sexta-feira, 16 de agosto de 2024

Pensionistas reivindicam, não suplementos, mas medidas estruturais

 

O primeiro-ministro (PM) arrancou, na defensiva, com a Festa do Pontal, a primeira em que o Partido Social Democrata (PSD) está no poder desde 2015. “Não estamos a tomar medidas menores”, disse Luís Montenegro, a 14 de agosto, no calçadão de Quarteira, no Algarve, garantindo que o governo não está a “resolver problemas pequenos”, mas a tratar, “estratégica e estruturalmente, do futuro de Portugal”.

No fim de um discurso de quase 45 minutos, o PM anunciou um suplemento extraordinário para as pensões mais baixas. Em outubro, mês da apresentação do Orçamento do Estado para 2025 (OE 2025), quem recebe até 509,26 euros, um IAS (Indexante de Apoios Sociais), receberá um extra de 200 euros. Para as pensões entre os 509,26 e os 1018,52 euros (dois IAS), o suplemento será de 150 euros. Já as pensões entre os 1018,62 e 1527,78 euros (três IAS) receberão 100 euros.

Diga-se, desde já que, este suplemento às pensões mais baixas não é uma medida estrutural nem estratégica. Não passa de imitação corrigida de medidas tão criticadas de António Costa e também deixa a classe média de parte. Não digo que seja uma esmola, mas é pouco mais.   

O também presidente do PSD reiterou que o complemento solidário para idosos (CSI) atingirá 820 euros, em 2028, e assegurou que as pensões continuarão a crescer ao ritmo da inflação, uma diferença face a “outros”, numa farpa ao governo de António Costa que, em 2022, antecipou aumentos aos pensionistas e suspendeu durante meses, a atualização das reformas pela inflação.

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O suplemento extraordinário para pensões mais baixas, pago de uma só vez, anunciado pelo chefe do governo, não resolve o problema dos pensionistas, sendo necessárias soluções estruturais, como declararam à agência Lusa duas associações que os representam.

“Parece-nos que não resolve nada”, considerou Isabel Gomes, presidente da direção da Confederação Nacional de Reformados, Pensionistas e Idosos (MURPI), frisando que “são apenas pensos rápidos que vão colocando”.

“Aquilo de que nós precisamos, é, de facto, de um aumento de pensões e o que nós colocávamos, no início deste ano, de 7,5% sobre o valor de dezembro, num mínimo de 70 euros, é o fundamental, porque 100, 150 ou 200 euros, agora”, não se repetirão “no mês seguinte”, referiu, lembrando que “os reformados necessitam, na mesma, de comer, de comprar os seus medicamentos” e de fazer todas as coisas habituais, “a que têm direito, porque trabalharam uma vida, descontaram para a segurança social”.

Maria do Rosário Gama, presidente da direção da Associação de Aposentados, Pensionistas e Reformados (APRe!) tem opinião semelhante. “É uma situação pontual, não é estrutural, ou seja, começa e acaba no mesmo mês, paga-se em outubro e já não será paga mais vezes e, portanto, não resolve o problema das pessoas com pensões muito baixas”, explanou, lembrando que há mais de 1,5 milhões de pensões abaixo de 500 euros e que o limiar de pobreza é de 591 euros.

O que nos preocupa é o facto de não haver um aumento de pensões que possa fazer com que não haja reformados com pensões abaixo dos 591 euros”, vincou.

A presidente da direção da MURPI reconheceu que, obviamente, “as pessoas ficam contentes” com esta medida, mas reiterou que isso “não traz nada de novo, porque, no mês seguinte, vão voltar a ter os mesmos problemas”. Portanto, a Confederação promete continuar a desenvolver iniciativas para ajudar os pensionistas a melhorar a sua qualidade de vida. Assim, a juntar a uma “petição sobre lares que, em setembro, deve ir à Assembleia da República [AR], porque já tem mais de oito mil assinaturas”, a entidade quer “aproveitar essa altura” para voltar ao primeiro ponto do “caderno reivindicativo, que é o problema do aumento das reformas”.

