segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Partido de Putin vence eleições regionais no leste ucraniano russófono

 

A Comissão Eleitoral Central (CEC) da Rússia indicou, a 10 de setembro, que o partido Rússia Unida, do presidente Vladimir Putin venceu, por confortável maioria, as eleições locais e regionais na Crimeia, anexada em 2014, e nos quatro territórios anexados por Moscovo na Ucrânia, em 2022, tendo participado mais de 74% dos eleitores inscritos, uma taxa de participação mais elevada do que em outros territórios da Rússia.

Efetivamente, realizaram-se, naquela data, na Rússia, eleições diretas para governadores de 21 províncias, com 20 a elegerem deputados regionais e 17 a designarem deputados municipais. E, para legitimar politicamente a anexação dos territórios russófonos localizados na Ucrânia, realizaram-se também naqueles territórios (apesar da guerra e de as suas forças não os controlarem na totalidade), no dia em que, na Rússia houve eleições regionais e municipais.

As comissões eleitorais impostas por Moscovo em Lugansk, Donetsk, Zaporijia e Kherson, num escrutínio legitimante da anexação, indicaram que cinco partidos com assento no Parlamento russo apresentaram candidatos às assembleias locais, com o partido de Putin a surgir destacado, segundo os resultados preliminares. Em Zaporijia, o partido do Kremlin obteve 83,96% dos votos, com cerca de 60% dos boletins escrutinados; em Kherson, tinha quase 87%; em Donetsk, liderava com 79,56%; e, em Lugansk, a única região do leste da Ucrânia que a Rússia controla quase totalmente, estava creditado com 74,72%, com quase 54% dos votos contados.

As eleições locais e regionais terminaram na Rússia às 18h00 (hora de Lisboa), após três dias de votação, mas, nas regiões anexadas e onde o voto antecipado se iniciou há uma semana, as assembleias de voto encerraram, cinco horas antes, por motivos de segurança.

A Rússia denunciou ataques ucranianos contra locais de votação, com um responsável do ministério do Interior, Mikhail Davidiv, a acusar “bombardeamentos contra os colégios eleitorais e seus arredores e [com] tentativas e destinação de explosivos e [de] drones”. E, neste sentido, a presidente da CEC, Ela Pamfioca, disse que, na madrugada do dia 10, foi destruída uma assembleia de voto, em Zaporijia, um “ato terrorista” com drones, enquanto a parte ucraniana reivindicava um ataque à sede do Rússia Unida em Pologi, província de Zaporijia.

Apesar de as regiões anexadas estarem perto da linha da frente, a CEC só cancelou as eleições num distrito e numa localidade da província russa de Belgoro, alvo de frequentes ataques.

As assembleias legislativas eleitas nas regiões anexadas – onde as populações possuem passaporte russo – têm 45 dias para eleger os governadores, apesar de os líderes interinos terem o apoio de Putin: Denis Pushilin, em Donetsk, Leonid Pasechnik, em Lugansk, Yevgeni Balitski, e, Zaporijia e Vladimir Saldo, em Kherson.

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A Ucrânia e os Estados Unidos da América (EUA) advertiram que os resultados destas “eleições” são pré-fabricados e, à semelhança da generalidade dos países ocidentais e aliados (Canadá e Japão), da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) e do Conselho da Europa, asseguraram que não vão reconhecer estas eleições “ilegais”.

A Ucrânia denunciou, a 8 de setembro, as eleições russas a decorrer nos territórios ucranianos ocupados como ilegais, por violarem a soberania do país, e avisou que “não terão quaisquer consequências jurídicas”.

“As ações da Rússia violam gravemente a soberania e a integridade territorial da Ucrânia, as leis ucranianas e as normas do direito internacional, em particular a Carta das Nações Unidas”, afirmou o Ministério dos Negócios Estrangeiros ucraniano, liderado por Dmytro Kuleba. Com efeito, para Kiev, “as pseudoeleições da Rússia nos territórios temporariamente ocupados são inúteis”, não vindo a ter “quaisquer consequências jurídicas” e não conduzindo a “uma alteração do estatuto dos territórios ucranianos capturados pelo exército russo”.

