sexta-feira, 18 de julho de 2025

Caminhar com as famílias e ajudá-las a encontrar a fé

 
Numa mensagem enviada aos participantes num seminário promovido pelo Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, nos dias 2 e 3 de junho, o Papa Leão XIV convida as pessoas a tornarem-se “pescadores de famílias”, a fim de lhes oferecerem um encontro com a ternura de Deus, pois a graça do matrimónio deve ser testemunhada àqueles que escolhem a convivência, lembrando-lhes que a vida cristã é uma experiência de encontro e não apenas um conjunto rigoroso de preceitos a respeitar.
O seminário intitulado “Evangelizar com as famílias de hoje e de amanhã. Desafios eclesiológicos e pastorais” teve início no dia 2, na sede do referido Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, organizador do evento, situada no bairro Trastevere, em Roma, e foi promovido logo após o Jubileu das Famílias, das Crianças, dos Avós e dos Idosos, com um grupo de especialistas a refletir sobre um tema que “expressa bem a preocupação maternal da Igreja com as famílias cristãs presentes em todo o Mundo: membros vivos do Corpo Místico de Cristo e o primeiro núcleo eclesial ao qual o Senhor confia a transmissão da fé e do Evangelho, especialmente, às novas gerações, como escreveu o Papa.
“A profunda questão do infinito, inscrita no coração de cada homem, confere aos pais e às mães de família a tarefa de conscientizar os seus filhos sobre a Paternidade de Deus”, ressalta Leão XIV, “segundo o que escreveu Santo Agostinho” nas Confissões: “Assim como em Ti temos a fonte da vida, assim também na Tua luz veremos a luz.”
De acordo com o Santo Padre, “o nosso tempo é marcado por uma crescente busca pela espiritualidade, especialmente entre os jovens, que desejam relações autênticas e mestres de vida. Por isso, é importante que a comunidade cristã saiba lançar um olhar distante, tornando-se guardiã, diante dos desafios do Mundo, do anseio de fé que habita o coração de cada um”.
Para Leão XIV, “é particularmente urgente, neste esforço, dedicar especial atenção às famílias que, por vários motivos, estão espiritualmente mais distantes: aquelas que não se sentem envolvidas, que dizem não estar interessadas, ou que se sentem excluídas dos percursos comuns, mas que, no entanto, gostariam de ser, de alguma forma, parte de uma comunidade, na qual crescer e com a qual caminhar”. “Quantas pessoas, hoje, ignoram o convite para encontrar Deus”, exclamou, sublinhando o atual anseio de espiritualidade, nem sempre expresso do melhor modo.
Depois, denunciou a existência de modelos ilusórios de vida.
“Infelizmente, diante dessa necessidade, uma ‘privatização’ cada vez mais difundida da fé impede, muitas vezes, esses irmãos e irmãs de conhecer a riqueza e os dons da Igreja, lugar de graça, fraternidade e amor”, escreveu o Papa, vincando que “muitos acabam por se apoiar em falsos apoios que, não suportando o peso de suas necessidades mais profundas, os fazem deslizar novamente, distanciando-os de Deus e fazendo-os naufragar num mar de solicitações mundanas”.
“Entre eles, encontram-se pais e mães, crianças, jovens e adolescentes, por vezes, alienados por modelos ilusórios de vida, onde não há espaço para a fé, para cuja difusão contribui, em grande medida, o uso distorcido de meios potencialmente bons em si mesmos, como as redes sociais, mas nocivos, quando transformados em veículos de mensagens enganosas”, explicitou.
Para o Sumo Pontífice, “o que move a Igreja no seu esforço pastoral e missionário é o desejo de ir ‘pescar’ esta Humanidade para salvá-la das águas do mal e da morte, através do encontro com Cristo”.
No quadro da compreensão a beleza da vocação ao amor, o Papa salienta que os jovens que hoje “escolhem a convivência em vez do matrimônio cristão”, talvez “precisem de alguém que lhes mostre, de maneira concreta e compreensível, sobretudo, com o exemplo de vida, o que é o dom da graça sacramental e qual a força que dela provém”, alguém “que os ajude a compreender “a beleza e a grandeza da vocação ao amor e ao serviço da vida” que Deus concede aos esposos”.
Leão XIV recorda que “muitos pais, na educação dos filhos na fé, precisam de comunidades que os apoiem na criação de condições para que possam encontrar Jesus, lugares onde se realiza aquela comunhão de amor que encontra a sua fonte última no próprio Deus”. Com efeito, a fé é, primeiramente, uma resposta a um olhar de amor, e o maior erro que podemos cometer como cristãos é, nas palavras de Santo Agostinho, “pretender que a graça de Cristo consista no seu exemplo e não no dom da sua pessoa”.
“Quantas vezes, num passado, talvez não tão distante, esquecemos esta verdade e apresentamos a vida cristã, principalmente, como um conjunto de preceitos a respeitar, substituindo a experiência maravilhosa do encontro com Jesus, Deus que Se doa a nós, por uma religião moralista, pesada, pouco atraente e, de certa forma, inviável na concretude da vida quotidiana”, considerou o Santo Padre.
Exortando a que os participantes no referido seminário, se tornem “pescadores de famílias”, o Papa sublinha que, “neste contexto, cabe antes de tudo aos bispos, sucessores dos Apóstolos e Pastores do rebanho de Cristo, lançar a rede ao mar, tornando-se pescadores de famílias. por sua vez, os leigos são chamados a comprometerem-se nesta missão, tornando-se, junto com os ministros ordenados, “pescadores” de casais, de jovens, de crianças, de mulheres e de homens de todas as idades e condições, para que todos possam encontrar Aquele que é o único que pode salvar. De facto, cada um de nós, no batismo, é constituído sacerdote, rei e profeta para os irmãos, e torna-se “pedra viva” para a construção do edifício de Deus “na comunhão fraterna, na harmonia do Espírito, na convivência das diversidades”.
