segunda-feira, 7 de outubro de 2024

Israel assinala aniversário do ataque mortal do Hamas com vigílias

 

Um ano depois dos brutais ataques que desencadearam a guerra entre Israel e o Hamas em Gaza, Israelitas de todo o país assinalaram o primeiro aniversário com vigílias em memória dos mortos. E a data é também assinala da com uma cerimónia de Estado pré-gravada na cidade de Ofakim, no Sul do país. O evento foi planeado, inicialmente, para ser muito maior, mas foi reduzido, devido a preocupações de segurança, à medida que Israel se envolve em crescente conflito com o Irão e com o Hezbollah.

Em Reʿim, um kibutz no Sul de Israel, a última música que se ouviu no festival Nova, tocou um ano depois do ataque do Hamas de 7 de outubro.

Às 6h30 locais, hora a que o Hamas lançou o ataque, há 12 meses, as famílias das vítimas mortais no festival – acompanhadas e abraçadas pelo presidente israelita Isaac Herzog, com quem se levantaram para um momento de silêncio – reuniram-se no local onde quase 400 pessoas foram mortas a tiro pelo grupo armado, tendo muitas outros sido feitas reféns.

Ao mesmo tempo, mais de 350 pessoas deslocaram-se até ao local onde decorreu o festival de música eletrónica para prestar homenagem às vítimas, bem como para apelar à libertação dos reféns ainda detidos em Gaza. De acordo com Telavive, cerca de 100 reféns permanecem em Gaza, mas deverão estar vivos menos de 70.

Centenas de pessoas protestaram nas ruas de Jerusalém, antes de se reunirem em frente à casa do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, apelando à negociação de um acordo de cessar-fogo com o Hamas que garanta o regresso dos reféns em segurança. “Gostaria de prometer a todos os 101 reféns, em nome de todos nós, de todo o povo de Israel, que não vamos parar de lutar. Não deixaremos de fazer ouvir as suas vozes. Não vamos parar de insistir no que é moral, na coisa mais básica, que eles voltem em segurança, o mais depressa possível”, garantiu, em frente à casa de Netanyahu, a israelita Shir Siegel, filha de um refém detido em Gaza, vincando: “Estamos aqui para lembrar (aos reféns) que não os esquecemos”, disse Shiri Albag.

Shiri Albag, cuja filha Liri está entre as pessoas mantidas em cativeiro, acrescentou que ela e as outras famílias “não descansarão”, até que os restantes reféns sejam devolvidos.

Entretanto, é de relevar que Benjamin Netanyahu e o seu governo têm estado sobre crescente pressão interna e externa, para um acordo de cessar-fogo com o Hamas, que ponha fim aos combates na Faixa de Gaza e que permita o regresso dos reféns. Muitas das famílias das pessoas mortas e feitas prisioneiras nos ataques estão ressentidas com o governo israelita, por não ter conseguido impedir o ataque e por não ter sido capaz de trazer os restantes reféns para casa.

O Fórum dos Reféns e das Famílias Desaparecidas, grupo criado para representar as famílias dos reféns, anunciou, no dia 7 de outubro deste ano, que Idan Shtivi foi morto nos ataques de 7 de outubro de 2023, estando o seu corpo na posse do Hamas. Idan Shtivi, de 29 anos, foi feito refém, depois de ter estado no festival de música Nova para fotografar o evento.

Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, que não distingue combatentes de civis, em Gaza, o conflito já matou mais de 41900 Palestinianos (2% da população), cerca de 17 mil dos quais menores, fez cerca de 17 mil feridos, além de quase 10 mil desaparecidos, deslocou a maior parte dos 2,3 milhões de habitantes do território e provocou uma crise humanitária que levou à fome generalizada (mais de 1,1 milhões de pessoas em “situação de fome catastrófica”). Por isso, a Europa vem sendo palco de numerosos protestos, em memória das dezenas de milhares de Palestinianos mortos no contexto dos combates, e Israel enfrenta críticas internacionais constantes sobre a sua conduta de guerra, com dois tribunais mundiais a examinarem as suas ações.

