Um estudo da Faculdade de Engenharia da Universidade de Carnegie
Mellon, nos Estados Unidos da América (EUA), publicado em janeiro de 2023, revela que metade dos glaciares do
planeta desaparecerá até final do século, mesmo que se cumpram as previsões mais otimistas do Acordo de
Paris, que implicam a limitação do aumento da temperatura média global a 1,5
graus celsius (1,5ºC), em relação aos níveis pré-industriais. E, caso se
mantenha o cenário atual, que prevê um
aumento de 2,7ºC, desaparecerão dois terços dos
glaciares.
É um cenário negro em que serão afetados, principalmente, os
glaciares mais pequenos da Europa Central, do Canadá e dos EUA, o que resultará
no aumento
preocupante no nível da água do mar.
Também a 21 de abril de 2023, um dia
antes de
ser assinalado o “Dia Mundial da Terra”, um relatório da Organização
Meteorológica Mundial (OMM) sublinhava
as tendências preocupantes que marcam a progressão das alterações climáticas,
estando estas a provocar aumentos recordes na subida do nível do mar, no derretimento dos
glaciares e no aumento das temperaturas.
O relatório vinca as
tendências preocupantes que marcam a progressão das alterações climáticas, que
incluem os recordes europeus de derretimento de
glaciares, em 2022, e a diminuição do gelo marinho na Antártida, também em 2022,
para o nível mais baixo de que há registo.
Além
disso, os oceanos estão a tornar-se mais quentes, com a quantidade de calor
armazenada por eles a atingir um novo recorde em 2022. A taxa de subida global do mar duplicou desde 1993,
atingindo também um novo recorde. E, globalmente, os últimos oito anos foram os mais quentes registados desde 1850,
com temperaturas a 1,15ºC, acima da média de 1850-1900.
Em março de 2023, os
principais cientistas climáticos do Mundo escreveram no relatório do Painel
Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC) que a bomba relógio climática estava “a fazer tiquetaque”.
Samantha Burgess, vice-diretora do Copernicus Climate Change
Service, disse que o nível de gases com efeito de estufa,
produzidos na Europa, por exemplo, tornará improvável que se atinja o objetivo
do Acordo de Paris de 2015 de
limitar o aquecimento a 1,5ºC, conclusão também alcançada no relatório do IPCC.
“Enquanto as emissões de gases com efeito de estufa continuarem a aumentar e o
clima continuar a mudar, as populações de todo o Mundo continuarão a ser
gravemente afetadas pelo clima e [pelos] eventos climáticos extremos”, disse o
secretário-geral da OMM, Petteri Taalas, num comunicado de imprensa.
Taalas frisou que a
seca na África Oriental, as chuvas recorde no Paquistão e ondas de calor na
China e na Europa afetaram dezenas de milhões de pessoas e custaram milhares de
milhões de euros em prejuízos. Os
impactos socioeconómicos das alterações climáticas incluirão problemas como a
segurança física, a segurança alimentar e a deslocação da população, concluiu o
relatório da OMM, o que representa “múltiplos riscos humanitários para a
sociedade”.
A título de exemplo, é
de referir que, 8 de agosto de 2023, uma casa ruiu na sequência das inundações
na capital do estado norte-americano Juneau. A força das águas foi agravada
pela quebra parcial de um glaciar a menos de 20 quilómetros de Juneau, que
funciona como barragem natural na região. O incidente provocou imensos
estragos, pois deitou abaixo árvores e danificou várias estruturas ao longo do
rio Mendenhall.
***
A 28 de setembro de 2023, a Comissão Suíça para a
Observação da Criosfera, da Academia Suíça de Ciências, alertava para o facto
de os glaciares suíços estarem a derreter cada vez mais depressa. Depois
de perderem 6% do seu volume, em 2022, diminuíram mais 4%, em 2023. É o segundo
maior declínio desde que há registo.
O organismo frisava que a “aceleração é dramática (e que) perdemos tanto
gelo, em dois anos, como entre 1960 e 1990”. Os dois anos extremos consecutivos estão a provocar a desintegração das
línguas dos glaciares e o desaparecimento de muitos pequenos glaciares. As
medições no St. Annafirn (UR), por exemplo, tiveram de ser interrompidas.
