sábado, 20 de julho de 2024

Encontrado altar dos cruzados no Santo Sepulcro em Jerusalém

 

Foi descoberto o altar-mor dos cruzados na igreja do Santo Sepulcro, em Jerusalém, que é considerado o maior altar medieval já descoberto e que evidencia profunda conexão entre Roma e Jerusalém. É provável que tenha sido erguido por ordem do Papa Eugénio III.

É uma descoberta inesperada que parece saída de uma trama dos filmes de Indiana Jones. A descoberta, anunciada pela Academia Austríaca de Ciências (ÖAW, na sigla em Alemão), oferece uma janela revestida de mármore para a arte cristã medieval e a projeção do poder papal.

A igreja do Santo Sepulcro tem primordial importância para os católicos como local da crucifixão, sepultamento e ressurreição de Cristo. A sua importância, como destino de peregrinação, perdura há quase dois mil anos, atraindo fiéis de todo o Mundo para os seus terrenos sagrados.

Os pesquisadores procederam à reconstrução digital preliminar do altar-mor dos cruzados, decorado com duas figuras e com o chamado quincunx. Com cinco círculos formados por uma única faixa entrelaçada, o quincunx é um dos aspetos favoritos dos mestres cosmatescos. Essa figura é cheia de significado espiritual, incluindo a infinidade da criação de Deus. Os círculos simbolizam as cinco chagas de Cristo e aludem à Cruz de Jerusalém, o emblema do Reino Cruzado de Jerusalém.

Os pesquisadores esperam que investigações mais aprofundadas nos arquivos papais possam revelar mais pormenores sobre a criação do altar e, talvez, mesmo identificar os artesãos qualificados que estão por trás dessa obra monumental.

Na verdade, em 15 de julho de 1149, Jerusalém celebrou um dia marcante: exatamente meio século antes, os cruzados europeus, sob o comando de Godofredo de Bulhão, haviam tomado a cidade santa, estabelecendo o Reino de Jerusalém, depois de séculos de domínio muçulmano. Para manifestar a alegria dos cristãos em posse daquele lugar santo, foi confecionado o novo altar-mor, que foi posicionado no meio da Igreja do Santo Sepulcro, um dos mais importantes santuários do Cristianismo.

O altar serviu, pois, de sentinela silenciosa para inúmeros peregrinos, durante séculos, antes de desaparecer da memória coletiva, em 1808, quando um incêndio devastou a parte românica da igreja, a qual desperta o interesse de pesquisadores e arqueólogos, há muito tempo. Porém, cerca de dois terços da laje de pedra original do frontal do altar foram preservados.

Serviu também de testemunho das oito cruzadas, expedições dos cristãos da Europa Ocidental, com apoio papal, entre os séculos XI e XIII, para retomarem a posse de Jerusalém e dos Lugares Santos, caídos, no século VII, em poder dos muçulmanos.

“Sabemos de relatos de peregrinação, dos séculos XVI, XVII e XVIII, sobre um magnífico altar de mármore em Jerusalém”, conta Ilya Berkovich, historiador do Instituto de Pesquisa sobre a Monarquia dos Habsburgo e os Balcãs da Academia de Ciências da Áustria (ÖAW) e coautor de um novo estudo sobre essa obra de arte histórica. Apesar da forte impressão que causou nas pessoas ao longo dos séculos, o altar desapareceu, repentinamente, da memória coletiva.

Ilya Berkovich, da ÖAW, e Amit Re’em, da Autoridade de Antiguidades de Israel, encontraram o altar durante uma reforma do local. O altar recém-descoberto estava escondido da vista de todos, atrás de uma laje de pedra coberta por grafitti que pesa várias toneladas.

Segundo a ÖAW, o altar, consagrado em 1149, tem 3,5 metros de largura, o que faz dele o maior altar medieval conhecido até hoje. “O Papa honrou a igreja mais sagrada da cristandade”, disse Berkovich, ao sugerir que o envio de um mestre cosmatesco para Jerusalém, pelo Papa, foi um movimento calculado, para fazer ressaltar as reivindicações cristãs à Cidade Santa.

