Em junho de 2024, a dívida pública, na ótica de
Maastricht, aumentou mil milhões de euros para 278 mil milhões de euros,
tendo-se
situado em 101,5% do produto interno bruto (PIB), no segundo trimestre do ano, de acordo com a “Nota de informação estatística de junho de 2024”, do
Banco de Portugal (BdP), publicada a 1 de agosto.
Esta subida refletiu, sobretudo,
o acréscimo dos títulos de dívida (1,1 mil milhões de euros), principalmente de
curto prazo, destaca o nosso banco central, anotando que a dívida pública está
cerca de um ponto percentual acima do contabilizado
no primeiro trimestre do ano.
Para o cálculo da dívida pública
em percentagem do PIB, utiliza-se o valor nominal do PIB divulgado pelo
Instituto Nacional de Estatística (INE). Caso o valor do PIB nominal para o
trimestre mais recente não esteja disponível, à data da publicação da
informação sobre dívida pública, é feita uma extrapolação com base na seguinte
informação divulgada pelo INE: valor nominal do PIB do trimestre homólogo,
variação homóloga em volume do trimestre mais recente e variação homóloga do deflator
do PIB do trimestre anterior.
Segundo a instituição liderada
por Mario Centeno, “os ativos em depósitos das administrações públicas
totalizaram 14 mil milhões de euros, o que corresponde à redução de 1,6 mil
milhões de euros, relativamente a maio”. Deduzida desses depósitos, a dívida
pública aumentou 2,6 mil milhões de euros, para 264,1 mil milhões de euros.
A dívida pública teve a
quarta subida mensal consecutiva. Não
obstante, é a subida mensal consecutiva menor de todas, com a dívida
pública a engordar apenas 0,34%, quando, nos três meses anteriores,
registou subidas entre 0,93% e 1,34%. Só este ano, o stock da dívida pública acumula uma subida de
5,68%, o equivalente a 14,9 mil milhões de euros.
Em termos homólogos, os dados do BdP revelam que a
dívida pública registou uma contração de 0,7%. Há nove meses consecutivos,
apresenta contrações homólogas. Porém, desde março que tem abrandado,
contabilizando, em junho, a menor contração homóloga, desde outubro de 2023.
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A dívida pública (das administrações públicas)
corresponde às responsabilidades financeiras do setor das administrações
públicas e é um dos indicadores macroeconómicos mais relevantes utilizado para
avaliar a saúde financeira das administrações públicas de um país e, até, do país
como um todo. Traduz o nível de endividamento das administrações públicas e
compreende as suas responsabilidades face aos restantes setores residentes da
economia e do resto do Mundo.
Há
várias formas de medir a dívida pública. Em Portugal, e nos outros países
da União Europeia (UE), utiliza-se uma definição harmonizada que é, comummente,
designada por “dívida de Maastricht” ou “dívida na ótica de Maastricht”. De
acordo com esta ótica, a dívida
pública engloba as responsabilidades em numerário
e em depósitos constituídos junto das administrações públicas (como os
certificados de aforro ou do Tesouro), os títulos de dívida emitidos
pelas administrações públicas (destacando-se, entre outros, as obrigações e os
bilhetes do Tesouro) e os empréstimos obtidos por estas entidades.
Não
são incluídos no cálculo da dívida
pública, na ótica de Maastricht, alguns instrumentos financeiros, tais
como as ações e outras participações, os derivados financeiros e os outros
débitos/créditos (nos quais se incluem as dívidas comerciais).
Este conceito de dívida é calculado
de forma consolidada, ou seja, exclui as dívidas de entidades das
administrações públicas que sejam detidas por outras entidades deste setor e
adota, como regra de valorização, o valor nominal, ou seja, o valor que as administrações
públicas (emitentes-devedores) deverão amortizar no termo do contrato.
O valor da dívida pública é expresso
em unidades monetárias mas, para fins de análise é, frequentemente, apresentado
em percentagem do PIB.
