A
cimeira de alto nível realizada em Bruxelas, a 12 de setembro, entre a
presidente da Comissão Europeia e os principais representantes da indústria
automóvel, confirmou a clara aposta estratégica nos automóveis elétricos, na
Europa, tendo a União Europeia (UE) permanecido firme nos seus objetivos, em
matéria de reduções de dióxido de carbono (CO2), até 2025. Foi a
terceira e última reunião de crise deste tipo, neste ano, uma parte do que a
Comissão Europeia chamou de “Diálogo Estratégico sobre o Futuro da Indústria
Automóvel”.
“Em perigo mortal” foi a classificação da indústria automóvel europeia feita, em abril, por Stéphane Séjourné, chefe da indústria da UE. Com efeito, os elevados preços da energia, a crescente concorrência global e o incerto ambiente regulamentar e comercial, que mergulharam o setor numa espiral de crise, levaram o chefe a considerar que “existe o risco de o futuro mapa da indústria automóvel mundial ser desenhado sem a Europa”.
“Em perigo mortal” foi a classificação da indústria automóvel europeia feita, em abril, por Stéphane Séjourné, chefe da indústria da UE. Com efeito, os elevados preços da energia, a crescente concorrência global e o incerto ambiente regulamentar e comercial, que mergulharam o setor numa espiral de crise, levaram o chefe a considerar que “existe o risco de o futuro mapa da indústria automóvel mundial ser desenhado sem a Europa”.
Para
obviar aos desafios prementes do setor, Ursula von der Leyen recebeu altos
responsáveis do setor automóvel, com vista a um plano de ataque, que lhe
apresentaram com cinco exigências principais, enunciadas por Camille Lamarque,
responsável pela comunicação política da Associação Europeia de Fabricantes de
Automóveis (ACEA), a saber:
1.
Recalibrar os objetivos de redução das emissões de CO2. A
quota de mercado dos automóveis de passageiros elétricos, na UE-27, era de
15,6% e de 9%, para as carrinhas. Porém, a adoção generalizada no mercado de
massas não acontecerá, “se não acelerarmos as infraestruturas e não baixarmos o
custo total de propriedade”. É certo que “as fábricas europeias estão a ser
construídas e reformadas e a mão de obra requalificada”, mas “os governos e as
entidades reguladoras não investiram, nem exigiram níveis suficientes de
infraestruturas e de modernização das redes e os incentivos continuaram a ser
inconsistentes”. Por conseguinte, “a atual trajetória de redução das emissões
de CO2, no transporte rodoviário, deve ser recalibrada, para
garantir o cumprimento dos objetivos climáticos da UE”, mas salvaguardando “a
competitividade industrial da Europa, a coesão social e a resiliência
estratégica das suas cadeias de abastecimento”.
2.
Reforçar as condições favoráveis. Para os veículos com emissões zero se
tornarem escolha óbvia, para os consumidores e para as empresas, “a compra ou a
utilização destes veículos tem de ser mais atrativa do que a dos veículos com
motores de combustão interna [ICE – Internal Combustion Engine]”, o que postula
incentivos consistentes à compra, tributação mais justa, custos de carregamento
mais baixos e acesso mais fácil às cidades. Para tanto, a Europa deve acelerar
as infraestruturas de carregamento e de reabastecimento, modernizar as redes e
reformar os mercados da energia, para fazer baixar os preços da eletricidade.
3.
Salvaguardar a neutralidade tecnológica. Como os veículos elétricos
dominarão a transição, mas não satisfarão todas as necessidades de transporte,
continuam a ser vitais os híbridos plug-in, as pilhas de combustível de
hidrogénio, os motores ICE alimentados por combustíveis renováveis e outras
soluções. Assim, “manter múltiplas tecnologias em cima da mesa alargaria a
escolha dos consumidores, aceleraria a descarbonização da frota existente e
sustentaria os pontos fortes da Europa, em termos industriais e de exportação”
4.
Reforçar a competitividade e a resiliência. Os decisores políticos
europeus concentraram-se na construção da indústria nacional de baterias, mas isso
levará tempo, pelo que a Europa deve reforçar e diversificar as cadeias de
abastecimento mundiais de baterias, de semicondutores e de matérias-primas
essenciais. Porém, são cruciais, para manter a Europa competitiva, face à forte
pressão mundial, “as parcerias estratégicas com aliados fiáveis, a
simplificação da regulamentação da UE e o apoio específico à inovação e ao
emprego qualificado”.
5.
