A 12 de julho, o presidente dos Estados Unidos da América (EUA) anunciou, em cartas publicadas na sua plataforma Truth Social, a imposição de tarifas de 30%, a partir de 1 de agosto, sobre todos os produtos da União Europeia (UE) e do México, dois dos seus maiores parceiros comerciais.
“A partir de 1 de agosto de 2025, cobraremos da União Europeia uma tarifa de apenas 30% sobre os produtos da UE enviados aos EUA, independentemente de todas as tarifas setoriais”, lê-se na carta endereçada à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, a qual teve conhecimento da missiva, ainda no dia 11, interpretando a iniciativa como uma estratégia negocial, quando Bruxelas acreditava estar próxima de entendimento com Washington.
Na carta, o presidente dos EUA afirmou que o défice comercial dos EUA representa uma ameaça à segurança nacional. “Tivemos anos para discutir a nossa relação comercial com a União Europeia e concluímos que precisamos de nos afastar desses défices comerciais de longo prazo, grandes e persistentes, gerados pelas políticas tarifárias e não tarifárias e [pelas] barreiras comerciais”, escreveu Donald Trump, vincando que reverterá a sua decisão, se a UE ou as suas empresas “decidirem fabricar produtos” nos EUA.
“Na verdade, faremos todos os esforços para obter aprovações, de forma rápida, profissional e rotineira, ou seja, em poucas semanas”, acrescenta, na carta, antes de alertar que se, por qualquer motivo, a UE decidir aumentar as tarifas e retaliar, “o valor que decidir aumentá-las será adicionado aos 30%” já anunciados.
“Basicamente, estamos a dizer aos países que lhes vamos dar o privilégio de comprarem e de trabalharem no nosso país. E acho que isso é muito bom”, disse, horas mais tarde, Donald Trump.
“Em alguns casos, faremos acordos diretos. Já fizemos alguns com vários países. É uma enorme quantidade de dinheiro para este país”, disse o presidente à emissora norte-americana Fox News.
Na carta à líder mexicana, o inquilino da Casa Branca reconhece que o país tem ajudado a conter o fluxo de migrantes, sem documentos, e fentanil, para os EUA, mas sustenta que não fez o suficiente para impedir que a América do Norte se transformasse num “recreio do narcotráfico”. Não obstante, promete que “não haverá tarifas”, se o México ou empresas mexicanas optarem por construir ou fabricar produtos nos EUA e que fará “todo o possível para que isso seja aprovado, de forma rápida, profissional e rotineira, em questão de semanas”.
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Em reação, a presidente da Comissão Europeia admitiu que
a UE poderá retaliar, caso avancem as tarifas de 30% sobre as exportações
europeias para os EUA. Contudo, garantiu continuar disponível para negociar um
acordo com os EUA, até à data prevista para a entrada em vigor das medidas. “Estamos
disponíveis para continuar a trabalhar no sentido de alcançar um acordo, até 1
de agosto. Ao mesmo tempo, tomaremos todas as medidas necessárias para
salvaguardar os interesses da União Europeia, incluindo a adoção de
contramedidas proporcionais, se necessário”, lê-se no comunicado da presidente
da Comissão Europeia.Ainda no seu comunicado, Ursula von der Leyen alerta que a imposição de tarifas sobre os produtos da UE “afetaria, gravemente, cadeias de abastecimento transatlânticas essenciais, em prejuízo das empresas, [de] consumidores e [de] pacientes de ambos os lados do Atlântico”.
A presidente do executivo comunitário frisou que “poucas economias, no Mundo, igualam o nível de abertura e de respeito pelas regras do comércio justo da União Europeia” e que Bruxelas tem mantido “uma postura de diálogo e [de] estabilidade, assente numa parceria transatlântica construtiva”. E assegurou que a UE “continua a aprofundar as suas parcerias globais, firmemente ancoradas nos princípios de um comércio internacional assente em regras”.
Em declarações à imprensa, após o encontro com o presidente indonésio, Prabowo Subianto, em Bruxelas, no dia 13, Ursula von der Leyen afirmou: “Sempre fomos muito claros, quanto ao facto de preferirmos uma solução negociada. É esse o caso e vamos utilizar o tempo de que dispomos, até ao dia 1 de agosto. Ao mesmo tempo, desde o início, trabalhámos e, agora, estamos prontos para responder com contramedidas, se necessário. Portanto, esta abordagem em duas vertentes compensa, porque estamos preparados.”
