sábado, 19 de outubro de 2024

Urge aumentar a ajuda humanitária a Gaza e pôr fim ao conflito

 

Os Estados Unidos da América (EUA), em carta, de 15 de outubro, enviada ao chefe do governo israelita e assinada pelo Secretário de Estado, Antony Blinken, e pelo Secretário da Defesa, Lloyd Austin, ameaçam Israel com o corte de alguma assistência militar, se não aumentar o acesso da ajuda humanitária a Gaza, no prazo de 30 dias. Trata-se da mais forte advertência formal ao aliado americano, desde o início da guerra, dada a profunda preocupação com “a deterioração da situação humanitária” na região.

De acordo com a carta, Israel negou ou impediu que cerca de 90% da ajuda humanitária fosse transportada para Gaza em setembro; as ordens israelitas de evacuação forçaram quase dois milhões de pessoas a concentrarem-se numa faixa estreita onde correm “elevado risco de contágio letal”; os ataques israelitas prosseguiram no sul da Faixa de Gaza, na noite de 15 de outubro, tendo, alegadamente, matado, pelo menos, 15 pessoas, incluindo seis crianças e duas mulheres.

As críticas a Israel tornaram-se mais generalizadas à medida que a guerra entre Israel e o Hamas se arrasta, causando mais de 42 mil mortos palestinianos, segundo o Ministério da Saúde de Gaza.

Estas críticas assumiram um nível sem precedentes, depois que Israel lançou uma invasão terrestre no Líbano, alegadamente, para eliminar as bases do Hezbollah, visto que este grupo paramilitar lançava cada vez mais ataques contra Israel.

Por outro lado, os ataques israelitas às forças de manutenção da paz da Organização das Nações Unidas (ONU), durante este assalto, suscitaram a condenação internacional, tendo o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, classificado de “completamente falsas” as acusações de que Israel visava, deliberadamente, a Força Interina das Nações Unidas no Líbano (UNIFIL).

A ministra alemã dos Negócios Estrangeiros, Annalena Baerbock, afirmou que a UNIFIL deve ser protegida para poder cumprir o seu dever de forma mais sólida. Porém, afirmou que Israel tem o direito de autodefesa e que as instalações do Hezbollah devem ser eliminadas.

O xeque Naim Kassem, vice-chefe do Hezbollah, que assumiu a liderança interina, após a morte de Hassan Nasrallah, em ataque aéreo israelita, prometeu, em discurso transmitido pela televisão, no dia 15, “derrotar os nossos inimigos e expulsá-los das nossas terras” e declarou que o grupo libanês está concentrado em ferir o inimigo, visando Haifa e outras partes de Israel.

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Entretanto, a 17 de outubro, o ministro dos Negócios Estrangeiros israelita, Israel Katz, confirmou que Yahya Sinwar foi morto numa operação das forças israelitas em Gaza, o que o Hamas confirmou no dia 18. O chefe da diplomacia considerou, como “feito militar e moral, para o exército israelita”, o assassinato de Sinwar, que se crê ter sido o cérebro do ataque de 7 de outubro a Israel, e que se tornara o líder do Hamas (em especial, da sua linha dura), em Gaza, substituindo Ismail Haniyeh, na sequência do seu assassinato em Teerão, no mês de agosto. “O assassinato de Sinwar criará a possibilidade de libertar, imediatamente, os reféns e de introduzir uma mudança que conduzirá a uma nova realidade em Gaza, sem o Hamas e sem o controlo iraniano”, declarou Katz, em comunicado. As Forças de Defesa de Israel (FDI) informaram, em comunicado, que, “depois de completo o processo de identificação do corpo, pode ser confirmado que Yahya Sinwar foi eliminado”. E o primeiro-ministro israelita, em declaração à televisão nacional, anunciou a morte de Sinwar [politicamente próximo do Irão] e disse que “o mal sofreu um duro golpe”, mas avisou que a “tarefa” de Israel ainda não está completa.