Adotar políticas adaptadas aos diferentes grupos de veículos. São necessárias
três faixas de políticas adaptadas a cada tipo de veículos: de passageiros,
carrinhas e pesados. Com efeito, a situação do mercado das carrinhas, com a
quota de 9% de veículos elétricos, é crítica e carece de atenção especial. Os
camiões e autocarros representam apenas 3,5% das matrículas de veículos
elétricos a bateria, pois o quadro de apoio está atrasado.
O
subdesenvolvimento do carregamento de megawatts, da capacidade da rede e
dos incentivos à compra impede o progresso num dos setores mais difíceis de
eliminar. Por isso, os líderes da indústria automóvel defendem que a UE não pode
esperar, até 2027, para rever as normas de CO2 para os veículos
pesados. Ao invés, Camille Lamarque diz que “é necessário um acompanhamento e
uma ação urgentes, para colocar o transporte rodoviário de mercadorias na via
da neutralidade climática”, bem como reintroduzir “uma perspetiva industrial e
de mercado para as tecnologias que ajudam a acelerar a transição” e dar “reconhecimento
especial ao fabrico de automóveis elétricos pequenos e eficientes.
***
Os
fabricantes de automóveis têm discordado da promessa da UE de alcançar a
neutralidade carbónica, até 2050, desde que, há quase seis anos, a Comissão
Europeia apresentou o Pacto Ecológico Europeu (PEE), aduzindo que as ambições
climáticas destruiriam a competitividade do setor. De facto, a indústria
automóvel europeia enfrenta mudanças para reduzir as emissões de CO2,
tendo de eliminar, gradualmente, os carros com motores ICE, até 2035,
investindo em eletrificação e assumindo a responsabilidade financeira pelos
veículos no fim de vida. E as negociações sobre o objetivo climático de
2040, para a redução de 90% nas emissões, pressionam o setor a aumentar a
produção de veículos elétricos, ante a incerteza dos compradores.
Com a tradição centenária de produção de veículos com motores ICE, o setor está em situação delicada, tentando adaptar-se à transição verde e lutando para manter-se à frente da concorrência global, com potências como a Alemanha já a sentir a pressão.
Com a tradição centenária de produção de veículos com motores ICE, o setor está em situação delicada, tentando adaptar-se à transição verde e lutando para manter-se à frente da concorrência global, com potências como a Alemanha já a sentir a pressão.
No atinente às emissões, regras controversas, em Bruxelas e nas capitais, preveem uma meta de redução de CO2 de 55%, até 2030, e de 100% até 2035, em comparação com 2021. E o eurodeputado Jens Gieseke (Alemanha/PPE), que integra as comissões do ambiente e da indústria do Parlamento Europeu (PE), defende a oposição do Partido Popular Europeu (PPE) à proibição total dos motores ICE proposta pela Comissão, reconhecendo o papel dos combustíveis neutros em CO2, para abrir caminho para os motores ICE descarbonizados se tornarem parte do futuro mix tecnológico, possibilitando “uma concorrência justa, aberta e baseada no mercado entre diferentes tecnologias de propulsão”.
Após
a emergência da China como um dos principais exportadores globais, o mercado
europeu de veículos elétricos foi inundado por marcas como a BYD, enquanto os
fabricantes nacionais demoraram a adotá-los. E, de acordo com o Instituto
Fraunhofer, as vendas recentes de veículos elétricos, na UE, ficaram aquém das
expectativas anteriores, estimando-se um ligeiro declínio não só no mercado
geral de veículos (-4 %), mas também nos modelos elétricos a bateria (-6 %) e
híbridos plug-in (-5%) de 2023 a 2024. Em contraponto, em junho de 2025,
as marcas chinesas de veículos elétricos obtiveram a sua maior quota de mercado
de sempre, na Europa, com 5,4%, segundo um relatório da empresa de pesquisa de
mercado Jato Dynamics, com forte desempenho, em julho de 2025, alcançando 5,1%.
Embora as tarifas da UE sobre carros chineses deem espaço para os fabricantes europeus competirem, isso não basta segundo representantes da indústria, que culpam a falta de infraestrutura suficiente de afastar os consumidores da compra de veículos elétricos, sendo “catastrófica” a perda de 51 mil empregos, no setor automóvel alemão, num ano, devido à transição para a eletrificação.
O principal grupo de lobby da indústria automóvel, a ACEA, tem expressado apreensão sobre a falta de condições cruciais que o setor enfrenta, para alcançar o aumento necessário na produção e adoção de veículos de zero emissões. Estas incluem “infraestrutura de carregamento e de reabastecimento de hidrogénio, bem como um ambiente de fabricação competitivo, energia verde acessível, incentivos de compra e fiscais, e um fornecimento seguro de matérias-primas, hidrogénio e baterias,” afirmou a direção do grupo.
