De acordo com as previsões económicas de outono,
divulgadas em relatório, a 15 de novembro, pela Comissão Europeia (CE), mais otimista do que o governo
português, o excedente
orçamental, no país, é de 0,6% do produto interno bruto (PIB), para este ano, face
a 1,25%, em 2023, e de 0,4%, em 2025, acima dos 0,4% e dos 0,3%, respetivamente.
Efetivamente,
a CE melhora a estimativa para o saldo orçamental de 2024, face ao avançado em
maio, quando esperava o excedente de 0,4%. Todavia, revê em ligeira baixa a
estimativa para 2025, de 0,5% para 0,4%. Além disso, o superavit das contas públicas diminuirá para 0,4% do PIB, em 2025
e, num cenário de políticas invariantes, para 0,3%, em 2026.
A previsão da
CE, para este ano, supera a do governo, que, na proposta de Orçamento do Estado
para 2025 (OE 2025), inscreveu um excedente orçamental de 0,4%, para 2024, e
coloca Portugal como o quarto país com o melhor excedente da Zona Euro, apenas
ultrapassado pela Irlanda (4,4%), pelo Chipre (3,5%) e pela Dinamarca (2,3%).
No atinente
ao rácio da dívida pública, o executivo comunitário prevê que continue a
diminuir, embora a ritmo mais lento, apontando para níveis de 95,7% do PIB, neste
ano, de 92,9%, em 2025, e de 90,5%, em 2026, e projetando uma diminuição do
excedente do setor público administrativo, graças às “pressões crescentes sobre
as despesas correntes” e a “medidas de política orçamental que deterioram o
equilíbrio das receitas”.
Todavia, as
receitas do governo continuarão a aumentar, beneficiando do desempenho das
receitas fiscais e das contribuições sociais, no contexto de atividade
económica sustentada, de maior rendimento disponível das famílias e de mercado
de trabalho resiliente. Em contraponto, “medidas de política fiscal, como o
pagamento do suplemento extraordinário de pensões e o aumento dos salários
estão a pressionar a despesa pública”. Assim, o custo orçamental líquido das
medidas para mitigar o impacto da subida dos preços da energia será de 0,5% do
PIB, em 2014, comparativamente a 0,8%, em 2023; e a política fiscal permanecerá
expansionista.
Em 2025, a
redução do excedente orçamental traduzirá o impacto de medidas de política
fiscal, como a redução do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC),
a atualização dos escalões do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
(IRS), o IRS Jovem e o aumento de salários na função pública. O investimento
público continuará a aumentar, associado à implementação do Plano de
Recuperação e Resiliência (PRR), e o custo orçamental líquido das medidas de
apoio energético diminuirá para 0,1% do PIB. E a CE considera que os riscos
para as perspetivas fiscais são no sentido descendente, devido, entre outros
aspetos, “aos processos em curso para o reequilíbrio financeiro das parcerias
público-privadas”.
Ao mesmo
tempo, a CE reviu em alta a taxa de inflação, em Portugal, para 2,6%, neste ano,
e para 2,1%, em 2025. Assim, Bruxelas prevê que “a inflação continue a diminuir,
durante o horizonte de previsão, em linha com as projeções para a área do euro”,
mas revê em alta as projeções, face a maio. Em termos médios anuais, prevê
que o Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC), em Portugal, se fixe
em 2,6%, em 2024, face aos antes previstos 2,3%, caindo para 2,1%, em 2025
(antes, previa 1,9%), e para 1,9%, em 2026. Assim, a inflação continuará “a
diminuir, apesar da pressão em alta dos serviços relacionados com o turismo”.
Ante o esperado
aumento dos salários reais, a CE projeta que a inflação subjacente (excluindo
os preços da energia e dos alimentos não transformados, cujos preços são mais
voláteis) recue a ritmo mais lento. Como assinala, o IHPC diminuiu, em termos
homólogos, de 5,3%, em 2023, para 2,3%, no terceiro trimestre de 2024,
refletindo a desaceleração em todos os principais componentes do índice. Porém,
o índice relativo aos serviços manteve-se, “substancialmente, acima” do índice
global, sobretudo, devido ao aumento dos preços da hotelaria e da restauração.
Por sua vez,
os preços da energia foram impulsionados pelo aumento das tarifas de acesso à
rede no setor elétrico, no primeiro semestre de 2024, embora estas tenham recuado,
novamente, no terceiro trimestre. Já os produtos industriais não energéticos e
os produtos alimentares não transformados “contribuíram, consistentemente, para
a desaceleração da inflação”, enquanto os preços dos alimentos processados
subiram além do índice global, no terceiro trimestre de 2024.
A CE manteve
a previsão de crescimento económico de Portugal em 1,7%, neste ano, e 1,9%, em
2025, abaixo dos 1,8% e 2,1%, respetivamente, estimados pelo governo. Todavia,
o Presidente da República (PR) não deve ter lido o relatório, pois sustenta que
Portugal crescerá 2%, neste ano.