A comissão considera que a “perda maciça de gelo” resultada de um “inverno
com muito pouca neve e de temperaturas elevadas no verão”.
O degelo dos glaciares está a afetar todo o país. No sul e no Leste, os
glaciares derreteram quase tanto como em 2022, ano em que se tinha já batido o
recorde, mesmo em áreas onde os glaciares ainda se encontravam em equilíbrio, há alguns anos. A perda de
espessura chegou a atingir três metros nos glaciares Gries, Basòdino ou Pers, o
que representa muito mais do que o registado durante a vaga de calor do verão
de 2003.
A 7 de abril de 2024, o Clube Alpino
Austríaco (OeAV), no seu relatório
de medição de gelo, que pormenoriza o rápido retrocesso dos 93 glaciares da
Áustria, nos últimos dois anos, advertiu que os 93 glaciares austríacos estão a sofrer um grave e visível degelo
nestes últimos dois anos, pelo que desaparecerão nos próximos 45 anos.
O glaciar de Pasterze foi o que mais recuou, acima dos 203 metros. O
Rettenbachferner, em Tirol, ocupa o segundo lugar, com 127 metros de gelo a
menos. Dos 93 glaciares analisados, apenas um se tem mantido como antes. “De
facto, dentro de 40 ou 45 anos toda a Áustria ficará
praticamente sem gelo”, declarou o chefe do serviço de medição
de gelo, Andreas Kellerer-Pirklbauer, em conferência de imprensa, em Salzburgo.
“Acabou o tempo” para os glaciares austríacos, anunciou Gerhard Lieb, do Clube Alpino Austríaco. Agora, só se a neve e o gelo começarem a formar-se de novo, os glaciares poderão, pelo menos, manter o seu tamanho atual, explicou Lieb, mas “já não se podem salvar os glaciares austríacos, porque os sistemas de recuperação estão muito lentos”.
Os peritos sustentam que a sobrevivência dos glaciares austríacos se deve, inteiramente, às reservas de gelo do passado. Não é uma tendência isolada, pois também, nos Alpes italianos ou na Suíça, os glaciares tiveram o mesmo destino.
Os glaciares são massas de gelo que se formam quando a neve e o gelo se compactam durante séculos e, depois, fluem lentamente sobre a terra. O seu degelo é um dos sinais mais notáveis da mudança climática e do aquecimento global provocado pelo homem, já que os glaciares de todo o Mundo retrocedem rapidamente.
***
A 27 de agosto deste ano, foi noticiado que o maior
glaciar de França está a desaparecer, tendo havido zonas em que perdeu 40
metros em quatro ou cinco anos.
O “Mer de Glace” (“Mar de Gelo”),
situado no vale de Chamonix-Mont-Blanc, na região de Chamonix, o maior glaciar francês, é o terceiro maior glaciar dos Alpes, está
a encolher de forma surpreendente e
está a desaparecer a olhos vistos.
Os responsáveis locais preocupam-se em encontrar alternativas para não
serem obrigados a vedar a visita ao glaciar, já que o turismo e as atividades
de inverno são o motor económico da região, mas também por uma questão de
sensibilização, não querem perder a oportunidade de mostrar, na prática, as
consequências das alterações climáticas. Assim, na semana anterior, foi
inaugurado um novo teleférico, um acesso mais fácil aos milhares de visitantes
que ali vêm todos os anos.
Segundo o glaciologista Luc Moreau, o teleférico permite observar de perto
as consequências do aquecimento global, ao mesmo tempo que promove o turismo
local. “Há zonas em que o glaciar perdeu 40 metros em quatro ou cinco anos”,
sublinhou.
A situação preocupa principalmente os especialistas em ambiente, que estão
agora mais empenhados do que nunca em sensibilizar as pessoas para a
necessidade urgente de conservação.
Assim, verifica-se que os glaciares estão a derreter,
no Mundo inteiro, devido às alterações climáticas. E, sendo a Europa o
continente que tem o degelo a um ritmo mais acelerado, não surpreende que os
seus glaciares estejam a desparecer mais rapidamente do que o esperado.