Também o presidente do Conselho Europeu, se pronunciou sobre as tarifas impostas por Donald Trump, garantindo que a UE se mantém “firme, unida e pronta para proteger os seus interesses” e [para] alcançar um acordo “justo” com os EUA. “O comércio livre e justo impulsiona a prosperidade, cria emprego e fortalece as cadeias de abastecimento”, afirmou António Costa numa publicação na rede social X, vincando que “as tarifas são impostos: alimentam a inflação, geram incerteza e travam o crescimento económico”. “Continuaremos a construir parcerias comerciais sólidas em todo o Mundo”, garantiu.
Como Ursula von der Leyen e António Costa, outros líderes europeus e a presidente do México, Claudia Sheinbaum, manifestaram, com desapontamento e com críticas, o seu desapontamento com as tarifas de 30% anunciadas pelo presidente dos EUA, mas mantiveram a abertura para chegar a uma solução negociada, dado que a medida, tomada unilateralmente, poderá causar enorme perturbação entre os EUA e dois dos seus maiores parceiros comerciais.
“Com a unidade europeia, cabe, mais do que nunca, à Comissão afirmar a determinação da União em defender, resolutamente, os interesses europeus”, afirmou o presidente francês, Emmanuel Macron, numa declaração publicada no X.
O gabinete da primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, afirmou que “não faria sentido desencadear uma guerra comercial entre os dois lados do Atlântico”.
O ministro dos Negócios Estrangeiros da Dinamarca, Lars Løkke Rasmussen, disse à emissora DR que Donald Trump estava a adotar uma “abordagem inútil e muito míope”. O primeiro-ministro sueco, Ulf Kristersson, avisou, numa entrevista à estação pública SVT, que “todos perdem com a escalada do conflito comercial e serão os consumidores norte-americanos a pagar o preço mais elevado”. E o primeiro-ministro cessante dos Países Baixos, Dick Schoof, escreveu, no X, que o anúncio “é preocupante e não é o caminho a seguir”.
A mesma linha de pensamento foi expressa pelo primeiro-ministro da Irlanda, Micheál Martin, ao considerar disse que estas tarifas são um “retrocesso” e não são sustentáveis, e mencionou que a UE tem contramedidas em cima da mesa, mas “não quer ter de as aplicar e prefere uma abordagem negociada”.
O ministro dos Negócios Estrangeiros português considerou que o anúncio de Donald Trump vem ao “arrepio” do que tinham sido as negociações, até aqui, mas reitera que é “fundamental” que o processo negocial continue até à data limite, aguardando “que possa ter um desenlace positivo para ambos os lados do Atlântico”. “Nenhuma opção está excluída”, incluindo “uma reação no sentido de reforçar os direitos aduaneiros recíprocos”, face a uma “escalada” como a agora anunciada, disse Paulo Rangel, em declarações à RTP e à Antena 1, à margem de uma visita oficial a São Tomé e Príncipe. Para já, o governante julga “prematuro” falar de um plano protecionista ou de incentivo aos empresários nacionais. “O sinal que deve ser dado à administração norte-americana é que a nossa vontade é chegar a um acordo”, vincou.
Questionado sobre as repercussões desta decisão para a economia portuguesa, Paulo Rangel afirmou que tarifas de 30% teriam um “efeito disruptivo” e “muito negativo”, para os dois lados. “Uma decisão destas tem sempre um impacto que não é fácil de antecipar” e este valor “não estava em cima da mesa”, acrescentou. Como tal, terá de ser analisado, até por o impacto depender dos vários setores e poder ser “assimétrico”, entre estados-membros da UE.
“A negociação das relações comerciais da União Europeia com estados terceiros é da exclusiva competência da Comissão Europeia” e o governo português está em “contacto estreitíssimo” com a Comissão, frisou o ministro, acrescentando que o comunicado da sua presidente “reflete, na íntegra, as linhas de posicionamento que o governo português transmitiu às entidades europeias”, isto é, há “um desenvolvimento negativo, mas as negociações estão em curso e a UE é defensora do comércio livre e de uma relação muito aberta e franqueada com os EUA”.
Por sua vez, o governo mexicano disse que foi informado, durante as conversações de alto nível com funcionários do Departamento de Estado dos EUA, no dia 11, de que a carta de Donald Trump estava a chegar. E a delegação mexicana, de acordo com declaração do governo, respondeu a Donald Trump, na reunião, que discordava da decisão, que é um tratamento injusto.
