domingo, 10 de novembro de 2024

Em época de gripe é necessária a proteção pessoal e comunitária

 

A gripe é uma doença infeciosa, causada por diversos vírus ARN (da família Orthomyxoridae), em especial, o vírus Influenza A e B, que afeta, sobretudo, as vias respiratórias e que, geralmente, ocorre no inverno, atingindo aves e mamíferos. Normalmente, é doença de curta duração e com sintomas moderados. Os doentes com mais de 65 anos ou imunocomprometidos podem ter sinais e sintomas mais ligeiros, mas a recuperação pode ser mais lenta e o risco de problemas e complicações é maior.

O vírus da gripe é, regra geral, transmitido por via respiratória, diretamente de pessoa a pessoa, por contacto próximo (cerca de dois metros). Os vírus contidos nas secreções respiratórias de pessoa infetada, que são expulsas, em partículas, através da tosse ou de espirros ou quando fala, podem infetar outra pessoa. Pode haver transmissão por contacto direto com partes do corpo, por exemplo, as mãos, com superfícies contaminadas com o vírus e, depois, se toca nos olhos, no nariz ou na boca. E pode, ainda, o vírus ser transmitido por contacto direto com excrementos ou com secreções nasais de aves infetadas, ou por contacto com superfícies contaminadas.

A gripe propaga-se, globalmente, em ciclos sazonais de epidemias, que provocam, anualmente, entre três e cinco milhões de casos graves da doença e entre 250 mil e 500 mortes, número que pode ascender a milhões, em anos de pandemia. No século XX, ocorreram três pandemias de gripe, cada uma delas provocada pelo aparecimento de nova estirpe do vírus em seres humanos, e responsáveis pela morte de dezenas de milhões de pessoas. Em muitos casos, as novas estirpes de gripe aparecem, quando um vírus existente se propaga para o ser humano a partir de outra espécie animal ou quando uma estirpe humana recolhe novos genes de um vírus que só infeta aves ou suínos. A estirpe aviária denominada H5N1 levantou preocupações, em relação a uma nova pandemia de gripe, em finais da década de 1990, mas não evoluiu para uma forma de fácil contágio entre o seres humanos. Em abril de 2009, ocorreu uma pandemia de nova estirpe que combinava genes da gripe humana, aviária e suína, denominada H1N1 ou gripe suína.

Embora, não raro, seja confundida com a constipação, a gripe é uma doença mais grave provocada por um tipo de vírus diferente. E pode, ocasionalmente, levar ao aparecimento de pneumonia, tanto viral como bacteriana, mesmo em pessoas bastante saudáveis.

Os vírus da gripe são neutralizáveis pela luz solar, por desinfetantes e por detergentes. E, porque o vírus é neutralizável com sabonete, lavar as mãos com frequência reduz o risco de infeção.

Os países desenvolvidos dispõem de vacinas contra a gripe. As aves de criação são vacinadas, para se evitar que sejam dizimadas por eventual surto. A vacina humana mais comum é a vacina trivalente, que contém antígenos purificados e neutralizados de três estirpes virais e que inclui, em geral, material de dois subtipos de Influenzavirus A e uma estirpe de Influenzavirus B. A vacina não apresenta qualquer risco de transmissão da doença. No entanto, uma vacina produzida para um determinado ano pode não ser eficaz no ano seguinte, uma vez que o vírus da gripe evolui rapidamente, substituindo as estirpes antigas por novas. Todavia, a vacina contra a gripe tem sido importante para diminuir o risco de transmissão do vírus e de desenvolvimento de doença grave e complicações em caso de infeção.

No tratamento da gripe são também usados alguns antivirais, como o oseltamivir.

O período de incubação, isto é, o período entre o momento da infeção e o aparecimento dos primeiros sintomas, é habitualmente, de dois dias, mas pode variar entre um e quatro dias. E, regra geral, o período de contágio começa ente 0h00 a 24h00 antes do início dos sintomas, tem um pico entre as 24h00 e as 48h00, declinando, rapidamente, com quase nenhum vírus detetado depois de cinco a 10 dias. Em crianças, doentes com mais de 65 anos, doença crónica, obesos e imunocomprometidos, este período pode ser maior.

Nos adultos, os sintomas são: mal-estar e cansaço; febre alta; dores musculares e articulares; dores de cabeça; dores de garganta; tosse; rinorreia (congestão nasal); calafrios e sensação geral de desconforto.

Em crianças jovens, os sintomas são semelhantes aos do adulto, mas, nas crianças mais pequenas, os sintomas podem incluir: febre alta; tosse; rinite; dor de cabeça e dores musculares; garganta e olhos vermelhos; náuseas e vómitos; diarreia; dores abdominais; e dificuldade respiratória.

O diagnóstico é, essencialmente, clínico, pela identificação dos sintomas.