Segundo pesquisadores, a instalação do altar, em 1149, coincidiu com um período de relativa estabilidade na Jerusalém controlada pelos cruzados. O Reino de Jerusalém procurou consolidar a sua presença através de grandes projetos de construção e cerimónias religiosas, 50 anos depois da primeira cruzada, e retomou a cidade. A rededicação da igreja do Santo Sepulcro, com esse altar recém-descoberto como sua peça central, marcou um ponto alto na posse dos cruzados na Terra Santa.

Essa redescoberta enriquece a compreensão da arte cristã medieval e ilumina a complexa trama de relações entre Roma e Jerusalém, durante a era das cruzadas. “Que algo tão significativo pudesse permanecer desconhecido por tanto tempo em tal lugar foi uma surpresa completa para todos os envolvidos!”, exclamou Berkovich.

As intrincadas decorações cosmatescas do altar – uma técnica dominada exclusivamente por artesãos na Roma papal – sugerem uma conexão, até então desconhecida, entre a Cidade Eterna e o Reino Cristão de Jerusalém fundado pelos cruzados.

Esses artesãos criaram padrões e ornamentos geométricos deslumbrantes ao usar fragmentos de mármore frequentemente recuperados de antigos edifícios romanos, disse Berkovich.

“Em 1808, um incêndio de grande proporção atingiu a parte românica da Igreja do Santo Sepulcro”, explica Berkovich. “Desde então, acreditava-se que o altar dos cruzados tinha desaparecido”, acrescentou o historiador.

Recentemente, Ilya Berkovich e Amit Re’em, da Autoridade de Antiguidades de Israel, fizeram uma descoberta extraordinária: no corredor traseiro da igreja encontraram uma pesada laje de pedra, recoberta de grafitti.

Contudo, ao virarem a laje, devido às obras, revelou-se um rico e antigo património artístico: a laje decorada daquele lado foi rapidamente identificada como a antiga e esplêndida fachada do altar medieval dos cruzados.

Este altar, de impressionante beleza, oferece a oportunidade de investigar a rara técnica cosmatesca, dificilmente encontrada fora de Roma. Esta técnica especial de decoração em mármore foi dominada exclusivamente por mestres de guilda, na Roma papal, que transmitiam essa habilidade de geração em geração. A técnica carateriza-se pelo uso de pequenas quantidades de mármore valioso, principalmente raspado de edifícios antigos da Roma medieval, para decorar superfícies extensas, colocando pequenos fragmentos com grande precisão, criando padrões geométricos e ornamentos deslumbrantes.

Da arte cosmatesca, apenas era conhecida uma obra de arte fora da Itália, na Abadia de Westminster, para a qual o Papa havia enviado um dos seus mestres. O altar cosmatesco redescoberto em Jerusalém também deve ter sido criado com a intervenção do Papa, possivelmente Eugénio III. Ao enviar um dos seus mestres cosmatescos ao Reino de Jerusalém para fazer o altar dos cruzados, o Pontífice, literalmente, sublinhou a reivindicação da cidade pela Cristandade. “O Papa honrou assim a igreja mais sagrada da cristandade”, observou Berkovich.

A descoberta do altar-mor revela uma conexão até então desconhecida entre Roma e Jerusalém, que também é importante para a história da arte europeia. “Com mais de 3,5 metros de largura original, este é o maior altar medieval atualmente conhecido”, destaca Berkovich, esperando que pesquisas futuras nos arquivos papais possam trazer à luz mais pormenores sobre a História da criação do altar, possivelmente até a identidade do mestre cosmatesco responsável pela obra.

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A descoberta motiva um excursus sobre o Santo Sepulcro. Localizado no coração de Jerusalém e um dos centros de peregrinação mais sagrados do cristianismo, é conhecido como o lugar onde Jesus Cristo foi crucificado, foi sepultado e ressuscitou. Visitar o Santo Sepulcro é experiência espiritual que permite aos visitantes caminhar literalmente nas pegadas de Jesus.

