Está
a decorrer, em Baku, no Azerbaijão,
entre o dia 11 de novembro e o dia 22, a COP29, ou seja, a 29.ª cimeira do clima da Organização da Nações Unidas
(ONU), que reúne governos de todo o Mundo, diplomatas, cientistas, membros da
sociedade civil e diversas entidades privadas com o objetivo de debater e de buscar
soluções para a crise climática causada
pelo homem.
A cimeira tem ocorrido, anualmente, desde 1995 (exceto
em 2020, devido à pandemia) e o termo COP é a sigla em Inglês a significar “Conferência das Partes”, em
referência às 197 nações que concordaram com um pacto ambiental da ONU, no
início da década de 1990.
O tratado, denominado “Convenção-Quadro
das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (CQNUMC)”, visa
estabilizar a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera e, assim, combater
a ameaça humana ao sistema climático da Terra, cada vez mais evidente nos
últimos meses.
Desta vez, registam-se ausências notórias, como as do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do
Brasil, do presidente Xi
Jinping, da China, do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, da presidente da
Comissão Europeia, Ursula von der Leyen,
do chanceler da Alemanha, Olaf
Scholz, que citaram compromissos internos. Também se prevê que o presidente
dos Estados Unidos da América (EUA), Joe Biden, e o presidente francês, Emmanuel Macron, presenças
constantes em conferências climáticas, não participem na COP do Azerbaijão, tal
como o presidente russo, Vladimir
Putin, que visitou o país em agosto, o presidente da Ucrânia, Volodymyr
Zelensky, e o primeiro-ministro de Israel, Benjamin
Netanyahu.
Neste ano, embora haja diversos tópicos em agenda, as
principais negociações versam as metas de emissões e contribuições nacionalmente
determinadas (NDC); o financiamento climático; a adaptação às mudanças
climáticas; e a transição energética e combustíveis fósseis.
As NDC constituem o coração do Acordo de Paris, pois os países
signatários concordaram que devem comunicar as ações que estão a tomar para
reduzir as emissões de gases de efeito estufa, pelo que as metas climáticas dos
países são, nos termos do acordo, apresentadas a cada cinco anos. Devido à
pandemia, a primeira revisão aconteceu na COP26.
Para que reflita em algo concreto, factível e justo,
ao longo do tempo, o Acordo de Paris prevê que cada NDC subsequente deve
representar uma progressão, em relação à anterior. Porém, embora as partes
tenham a obrigação legal de ter uma NDC, se as suas medidas listadas não forem
cumpridas, não serão responsabilizadas por isso.
A este respeito, Cíntya Feitosa, especialista de
Estratégias Internacionais do Instituto Clima e Sociedade (iCS), do Brasil alerta
que as atuais NDC não estão no rumo
certo para limitar o aquecimento global a 1,5°C (graus centígrados ou graus
Celsius) ou 2°C, como estipulado no Acordo de Paris. Por isso, na
cimeira em curso, há necessidade de os países reverem as suas metas, levando em
conta a transição dos combustíveis fósseis e as suas condições económicas.
No atinente ao financiamento
climático – há quem chame a esta a cimeira do financiamento –, como parte do Acordo de Paris, os países desenvolvidos
prometeram aos países em desenvolvimento dar cem mil milhões de dólares por
ano, a partir de 2020, para os ajudar a prepararem para as mudanças climáticas.
Todavia, essa meta não vinha sendo cumprida pelo que havia a expectativa de que
as negociações da COP27 e da COP28 selassem alguma medida imediata – o que não
ocorreu.
Hoje, o cenário é ainda mais preocupante: os
especialistas dizem que são necessários biliões ou triliões de dólares para
a ação climática; e quanto mais tempo se demora a agir, mais caro será o
processo.
Os ambientalistas pedem que da COP29 saia uma decisão
clara sobre essa meta financeira, considerando recursos públicos e
concessionais, além de empréstimos e de investimentos.
Além disso, há a questão da dívida dos países mais
pobres. Por exemplo, se forem contabilizados empréstimos com juros normais como
parte do financiamento climático, a dúvida persiste em como garantir que esses
países consigam pagar, especialmente após eventos climáticos extremos que os
deixam ainda mais endividados. A discussão sobre o financiamento evolui à
medida que a ciência avança e é, sem dúvida, o tema principal da COP29.
