O presidente
dos Estados Unidos da América (EUA), em campanha eleitoral, prometeu que, sendo
eleito, acabaria com a guerra da Rússia na Ucrânia em 24 horas. Obviamente, essas
24 horas estão largamente ultrapassadas. Contudo, Donald Trump não desiste facilmente,
parecendo convincente o seu forte poder de comunicação.
Ao discursar
no Fórum Económico Mundial (WEF, na sigla em Inglês), a 23 de janeiro, prometeu
exercer pressão sobre a Organização dos Produtores e Exportadores de Petróleo (OPEP),
ao afirmar que a descida do preço do petróleo poderia pôr termo, “imediatamente”,
à guerra na Ucrânia. “Neste momento, o preço é suficientemente elevado para que
a guerra continue e é preciso baixar o preço do petróleo e acabar com a guerra”,
defendeu.
A OPEP é
constituída por 13 países ricos em petróleo, incluindo o Iraque, o Irão, a
Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos (EAU), que representam, juntos,
cerca de 40% da oferta mundial de petróleo. A sua importância significa que
podem afetar, drasticamente, o preço do petróleo, aumentando ou diminuindo a
produção. E o presidente dos EUA sustenta que a aliança OPEP partilha a
responsabilidade pelo conflito de quase três anos na Ucrânia, porque manteve os
preços do petróleo demasiado altos. “Se o preço baixasse, a guerra entre a
Rússia e a Ucrânia acabaria imediatamente”, porfiou.
Donald Trump
comprometeu-se a pressionar a Arábia Saudita e a OPEP a baixar os preços
do petróleo, sugerindo que as medidas económicas – e não a ajuda militar –
poderiam ser a chave para pôr fim
ao conflito. Ao mesmo tempo, mostrou vontade de dialogar diretamente com
Vladimir Putin, para pôr fim à guerra. E, embora não tenha dado pormenores
sobre a forma como negociaria a paz, insistiu que “a Ucrânia está pronta para
fazer um acordo”.
A estratégia
do presidente dos EUA não é clara e a Rússia não esquece que tem resistido a
uma série de sanções dos EUA e da União Europeia (UE) desde o início da invasão
da Ucrânia, há quase três anos. O petróleo era a maior exportação da Rússia
para os EUA, mas esse negócio cessou em 2023. Ora, as vendas de energia
constituem uma grande parte das receitas da Rússia.
Por outro
lado, não é de esquecer que, no início da primeira semana do seu mandato, o chefe
de Estado norte-americano ameaçou impor “um elevado nível de impostos, tarifas
e sanções”, à Rússia, se Vladimir Putin não chegar a um acordo para acabar com
a guerra.
Por sua vez,
o Irão, que é membro da OPEP e aliado da Rússia, poderá opor-se ao plano
proposto por Donald Trump.
Entretanto,
o novo inquilino da Casa Branca também está a propor mais perfurações de
petróleo e de gás nos EUA, o que poderá fazer baixar os preços globais e
pressionar a Rússia.
Da sua parte,
o presidente ucraniano, Volodymr Zelenskyy, no seu discurso do dia 23, disse: “O
principal é não abrandar e pressionar a Rússia, a única entidade que quer esta
guerra. […] Os recursos energéticos, nomeadamente o petróleo, são uma das
chaves mais importantes para a paz e para a segurança real. […] A Europa
precisa de trabalhar mais com a América e [com] outros parceiros no Mundo, e
não com a Rússia, no que diz respeito aos recursos energéticos.”
***
Em resposta ao desafio dos EUA, o presidente russo,
propõe uma reunião com Donald Trump. Em
entrevista pela televisão, Vladimir Putin repetiu a afirmação do presidente norte-americano de
que o conflito na Ucrânia poderia ter sido evitado, se ele estivesse na Casa Branca
em 2022. E declarou o Kremlin pronto para dialogar com os EUA sobre uma vasta
gama de questões. “É melhor encontrarmo-nos e conversarmos, calmamente, sobre
todas as questões de interesse para os EUA e para a Rússia, com base nas
realidades atuais”, sustentou o líder russo, elogiando Donald Trump como “homem
inteligente e pragmático”, focado nos interesses dos EUA.
“Eu não
poderia discordar de que, se ele tivesse sido presidente, se eles não tivessem
roubado a vitória dele em 2020, a crise que surgiu na Ucrânia em 2022 poderia
ter sido evitada”, declarou o presidente russo, Vladimir Putin, mostrando convicção.
Esta
declaração do presidente russo foi o seu endosso mais direto, até agora, da
recusa de Donald Trump em aceitar a derrota nas eleições de 2020. Contudo, é difícil
de acreditar na capacidade de Trump em evitar a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Na verdade, disse, repetidamente, que não teria permitido que o conflito
começasse, se estivesse no cargo, mas era presidente enquanto os combates
cresciam, no Leste da Ucrânia, entre as forças de Kiev e os separatistas
alinhados com Moscovo, antes de Vladimir Putin enviar dezenas de milhares de
tropas, em 2022.