Crê-se que o local foi identificado, pela primeira vez, como o local da crucifixão de Jesus no século IV, no reinado do imperador Constantino, o qual, após a sua conversão ao cristianismo, enviou a sua mãe, Santa Helena, para identificar os locais sagrados da vida de Jesus, em Jerusalém. Segundo a tradição, Helena descobriu a cruz em que Jesus foi crucificado (pelo que se chama Helena da Cruz), e Constantino mandou construir ali uma igreja. Desde então, o local sofreu inúmeras destruições e reconstruções. Apesar disso, continua a ser um dos locais mais sagrados do cristianismo, atraindo milhões de peregrinos de todo o Mundo, em cada ano.

Tem um significado profundo para os cristãos de todo o Mundo. É considerado o local mais sagrado da cristandade, pois marca o lugar onde se acredita que Jesus foi crucificado, foi sepultado e ressuscitou dos mortos. Visitá-lo é uma oportunidade de se ligar profundamente à fé e reviver os eventos cruciais da vida de Jesus.

Além do significado religioso, o Santo Sepulcro tem um valor significativo arqueológico. A igreja, que abriga uma variedade de artefactos históricos e arqueológicos importantes, continua a ser um campo ativo de pesquisa e de descoberta.

Constantino desempenhou papel fulcral na formação do Santo Sepulcro. A construção da igreja original, um esforço monumental, assinalou o início do cristianismo como religião oficialmente reconhecida. O Imperador, que se converteu ao cristianismo, após uma visão miraculosa, queria que o local fosse um símbolo poderoso da fé. Não poupou despesas no projeto. Contratou os melhores arquitetos e artesãos do império para criar uma estrutura que combinasse beleza e simbolismo. Era para ser um local de peregrinação, onde os cristãos de todo o Mundo poderiam reunir-se, orar e adorar. E foi assim que se tornou um dos lugares mais sagrados do cristianismo, um testemunho da fé de Constantino e da sua determinação em estabelecer o cristianismo como força dominante no Mundo.

A cúpula do Santo Sepulcro é uma das caraterísticas mais impressionantes da igreja. Eleva-se, majestosamente, acima do resto da estrutura, como testemunho da habilidade e da visão dos arquitetos. É um marco notável em Jerusalém, visível de muitas partes da cidade. E, dentro da igreja, é impressionante. Abriga o Edículo, pequena capela que marca o local acreditado como túmulo de Jesus. Ornada a mármore e a ouro, em homenagem à importância do local, é a peça central da igreja, um lembrete da importância do local e testemunho da habilidade dos artesãos que a construíram e da fé que inspirou a sua criação.

Dentro do Santo Sepulcro, está a Capela de Santa Helena, um dos tesouros escondidos. Localizada num nível mais baixo da igreja, é local tranquilo de oração, longe do burburinho do resto da igreja. Dedicada a Santa Helena, mãe de Constantino, creditada com a descoberta da Verdadeira Cruz, é lugar de beleza tranquila. As paredes e o teto são ornados de mosaicos coloridos e de ícones religiosos, criando um ambiente de serenidade e de reverência.

O local específico da crucifixão, conhecido por Calvário, é dos pontos mais sagrados da igreja, aonde os peregrinos vêm para refletir sobre o sofrimento e o sacrifício de Jesus. É marcado pela Capela da Crucifixão, local de oração intensa, onde os peregrinos oram reverentemente. Explorar o Calvário é uma experiência poderosa, visto que é um lugar que convida à reflexão, à oração e à contemplação do significado da crucifixão e da mensagem de amor e de redenção que ela carrega.

A Basílica, estrutura complexa, composta de várias capelas e santuários, é uma colcha de retalhos de estilos arquitetónicos, cada um refletindo uma época diferente na História do local. É o coração do Santo Sepulcro. Aqui, os peregrinos oram e participam nos rituais sagrados.

O Santo Sepulcro continua como local de pesquisa, como se viu com o referido achado arqueológico. Arqueólogos e historiadores trabalham, constantemente, para desenterrarem os segredos do local e para entenderem melhor a sua História. Recentemente, os pesquisadores realizaram uma série de restaurações no Santo Sepulcro, incluindo uma renovação do Edículo.

É um local de grande importância histórica e religiosa. As pesquisas em curso no local prometem lançar nova luz sobre sua História, contribuindo para a compreensão do cristianismo e da sua génese e da sua evolução.

2024.07.20 – Louro de Carvalho

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