Bruxelas
prevê um crescimento do PIB de 1,7%, em 2024, abaixo dos 2,5%, de 2023,
recuperando o ritmo para 1,9% em 2025 e 2,1% em 2026, “apoiado, principalmente,
pela procura interna”.
A CE compara
as suas previsões com as do governo inscritas no OE2025, que apontam para o
crescimento de 1,8%, em 2024, e de 2,1%, em 2025, pondo a economia a crescer
acima da média da Zona Euro, para a qual espera a expansão do PIB, de 0,8%, em
2024, e de 1,3%, em 2025.
“O
crescimento económico, em Portugal, deverá aumentar gradualmente, ao longo do
horizonte das previsões, apoiado pelo consumo privado e pelo investimento”,
vinca o relatório, segundo o qual o crescimento abranda, em 2024, mas voltará a
aumentar, em 2025 e em 2026.
A CE anota
que a economia portuguesa abrandou no primeiro semestre de 2024, no contexto de
procura externa moderada e de fraco sentimento empresarial. O fim do ciclo de
utilização dos fundos de coesão da União Europeia (UE) para 2014-2020, que
permitiu despesas até ao final de 2023, resultou na “desaceleração substancial
do crescimento do investimento no início do ano”. E o consumo privado acelerou
no segundo trimestre de 2024, devido ao aumento da remuneração total dos
trabalhadores, e as exportações e as importações aumentaram a taxas similares.
Os serviços,
em particular, o turismo continuaram a apoiar a economia, apesar de alguma
moderação, ao passo que a indústria transformadora “enfrentou dificuldades
significativas”, devido à fraca procura externa de bens, enquanto a construção
se manteve estável. O sentimento económico melhorou, no terceiro trimestre, impulsionado
pelo setor dos serviços e por expectativas menos negativas na indústria, com o
PIB a aumentar 0,2% (em termos trimestrais) segundo a estimativa provisória do
Eurostat, mantendo o ritmo do trimestre anterior. O consumo privado deve
continuar a beneficiar do crescimento dos salários reais, enquanto a projetada
aceleração da implementação do PRR impulsionará os investimentos. E a recente moderação
das taxas de juro deverá apoiar tanto o consumo privado como os investimentos.
A nível
externo, o turismo estrangeiro continuará a ser “importante fator de
crescimento, embora menos do que nos últimos anos”. E a recuperação da procura
de bens de investimento levará as importações a crescerem mais rapidamente do
que as exportações, pelo que o excedente da balança corrente deverá diminuir,
em 2025 e em 2026, após um pico, em 2024.
O executivo
comunitário regista a redução do desemprego, em Portugal, para 6,4%, no
terceiro trimestre deste ano, face à média anual de 6,5%, em 2023, no contexto
de moderação do crescimento do emprego, que abrandou gradualmente para 1,3%, em
termos homólogos. E prevê que o crescimento do emprego continue moderado, mas
permita uma diminuição marginal da taxa de desemprego, de 6,4%, em 2024, para
6,3%, em 2025, e 6,2%, em 2026.
O comissário
europeu dos Assuntos Económicos, reagindo às últimas análises e indicadores que
apontam para a aceleração dos gastos públicos, que poderão, neste ano, aumentar
a ritmo bastante elevado, face ao comum nos últimos anos, na ordem dos 10%, disse
não ter, para já, “particular preocupação” sobre o nível de despesa, em
Portugal, salientando a redução da dívida pública (embora esta seja uma das
mais elevadas da Europa e do Mundo desenvolvido), que deverá atingir os 90% do
PIB, em 2026, bastante acima dos 60% estabelecidos pelo Pacto de Estabilidade.
“É uma
decisão que registamos [de Portugal ter vindo a registar mais gastos]”, mas “não
estamos, neste momento, particularmente preocupados com o nível de despesa”,
declarou Paolo Gentiloni, em conferência de imprensa, em Bruxelas, na
apresentação das previsões económicas de outono, indicando tomar “nota do facto
de, globalmente, continuar a haver, em relação a Portugal, uma situação
orçamental muito boa”.
“Lembro-me,
pessoalmente, quando celebrei com o então primeiro-ministro, que é agora o
presidente [eleito] do Conselho Europeu, do facto de Portugal ter descido
abaixo dos 100% a dívida, em relação ao PIB”, disse o comissário, aludindo a
António Costa.
Estas
declarações surgem depois de, no final de outubro, o Conselho das Finanças
Públicas (CFP) ter previsto a taxa média de crescimento da despesa líquida de
4,3%, no período 2025-2028, superior ao compromisso de 3,6%, assumido pelo governo
no Plano de Estabilidade enviado a Bruxelas, e de ter, recentemente, avisado
que Portugal não comportará um aumento da despesa pública da ordem dos dois
dígitos.