No dia 23, Donald
Trump disse à Fox News que o
presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, deveria ter feito um acordo com
Putin para evitar o conflito; e no dia 24, Vladimir Putin sublinhou que está
aberto a negociações, mas apontou a decisão de Zelenskyy de 2022 de excluir
Moscovo. Neste âmbito, questionou: “Como é que é possível conversar se isso for
proibido?” E advertiu: “Se as conversações começarem no quadro jurídico
existente, serão ilegítimas e os seus resultados também poderão ser declarados
ilegítimos.”
Todavia, o presidente
russo afirmou que os EUA e a Rússia têm muitos outros pontos na sua agenda,
incluindo o controlo de armas nucleares e questões económicas. “Podemos ter
muitos pontos de contacto com a atual administração e procurar soluções para as
questões fundamentais da atualidade”, adiantou.
Vladimir Putin
disse que as sanções contra a Rússia, introduzidas durante o primeiro mandato
de Donald Trump e sob a administração de Joe Biden, prejudicaram os interesses
dos EUA, minando o papel do dólar no sistema financeiro global. E descreveu o
líder norte-americano como “não só inteligente, mas também um homem pragmático”,
sustentando: “Acho difícil imaginar que ele tomaria decisões que prejudicariam
a economia americana. […] É melhor encontrarmo-nos e termos uma conversa calma
sobre todas as questões de interesse para os Estados Unidos e para a Rússia,
com base nas realidades atuais.”
De facto,
enquanto principais produtores de petróleo e grandes potências industriais, a
Rússia e os EUA não têm interesse em que os preços globais do petróleo sejam
demasiado baixos ou demasiado altos. “Temos coisas para falar”, disse Putin.
***
Questionado
sobre os comentários de Trump, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, afirmou
que Moscovo entende que o conflito “não depende dos preços do petróleo”, pois foi
desencadeado pela recusa do Ocidente, sem ter em conta os interesses de
segurança da Rússia. “O conflito está a decorrer, devido à ameaça à segurança
nacional da Rússia, à ameaça aos Russos que vivem nesses territórios e à recusa
dos Americanos e dos Europeus em ouvirem as preocupações de segurança da
Rússia. Não está relacionado com os preços do petróleo”, disse Peskov, cujos comentários
são eco das declarações de Putin, segundo as quais teve de enviar tropas para a
Ucrânia, para afastar a ameaça à segurança da Rússia, resultante dos planos de adesão
da Ucrânia à Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e para proteger
os russófilos que aí vivem.
A Ucrânia e
o Ocidente denunciaram a ação de Moscovo como um ato de agressão não provocado.
E Peskov disse que o Kremlin estava a seguir, atentamente, as declarações de
Trump e observou que este impôs uma série de sanções no seu primeiro mandato.
Moscovo “continua pronta para um diálogo igualitário, para um diálogo
mutuamente respeitoso”, afiançou Peskov, segundo o qual “este diálogo teve
lugar entre os dois presidentes, durante a primeira presidência de Trump”,
aguardando-se, agora, sinais que ainda não se receberam.
***
Os Russos estão cansados da guerra. “Toda
a gente está preparada. Por isso, é difícil adivinhar o que está para acontecer”,
disse o porta-voz do Kremlin, assegurando que, se for acordada uma conversa entre
os dois líderes, Moscovo informará, atempadamente, sobre essa reunião.
A Reuters
noticiou que Trump queria uma reunião com Putin, “imediatamente”, mas não foi
especificado quando é que o presidente norte-americano pretende encontrar-se
com o homólogo russo, sendo, no entanto, o principal objetivo é pôr fim a uma
guerra de quase três anos.
Espera-se que os líderes dos EUA e da
Rússia trabalhem em conjunto para se acabar com a guerra na Ucrânia e para retomarem
as negociações sobre o desarmamento nuclear e sobre o regime de sanções. A
determinação de pôr fim ao conflito foi uma das promessas de campanha mais
mediáticas de Trump. E, imediatamente após a sua tomada de posse, o 47.º
presidente dos EUA apelou a ambas as partes para que pusessem fim às
hostilidades, embora ainda não tenha sido apresentado qualquer plano de paz
concreto.
De acordo com a imprensa russa, a
24 de janeiro, Vladimir Putin disse que a Rússia estava pronta para
conversações sobre a Ucrânia. “Sempre dissemos, e quero voltar a sublinhar, que
estamos prontos para as conversações sobre a questão ucraniana. Mas também há
questões que requerem uma atenção especial”, avisou o presidente russo, sem
deixar de criticar o decreto do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, que
proíbe as negociações.