Um outro tema importante deste ano é o da adaptação às mudanças climáticas, isto é, como
encontrar ferramentas e soluções para reduzir a nossa fragilidade, face à crise
climática.
Como o aquecimento global tem efeitos diferentes no Mundo,
causando secas, em alguns lugares, e cheias, em outros, na prática, isso diz
respeito às respostas efetivas a esses problemas, como por exemplo, projetos de
barragens marítimas para conter o aumento do nível do mar, ações de preparo
para uma temporada de seca mais longa e intensa, em zonas mais suscetíveis.
Ora isso é algo que, historicamente, vem recebendo
menos financiamento. Assim, nesta COP, espera-se que os países reavaliem os seus compromissos
nacionais de adaptação. E isso inclui o compromisso dos países
desenvolvidos de fornecer 100 mil milhões de dólares, por ano, até 2020, com a
meta de atingir, ao menos 600 mil milhões, no período de 2020 a 2025. Além
disso, espera-se que os países desenvolvidos dupliquem o financiamento para a adaptação,
em relação aos níveis de 2019 até 2025, com uma contribuição mínima anual
de 38,4 mil milhões.
O Word Wide Fund for Nature (WWF), uma das maiores ONG ambientais do Mundo,
defende que o financiamento público à adaptação seja, no mínimo, igual ao destinado
à mitigação, conforme o artigo 9.4 do Acordo de Paris. Com efeito, as discussões
sobre a adaptação às mudanças climáticas continuam a ser tema central focado em
métricas para medir os progressos na adaptação.
Por fim, vem a questão da transição
energética e dos combustíveis fósseis. Na COP28,
apesar de alguns avanços, os países acordaram que é necessário começarem a
afastar-se dos combustíveis fósseis, especialmente nesta década. Também, pela
primeira vez, foi reconhecida a necessidade de uma transição energética, embora o documento não
tenha incluído a eliminação imediata de combustíveis fósseis, algo que gerou
críticas dos ambientalistas.
O acordo propôs-se triplicar a capacidade de energia
renovável global, até 2030, mas
não estabeleceu compromissos financeiros concretos com a adaptação e com a mitigação.
O texto final, que refletiu a forte oposição de países produtores de petróleo,
sugeriu a redução gradual do uso do petróleo, do gás e do carvão, mas sem uma
meta clara de eliminação. A expressão usada foi “transição energética”, ao
invés de “eliminar”, o que agradou menos aos ambientalistas, que esperavam um
compromisso mais robusto para o fim desses combustíveis.
Por isso, espera-se que, na COP29, haja mais avanços em
direção a um plano mais definitivo e com compromissos mais claros sobre a
redução do uso de combustíveis fósseis, principalmente, nos países que dependem
desses recursos, como os grandes produtores de petróleo.
***
Na abertura da cimeira, António Guterres,
secretário-geral da ONU, abordou a corrida por minerais essenciais para a produção
de veículos elétricos e de painéis solares e alertou que a luta por recursos
faz com que haja “comunidades exploradas, direitos espezinhados e ambientes destruídos”.
Por outro lado, sustentando que a transição energética precisa de estar “no rumo da justiça”,
considerou que, “com muita frequência, os erros do passado são repetidos numa corrida
gananciosa que esmaga os pobres”.
Por seu turno, o presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, na qualidade de anfitrião
e de líder do país presidente da COP, no seu discurso de abertura da cimeira,
lançou “um sério ataque aos governos ocidentais, que compram o gás do país e,
ao mesmo tempo, o criticam pela economia dependente dos combustíveis fósseis”.
E, perante os líderes mundiais, frisou que os recursos naturais do Azerbaijão
são, segundo ele, uma “dádiva de Deus”. “Todos os recursos naturais, seja o
petróleo, sejam o gás, o vento, o sol, o ouro, a prata ou o cobre, são recursos
naturais e os países não devem ser culpados por os possuírem e não devem ser
culpados por colocarem esses recursos no mercado. Mas, ao mesmo tempo, temos de
ser realistas”, declarou.