Apesar de ambas serem infeções virais, a gripe e a constipação não são causadas pelos mesmos vírus e apresentam alguns sintomas diferentes. Os sintomas de constipação surgem de forma mais leve do que os de gripe. É comum estarem limitados à zona do nariz e não estão tão associados a complicações graves. Os sintomas da gripe tendem a ser mais intensos do que os da constipação e é mais comum surgirem dores musculares, cansaço e febre alta. Além disso, há risco maior de desenvolvimento de complicações ou de agravamento de doenças pré-existentes.

É possível prevenir a gripe, evitando o contágio através de medidas, como a vacinação anual, segundo as indicações da Direção-Geral da Saúde (DGS) ou do médico assistente.

As pessoas doentes não devem, partilhar a mesma divisão, beijar ou abraçar; e devem manter distanciamento dos outros, usar máscara, arejar espaços interiores, desinfetar zonas de utilização comum, lavar as mãos com frequência e manter a etiqueta respiratória (cobrir boca/nariz com um lenço ou com o braço, quando se espirra ou tosse; não espirrar / tossir para as mãos; e lavar as mãos, após tossir ou espirrar).

A gripe é, habitualmente, doença de curta duração (dois a quatro dias), com sintomas de moderada intensidade e com benigna evolução, demorando a recuperação completa entre uma e duas semanas. Nos grupos de risco – pessoas com doenças crónicas e idosos – pode ser mais longa a recuperação e maior o risco de complicações, nomeadamente, pneumonia ou descompensação da doença de base (asma, diabetes, doença cardíaca, pulmonar, cancro).

Em caso de gripe, o doente deve ficar em casa, em repouso (geralmente, até 24h00, após deixar de ter febre); evitar contacto com outras pessoas enquanto estiver doente; manter o ar limpo (abrir uma janela para arejar); medir a temperatura, ao longo do dia; se tiver febre, pode tomar paracetamol (mesmo as crianças); utilizar soro fisiológico, para aliviar a congestão nasal; e, se viver sozinho, especialmente se tiver limitações de mobilidade ou se estiver doente, deve pedir a alguém que lhe telefone, regularmente, para saber como está.

É de referir que é contraindicada a toma de antibióticos, sem recomendação médica, uma vez que não atuam nas infeções virais, não melhoram os sintomas, nem aceleram a cura; que se devem beber muitos líquidos (água e sumos de fruta); e que as grávidas ou as que amamentam não devem tomar medicamentos, sem falarem com o seu médico.

A gripe ocorre, geralmente, nos meses de inverno. Em Portugal, nos anos recentes, tem-se verificado que a maior atividade gripal ocorre nos meses de outono e de inverno (entre outubro e abril), sendo o pico registado entre novembro e fevereiro.

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Com a época oficial da gripe, chegam ideias erradas sobre o seu vírus, desde a eficácia das vacinas até à medicação a tomar. A este respeito, James Thomas deu voz à EuroVerify (equipa de jornalistas especializados no apuramento de factos e na desmistificação das principais histórias e rumores que visam a Europa e a União Europeia), em artigo intitulado “Época de gripe: Mitos comuns desmascarados”, publicado pela Euronews, a 6 de novembro.

“A vacina contra a gripe aumenta o risco de contrair o vírus” é o primeiro mito cuja resposta é um “não” muito fácil, de acordo com o virologista Richard Webby, do Departamento de Interações Micróbio-Hospedeiro do St Jude Children’s Research Hospital em Memphis, Tennessee, que explicita: Isso é exatamente o oposto daquilo para que a vacina da gripe foi concebida. […] A vacina foi concebida para induzir imunidade no corpo, o que ajudará a protegê-lo, caso esteja exposto à gripe. […] Portanto, tomar a vacina da gripe não aumenta as hipóteses de contrair gripe. […] E todas as esperanças são de que ela, realmente, faça o oposto.”

Também Koen Blot, responsável pelo departamento de doenças infeciosas do Instituto Nacional de Saúde Pública da Bélgica, afirmou que “a vacina protege o doente, em vez de o tornar mais suscetível aos vírus que causam a gripe” e salientou que “é importante manter a vacina em dia, porque a composição da gripe muda de ano para ano”. “As vacinas são adaptadas para ter em conta estas pequenas alterações no genoma e na microbiologia – a pequena estrutura do vírus – de modo que, quando se toma uma vacina, a probabilidade de ela o proteger, em comparação com a sua imunidade anterior, seja maior”, explicou.

“Ter gripe é a mesma coisa que ter uma constipação” é outro mito que muitas pessoas acolhem, a ponto de dizerem que o perigo está numa constipação mal curada. Ora, como diz James Thomas, tanto a gripe como a constipação podem causar sintomas similares e, muitas vezes, parecem ser mais frequentes nos meses de inverno, levando as pessoas a utilizar os termos, indistintamente. Porém, é incorreto fazê-lo. São ambas doenças respiratórias contagiosas, mas são causadas por vírus diferentes e podem diferir, significativamente, em gravidade, como vimos.Quando as pessoas se referem à constipação ou à gripe, temos tendência a juntá-las, quando se trata de uma série de vírus respiratórios diferentes, vírus transportados pelo ar que circulam durante o inverno”, afirmou Blot, explicitando: “As pessoas podem ficar com uma doença muito ligeira, devido à gripe, e [que] também pode tornar-se muito grave, dependendo de pessoa para pessoa.”