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Face à pressão crescente – com apelos dos Estados Unidos da América (EUA) e da União Europeia (UE) para um cessar-fogo em Gaza – sobre a coligação governativa de Benjamin Netanyahu, à medida que se intensifica o conflito entre Israel e os grupos aliados do Irão, a questão que se coloca é se o primeiro-ministro conseguirá manter o apoio interno, enquanto Israel luta em várias frentes.

Enquanto Israel aumenta as suas apostas militares contra o Hamas e contra o Hezbollah, grupos aliados e apoiados pelo Irão, os chamados “proxies”, Benjamin Netanyahu esforça-se por persuadir os parceiros ocidentais tradicionais de que a sua estratégia musculada é a única opção para salvar Israel da desgraça. Apesar de os EUA e a UE exigirem, cada vez mais, um cessar-fogo em Gaza, a guerra estendeu-se à frente libanesa. E Israel está a ser atacado e a lutar contra os representantes do Irão, o que poderá levar a eventual confronto com o regime de Teerão.

Entretanto, o governo conservador de extrema-direita liderado por Benjamin Netanyahu – político populista do Likud com mais de duas décadas de experiência – tem estado cada vez mais sob pressão, desde uma miríade de alegados escândalos e acusações de conflito de interesses até alegações de má gestão da guerra contra o Hamas e do objetivo de libertar os reféns israelitas em Gaza. Porém, conseguiu manter-se no poder e conservar a sua posição, enquanto Israel abria uma nova frente contra o Hezbollah.

A 29 de dezembro de 2022, Benjamin Netanyahu, sob pressão, formou um governo de coligação com os ultraconservadores de Israel. O novo executivo foi visto com ceticismo pelos setores mais moderados da sociedade israelita, que saíram, cada vez mais, à rua para protestar contra as reformas do governo, como a revisão do sistema judicial. Contudo, os acontecimentos de 7 de outubro de 2023 mudaram tudo. “Os massacres de 7 de outubro mudaram a situação e criaram um governo de unidade nacional”, considerou Gregory Alegi, professor de política da Universidade Luiss, em Roma, à Euronews.

Inicialmente, o massacre de 7 de outubro foi encarado pela população israelita como fracasso das forças de segurança e erro pessoal de Netanyahu, que fez campanha com a imagem de “Senhor Segurança”. Todavia, de acordo com os especialistas, o sentimento de emergência acabou por prevalecer sobre as disputas políticas. “Todos os israelitas concordam com a necessidade de proteger e defender o país e de o tornar seguro. Penso que é um erro pensar que algumas pessoas são contra esse objetivo geral”, sustentou Gregory Alegi, mantendo que, apesar do debate permanente sobre as escolhas estratégicas do governo, os israelitas têm o sentimento de que estão a lutar pela sobrevivência do seu país.

“Há poucas dúvidas de que se trata de um governo de unidade nacional que concorda com o ponto básico de defender e preservar Israel, tanto como Estado, como um lugar seguro para os judeus e um símbolo para os judeus no mundo. Isso não mudou. E seria um erro pensar que podemos mudar. […] Como é que podem separar os diferentes partidos e derrubar o governo?”, questionou.

Após os ataques a Israel, a aliança moderada liberal-centrista Unidade Nacional ou Home Camp juntou-se ao gabinete de guerra, trazendo o apoio de um segmento relevante da população israelita que, anteriormente, se opunha ao governo de extrema-direita.

A Unidade Nacional é liderada por Benny Gantz e Gadi Eisenkot, dois antigos chefes de estado-maior das forças de defesa israelitas (FDI), altamente respeitados. No entanto, ambos deixaram o gabinete de Netanyahu, a 8 de junho.

Ganz demitiu-se depois de o primeiro-ministro ter rejeitado o seu “plano de seis pontos”, sobre o futuro de Gaza e a forma de pôr fim à guerra, apoiado por Washington.

Benny Gantz, membro centrista do Gabinete de Guerra de Israel, composto por três homens, anunciou a sua demissão, a 8 de junho, em conferência de imprensa. A mudança não constituiu ameaça imediata para Benjamin Netanyahu, que ainda controla uma coligação maioritária no parlamento, mas o chefe do governo torna-se mais dependente dos aliados de extrema-direita.

Gantz disse que Netanyahu está a tornar “impossível a vitória total” e que o governo tem de colocar o regresso dos reféns capturados pelo Hamas “acima da sobrevivência política”.

