sábado, 13 de julho de 2024

“O andor é pesado, mas vamos nas nuvens!”

 

Celebrou-se, a 12 e 13 de julho, nos Santuário de Fátima, a 3.ª Peregrinação Internacional Aniversária das Aparições de Nossa Senhora, sob a presidência de D. Manuel da Rocha Felício, Bispo da Guarda, que exortou os peregrinos a seguirem o exemplo dos Pastorinhos na “entrega incondicional” e na “oração”. Nos serviços do Santuário, fizeram-se anunciar cerca de 53 grupos de peregrinos oriundos de Portugal, da Alemanha, dos Camarões, do Canadá, da Coreia do Sul, da Costa do Marfim, da Eslováquia, de Espanha, dos Estados Unidos da América (EUA), da Irlanda, da Itália, de Malta, da Polónia, do Reino Unido e do Vietname.

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A cada Peregrinação Aniversária,  meia centena de peregrinos são chamados a levar aos ombros o andor de Nossa Senhora, uma experiência feliz que marca quem a assume. “Vamos nas nuvens!”

Minutos antes do início do Terço, na Capelinha das Aparições, já os sete grupos de peregrinos que levarão ao ombro o andor com a imagem de Nossa Senhora estão reunidos junto à saída da Colunata do lado Norte, para receberem instruções dos Servitas de Nossa Senhora de Fátima.

As indicações dadas variam consoante a posição de cada grupo que assumirá no percurso, até porque o levantamento do andor, logo no início da procissão, ou a parte final, com a “difícil” subida da escadaria do presbitério do Recinto de Oração e o pouso, na peanha, implicam graus de exigência diferentes, como refere Lourenço Correia de Oliveira, o Servita que está a coordenar o grupo de peregrinos. “As indicações que damos incidem mais sobre os grupos que fazem o levantamento e o pouso do andor, até porque estes momentos requerem mais destreza, para que a Imagem possa ir sempre direita. Por exemplo, na subida das escadas, damos a indicação para que os da frente e do meio retirem o andor dos ombros, por forma a nivelá-lo com os que vão atrás”, descreve o Servita, frisando a calma e a coordenação como atitudes essenciais para o processo.

A troca do andor é também um “momento sensível”, pela possibilidade de um dos lados ficar desequilibrado, até porque esta troca é sempre feita em movimento, para que a procissão não pare, lembra Lourenço de Oliveira, considerando que, em todo o percurso, são os Servitas a voz de comando. Um à frente e outro atrás, são quem dá as coordenadas que guiam quem leva o andor aos ombros, quando se sobe ou desce, respetivamente. Meia hora antes do início da procissão, os grupos são orientados para as respetivas posições. Seguem em fila, pelo corredor central, posicionados na ordem inversa do sentido que a procissão vai percorrer.

“Lourenço, alinhas os peregrinos?”, pergunta o outro Servita, à medida que cada grupo vai assumindo a posição. “Sim”, reponde de imediato, já a dispor os elementos de cada grupo pela altura, opção que visa colmatar o desnível do Recinto de Oração.

No processo de seleção, feito nas primeiras horas da manhã de cada Peregrinação Aniversária, a altura dos ombros dos peregrinos é um dos fatores que é mais considerado na formação dos grupos de oito elementos. Quando são escolhidos, o receio ou o medo que possa haver em assumir tamanha responsabilidade são logo dissipados pela alegria de poder transportar o andor com a Imagem de Nossa Senhora de Fátima. E Abílio Pereira atesta a “felicidade e o significado intenso de levar Nossa Senhora de Fátima aos ombros”. Natural de Arco de Baúlhe, distrito de Braga, vem a pé nas peregrinações de maio e de outubro e de carro, sempre que o 12 ou 13 calha em fim de semana. Já levou o andor em duas dessas peregrinações, mas “o momento é sempre especial”.

“A primeira vez que peguei foi uma surpresa, mas depois, quando regressei, ofereci-me logo como voluntário”, diz, apontando para o lugar onde o grupo estava reunido, na saída da Colunata do lado Norte, onde acontece a reunião entre os que se voluntariam e os que são convidados. “É uma sensação única. O trajeto é pequeno e o andor pesado, mas a emoção é grande e parece que vamos nas nuvens”, descreve, encarando cada peregrinação a Fátima como uma ida “ao colo da Mãe”.

“Sabe bem levar Nossa Senhora aos ombros, para o banquete da Eucaristia, em ação de graças pelas vezes que Ela me carrega, ao longo do ano”, confidencia, sem esconder o sorriso rasgado. 