***
As novas previsões da CE mostram que Portugal tem o quarto maior
retrocesso da Europa nos ganhos salariais, até 2026, mas com exceções em
setores, como a indústria e a construção, por via da escassez de pessoal
qualificado. Nas contas públicas, o excedente, para 2024, é de 500 milhões de
euros, maior do que dizem as Finanças.
Após fortes
ganhos reais em 2023 e neste ano, a recuperação do poder de compra dos salários
em Portugal (salário bruto médio por empregado) travará a fundo, nos próximos
dois anos, prevendo-se um ganho só de 1%, em 2026, ao nível dos salários reais
(descontando a inflação prevista).
Portugal
aparece com a quarta maior degradação no ritmo do poder de compra salarial, que
registou forte impulso nos últimos dois anos, na sequência da recuperação da
crise inflacionista e do embate sofrido em 2022, ano em que se iniciou a guerra
da Rússia contra a Ucrânia.
Porém, a recuperação
de rendimentos, neste período de 2023 e 2024 (que fez o salário real por
trabalhador subir acima dos 3%, ao nível da economia portuguesa), é explicada, sobretudo,
como o reflexo de medidas para proteger o poder de compra dos trabalhadores e dos
pensionistas tomadas pelo anterior governo e prolongadas, em parte, pelo atual,
que adicionou algumas novas, embora de menor escala. A ideia em que assentaram
tais políticas foi devolver aos contribuintes parte do ganho das contas
públicas, obtido pelo assinalável crescimento de contribuições e de impostos,
assente em sucessivos recordes na criação de emprego. Todavia, Isso acabou. A
inflação, que chegou a tocar num máximo superior a 10%, no final de 2022,
desceu, devendo ficar na média de 2,6%, em 2024.
As previsões
da CE mostram que o ajustamento em baixa no ganho de poder de compra salarial
(entre 2023 e 2026) acontece numa minoria de países, essencialmente, os que, em
2023, não acusaram quebra no indicador. É o caso da Croácia, da Letónia, da Roménia
e de Portugal, que experimentarão, até 2026, um ajustamento mais agressivo nos
ganhos de poder de compra. A Croácia lidera a travagem, com a redução de 4,9% (face
a 2023), no ganho real nacional (que será de 1,7%, em 2026). Em segundo, surge
a Letónia (menos 4,2%), devendo registar o ganho real salarial de 1,8%, daqui a
dois anos. Em terceiro, surge a Roménia (menos 3,2%), a obter o ganho real
aceitável de 4,4%, em 2026. Em quarto, vem Portugal, cujo ganho real baixa
cerca de 2,3%, colocando o salário por trabalhador apenas 1,2% acima da
inflação esperada pela CE, em 2026.
Porém, a CE
está preocupada com as pressões salariais em Portugal, que tem escassez em
algumas áreas vitais da atividade, e vinca-o no estudo que elaborou para as 27
economias da UE. Segundo ela, o crescimento do emprego continua moderado ao
longo do período de previsão (crescerá 1,1%, neste ano, mas deslizará para 0,8%,
em 2026], embora ainda permita a descida marginal da taxa de desemprego, de
6,4% da população ativa para 6,2%, dentro de dois anos.
Contudo, embora
as taxas de ofertas de emprego tenham permanecido baixas, alguns setores, como
a indústria transformadora e a construção, sinalizam “condições de contratação
restritivas e escassez de competências”, o que deverá “manter as pressões
salariais elevadas”.
Embora o
aumento geral que se prevê nos salários (sobretudo os nominais e em
determinados setores) ajude o consumo privado e a economia como um todo, a CE lembra
o que está a acontecer no setor público, em termos remuneratórios, o que pode
complicar a “consolidação orçamental” (uso de excedentes sucessivos para
reduzir a dívida). Em 2024, as medidas de política orçamental, como os
pagamentos de valores fixos nas pensões e os aumentos extraordinários da massa
salarial da função pública, pesam na despesa pública. E, em 2025, sobressaem os
aumentos das remunerações da função pública, a redução das taxas do IRC, o
impacto da transição do quadro revisto do IRS, a atualização do IRS Jovem.
Quase todos
os ministros das Finanças das últimas décadas rejeitam a ideia de que as contas
públicas têm folgas e sustentam que todo o ganho adicional deve ser canalizado,
prioritariamente, para pagar aos credores, para abater na dívida pública.
Segundo as Finanças e a CE, em contabilidade nacional, o excedente deste ano
pode chegar a 1,6 mil milhões de euros, em vez de 1,1 mil milhões. Se não é
folga, é um desvio positivo de 500 milhões de euros, face ao que se pensava em
meados de outubro. E o ano ainda não acabou.
As receitas
públicas continuarão a expandir-se, mercê das receitas fiscais e das
contribuições sociais, o que explica o excedente, apesar da hesitação da CE sobre
aspetos novos na despesa.
2024.11.16 – Louro de Carvalho
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