Segundo o primeiro-ministro, a morte do líder do Hamas foi o “princípio do fim”, mas Israel continuará a trabalhar até ao fim da guerra. Aos cidadãos, Netanyahu disse que ainda há “muitos desafios a enfrentar e que é necessário manter a resiliência e “continuar a lutar”. Às famílias dos reféns, garantiu que as forças israelitas continuarão, “com toda a força”, até eles regressarem.

O presidente dos EUA reagiu à morte de Sinwar, dizendo que aquele foi um “dia de alívio”, comparando-o com o momento em que Barack Obama deu a ordem para matar Bin Laden e considerando que a morte do líder do Hamas pode ser uma “oportunidade” para Gaza.

Ao início da tarde do dia 17, as FDI, em declaração conjunta com o Shin Bet, tinham informado que o líder do Hamas fora, “muito provavelmente”, morto depois de o exército ter enfrentado e matado três militantes, nas operações terrestres em Gaza. “No prédio onde os terroristas foram eliminados, não havia sinais da presença de reféns na área”, acrescenta o comunicado das FDI. Portanto, as unidades que enfrentaram os três militantes não estavam a participar numa operação de homicídio e não sabiam da presença de Sinwar no local.

Foram encontrados dinheiro, documentos e armas nos corpos dos militantes. O exército israelita recuperou os corpos para teste de ácido desoxirribonucleico (ADN). Com efeito, Israel tinha em arquivo o ADN e os dados biométricos de Sinwar, desde a sua passagem por uma prisão israelita.

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Enquanto o presidente dos EUA, Joe Biden, referiu a possibilidade de cessar-fogo aberta pela morte de Sinwar, António Guterres escreveu sobre a situação humanitária em Gaza. Por isso, Israel voltou a criticar o secretário-geral da ONU, na sequência da morte do líder do Hamas, considerado um dos cérebros dos ataques de 7 de outubro de 2023. Isto, depois de Joe Biden e de outros líderes internacionais se terem mostrado otimistas com a notícia.

ministro dos Negócios Estrangeiros israelita escreveu, no X, que Guterres não mostrou “satisfação pela eliminação do arquiterrorista Yahya Sinwar” e segue uma agenda “anti-israelita e antijudaica”. Por isso, Israel continua a considera-lo “persona non grata”. Na mesma linha, o embaixador de Israel nas Nações Unidas, Gilad Erdan, escreveu que “é a figura pública mais irrelevante e desapegada do planeta”. Israel Katz respondeu à publicação do secretário-geral da ONU, que voltava a alertar para a situação humanitária em Gaza.

“A fome paira. Isto é intolerável. Os pontos de passagem devem ser abertos imediatamente, os impedimentos burocráticos devem ser removidos e a lei e a ordem devem ser restauradas, para que as agências da ONU possam prestar assistência humanitária que salva vidas”, escreveu Guterres, referindo o aumento dos deslocados, pouco depois de as autoridades israelitas terem confirmado que Yahya Sinwar fora morto pelo exército israelita, em Rafah.

Os responsáveis norte-americanos mostraram-se otimistas quanto à possibilidade de a morte de Sinwar assinalar um ponto de viragem no Médio Oriente e dar novo ímpeto às conversações de cessar-fogo, agora estagnadas. “Nas últimas semanas, não houve negociações para pôr fim à guerra, porque Sinwar se recusou a negociar”, disse aos jornalistas o porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller, acrescentando que a sua morte abriu a possibilidade de o Hamas e Israel negociarem o fim dos combates.

Tal como Joe Biden, outras personalidades viram na morte de Sinwar a possibilidade de pressionar para o cessar-fogo. “Há uma proposta do presidente Biden e de outros sobre como seria este cessar-fogo e apoiamos totalmente isso”, disse o chanceler alemão Olaf Scholz, em Bruxelas.