Os estados-membros
da UE, no Tratado da União Europeia (TUE),
acordaram em manter a dívida pública num valor inferior a 60% do PIB e um
défice orçamental inferior a 3% do PIB. No Pacto de Estabilidade (PE), os estados-membros
comprometeram-se a manter uma situação orçamental positiva ou próxima do
equilíbrio. Estes valores encontram-se definidos no Protocolo anexo ao TUE, sobre o procedimento relativo aos
défices excessivos (PDE), no qual se refere que os estados-membros devem enviar
à Comissão Europeia informação sobre o défice e sobre a dívida do respetivo
país. De acordo com a legislação em vigor, o Eurostat analisa e valida a
informação transmitida por cada país.
Além do
conceito da dívida de Maastricht, existem outras formas de medir a dívida
pública. As principais diferenças entre as diversas alternativas assentam,
essencialmente, nas entidades abrangidas, nos instrumentos considerados e nos
critérios de valorimetria utilizados.
O endividamento das administrações
públicas apresenta duas principais diferenças, face à dívida de Maastricht: considera
também as responsabilidades das administrações públicas em dívidas comerciais;
e é calculado de forma não consolidada, ou seja, inclui a dívida de entidades
das administrações públicas que é detida por outras entidades deste setor.
Adicionalmente, é divulgada informação sobre o endividamento do setor público
não financeiro, que inclui, para lá do setor das administrações públicas, as
sociedades não financeiras públicas.
Os passivos
das administrações públicas resultantes das contas
nacionais financeiras correspondem a uma medida alternativa da dívida deste
setor. Este indicador inclui as responsabilidades sob a forma de derivados
financeiros, ações e outras participações e outros débitos (incluindo as
dívidas comerciais), que complementam os instrumentos incluídos na dívida, na
ótica de Maastricht (depósitos e
equiparados, títulos de dívida e empréstimos).
A informação produzida no âmbito das contas nacionais financeiras é avaliada ao
valor de mercado e engloba juros vencidos por pagar, constituindo mais um ponto
de divergência, face à dívida de Maastricht.
A dívida
direta do Estado corresponde à dívida em que o subsetor Estado é o
devedor, isto é, inclui só os passivos deste subsetor; e é também apurada de
forma não consolidada, ou seja, inclui os passivos deste subsetor que são
detidos por outros subsetores das administrações públicas.
No BPstat,
o BdP publica a evolução da dívida pública com possibilidade de
desagregação por instrumento, moeda de denominação, setor detentor e setor
emitente, prazo residual e prazo original. É também disponibilizada informação
sobre a dívida pública em percentagem do PIB.
No subdomínio da dívida pública, é possível
consultar quadros e gráficos pré-definidos, enquanto, no separador Dados, se pode construir análises
personalizadas sobre a dívida pública.
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A par da dívida pública, deparamo-nos
com o défice. Neste capítulo as notícias não são boas.
De acordo com dados da Direção-Geral do
Orçamento (DGO) divulgados a 31 de julho, o défice do Estado subiu para 2731
milhões de euros, em junho, em contabilidade pública. Desde dezembro de 2022,
quando o saldo global foi negativo em 3590,8 milhões de euros, que não era tão
elevado. O saldo até junho agravou-se em 178 milhões de euros, face ao mês
anterior e, em 7574,5 milhões de euros, face ao período homólogo. Esta
evolução resulta do aumento da despesa (11,2%) aliado à diminuição da receita
de 4,1%.
As contas públicas voltaram ao
‘vermelho’, em março, pela primeira vez desde dezembro de 2022, ano de pandemia.
Desde aí, tem o saldo tem vindo a agravar-se, mas a DGO releva que o ritmo de
subida de junho, face ao mês anterior, já abrandou.
A variação do saldo foi influenciada
pela transferência, em 2023, da totalidade das responsabilidades asseguradas
pelo Fundo de Pensões do Pessoal da Caixa Geral de Depósitos (FPCGD) para a
Caixa Geral de Aposentações (CGA), no valor de 3018,3 milhões de euros, operação
que não tem impacto no saldo em contas nacionais, por ter uma natureza
financeira.
Os dados da execução orçamental são, em
ótica de caixa (entradas e saídas de dinheiro), que difere da contabilidade
nacional, que utiliza a lógica dos compromissos, sendo aferida pelo Instituto
Nacional de Estatística (INE) e nas comparações internacionais.