O ministério considerou que, “ao organizar eleições fictícias nas regiões ucranianas e na Crimeia, o Kremlin continua a deslegitimar o sistema jurídico russo”. Por consequente, a diplomacia ucraniana apelou à comunidade internacional a que “condene as ações inúteis e arbitrárias da Rússia” e a que “não reconheça a legitimidade de qualquer ‘administração’ criada em resultado destas eleições ilegais, bem como de quaisquer decisões por ela tomadas”.

“Os envolvidos nestas pseudoeleições, incluindo os dirigentes russos, os representantes das administrações de ocupação e as estruturas eleitorais, devem ser levados à justiça”, defendeu o ministério de Kuleba, que acrescentou: “Trabalharemos para a imposição de novas sanções internacionais contra eles.”

Na verdade, a Ucrânia vem denunciando pressões sobre a população para comparecer neste escrutínio, com a Administração militar ucraniana de Lugansk a referir que os residentes foram “obrigados a votar nos candidatos sob a vigilância de agentes russos e das forças de segurança”.

O Estado-Maior das Forças Armadas ucranianas exortou os residentes nos territórios anexados a boicotarem estas eleições, e advertiu que serão utilizadas pela Rússia para futuras mobilizações. E o governo considerou que a maioria dos candidatos que se apresentaram às eleições “são utilizados pelos ocupantes para ocultar os verdadeiros líderes russos”.

Já o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, descreveu as eleições como um “exercício de propaganda”, reiterou que Washington não reconhecerá as pretensões de Moscovo “a qualquer território soberano da Ucrânia” e avisou que todas as pessoas que apoiem “as eleições fraudulentas da Rússia na Ucrânia, inclusive atuando como os chamados ‘observadores internacionais’, podem estar sujeitas a sanções e restrições de vistos”.

Em resposta, segundo a agência espanhola Europa Press, a embaixada russa em Washington afirmou que as observações de Blinken equivaliam a uma interferência nos assuntos internos da Rússia: “As autoridades norte-americanas não abandonam o velho hábito de se imiscuírem nos assuntos internos de outros países. Consideram-se autorizadas a fazer recomendações e avisos sobre a condução de campanhas eleitorais no estrangeiro.”

Também, a 8 de setembro, estas eleições foram condenadas pela Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), organização de que a Rússia e a Ucrânia fazem parte.

A OSCE disse que as eleições “não terão qualquer validade ao abrigo do direito internacional” e que a sua realização “viola a integridade territorial e a soberania da Ucrânia”.

Por seu turno, a União Europeia (UE) condenou veementemente, a 11 de setembro, a realização de eleições nos territórios ucranianos ocupados pelas tropas russas, apelidando o sufrágio de uma “tentativa fútil” de Moscovo de normalizar a invasão e alertou que haverá consequências.

“A UE condena veementemente a realização destas eleições ilegítimas na República Autónoma da Crimeia, na cidade de Sevastopol e em partes das regiões ucranianas do Donetsk, Luhansk, Zaporizhzhia e Kherson”, disse em comunicado o alto-representante da UE para os Negócios Estrangeiros, Josep Borrell, explicitando que os 27 condenaram e rejeitaram “mais uma tentativa fútil da Rússia de legitimar ou normalizar o controlo militar ilegal e a tentativa de anexação de partes do território ucraniano”.

As eleições ilegais, vincou o chefe da diplomacia europeia, são “mais uma manifesta violação da lei internacional, incluindo da Carta das Nações Unidas, [da] independência, [da] e integridade territorial da Ucrânia”. Por isso, a UE “não vai reconhecer a realização das chamadas ‘eleições’, muito menos os resultados”.

Borrell deixou uma ameaça: “Haverá consequências destas ações ilegais para a liderança política da Rússia e para os envolvidos na organização [das eleições].”