Já o presidente francês, Emanuel Macron escreveu, no X, que “Yahya Sinwar foi o principal responsável pelos ataques terroristas e atos bárbaros de 7 de outubro” e que “a França exige a libertação de todos os reféns ainda detidos pelo Hamas”.

Apesar do otimismo internacional de que o conflito no Médio Oriente poderia cessar, Benjamin Netanyahu disse que, embora a morte de Sinwar tenha marcado nova fase na guerra, a guerra de Israel em Gaza e no Líbano “ainda não terminou”, pelo que manterá o controlo sobre a Faixa de Gaza, durante o tempo suficiente para garantir que o Hamas não regressa. E, como Israel, nem o Hamas nem o Hezbollah deram qualquer indicação de que possa haver pausa nas hostilidades.

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O exército israelita divulgou imagens que diz mostrarem os últimos momentos antes da morte do líder do Hamas. Assim, a morte não foi acidental, nem instantânea. Numa sala danificada pelos bombardeamentos, aparece um homem sentado numa cadeira e de rosto coberto, possivelmente, para esconder a identidade. Daniel Hagari, porta-voz das FDI, disse que os militares dispararam um projétil contra o edifício, provocando o seu desmoronamento e matando Sinwar. 

Khalil al-Hayya, que foi adjunto de Sinwar no Qatar e que representou o Hamas em várias rondas de negociações de cessar-fogo, confirmou o óbito do líder, que morreu, “confrontando o exército de ocupação até ao último momento da sua vida”. Reforçou que o Hamas não devolverá nenhum dos reféns, antes do fim da agressão a Gaza, garantindo que a morte do líder fortaleceu o grupo: “O martírio dos líderes só aumentará a determinação do movimento em continuar”, proclamou.

Em comunicado, o grupo militante, com sede na Faixa de Gaza, saudou Sinwar como herói, por “não ter recuado, brandindo a sua arma, enfrentando e confrontando o exército de ocupação na primeira linha das fileiras”. A declaração parece referir-se ao vídeo que os militares israelitas fizeram circular dos alegados últimos momentos do líder do Hamas.

O ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão homenageou o líder do Hamas, no X, afirmando que “não temia a morte” e que “lutou corajosamente até ao fim”. Seyed Abbas Araghchi faz referência à fotografia do suposto cadáver de Sinwar, descrevendo-o como “fonte de inspiração para os combatentes da resistência em toda a região, Palestinianos e não Palestinianos”. “A causa da libertação da Palestina da ocupação está mais viva do que nunca”, garantiu.

O Hamas regenerou-se para continuar a luta. Além do recrutamento de milicianos, exigirá ter um papel na definição do futuro do território. “Diz-se, por exemplo, que o Hamas perdeu seis mil combatentes, mas parece estar a recrutar – ou melhor, a mobilizar – cerca de seis mil membros das suas reservas”, disse Hugh Lovatt, analista político, no centro de estudos European Council for Foreign Relations (ECFR), sustentando: “Não estarão tão bem treinados como o grupo inicial, mas são capazes de segurar numa arma e de disparar lança-foguetes contra tanques israelitas.”.

O chefe do Estado-Maior General das FDI, Herzi Halevi, disse, em carta aos soldados, por ocasião do primeiro aniversário do ataque, que as forças armadas “derrotaram a ala militar do Hamas” e que continuam a combater as suas capacidades terroristas. Porém, os analistas sustentam que o Hamas não foi derrotado, continua a ter capacidade de regeneração, ao nível do recrutamento de milicianos e da reabilitação da infraestrutura subterrânea. “Acho que é muito fácil, de facto, recrutar e regenerar, simplesmente porque há muitos órfãos e grupos como o Hamas que sempre recrutaram os que ficaram órfãos em ataques israelitas anteriores”, afirmou Joost Hiltermann, analista político no Cris Group.