***
Os glaciares são grandes e
espessas massas de gelo formadas em camadas sucessivas de neve compactada
e recristalizada, de várias épocas, em regiões onde a acumulação de neve é
superior ao degelo. São dotados de movimento e deslocam-se lentamente, em razão
da gravidade e do relevo abaixo, provocando erosão e sedimentação glacial. O seu gelo é o maior reservatório
de água doce sobre a Terra, perdendo em volume total de água
apenas para os oceanos. Cobrem vasta área das zonas polares, mas
ficam restritos às montanhas mais altas nos trópicos.
Podem apresentar a extensão de vários
quilómetros e a espessura pode também alcançar a faixa dos quilómetros. À neve
que restou de uma estação glacial dá-se o nome de nevado (usa-se também o
termo alemão “Firn” e
o francês “neve”). O
nevado é a etapa intermediária da passagem da neve para o gelo. À medida que se
acumulam as camadas anuais sucessivas, o nevado profundo é compactado,
recongelando os grânulos num corpo único.
Entre as caraterísticas geológicas criadas
pelos glaciares estão as morenas (ou moreias) terminais ou frontais,
mediais, de fundo e as laterais, que são cristas ou depósitos de fragmentos de
rocha, transportados pelo glaciar; os vales em forma de U e circos nas
suas cabeceiras; e a franja do glaciar, que é a área onde o glaciar
derreteu recentemente.
Os glaciares formam-se onde se acumula
mais neve no inverno que derrete no verão. Quando as temperaturas se
mantêm abaixo do ponto de congelamento, a neve caída muda a sua estrutura
já que a evaporação e a recondensação da água causa a recristalização para
formar grânulos de gelo menores, espessos e esféricos. Esta neve é conhecida
por nevado. À medida que a neve se acumula e converte em nevado, as
camadas mais profundas são submetidas às pressões cada vez mais intensas.
Quando as camadas de gelo e de neve têm espessuras de várias dezenas de metros,
o peso é tal que o nevado desenvolve cristais de gelo maiores.
Nos glaciares onde a fusão se dá na zona
de acúmulo de neve, a neve pode converter-se em gelo pela fusão e pelo regelo
(em vários anos). Na Antártida, onde a fusão é muito lenta ou
não existe, a conversão da neve em gelo pode demorar mil anos. A pressão sobre
os cristais de gelo faz que estes tenham uma deformação plástica, cujo comportamento
faz com que os glaciares se movam lentamente, sob a força da gravidade, como
se tratasse de um enorme fluxo de terra.
O tamanho dos glaciares depende do clima
da respetiva região. O equilíbrio entre a diferença do acumulado na parte
superior, em relação ao que se derrete na parte mais profunda tem o nome de equilíbrio
glacial. No glaciar de montanha, o gelo compacta-se nos circos
glaciários, isto é, depressões em forma de nicho, de bordas
escarpadas, nas altas montanhas. No glaciar continental, o acúmulo ocorre na sua
parte superior, em consequência mais da formação da escacha branca (isto é,
da passagem direta do vapor de água do ar ao estado sólido pelas baixas
temperaturas) do que das precipitações de neve. O gelo acumulado comprime-se e
exerce pressão sobre o gelo mais profundo; e o peso do glaciar exerce pressão
centrífuga que provoca o empuxo do gelo até a borda exterior, onde se derrete. A
esta parte dá-se o nome de área de ablação.
No glaciar de vale, a linha que separa
as duas áreas (acumulação e ablação) é a linha de neve ou de equilíbrio. A
elevação destas linhas varia consoante as temperaturas e a quantidade de neve
precipitada é maior nas vertentes ou ladeiras do que nas regiões de menor
incidência solar. O avanço ou retrocesso do glaciar é determinado pelo aumento
da acumulação ou da ablação. Os motivos do avanço ou do retrocesso podem ser
naturais ou humanos, sendo estes últimos os mais evidentes desde 1850, pelo
desenvolvimento da industrialização, sendo o efeito mais observado a
enorme produção de dióxido de carbono (CO²), que absorve grandes
quantidades de água (dos glaciares próximos) para formar o ácido carbónico,
com o que os glaciares de vale retrocedem.
A morfogénese glaciária dá-se pelo
processo de modificação do relevo, através do depósito ou da vazão do gelo,
podendo alterar a estrutura e o formato da rocha ou da montanha.
***
Enfim, mistérios da Natureza, que parece
saber mais o que quer do que o ser humano!
2024.08.29 – Louro de Carvalho
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