Uma das fontes renováveis de energia
elétrica em expansão é a que recorre à instalação de painéis fotovoltaicos, o
que representa uma forma de produção democratizada de energia elétrica, por ser
acessível a muitas bolsas pessoais e empresariais.
Entretanto, a proliferação de painéis
solares pode trazer fortes impactos ambientais, por exemplo a nível visual e a nível
das produções agrícolas e hortícolas.
Porém, as novas tecnologias não só aumentam
a eficiência e durabilidade das células e módulos fotovoltaicos, como estão a
mudar, de forma tangível, a sua relação com o ambiente. Hoje, sobre a terra e
sobre o mar ou sobre as águas de albufeira, já vemos estruturas gigantes de
painéis a captar energia. Não é bonito de ver e virá um dia em se evidenciam as
consequências nefastas, se não se pensar o modo de estabelecer a sintonia entre
a Natureza e a tecnologia humana.
Há já uma alternativa interessante
nesta tecnologia. Com orientação vertical dos módulos de Este para Oeste, é
possível alcançar picos de energia de manhã e ao final da tarde, diminuindo a
carga dos sistemas fotovoltaicos nas redes elétricas, o que significa também a
necessidade de menos capacidade de armazenamento de energia.
Por outro lado, como se vê, os
parques solares oblíquos não permitem que nada cresça debaixo das estruturas,
deixando muitos hectares de terreno sem qualquer outra utilidade. Durante uma
vida útil, a instalação solar padrão tem sido uma instalação com painéis
virados a Sul e inclinados num ângulo entre 20ºC e 35ºC (graus celsius), para
assegurar a maior produção de energia possível, um esquema que teve e continua
a ter consequências diretas na gestão da energia.
Porém, há quem aproveite a
instalação dos painéis para cobrir espaços, permitindo abrigo contra o calor de
verão e contra a intempérie invernal, que poder surgir em qualquer momento do
ano. Isso acontece, por exemplo, no Instituto Português de Oncologia do Porto (IPO),
cujo espaço exterior, aplicados os painéis, permite o estacionamento de
veículos ao abrigo do calor e da chuva.
A maior parte da eletricidade é
produzida durante as horas centrais do dia, especialmente no verão, o que
aumenta a necessidade de sistemas de armazenamento para compensar as flutuações
durante o dia ou a estação. Todavia, é possível obter uma flexibilização da rede,
manter a produção agrícola rendível e aumentar a produtividade energética. Isso
conseguir-se-á com painéis solares verticais. Assim, num futuro não distante,
será possível ter campos de cultivo a partilhar o seu espaço com filas de
painéis solares verticais.
De acordo com um grupo de
investigação de Leipzig, existe uma abordagem que pode fazer avançar a
implantação de fotovoltaicos, sem reduzir a flexibilidade da rede.
Segundo Sophia Reker, da Universidade
de Ciências Aplicadas de Leipzig, os módulos fotovoltaicos bifaciais podem
aproveitar a energia solar de ambos os lados. Se forem instalados numa orientação Este-Oeste,
a maior parte da eletricidade é produzida de manhã e à tarde. Isto reduzirá a
necessidade de armazenamento de eletricidade e, em simultâneo, minimizará a quantidade de terra
necessária para a produção de eletricidade. A questão que se coloca
é se estes painéis fotovoltaicos verticais são rentáveis.
Para responder a essa dúvida, a
investigação avaliou o impacto das diferentes orientações do painel na
distribuição do rendimento energético, utilizando o Sistema de informação Geográfica
Fotovoltaica (PVGIS) do Centro Comum de Investigação da Comissão Europeia. E os
cientistas descobriram que, no caso dos painéis solares verticais de dupla
face, apesar de diminuir a potência instalada por área num fator de 4 a 5, a
dupla utilização do terreno (eletricidade e produção agrícola) permitiria um
grande potencial técnico na gama de terawatt-hora por ano.
Em detalhe, Sophia Reker e os colegas
modelaram um sistema energético para a Alemanha, em conformidade com os
objetivos alemães de proteção climática, assumindo um aumento das instalações fotovoltaicas
dos atuais 58 GW (Gigawatts) para 400 GW, em 2030.