Entre os muitos homens que vão carregar o andor há um ombro feminino. Maria de Jesus veio de Sevilha em peregrinação ao Santuário de Fátima, com a possibilidade de assumir pela primeira vez esta função. “Foi o instinto. Eu e uns familiares disponibilizámo-nos e aqui estamos todos, prontos para esta grande graça. Já me disseram que pesa muito, mas com fé tudo se consegue”, afirma, num misto de convicção e nervosismo, vincando: “Espero conseguir carregá-La ao ombro, porque foi isso que também vim pedir: que Ela me ajude a suportar a cruz que carrego. Vim para não perder a fé. Este é, sem dúvida, um momento especial para agradecer a Nossa Senhora.”

No topo do Recinto de Oração, já perto do Altar, aguarda o grupo fardado dos Bombeiros de Viatodos, do concelho de Barcelos, que peregrinou à Cova da Iria, com a intenção de poder transportar o andor. “Lá já costumamos levar o andor, nas procissões, mas aqui é a primeira vez”, refere Lino Sampaio, que, nesta estreia, assumia um dos percursos mais exigentes: a subida da escadaria. “É um momento especial que ganha mais importância porque vimos como bombeiros”, diz, com o nervoso miudinho de quem sabe que o momento é seguido por muitos olhos. “Contamos uns com os outros para este caminho, mas, no final, a fé e Nossa Senhora vão-nos ajudar”, remata, confiante.

O sino marca as 10h00 do dia 13 e o primeiro grupo de peregrinos contorna a Capelinha das Aparições com o andor ainda vazio. A imagem de Maria está a ser retirada da redoma por dois Servitas, que a colocam no andor, para ser venerada de perto pelos peregrinos, mas sempre com a atenção e o cuidado que exige o momento, recorda Lourenço de Oliveira, enumerando algumas regras a considerar, para garantir a segurança de quem transporta o andor e para salvaguardar a escultura centenária da Virgem. “Os peregrinos nunca se devem aproximar do andor nem tentar tocar-lhe, sob o perigo dele se desequilibrar ou de alguém tropeçar”, alerta.

Paulatinamente, o andor, já com a Imagem, segue o percurso habitual, dando a volta pelo lado direito do Recinto de Oração, até ao topo do Santuário e, dali, pelo corredor central até ao Altar. Do lado de fora, há peregrinos que acompanham o ritmo da passada dos que transportam a Imagem. Ao ombro, são oito a carregá-La, mas, no coração, é a multidão que A sustenta.

Nesta peregrinação, o andor que transportou Nossa Senhora foi embelezado com quase mil pés de flores e verdura, dispostos em 36 esponjas florais, embebidas em água – ornamentação que aumenta o peso do andor, que, no final, poderá alcançar mais de 250 quilos. No arranjo floral foram usados: cravos, dálias de jardim, rosas de Santa Teresinha e de outras qualidades, jarros, orquídeas e antúrios. Como verdura, foram usados fetos e espargos.

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“Nesta noite, coloquemos diante de nós o exemplo de Nossa Senhora e dos Três Pastorinhos”, pediu D. Manuel Felício, na noite de 12 de julho, no Recinto de Oração, elegendo esta vigília, na Cova da Iria, como um tempo de pausa que permite cada um olhar para si, no silêncio da noite.

O Bispo da Guarda, sustentando que contemplar a figura de Maria “é olhar e ver nela Aquela que nos traz a paz”, solicitou aos peregrinos que fixassem a atenção na “atitude interior ao receber a Palavra do Senhor, que Lhe entrava no ouvido, baixava ao seu coração e A motivava para as melhores decisões”. E exortou cada um a conceber um caminho “para chegar à paz, uma paz verdadeira que Maria nos traz e aos Três Pastorinhos”, que viviam no tempo da Primeira Guerra Mundial. Efetivamente, na Celebração da Palavra, a liturgia referia que o caminho da paz é um caminho de “humildade e de serviço”.

Aproveitando o exemplo de Lúcia, Francisco e Jacinta, o prelado falou da “forte experiência de oração e incondicional entrega, que expressa um convite a cada um de nós hoje aqui”. E pediu orações pelo Jubileu de 2025, para cada um “viver e aprofundar o sentimento de entrega”.

A Procissão do Silêncio levou, novamente, a Imagem de Nossa Senhora de Fátima até à Capelinha das Aparições, seguindo-se a vigília de oração com momentos de adoração eucarística, veneração dos santos Francisco e Jacinta Marto e a oração da Via-Sacra.