Já a APRe!, segundo a sua presidente, esteve presente numa reunião com o secretário de Estado da Segurança Social e espera uma audição com a ministra da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social. “Em todas as situações, temos reivindicado o aumento das pensões mais baixas, que é o que nós queremos fazer, junto do governo, dos partidos políticos”, considerou Maria do Rosário Gama, sustentando que “uma pensão abaixo de 500 euros não permite viver com dignidade, nem sequer permite, por exemplo, pagar uma instituição onde [a pessoa] possa ser internada”, caso seja necessário.

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O suplemento em causa vai custar cerca de 400 milhões de euros ou “talvez um pouco mais”. O valor foi revelado, a 16 de agosto, pelo ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, que adiantou que o governo estima que 2,4 milhões de pensionistas serão abrangidos por este “brinde”, que varia entre 100 e 200 euros. “Neste momento, a nossa estimativa – que precisa de um afinamento – rondará os dois milhões e 400 mil pessoas, e poderá andar à volta de 400 milhões de euros, talvez um pouco mais”, indicou o governante, em declarações aos jornalistas, transmitidas pela RTP 3.

O chefe do Executivo, quando anunciou a medida, não indicou nem, o impacto orçamental da medida, nem o universo de beneficiários, mas, agora, Paulo Rangel, ladeado pelo secretário de Estado do Trabalho, Adriano Moreira, revelou uma primeira estimativa.

Em declarações aos jornalistas, Rangel sublinhou que “esta é uma medida de apoio fundamental”. “Não compreendo como há tanta gente, mesmo entre os partidos da oposição, que está incomodada com uma medida que é social e revela responsabilidade orçamental“, atirou.

Na visão do governante, o Executivo tem de promover o crescimento da economia, mas tem de “olhar para as pessoas com rendimentos menores”, daí que se avance com o suplemento para os reformados. “É uma medida que, em outubro, atingirá mais de dois milhões de pessoas. Estar a querer tentar desvalorizar essa medida… Onde está a sensibilidade do Partido Socialista [PS]?”, farpou o governante, deixando claro, quando confrontado com as críticas de que a medida é eleitoralista, que “só há eleições, se o secretário-geral do PS” quiser.

Como vimos também as associações representativas deixam críticas à medida. Por um lado, trata-se de um pagamento único, ou seja, não é um aumento das pensões, mas um cheque que será pago uma única vez; por outro, é inferior ao suplemento extraordinário que o governo de António Costa aplicou em outubro de 2022, correspondente a meia pensão.

Porém, é de recordar que, nessa altura, o suplemento serviu como contrapartida por não se ter aplicado de, forma plena, às pensões o aumento que resultaria da inflação histórica (o anterior governo acabou por aplicar por completo a subida, em meados de 2023). Desta vez, o suplemento não tem essa contrapartida, tendo o PM garantido que irá cumprir a lei e aplicar, por completo, o aumento das pensões que resultar da inflação e do crescimento económico.

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Em suma, os pensionistas com reformas mais baixas receberão um suplemento extra, no mês de outubro, entre 100 e 200 euros, variando de acordo com o valor da pensão bruta que auferem. Quanto mais baixa for a pensão, mais recebem.

Aquando do anúncio do pagamento deste suplemento, o PM comprometeu-se, ainda, a atualizar os valores das reformas, no próximo ano, mediante a aplicação da lei e, se a situação orçamental estiver igual ou melhor do que a atual, voltando a fazer pagamentos extraordinários em 2025.

Todavia, é necessário rever toda a filosofia das pensões de reformados ou aposentados. É imoral que haja tantas e tão baixas pensões, após uma longa carreira contributiva. Se os salários estão baixos, as pensões estão ainda muito mais. E a idade legal para aposentação ou reforma é absurda.  

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Em 2023 e 2024, a idade normal de acesso à reforma é de 66 anos e quatro meses. Porém, em 2019, foi criada a idade pessoal de acesso à reforma, permitindo que as pessoas com mais de 40 anos de descontos possam ter acesso à reforma, sem penalizações, antes da idade normal.