Embora as tarifas da UE sobre carros chineses deem espaço para os fabricantes europeus competirem, isso não basta segundo representantes da indústria, que culpam a falta de infraestrutura suficiente de afastar os consumidores da compra de veículos elétricos, sendo “catastrófica” a perda de 51 mil empregos, no setor automóvel alemão, num ano, devido à transição para a eletrificação.
O principal grupo de lobby da indústria automóvel, a ACEA, tem expressado apreensão sobre a falta de condições cruciais que o setor enfrenta, para alcançar o aumento necessário na produção e adoção de veículos de zero emissões. Estas incluem “infraestrutura de carregamento e de reabastecimento de hidrogénio, bem como um ambiente de fabricação competitivo, energia verde acessível, incentivos de compra e fiscais, e um fornecimento seguro de matérias-primas, hidrogénio e baterias,” afirmou a direção do grupo.
Embora
a ACEA mantenha o compromisso com os objetivos do PEE e da mobilidade verde,
destacando as centenas de modelos elétricos lançados e os milhões investidos,
apela a um “caminho pragmático para a frente”, em linha com o cenário
industrial, económico e geopolítico. Isso significa, de acordo com um porta-voz
da ACEA, “recalibrar metas, criar as condições certas, como infraestrutura e
energia acessível”, e garantir consistência e simplificação na legislação. Para
que o PEE tenha êxito, são necessárias regras coerentes, simplificadas e
alinhadas em toda a Europa, em vez de fragmentadas ou em constante mudança.
Em
2024, a Itália, a Áustria, a Bulgária, a Chéquia, a Polónia, a Roménia e a Eslováquia,
apresentaram uma proposta conjunta de revisão antecipada das normas de emissões
de CO2. E a lei foi selada pelos colegisladores – Conselho e
Parlamento – em 17 de junho deste ano.
Paralelamente,
profissionais de saúde de toda a Europa escreveram uma carta a Wopke Hoekstra,
Comissário Europeu para o Clima, Crescimento Zero e Limpo, a alertar para o
perigo de reverter a proibição dos carros a diesel e a gasolina. Os signatários
notaram os riscos para a saúde humana do dióxido de nitrogénio (NO2)
e das partículas finas (PM2.5) resultantes da queima de combustíveis
fósseis no transporte rodoviário.
A
luta entre o setor automóvel e os que lutam para manter intactas as metas está
para durar.
***
No
início da cimeira de 12 de setembro, os fabricantes de automóveis europeus
apelaram a uma maior flexibilidade na aplicação dos objetivos de CO2.
“Não importa o que aconteça, o futuro é elétrico”, disse à Euronews, sob
anonimato, uma fonte com conhecimento das conversações entre a presidente da
Comissão Europeia e os executivos de topo do setor automóvel, vincando que a
indústria está consciente da necessidade de transição e que, mesmo que a
Comissão Europeia eliminasse estes objetivos, a concorrência mundial iria
fixá-los, para a indústria”
Bruxelas tem por objetivo a neutralidade climática, até 2050, e decidiu, entre outras coisas, eliminar, progressivamente, os veículos novos com motores ICE, até 2035. Nestas conversações, a Comissão pareceu disposta a avançar com os objetivos para 2035, apesar dos apelos das empresas e dos políticos para que se desvie do objetivo. E o setor automóvel está a aderir.
Bruxelas tem por objetivo a neutralidade climática, até 2050, e decidiu, entre outras coisas, eliminar, progressivamente, os veículos novos com motores ICE, até 2035. Nestas conversações, a Comissão pareceu disposta a avançar com os objetivos para 2035, apesar dos apelos das empresas e dos políticos para que se desvie do objetivo. E o setor automóvel está a aderir.
“Não
conheço nenhuma tecnologia melhor do que o carro elétrico, para fazer avançar a
redução de CO2, nos transportes, nos próximos anos”, disse Gernot
Döllner, CEO da Audi, à revista alemã Wirtschaftswoche, acrescentando: “Em vez
de realçarem estas vantagens, estão constantemente a ser lançados novos debates
sobre a preservação do motor de combustão – isto é contraproducente e perturba
os clientes.”