Ajustado do efeito inerente ao FPCGD, o
saldo orçamental do Estado decresceu 4556,2 milhões de euros, face ao registado
no mesmo período do ano anterior, pelo facto de o aumento da despesa (11,2%)
ter sido superior ao da receita (1,7%). Já o saldo primário cifrou-se em 958,1
milhões de euros, menos 4253,2 milhões de euros do que em 2023.
Até junho, como dissemos, a despesa
cresceu 11,2%, face ao período homólogo, enquanto a despesa primária aumentou
11,4%. A DGO assinala
que, com a exclusão do efeito das medidas extraordinárias, a despesa primária
subiu 11,2%, sobretudo por via dos acréscimos na despesa de transferências,
despesas com o pessoal e aquisições de bens e serviços.
A pesar na evolução da despesa,
destacam-se as transferências correntes com o aumento homólogo de 15,6%,
influenciado, em grande medida, pelo aumento dos encargos com pensões e outros
abonos e com os
acréscimos verificados na generalidade das restantes prestações sociais a cargo
da Segurança Social. Além disso, a despesa com subsídios recuou 12,4%, devido à
diminuição dos subsídios relativos à formação profissional, concedidos pela
Segurança Social.
O crescimento das despesas com
pessoal (7,2%) é justificado pelo efeito transversal das medidas de valorização
dos rendimentos dos trabalhadores em funções públicas, em vigor desde o início
de 2024 e, em menor grau, pelo efeito do acelerador nas carreiras
da Administração Pública. Destaca-se, nesta área, o setor saúde, o regime
jurídico de dedicação plena, o desenvolvimento da carreira de técnico auxiliar
de saúde e a organização e funcionamento das Unidades de Saúde Familiar, modelo
A, bem como da alteração das Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados, para
Unidades de Saúde Familiar, modelo B.
A DGO anota de que “os impactos do novo
modelo de organização do Serviço Nacional de Saúde (SNS), que procedeu à
reestruturação das entidades públicas empresariais”. Relativamente às
aquisições de bens e serviços (10,8%), sobressaiu o maior volume de pagamentos
no SNS e a evolução no subsetor da Administração Local. Já a despesa com juros
cresceu 8,9%.
A receita reduziu-se em 4,1%,
com a receita fiscal do Estado a cair 8% para 23326,7 milhões de euros,
influenciada, em parte, pelos efeitos dos pagamentos relativos ao regime de
ativos por impostos diferidos de imposto sobre o rendimento de pessoas
coletivas (IRC) (117 milhões de euros), em fevereiro, e pela prorrogação
do pagamento de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) (-188,3 milhões de
euros em junho de 2023 e 320 milhões de euros em junho de 2024). Excluindo
estes efeitos, a receita fiscal diminuiu 5,6%, em resultado,
sobretudo, da evolução do IRC
(-63,2%), conexa com a prorrogação de prazo para pagamento desse imposto
relativo ao período de tributação de 2023, atenuada pelo comportamento
verificado no imposto sobre o rendimento de pessoas singulares (IRS) (5%), no IVA (2,4%) e no imposto
sobre produtos petrolíferos (ISP)
(16,7%).
A execução acumulada indica que a
receita dos impostos diretos caiu -20,3%, para 8183,6 milhões de euros, refletindo
menor receita de IRC, (-66,5%), explicada pela prorrogação do prazo de entrega
da declaração anual de rendimentos (modelo 22), enquanto a receita de IRS subiu
5%.
No atinente aos impostos indiretos, em
comparação com o período homólogo, verifica-se uma ligeira subida (0,4%) para
15143,1 milhões de euros, destacando-se uma quebra de 2,2% da receita de IVA,
compensada parcialmente por um incremento de 16,7% na receita de ISP.
***
Tem-se referido que há milhões de euros
em receitas por arrecadar, por falta de recursos humanos na Autoridade
Tributária (AT), que aumenta a economia paralela e que os pacotes de medidas do
governo não têm suporte orçamental. Terminaremos o ano com défice e dívida maiores?
2024.08.01 – Louro de Carvalho
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