Neste caso, é possível antecipar a idade da reforma em quatro meses por cada ano que exceda os 40 anos de contribuições. Por exemplo, quem some 41 anos de descontos para a Segurança Social pode reformar-se sem penalizações a partir dos 66 anos.

Além disso, a reforma antecipada pode ser pedida por quem: tenha, pelo menos, 60 anos de idade e 40 anos de descontos; tenha, pelo menos, 60 anos de idade e 46 anos de descontos (regime de antecipação por carreiras muito longas); esteja em situação de desemprego involuntário de longa duração; e tenha atividade profissional de natureza penosa ou desgastante.

Atualmente, pode pedir a reforma antecipada, através do regime de idade, quem tenha, pelo menos, 60 anos de idade e, enquanto tiver essa idade, complete 40 ou mais anos de descontos. Se o fizer, será penalizado pelo fator de redução. Ou seja, a reforma será reduzida em 0,5% por cada mês de antecipação em relação à idade pessoal da reforma. Ainda assim, é possível usufruir do regime de flexibilização da idade e não ser penalizado pelo fator de sustentabilidade.

Veja-se um exemplo de quem tem penalização: idade pessoal de reforma, 65 anos (porque tem 44 anos de descontos), e idade que decide reformar-se, 63 anos. Antecipou a reforma em 24 meses. Uma vez que são descontados 0,5% por cada mês, esta pensão vai sofrer um corte de 12%. E um exemplo sem penalização: idade pessoal de reforma, 64 anos e 8 meses, (porque tem 45 anos de descontos), e idade em que decide reformar-se, 64 anos e 11 meses. Não terá qualquer corte na pensão, porque se reformou depois da idade pessoal de reforma.

O fator de sustentabilidade é aplicado em casos de reformas antecipadas por flexibilização da idade. É o caso em que a pessoa completou 40 anos de contribuições depois dos 61 anos de idade.

Quem tiver carreiras com muitos anos de descontos não sofre qualquer penalização. É o caso das pessoas com, pelo menos, 60 anos de idade e 48 anos de contribuições. Além disso, também se enquadram neste regime as pessoas com 60 ou mais anos de idade e, pelo menos, 46 anos de descontos. Neste último caso, terão começado a descontar antes dos 17 anos de idade.

Os desempregados de longa duração também podem pedir a reforma antecipada. Existem duas possibilidades: pedir a reforma aos 57 anos ou aos 62 anos.

A reforma antecipada por desemprego de longa duração, aos 57 anos, exige: ter ficado desempregado, pelo menos, aos 52 anos; ter, pelo menos, 22 anos com registo de remunerações; ter esgotado o período de concessão do subsídio de desemprego ou do subsídio social de desemprego; e continuar em situação de desemprego involuntário.

A reforma antecipada por desemprego de longa duração, aos 62, anos exige: ter ficado desempregado, pelo menos, aos 57 anos; ter, pelo menos, 15 anos de descontos; ter esgotado o período de concessão do subsídio de desemprego ou do subsídio social de desemprego; e continuar em situação de desemprego involuntário.

Por fim, é possível pedir a reforma antecipada por motivos da natureza da atividade profissional (desgaste rápido). O regime de acesso a esta reforma antecipada e as penalizações são específicos para cada profissão. Estão neste âmbito: trabalhadores do interior ou das minas, das lavarias de minério e trabalhadores da extração ou transformação primária da pedra; bordadeiras da Madeira; profissionais de bailado clássico ou contemporâneo; trabalhadores portuários integrados no efetivo portuário nacional; trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio, SA; controladores de tráfego aéreo; pilotos comandantes e copilotos de aeronaves de transporte público comercial de passageiros, carga ou correio; trabalhadores marítimos na marinha de comércio de longo curso, de cabotagem e costeira e de pesca; trabalhadores marítimos na pesca; e trabalhadores integrados nas carreiras de bombeiro sapador e de bombeiro municipal.

Enfim, há carreiras contributivas longas e atribuladas que não constam desta listagem e que deviam merecer a atenção dos decisores políticos, não por esmola, mas por justiça. O trabalhador merece salário condigno e o guerreiro o justo descanso.

2024.08.16 – Louro de Carvalho

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