Depois, acrescentou que é impossível haver eleições em territórios ocupados onde estão a ser atribuídos passaportes, “ilegal e forçadamente”, a cidadãos ucranianos, “incluindo crianças”, onde há “transferências forçadas e deportações, violações e abusos dos direitos humanos sistemáticas e transversais, assim como intimidação e um aumento na repressão” de cidadãos da Ucrânia pelas autoridades “ilegitimamente nomeadas” por Moscovo.

Por sua vez, a Organização das Nações Unidas (ONU) manifestou, a 8 de setembro, preocupação com os relatos de que a Rússia estava a realizar eleições em áreas ocupadas da Ucrânia e sublinhou que este sufrágio “não tem fundamento jurídico”.

A posição da ONU foi apresentada por Miroslav Jenca, secretário-geral adjunto para a Europa, Ásia Central e Américas, em reunião do Conselho de Segurança agendada para discutir a situação no território ucraniano, nomeadamente as eleições locais que a Rússia estava a realizar nas regiões de Donetsk, de Lugansk, de Zaporijia e de Kherson.

“Estamos preocupados com os relatos de que a Federação Russa realiza as chamadas eleições em áreas da Ucrânia atualmente sob controlo militar russo. Estas chamadas eleições nas áreas ocupadas da Ucrânia não têm fundamento jurídico”, disse o representante da ONU.

Jenca citou, ainda, António Guterres, secretário-geral da ONU, que declarou que “qualquer anexação do território de um Estado por outro Estado resultante da ameaça ou uso da força é uma violação dos princípios da Carta [das Nações Unidas] e do direito internacional”.

“Desejo reiterar que as Nações Unidas continuam totalmente empenhadas na soberania, independência, unidade e integridade territorial da Ucrânia dentro das suas fronteiras internacionalmente reconhecidas, estendendo-se às suas águas territoriais”, frisou o secretário-geral adjunto, considerando: “Lamentavelmente, [...] estas últimas tentativas ilegais de organizar novos chamados processos eleitorais nas áreas ocupadas da Ucrânia minam ainda mais as perspetivas de paz.”

Na reunião do Conselho de Segurança, convocada pela Albânia e pelos EUA, vários países rejeitaram a legalidade e a legitimidade destas eleições e referiam que os resultados já estavam “predeterminados”. “Temos informações de que o Kremlin predeterminou os resultados das eleições falsas em todo o território soberano ucraniano que a Rússia controla temporariamente”, disse Barbara Woodward, embaixadora do Reino Unidos junto da ONU.

“O Kremlin utiliza estes referendos e eleições falsas para tentar dar uma aparência de legitimidade às suas tentativas de anexar ilegalmente o território soberano dos seus vizinhos. [...] O Kremlin sabe muito bem que as suas eleições na Ucrânia são uma fraude total”, vincou o embaixador norte-americano Robert Wood, denunciando que soldados armados da Rússia proporcionavam a ‘segurança’ aos eleitores, em “combinação intimidante de balas e votos”.

O representante permanente de França na ONU, Nicolas de Rivière, alertou que “nenhum país pode considerar-se seguro”, se for permitido à Rússia continuar este tipo de ações, pelo que é imperativo que “cada membro das Nações Unidas rejeite, claramente e sem ambiguidade, estas eleições falsas e defenda a Carta das Nações Unidas e os seus princípios universais”.

O embaixador ucraniano na ONU, Sergiy Kyslytsya, também participou na reunião, onde enfatizou que os resultados eleitorais em causa “serão nulos e não podem produzir efeitos jurídicos ao abrigo do direito internacional”. “Apelamos à comunidade internacional para que condene a utilização do sistema eleitoral russo no território de outro Estado. Também instámos a que não reconheçam os chamados resultados destas eleições falsas”, reforçou.

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Enfim, estas eleições desafiam tudo e todos, impondo a normalidade não desejada. E a culpa é da ambição imperialista russa e da ambição expansionista do Ocidente. Quem começou?

2023.09.11 – Louro de Carvalho

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