As palavras
do presidente e anfitrião criaram um burburinho entre os participantes.
***
Entretanto,
a COP avança, de um lado, com protestos de ambientalistas e de defensores dos
direitos humanos, que são espezinhados no país, e do outro lado, com a pressão
de mais de 1700 lobistas do petróleo e do gás. Segundo os observadores, a presença desta indústria está a
“ofuscar” a dos que estão na linha da frente da crise climática e que sofrem,
devido às ações das empresas petrolíferas e de gás.
Ao quinto
dia, a COP29 acolheu um painel de alto nível sobre clima e paz. Porém, foi o
debate sobre a necessidade de reformar o processo da COP que ocupou o centro
das atenções em Baku.
Já no dia
12, no quadro de uma manifestação pela paz, Asad Rehman, diretor executivo da
War on Want, sublinhou que não pode haver verdadeira justiça climática sem
direitos humanos, chamando a atenção para os conflitos em curso como um
elemento essencial de reflexão para a justiça global. E os delegados de todo o
Mundo estão reunidos em Baku, na esperança de encontrarem formas de evitar o
aumento da temperatura global e de cumprir as promessas feitas no âmbito do
Acordo de Paris.
Em carta aberta
publicada a 15 de novembro, mais de 20 peritos, incluindo o antigo
secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, a antiga presidente da Irlanda, Mary
Robinson, e a antiga responsável pelo clima da ONU, Christiana Figueres,
afirmaram que, apesar dos seus êxitos, o processo da COP precisa de ser revisto. Nesse
sentido, apelam a sete reformas fundamentais, que vão desde o controlo rigoroso
do financiamento da luta contra as alterações climáticas e a integração das
mais recentes provas científicas até a reuniões mais pequenas e mais frequentes
e a critérios de elegibilidade rigorosos para os países anfitriões.
Também, a 15
de novembro, em entrevista exclusiva à Euronews, o ex-vice-presidente dos EUA e atual ativista pelo clima,
Al Gore, afirmou ser “absurdo” que a presidência das negociações da ONU sobre o
clima esteja a ser, repetidamente, entregue a países petrolíferos (a anterior
foi no Qatar). Há, na sua perspetiva, um real conflito de interesses
direto. Por isso, o processo deve ser reformado, segundo Al Gore. “Embora o presidente desta COP
não seja o líder da indústria petrolífera, está em sintonia com a dependência
deste país, em relação aos combustíveis fósseis. […], Noventa por cento da sua
balança de pagamentos provém da venda de petróleo e gás”, vincou Al Gore.
O presidente
indigitado da COP29, Mukhtar Babayev, releva que as conversações estão a
decorrer muito bem, até agora. “Penso que o início da COP29 está a ser muito
bom. […] Não só o ponto 6.4 do Acordo de Paris, relativo aos mercados de
carbono, mas também a agenda adotada no primeiro dia, e começámos a trabalhar.
O 6.4 dá-nos uma motivação adicional para cumprir todas as outras obrigações ou
pontos de discussão”, declarou, frisando que as conversações estão centradas no
novo objetivo coletivo quantificado, que substituirá o anterior do financiamento climático de 100 mil milhões
de dólares, por ano, estabelecido em 2009. No âmbito do Acordo de Paris, os
governos concordaram em definir novo objetivo de financiamento do clima até
2025.
O acordo
sobre o novo objetivo está a progredir, mas é “complicado”. “Já recebemos
sinais positivos dos institutos financeiros internacionais no sentido de
aumentarem as suas contribuições para os próximos dois anos. E penso que é um
bom sinal”, sustentou Mukhtar Babayev, referindo: “Compreendemos a importância
de enviar esta mensagem positiva às partes, de que todas as forças estão,
realmente, consolidadas para chegar a esta conclusão, em Baku. Porém, é
realmente complicado e ainda estamos a tentar falar com as partes para navegar
neste processo”.
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E
a questão que perpassa, de forma pertinente, a cimeira é: “A neutralidade carbónica
é apenas um sonho ou um objetivo alcançável?”
2024.11.15 – Louro de Carvalho
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