Leão XIV convida a entender como “caminhar com essas famílias e como ajudá-las a encontrar a fé, tornando-se ‘pescadores’ de outras famílias”, famílias “feridas de muitas maneiras”, a abrirem-se, quando necessário, a novos critérios de avaliação e a diferentes modos de agir, porque cada geração é diferente da outra e apresenta os seus desafios, sonhos e interrogações”. Porém, no meio de tantas mudanças, Jesus Cristo permanece “o mesmo ontem, hoje e sempre”. Portanto, se queremos ajudar as famílias a viverem caminhos alegres de comunhão e a serem sementes de fé umas para as outras, é necessário que, antes de tudo, cultivemos e renovemos a nossa identidade de fiéis”, conclui o Papa.
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Toda esta reflexão é consonante com o pensamento do seu predecessor imediato, Francisco, o qual, desde o início do seu pontificado, mostrou especial interesse pela família e falou dela inúmeras vezes, perante as multidões que se juntam na Praça de São Pedro, salientando a importância de cuidar dela com carinho. Aqui se deixam algumas frases do Papa Bergoglio, que expressam o seu pensamento.
“Entre todas as coisas, aquilo que mais pesa é a falta de amor. Pesa não receber um sorriso, não ser recebido. Pesam certos silêncios. Por vezes, também em família, entre marido e mulher, entre pais e filhos, entre irmãos. Sem amor, o esforço torna-se mais pesado, intolerável.”
“Há três palavras mágicas: ‘Pedir licença’, para não ser invasivo na vida do cônjuge. ‘Obrigado’, agradecer o que o outro fez por mim, a beleza de dizer ‘obrigado’. E a outra, ‘desculpa’, que às vezes é mais difícil, mas é necessário dizê-la.”
“No vosso caminho familiar, vós partilhais tantos momentos inolvidáveis. No entanto, se falta o amor, falta a alegria e o amor autêntico dá-no-lo Jesus.”
“O segredo é que o amor é mais forte do que o momento em que se discute e, por isso, aconselho aos esposos: Não acabeis o dia em que discutistes, sem fazerdes as pazes, sempre.”
“O verdadeiro vínculo é sempre com o Senhor. Todas as famílias têm necessidade de Deus: todas, todas! Necessidade da Sua ajuda, da Sua força, da Sua bênção, da Sua misericórdia, do Seu perdão. E requer-se simplicidade. Para rezar em família requer-se simplicidade! Quando a família reza unida o vínculo torna-se mais forte.”
“Se o amor é uma relação, constrói-se como uma casa. Não a queirais construir sobre a areia dos sentimentos que vão e vêm, mas sobre a rocha do amor verdadeiro, o amor que vem de Deus. A família nasce deste projeto de amor que quer crescer como se constrói uma casa: que seja lugar de afeto, de ajuda, de esperança.”
“Hoje, a família é desprezada, é maltratada, e o que se nos pede é reconhecer o belo, o autêntico e o bom que é formar uma família, ser família hoje; o indispensável que isto é para a vida do mundo, para o futuro da Humanidade.”
“O matrimónio é uma longa viajem que dura toda a vida, e necessitais da ajuda de Jesus para caminhardes juntos, com confiança, para vos acolherdes, um ao outro todos os dias, e perdoardes-vos todos os dias; e isto é importante nas famílias, saberem perdoar-se. Porque todos nós temos defeitos. Todos!”
“Quando nos preocupamos com as nossas famílias e com as suas necessidades, quando entendemos os seus problemas e esperanças, […] quando se apoia a família, os esforços repercutem-se não só em benefício da Igreja; ajudam também a sociedade inteira.”
“A verdadeira alegria vem da harmonia profunda entre as pessoas, que todos experimentam no seu coração e que nos faz sentir a beleza de estar juntos, de apoiar-se, mutuamente, no caminho da vida.”
“Quando eu era criança em Buenos Aires, era costume não se visitarem as famílias ‘irregulares’, de casais separados ou de outras religiões e, mesmo por parte dos pregadores, havia uma espécie de isolamento. Mas a minha mãe e, sobretudo, o meu pai, até pelos seus vínculos de trabalho, cultivavam relações com todos. O mesmo se pode dizer da minha avó Rosa, que se empenhava na Ação Católica e convivia com as mulheres evangélicas do Exército de Salvação: ‘São boas’, assegurava. Embora, na adolescência, eu talvez tenha sido um pouco mais rígido, o instinto de compreensão, da complexidade da existência e do acolhimento começou a formar-se em mim, a partir de então, do que eu vivia em família. É o amor que restaura a vida, que salva. A nossa fé não se detém diante das feridas e dos erros do passado, mas vai além dos erros e dos pecados. Esse olhar sem julgamentos foi-me demonstrado com certa naturalidade, já em família”
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Boa atitude: expor a doutrina com toda a clareza, mas apostar na compreensão, no diálogo e na aceitação da diversidade e da complexidade das vidas humanas. Não é pela rejeição que elas se melhoram, nem se lhe oferece o testemunho da misericórdia de Deus. Temos de voltar ao dinamismo do Cristo do Evangelho.

2025.07.18 – Louro de Carvalho


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