estádio de futebol.

Trygve Mongstad, diretor executivo da Over Easy Solar, trabalhou, anteriormente, como instalador de painéis solares e apercebeu-se de que os painéis fotovoltaicos tradicionais podem ser difíceis de fixar nos telhados, sendo pesados e demorados a instalar. Com os novos painéis verticais, o processo é mais leve, reduzindo os custos e tornando-o mais fácil de concluir: “Demorámos quatro dias a instalar todas estas unidades”, diz Mongstad.

Os painéis fotovoltaicos verticais também beneficiam do efeito albedo, em que a neve que cai entre as filas reflete a luz solar nos painéis, aumentando o rendimento energético. Em contraponto, os painéis horizontais ou inclinados requerem muita manutenção e limpeza, após tempestades de neve, nas regiões do Norte, ou tempestades de areia nos climas do Sul, que podem bloquear a produção de energia durante dias inteiros.

A Over Easy Solar tem, atualmente, 30 instalações solares em 11 países europeus, incluindo a Espanha e a Suíça. Observou o desempenho do produto também nas regiões meridionais. Tem bom desempenho, sobretudo quando combinado com telhados de cor branca, que é altamente refletora e que é comum nos países mais quentes e soalheiros, para reduzir a absorção de calor.

A transformação de locais públicos em produtores de energia está a generalizar-se. A O2 Arena, em Londres, o maior recinto coberto da Europa, e o Estádio Galatasaray, na Turquia, são exemplos de como os recintos de espetáculos avançam para a sustentabilidade, integrando soluções de energias renováveis nas suas operações, que os ajudam a reduzir os custos.

À medida que as cidades procuram reduzir a sua pegada de carbono, a procura de soluções de energia solar mais eficientes e que poupem espaço cresce para além dos recintos públicos.

De acordo com a Comissão Europeia, a integração desta tecnologia pode ajudar a Europa a corrigir as oscilações dos preços da energia e a garantir maior segurança energética.

No entanto, a energia fotovoltaica vertical não faz parte de uma corrida “o vencedor leva tudo”. Mongstad sugere que não haverá mudança da energia fotovoltaica horizontal para a vertical tão cedo; é mais provável que essa mudança ocorra, quando as instalações mais antigas chegarem ao fim do seu ciclo de vida, altura em que as empresas poderão substituir os painéis antigos por painéis verticais. Apenas uma mistura de inclinações – da vertical para a horizontal, e orientações de Este para Oeste e de Sul para Norte – ajudará a gerar energia constante ao longo do dia e a estabilizar, ainda mais, os preços da energia em todo o continente.

Entretanto, os painéis solares verticais já estão a revelar-se uma nova solução para as regiões setentrionais, produzindo mais 20% de energia do que os painéis tradicionais.

2024.10.07 – Louro de Carvalho

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