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O 13 de julho começou com a recitação do Rosário, às 9h00, na Capelinha das Aparições, após o que a Imagem de Nossa Senhora do Rosário de Fátima seguiu em procissão até ao Altar do Recinto de Oração, onde o Bispo da Guarda presidiu à Missa internacional pelas 10h00. A celebração incluiu o momento de Bênção aos Doentes e terminou com a Procissão do Adeus.

À homilia, o prelado egitaniense lembrou o drama da guerra “em partes do Mundo menos noticiadas”, mas onde sofrem populações inteiras, e evocou as “recomendações tão preciosas” que Nossa Senhora deixou na Cova da Iria, convidando os peregrinos a “fazer memória da experiência feliz dos Três Pastorinhos”.

Na Cova da Iria, Nossa Senhora “fez um convite à oração e penitência [e] veio dizer ao Mundo o que é preciso fazer, para vencer as crises e a grande crise que, naquele momento, se vivia e fazia sofrer as pessoas, as famílias e as nações era a crise imposta pela Primeira Guerra Mundial”.

O prelado lembrou que as crises “não terminaram e, em particular, os dramas da guerra estão a pedir soluções que tragam, de novo, à vida das pessoas e dos povos a tranquilidade e a paz”.

Na terceira aparição de Nossa Senhora aos Três Pastorinhos já havia notícias sobre as aparições anteriores. Por isso, a 13 de julho de 1917, uma multidão compareceu na Cova da Iria. Nesta aparição, a Senhora pediu especial oração pelos pecadores e foi neste dia que Lúcia, Jacinta e Francisco tiveram a visão do inferno. A Virgem anunciou que a guerra iria acabar, mas que começaria novo conflito, ainda pior, no pontificado de Pio XI, se a Humanidade não deixasse de ofender a Deus. E Nossa Senhora revelou o Segredo de Fátima, dividido em três partes. O primeiro quadro compõe-se da visão do inferno; o segundo apresenta a devoção ao Imaculado Coração de Maria; e o terceiro refere-se à Igreja peregrina e mártir.

O presidente da Peregrinação falou desta aparição em particular, para referir as “recomendações tão preciosas que Nossa Senhora aqui deixou”. “Nós hoje, neste seu Santuário, queremos sentir, de novo, como Ela é nosso modelo e nossa Mãe, sempre atenta aos pedidos que Lhe fazemos, mas sobretudo atenta às necessidades do Mundo inteiro, hoje a braços com problemas novos, dos quais as guerras são a expressão mais visível e sentida pelas populações”, alertou o prelado.

O prelado considera que a maior urgência do Mundo atual é a paz, “e estamos a lembrar-nos da Ucrânia e da Palestina, mas também de outras partes do Mundo menos noticiadas, mas onde o drama da guerra está instalado e faz sofrer populações inteiras”. Referiu-se, em concreto, à situação vivida no Sudão, em Mianmar, no Líbano ou na Etiópia. Estes lugares “ocupam menos espaço nas notícias, talvez por serem considerados menos importantes para os interesses dos países ricos, mas vivem ali pessoas que sofrem os horrores da guerra e a morrer”. E, citou o Santo Padre, para referir que a guerra é sempre “um fracasso para todas as partes envolvidas e, particularmente hoje, não se podem esperar vencedores”.

Assim, o único caminho é “fazer a paz, esse bem sem o qual a vida é um tormento”. “Está na via do diálogo conseguir entendimentos entre pessoas, países, raças, religiões e culturas”, observou.

Numa saudação final, D. José Ornelas, bispo da Diocese de Leiria-Fátima, enalteceu a “mensagem de paz”, ao longo destes dois dias, e considera que a Humanidade “tem sede de paz”. “Somos peregrinos da esperança para o ano jubilar de 2025 que se aproxima, [importando], por isso, que levemos a toda a parte esta mensagem que aqui recebemos”, à semelhança do que aconteceu com os discípulos relativamente às palavras de Jesus. E o prelado do Lis desafiou as crianças presentes em Fátima, em tempo de férias, a largar os computadores e os telemóveis, e a “levar o dom da alegria”, experimentando outras atividades em família.

No final, a Procissão do Adeus levou Nossa Senhora de volta à Capelinha das Aparições.

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É Fátima no seu papel de acolhimento e de promoção do ser e da missão da Igreja!

2024.07.13 – Louro de Carvalho

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