Os investigadores mostraram como a
necessidade de armazenamento diminui, se a maior parte da nova capacidade
fotovoltaica for instalada verticalmente com uma orientação Este-Oeste. “Poder-se-ia demonstrar que os sistemas
fotovoltaicos verticais permitem uma menor capacidade de armazenamento ou uma
menor utilização de centrais elétricas alimentadas a gás. Sem qualquer opção de
armazenamento, é possível uma redução das emissões totais de dióxido de carbono
(CO2) de até 10,2 Mt/ano”, referiu a investigadora Sophia
Reker.
Parecerá contraintuitivo, para alguém,
não inclinar os painéis solares, para ficarem diretamente virados para o sol, já
que as instalações são, geralmente, inclinadas, para se alinharem com a
latitude em que os edifícios estão localizados. Porém, como vimos, estudos
recentes mostram que os painéis fotovoltaicos (PV) verticais bifaciais podem
superar os modelos tradicionais em termos de produção de energia. E, nesse
sentido, os cientistas da Organização Neerlandesa para a Investigação
Científica Aplicada (TNO) analisaram a razão deste facto. Não é
porque os painéis solares bifaciais têm dois lados idênticos mas opostos, mas
porque os painéis fotovoltaicos tradicionais inclinados tendem a sobreaquecer
quando a luz solar é demasiado forte.
“As temperaturas
de funcionamento mais baixas correspondem a um melhor desempenho”, explica Bas
van Aken, cientista da TNO, acrescentando: “Os painéis fotovoltaicos perdem cerca de 1%
do desempenho por cada 2ºC a 3ºC que aquecem. Os sistemas fotovoltaicos de
telhado inclinado podem facilmente aquecer 50ºC, enquanto os sistemas
fotovoltaicos de campo aberto registam painéis que chegam a aquecer 25ºC a 30ºC
mais do que o ar ambiente.”
Os painéis solares verticais podem produzir
até 20% mais energia, o que os torna valiosos em climas com invernos rigorosos
e escuros, onde é crucial maximizar a produção de energia durante os dias mais
curtos.
Em suma, aproveitar a energia solar
poderá exigir uma reestruturação dos painéis de forma que não ocupem área que
fica inutilizada de terrenos, muitos deles com potencial de cultivo.
Nestes
termos, em 2022, a Alemanha já esperava que, no seu futuro sistema energético, a energia eólica e solar cobrirá, diretamente,
toda a procura de eletricidade durante mais de metade do ano.
Os módulos
fotovoltaicos inclinados típicos voltados para o Sul produzem um pico forte por
volta do meio-dia, em dias ensolarados. Nos módulos fotovoltaicos verticais
voltados de Leste-Oeste, os picos de rendimento energético são deslocados para
as horas da manhã e da tarde. Tais sistemas podem ser aplicados em complexos
agrofotovoltaicos com rendimento energético por capacidade instalada semelhante
aos sistemas fotovoltaicos convencionais. Embora a potência instalada por área
seja quatro a cinco vezes menor, a dupla utilização do solo com agricultura
permite um potencial técnico na ordem dos terawatts-hora por ano, o que é
comparável a metade de toda a procura de energia primária alemã. Num modelo de
simulação baseado no programa EnergyPLAN para a Alemanha 2030, com 80% de
redução de CO2, em relação a 1990, é investigado o efeito de
diferentes orientações de centrais fotovoltaicas.
No modelo
encontra-se percentagem ótima de cerca de 80% de sistemas fotovoltaicos verticais,
sem quaisquer armazenamentos de eletricidade, e 70%, com possibilidades de
armazenamento de eletricidade. Pode demonstrar-se que os sistemas fotovoltaicos
verticais permitem menores capacidades de armazenamento ou menor utilização de
centrais elétricas a gás. Sem quaisquer opções de armazenamento, é possível
reduzir as emissões globais de CO2 em até 10 Mt/ano.
***
Neste quadro de novas tecnologias, o
estádio nacional de futebol da Noruega já tem uma atração menos conhecida: 1242
painéis solares que se estendem pelo telhado. Não se trata dos painéis tradicionais
de telhado plano. Os minipainéis solares, de forma quadrada, têm duas
caraterísticas principais que os distinguem dos que se veem normalmente nos
edifícios: são bifaciais, o que significa que têm dois lados ativos, e são
instalados verticalmente.