Um
dos maiores desafios é a aplicação da política climática europeia. Porém, os
governos e os reguladores não investiram, nem exigiram, níveis suficientes de
infraestruturas e atualizações da rede e dão magros incentivos. Ora, para que
os veículos com emissões zero se tornem escolha óbvia, para os consumidores, a
compra ou utilização destes veículos tem de ser mais atrativa do que a dos
veículos com motores ICE. Para tal, são necessários incentivos consistentes à
compra, tributação justa, custos baixos de carregamento e acesso fácil às
cidades. Simultaneamente, a Europa deve acelerar as infraestruturas de
carregamento e de reabastecimento, especialmente, para os veículos pesados,
modernizar as redes e reformar os mercados da energia, para fazer baixar os
preços da eletricidade.
A
indústria automóvel, pedra angular da economia, dá mais de 13 milhões empregos (diretos
e indiretos) e contribui com cerca de 7% para o produto interno bruto (PIB) da
UE.
***
Embora
todos os estados-membros da UE ofereçam benefícios fiscais para impulsionar as
vendas de elétricos, há diferenças entre os regimes de incentivo à compra
direta, provindo dos países do Sul da Europa alguns dos mais generosos. Assim,
os países que oferecem os subsídios mais generosos à compra de veículos
elétricos, em 2025, são a Itália (que iniciou o esquema em meados de outubro
passado), seguida pela Croácia, pela Polónia e pela Grécia.
As vendas de veículos elétricos são limitadas pelos preços elevados e pela falta de estações de carregamento, mas os países implementaram grande variedade de esquemas, para aumentarem as vendas de veículos com emissões zero, num esforço para cumprir os objetivos da UE, que exigem que as frotas de veículos de passageiros novos reduzam as emissões de CO2 em 55%, até 2030.
As vendas de veículos elétricos são limitadas pelos preços elevados e pela falta de estações de carregamento, mas os países implementaram grande variedade de esquemas, para aumentarem as vendas de veículos com emissões zero, num esforço para cumprir os objetivos da UE, que exigem que as frotas de veículos de passageiros novos reduzam as emissões de CO2 em 55%, até 2030.
Não
contando com incentivos para empresas, nem como subsídios regionais ou locais, é
de referir que a Itália oferece cerca de 11 mil euros para pessoas singulares,
cobrindo até 30% do preço de compra de novo veículo elétrico, se o preço for
até a 42700 euros, incluindo IVA.
A
Grécia e a Polónia oferecem, cada uma, cerca de nove mil euros em subsídios
para particulares. Na Grécia, há mais dois mil euros, para a eliminação de
veículo antigo poluente, e mil euros, se o comprador tiver menos de 29 anos.
Além disso, o país oferece incentivos fiscais. E a Polónia também impõe um
imposto de registo nulo para os elétricos.
Outros
países com subsídios generosos incluem a Eslovénia, onde as pessoas podem obter
até 7200 euros, para ajudar à compra de elétrico novo com preço até 35 mil
euros (incluindo IVA).
A
Espanha oferece entre 4500 e sete mil euros, para compra dos elétricos (2500 e cinco
mil euros para os Veículos Elétricos Híbridos Plug-in), mas estipula uma
série de incentivos fiscais.
Os
países nórdicos, incluindo a Noruega e a Dinamarca, com a maior proporção de
veículos elétricos a bateria nas estradas, não oferecem incentivos diretos à
compra, mas estipulam diversos incentivos fiscais.
Alguns
países, incluindo a Áustria, acabaram de suprimir incentivos aos particulares,
para os elétricos, enquanto outros, incluindo a Suécia, propõem novos
incentivos. A Suécia propõe o subsídio de 54 mil coroas suecas (4938 euros),
durante 36 meses, só para famílias de baixos rendimentos das zonas rurais, prevendo-se
que a vigência se inicie em janeiro de 2026.
A
França reduziu o orçamento para subsídios aos veículos elétricos, mas oferece considerável
pacote de incentivos e está prestes a adicionar mil euros, por aquisição de
elétrico produzido na Europa, desde que o preço seja inferior a 47500 euros. E
a Finlândia pondera novo programa de incentivo ao abate de veículos, podendo
conceder o apoio de até 2500 euros a quem comprar um veículo de baixas emissões
e abater um automóvel com mais de 10 anos.
***
Enfim,
a UE tem um dilema cujo segundo membro tem várias vertentes: promover a transição
energética para soluções verdes e garantir outras exigências, como fomentar a
agricultura e a floresta, viabilizar a mobilidade terrestre (rodoviária e
ferroviária), aérea e aquática (marítima, lacustre e fluvial), sustentar as
indústrias, nomeadamente, a automóvel, e assegurar o emprego.
Só
a solução elétrica é inviável. Talvez o hidrogénio venha a dar uma ajuda!
2025.09.17
– Louro de Carvalho
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