Claudia Sheinbaum, que tem procurado evitar criticar, diretamente, o inquilino da Casa Branca, no início da sua presidência, expressou uma certa confiança, durante uma aparição pública, no dia 12, de que os EUA e o México chegarão a “melhores termos”. “Sempre disse que, nestes casos, é preciso ter cabeça fria para enfrentar qualquer problema”, apontou.
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Na sequência das declarações da presidente da Comissão
Europeia, do presidente do Conselho Europeu e de outros líderes, o comissário europeu do Comércio prometeu continuar a negociar com
os seus homólogos dos EUA, apesar do recente anúncio de novas tarifas dos EUA,
recusando a desistir sem “esforço genuíno”.
“Continuamos convencidos de que as nossas relações
transatlânticas merecem uma solução negociada, uma solução que crie as bases
para uma nova estabilidade e cooperação e é por isso que continuamos a
colaborar com a administração dos Estados Unidos e a dar prioridade a uma
solução negociada até ao novo prazo do dia 1 de agosto”, declarou
Maros Sefcovic.Falando à chegada à reunião dos ministros do Comércio da União Europeia (UE), em Bruxelas, a 14 de julho, o responsável aludiu ao anúncio do presidente norte-americano de tarifas recíprocas de 30% ao bloco comunitário, dentro de cerca de duas semanas, vincando: “Não consigo imaginar-me a desistir [de negociar], sem um esforço genuíno.”
Salientando o “contexto cada vez mais difícil do comércio internacional”, o comissário europeu do Comércio descreveu estes direitos aduaneiros adicionais de 30% como “efetivamente proibitivos para o comércio mútuo” entre a UE e os EUA, pois terão “um enorme impacto no comércio”, sendo, em seu entender, “quase impossível continuar o comércio, como estamos habituados, numa relação transatlântica”, e sendo as cadeias de abastecimento transatlânticas fortemente afetadas, em ambos os lados do Atlântico”.
O comissário europeu vincou, ainda, que o executivo comunitário está a preparar-se “para todos os resultados, incluindo, se necessário, contramedidas proporcionais bem ponderadas, para restabelecer o equilíbrio”. E garantiu: “Farei, definitivamente, tudo o que estiver ao meu alcance para evitar um cenário muito negativo.”
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Entretanto,
os ministros do Comércio da UE reúnem-se em Bruxelas, nos dias 14 e 15, para
discutirem o facto de o presidente dos EUA, Donald Trump, ter declarado que
as tarifas de 30% sobre a UE começarão
a ser aplicadas a 1 de agosto, numa altura em que os líderes
alemães se juntaram a outros líderes europeus, no dia 13, a aconselhar uma
abordagem calma das negociações comerciais em curso.Os ministros também debaterão o comércio com os EUA e a China, durante o primeiro de dois dias da reunião do Conselho dos Negócios Estrangeiros, a decorrer na capital belga.
Espera-se que, em relação aos EUA, os participantes mantenham a linha das afirmações que foram produzindo, que se reduzem a dois aspetos: continuar o esforço de negociação e preparar, se necessário, contramedidas proporcionadas.
Não obstante, é de ter em conta a postura do chanceler alemão, Friedrich Merz, que adotou um tom otimista, nos meios de comunicação social, afirmando que falou com Ursula von der Leyen, com o presidente francês Emmanuel Macron e com Donald Trump, no dia 11, e que estes concordaram em tentar chegar a um acordo, nas próximas duas semanas.
Por outro lado, Friedrich Merz afirmou que as negociações estão avançadas e sublinhou que outros países que receberam cartas semelhantes – incluindo a China e o Canadá – encontraram soluções razoáveis.
“Ninguém necessita de novas ameaças ou de provocações, neste momento. O que precisamos é de que a UE prossiga as conversações sérias e concentradas com os EUA”, declarou o ministro das Finanças do país, Lars Klingbeil, ao jornal alemão Süddeutsche Zeitung.
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Na verdade,
o líder político norte-americano, com os seus avanços e recuos, perturba o ambiente
de negociações e, publicando, na sua rede social, as cartas que envia aos governos
de outros países de grupos de países, contradiz as boas regras da atividade
diplomática. Ao mesmo tempo, ao admitir negociar, em particular, com este ou
aquele país da UE, compromete as negociações institucionais ao nível de todo o
bloco europeu, o que não é saudável. Contudo, é o chefe de Estado do e do
governo do seu país e a UE deve ter a paciência de Job para continuar o
diálogo.
2025.07.14 – Louro de Carvalho
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