O popular antigo chefe militar juntou-se ao governo de Netanyahu pouco depois do ataque do Hamas, numa demonstração de unidade. A sua presença reforçou a credibilidade de Israel junto dos parceiros internacionais, pois tem boas relações de trabalho com os EUA.

Gantz tinha dito que deixaria o governo até 8 de junho, se Netanyahu não formulasse um novo plano para o pós-guerra em Gaza, o que o primeiro-ministro não fez.

Durante o anúncio de demissão, apelou a Netanyahu (“não deixes que o nosso povo seja dilacerado”) para que marcasse uma data para as eleições. “Para garantir uma verdadeira vitória, é conveniente que, no outono, um ano (após) a catástrofe, se realizem eleições que acabarão por estabelecer um governo que irá ganhar a confiança do povo e será capaz de enfrentar os desafios (de Israel)”, disse Gantz.

A conferência de imprensa de Benny Gantz ocorreu depois de quatro reféns israelitas terem sido, dramaticamente, resgatados de Gaza, no início do dia, na maior operação deste tipo realizada por Israel, desde o início da guerra de oito meses.

Meses após o choque do ataque do Hamas, a dissidência política voltou a prevalecer, sobretudo, após a pressão dos EUA e da UE, dois parceiros cruciais, aos olhos de muitos Israelitas moderados. Pela primeira vez, na História de Israel, o Tribunal Penal Internacional (TPI) instaurou um processo contra o seu primeiro-ministro, Netanyahu, e contra o ministro da Defesa, Gallant. Além disso, a coabitação com políticos ultraconservadores, como o ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, e o ministro da Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, tornou-se impossível, para Gantz.

As razões que levaram à demissão dos liberais centristas, a 8 de junho, são sistémicas e, quatro meses depois, continuam presentes: giram em torno de opiniões muito divergentes sobre a solução dos dois Estados e sobre os colonatos ilegais na Cisjordânia. Os partidos de Smotrich e Ben-Gvir opõem-se, radicalmente, à solução dos dois Estados e são contra a repressão dos colonos ilegais.

“A Cisjordânia é um problema, uma questão internacional, há muito tempo. E é a única parte que está, pelo menos, nominalmente, sob o controlo da Autoridade Palestiniana [AP]. Por isso, em muitos aspetos, é um símbolo positivo e negativo ao mesmo tempo”, disse Gregory Alegi, sustentando: “Há um sinal de receio de que os extremistas, como o Hamas, possam também apoderar-se da Cisjordânia. É evidente que a resposta não é o estabelecimento indiscriminado de colonatos por parte de Israel, nem a retirada de propriedades ou a demolição de casas.”

“Além da base jurídica, a criação de um clima de entendimento pode ajudar a encontrar uma solução. Por isso, a Cisjordânia é outro problema importante”, acrescentou.

Nestas circunstâncias, coloca-se a questão se o primeiro-ministro é refém dos extremistas ou se tem um grande plano estratégico, independentemente dos seus aliados. Os planos para o futuro podem ser tão ambiciosos como uma mudança de regime no Irão. Ainda recentemente se dirigiu ao povo iraniano numa mensagem de vídeo. “Quando o Irão for finalmente livre, e esse momento chegará muito mais cedo do que as pessoas pensam, tudo será diferente... Os nossos dois países, Israel e Irão, estarão em paz”, afirmou Benjamin Netanyahu.

A pressão militar sobre Gaza e sobre o Líbano aumentou com a morte de mais civis. Nesse sentido, o presidente francês, Emmanuel Macron apelou ao não fornecimento de armas a Israel.

Por outro lado, os democratas norte-americanos estão cada vez mais perplexos com os custos políticos da estratégia geopolítica israelita, o que pode ter enorme impacto na política interna israelita. Poderá Netanyahu ser abandonado pelos EUA? “Recentemente, vimos que a marinha americana ajudará sempre a abater foguetes e mísseis disparados contra Israel”, considerou Gregory Alegi, advertindo: “Não se enganem, isso não vai mudar. O que pode mudar é o apoio externo, digamos, a teatralidade, mas a substância vai manter-se inalterada, seja quem for que governe Israel, seja quem for que governe os Estados Unidos.”

Caprichos da guerra!

2024.10.07 – Louro de Carvalho

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