Em junho de 2024, o Estádio Ullevaal,
em Oslo, acolheu, num telhado, a maior instalação vertical de painéis solares
do Mundo, colocando o estádio na vanguarda da inovação em matéria de energias
renováveis. À primeira vista, os painéis parecem frágeis, e poder-se-ia ter
receio de os pisar. Todavia, durante uma visita ao estádio, ficou a saber-se
que são incrivelmente eficientes na produção de energia solar.
O Estádio Ullevaal tem o objetivo
ambicioso de produzir pelo menos 250 mil quilowatts-hora (kWh) de eletricidade
por ano, o que equivale à energia necessária para abastecer 71 casas durante um
ano inteiro. Estes módulos solares verticais bifaciais são a única solução
capaz de atingir estes valores, nomeadamente, nas regiões mais frias e menos
soalheiras. Se o objetivo for atingido, o estádio alargará a sua instalação a
outros lados da cobertura.
No estádio, os painéis estão virados
diretamente para o sol, com o sistema fotovoltaico orientado no sentido Norte-Sul
para captar a luz durante as horas de ponta, ao início da tarde. “Escolhemos
esta orientação, porque queremos produzir mais energia no inverno, quando os
preços da eletricidade são mais elevados”, afirma Lise Kristin Sunsby, gestora
imobiliária do estádio.
O estádio
utiliza painéis verticais desenvolvidos pela empresa norueguesa Over Easy
Solar, que testou a sua invenção noutros edifícios na Noruega, antes de obter o
contrato para cobrir o telhado do estádio de futebol.
Trygve
Mongstad, diretor executivo da Over Easy Solar, trabalhou, anteriormente, como
instalador de painéis solares e apercebeu-se de que os painéis fotovoltaicos
tradicionais podem ser difíceis de fixar nos telhados, sendo pesados e
demorados a instalar. Com os novos painéis verticais, o processo é mais leve,
reduzindo os custos e tornando-o mais fácil de concluir: “Demorámos quatro dias
a instalar todas estas unidades”, diz Mongstad.
Os painéis
fotovoltaicos verticais também beneficiam do efeito albedo, em que a neve que
cai entre as filas reflete a luz solar nos painéis, aumentando o rendimento
energético. Em contraponto, os painéis horizontais ou inclinados requerem muita
manutenção e limpeza, após tempestades de neve, nas regiões do Norte, ou tempestades de areia nos climas do Sul, que podem
bloquear a produção de energia durante dias inteiros.
A Over Easy Solar tem, atualmente, 30
instalações solares em 11 países europeus, incluindo a Espanha e a Suíça.
Observou o desempenho do produto também nas regiões meridionais. Tem bom
desempenho, sobretudo quando combinado com telhados de cor branca, que é
altamente refletora e que é comum nos países mais quentes e soalheiros, para
reduzir a absorção de calor.
A transformação de locais públicos em
produtores de energia está a generalizar-se. A O2 Arena, em Londres, o maior
recinto coberto da Europa, e o Estádio Galatasaray, na Turquia, são exemplos de
como os recintos de espetáculos avançam para a sustentabilidade, integrando
soluções de energias renováveis nas suas operações, que os ajudam a reduzir os
custos.
À medida que as cidades procuram
reduzir a sua pegada de carbono, a procura de soluções de energia solar mais
eficientes e que poupem espaço cresce para além dos recintos públicos.
De acordo com a Comissão
Europeia, a integração desta tecnologia pode ajudar a Europa a corrigir as
oscilações dos preços da energia e a garantir maior segurança energética.
No entanto, a
energia fotovoltaica vertical não faz parte de uma corrida “o vencedor leva
tudo”. Mongstad sugere que não haverá mudança da energia fotovoltaica
horizontal para a vertical tão cedo; é mais provável que essa mudança ocorra,
quando as instalações mais antigas chegarem ao fim do seu ciclo de vida, altura
em que as empresas poderão substituir os painéis antigos por painéis verticais.
Apenas uma mistura de inclinações – da vertical para a horizontal, e
orientações de Este para Oeste e de Sul para Norte – ajudará a gerar energia
constante ao longo do dia e a estabilizar, ainda mais, os preços da energia em
todo o continente.
Entretanto, os painéis solares verticais já estão a
revelar-se uma nova solução para as regiões setentrionais, produzindo mais 20%
de energia do que os painéis tradicionais.
2024.10.07
– Louro de Carvalho
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