Efetivamente, algumas pessoas que sofrem de gripe podem ficar apenas com o nariz a pingar ou entupido, semelhante à constipação comum, enquanto outras podem ter sintomas mais graves em que o vírus invade e ataca o tecido pulmonar, causando inflamação. “Isso provoca uma tosse muito profunda e seca”, esclarece Blot, para acrescentar: “Se a inflamação aumentar ainda mais, devido à infeção, começará a ter um impacto negativo na transmissão de oxigénio que os pulmões devem fazer. E então as pessoas começam a falar de falta de ar.”

À medida que o vírus invade o organismo, desenvolvem-se sintomas sistémicos, os que envolvem o corpo todo, como febre, mal-estar geral e dores musculares e articulares. “Aquilo a que nos referimos como constipação não é tanto o trato respiratório inferior dos pulmões, mas mais o trato respiratório superior, à volta da garganta e do nariz, como um corrimento nasal. […] E isso vai ser mais suave”, explica Blot.

“Pode apanhar-se gripe com temperaturas baixas” é outro mito, que tem alguma razão de ser. Mercê da ocorrência da gripe nos meses mais frios, assume-se que são as baixas temperaturas a causar a doença. Todavia, a questão não é assim tão clara.Não é, especificamente, a temperatura fria que faz com que se apanhe gripe”, diz Webby, mas sustentando que “a gripe é uma doença de inverno, nas regiões mais temperadas do Mundo, [mas, se] vivermos perto do equador, é mais uma doença que se manifesta durante todo o ano, com alguns picos durante a estação”.

Os cientistas não têm a certeza dos fatores que tornam a gripe mais uma doença de inverno, nas regiões mais frias do Mundo, mas é provável que seja a combinação de muitos fatores diferentes. “Sabemos que a gripe se transmite um pouco melhor entre as pessoas, em determinadas condições de humidade. […] Se estivermos a falar do inverno, temos tendência para nos aglomerarmos um pouco mais e ficarmos em casa”, considera Webby, realçando que “essa aglomeração cria as condições que favorecem um pouco mais a propagação da gripe”, pelo que “o frio, em si, não é um fator tão importante, embora possa contribuir para a mistura de diferentes fatores que levam a que seja uma doença de inverno”.

“Há medicação que se pode tomar para curar a gripe”, dito assim, é outro mito. Há, de facto, medicação que se pode tomar para a gripe, segundo Blot, mas não os antibióticos, que são feitos para garantir que as bactérias não se desenvolvem. Não funcionam contra os vírus, que podem ser tratados com terapias antivirais como o oseltamivir, também conhecido pelo seu nome comercial, tamiflu.O objetivo da medicação é impedir que o vírus passe do interior do tecido pulmonar infetado para o exterior, para o trato respiratório, para ser transmitido a outras pessoas ou para o interior do corpo, causando mais infeções”, refere Blot, vincando que não é totalmente claro se é eficaz para todos os casos de gripe, embora haja “indicações de que deve ser administrado numa fase precoce”. Porém, “não é muito claro se terá um impacto muito forte, no sentido de garantir uma recuperação mais rápida ou de evitar a hospitalização”, adverte.

As principais diretrizes para o tratamento indicam que este deve ser administrado apenas a pessoas que correm um risco muito elevado. “As pessoas que estão gravemente doentes serão tratadas com estes medicamentos antivirais, mas não é algo que seja administrado a todas as pessoas com uma potencial infeção de gripe”, alerta Blot.

Não há fórmula mágica para garantir que nunca se apanha gripe, mas há medidas a tomar para se proteger melhor e reduzir, significativamente, o risco de desenvolver uma estirpe grave da doença. “São aquelas mensagens […] que ouvimos milhares de vezes, na pandemia de covid: lavar as mãos, espirrar para o cotovelo e, se se sentir doente, ficar em casa”, refere Webby.

A vacina contra a gripe é muito importante, sobretudo se se pertencer a um grupo vulnerável. “Toda a gente pode beneficiar com a vacina da gripe, mas sobretudo os idosos ou as pessoas que, quando tomam a vacina da gripe, tendem a ficar mais doentes”, diz Webby, vincando: “É essa a prioridade máxima: os idosos e as pessoas com doenças subjacentes, como a diabetes.”

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Protegendo-nos, protegemos os outros e mantemos a comunidade mais sadia, que agradece.  

2024.11.10 – Louro de Carvalho

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