O Hamas tem trabalhado para restaurar alguns dos túneis danificados. Porém, o assassinato do líder político do Hamas, Ismail Haniyeh, a 31 de julho de 2024, em visita ao Irão, pode ter sido analisado como importante golpe contra o movimento. Exilado no Qatar, Haniyeh era pragmático e moderado nas negociações. Mas o novo líder, Yahya Sinwar, o mentor do atentado de 7 de outubro, é visto como um elemento da linha dura, que manteria a luta armada a qualquer preço. Hiltermann revelou que “as decisões são tomadas por consenso no Conselho da Shura”, mas que Yahya Sinwar teria uma voz forte, devido ao 7 de outubro e à forma como é visto no Hamas e talvez fora do Hamas, o líder forte”. E manter reféns israelitas, dava-lhe uma carta forte”.

Yahya Sinwar não se arrependeu do 7 de outubro e considerou que só é possível criar um Estado palestiniano “pela via armada”, segundo a Reuters, que contactou seis fontes políticas (quatro em organizações palestinianas e dois governos do Médio Oriente).

Um ex-militante comunista libanês, Nabih Awadah, que esteve preso com Sinwar (em Ashkelon, entre 1991-95), disse que o líder do Hamas via os acordos de paz de Oslo (1993), entre Israel e a Autoridade Palestina (AP), como “desastrosos” e um estratagema de Israel, que só abriria mão de terras palestinianas “pela força, não por negociações”. “Obstinado e dogmático”, iluminava-se de alegria, sempre que ouvia falar de ataques do Hamas ou do Hezbollah contra Israelitas. O confronto militar era a única via para libertar a Palestina da ocupação israelita.

Os EUA e a União Europeia (UE) tratam o Hamas como grupo terrorista, mas o movimento é crucial para a negociação de um cessar-fogo. Alguns países ocidentais poderiam desempenhar um papel de mediação mais importante, refere Joost Hiltermann, considerando: “Países como a Noruega e a Suíça podem manter conversações com o Hamas, porque não lhes atribuem o rótulo político de organização terrorista. É uma decisão política.”

A ausência de canais diretos de negociação é problema, segundo Hiltermann, porque o Hamas é um movimento que luta contra a ocupação militar com violência, mas “é preciso falar mais sobre soluções para o conflito israelo-palestino, que, até agora, não estão a ser fomentadas”.

Porém, segundo Hugh Lovatt, analista político do ECFR, uma solução política para o conflito terá como principal interlocutor a Autoridade Palestiniana (AP), do presidente Mahmoud Abbas, pois governa a Cisjordânia e parte de Jerusalém, devendo ser chamada a governar Gaza, como o fazia desde 2007, depois de ter vencido eleições com o seu braço político. “Sejamos claros, o Hamas não vai a lado nenhum, mesmo tendo sofrido tanto. Terá sempre a possibilidade de se opor a qualquer intervenção externa em Gaza, quer se trate de uma intervenção israelita, como está a acontecer neste momento, quer se trate da intervenção da Autoridade Palestiniana no futuro ou de uma força internacional”, sustenta o analista, realçando que o conflito no Líbano e as retaliações do Irão agravam a crise e sinalizam que o Irão continuará a apoiar o Hamas em todas as frentes.

Outros analistas dizem que o Hamas terá de ser incluído nas decisões sobre o futuro do território, apesar de o ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, ter prometido “limpar o Hamas da face da Terra”. O Irão é a maior fonte de financiamento do Hamas. Por razões estratégicas, ideológicas e pragmáticas, continuará a sê-lo, segundo Lovatt. E Joost Hiltermann diz não haver espaço significativo para soluções diplomáticas (embora existam sempre), pois a via escolhida foi a da força, para subjugar os inimigos, vendo onde caem “as fichas” e trabalhando “a partir daí”.

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Enfim, a guerra continua, como convém a muitos, e as pessoas sofrem a destruição e a morte!

2024.10.18 – Louro de Carvalho

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