No final de 2024, Vladimir Putin
nomeou os termos das negociações com a Ucrânia, que, no entanto, não foram
levadas a sério nem na UE, nem nos EUA.
O ministro dos Negócios Estrangeiros
russo, Sergei Lavrov, reiterou: “O cessar-fogo temporário e o congelamento do
conflito são inaceitáveis. Serão certamente utilizados pelo Ocidente para
reforçar o potencial militar do regime de Kiev e as tentativas de vingança
armada. São necessários acordos e mecanismos fiáveis e juridicamente
vinculativos para garantir que o conflito não seja retomado.”
Por sua vez, Peskov afirmou, num briefing, que devem ser retomados os acordos de desarmamento nuclear, “no interesse
de todo o Mundo e no interesse dos povos dos nossos países”, sustentando que “a
Rússia acredita no reinício das negociações de
desarmamento o mais rapidamente possível”, sobretudo, porque
“o quadro jurídico e de tratados no domínio do controlo de armas foi
significativamente prejudicado”, não por culpa da Federação Russa. Foram os EUA
quem pôs termo à sua participação e minou a própria deste quadro jurídico.
Todavia, recorda as palavras do
presidente russo de que, “nas atuais circunstâncias, é evidente que todas as
capacidades nucleares devem ser tidas em conta”, sendo impossível, por exemplo,
negociar e não ter em conta as capacidades da França e do Reino Unido. As
realidades atuais é que ditam esta necessidade. “Portanto, há que falar, há que
falar, e perdeu-se muito tempo. […] A bola está no campo dos Americanos, que
suspenderam todos os contactos, todos os contactos substantivos com a nossa
parte”, disse Peskov.
Sergei Naryshkin, diretor do Serviço
de Informações Externas da Rússia, falou da possibilidade de diálogo com
Washington, a nível da sua agência. Anteriormente, disse à agência noticiosa
TASS que estava pronto para
reunir com o chefe da CIA, John Ratcliffe, se houvesse interesse da parte dos
EUA. “Estamos sempre prontos para conversações”, referiu, questionado sobre a
disponibilidade para uma reunião, se esta fosse solicitada pela parte
americana.
Em resposta a uma pergunta de
esclarecimento sobre se ainda existem contactos entre o SVR (Serviço de Inteligência
Estrangeiro russo) e a CIA, declarou: “Temos um representante oficial em
Washington e a Central Intelligence Agency tem um representante oficial em
Moscovo.”
Um dia antes, Sergey Lavrov falou
sobre como e quem poderia tornar-se um intermediário em possíveis negociações
entre a Rússia e a Ucrânia, afirmando que a Rússia “não considera a Itália como
possível participante nas conversações de paz na Ucrânia”. “Infelizmente, as
relações russo-italianas estão a atravessar a crise mais profunda, desde a
Segunda Guerra Mundial, e a responsabilidade oficial cabe, certamente, a Roma”,
disse Lavrov, recordando que a Itália bloqueou todas as relações bilaterais com
a Rússia.
Assim, entre os países que poderiam
participar no processo de manutenção da paz, o ministro dos Negócios
Estrangeiros russo destacou a China e o
Brasil, mas sublinhou que Moscovo “está aberta a quaisquer
negociações, se forem, essencialmente, sobre as causas profundas e os
princípios que Vladimir Putin afirmou em junho de 2024, falando no Ministério
dos Negócios Estrangeiros, que gostaria de vincar que “não se trata de
quaisquer condições prévias”.
***
Por fim, é de referir que o presidente
ucraniano defendeu, a 25 de janeiro, que as conversações de paz com a Rússia
não terão “resultados reais” sem a Ucrânia, pelo que pediu aos aliados para
procurarem um formato negocial com esse fator. “É impossível excluir a Ucrânia
de qualquer plataforma de negociação. Caso contrário, esta plataforma de
negociação não conseguirá resultados efetivos”, explicou Volodymyr Zelensky,
durante uma reunião, em Kiev, com a sua homóloga moldova, Maia Sandu.
“Antes de
qualquer reunião, seja ela qual for, é apropriado estabelecer um formato: como
podemos alcançar uma paz justa? Penso que nos devemos concentrar nisso”, frisou
o líder ucraniano, temendo que a Rússia escolha o modelo de decreto de paz sem
a aprovação da Ucrânia.
Já no dia 25, Andrii Yermak, chefe de gabinete presidencial ucraniano,
vincara que Kiev se opõe a conversações de paz entre Vladimir Putin e Donald
Trump, sem a Ucrânia. E sintetizou a posição de Kiev, dizendo que Putin quer “negociar
o destino da Europa sem a Europa”.
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A paz é passível
e é urgente, mas não se impõe. Ao invés postula os esforços de todos.
2025.01.25 – Louro de Carvalho
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