quarta-feira, 31 de julho de 2024

Resultados das eleições na Venezuela sob forte e ampla contestação

 
De acordo com o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), a autoridade eleitoral venezuelana, Nicolás Maduro venceu as eleições presidenciais de 28 de julho, com 51,2% dos votos, tendo ficado em segundo lugar Edmundo González Urrutia, da oposição, com 44,2% dos votos.
O CNE divulgou os primeiros resultados pela meia-noite, hora local, garantindo que tinham sido contabilizados 80% dos votos e que a vitória de Maduro era “irreversível”. Contudo, o atraso de seis horas na divulgação dos resultados criou preocupações nos governos sul-americanos e nos Estados Unidos da América (EUA). E a oposição veio a público alegar “irregularidades”.
O CNE ainda tinha de revelar a contagem de cerca de 30 mil mesas de voto. O presidente do CNE disse que não iria rever os resultados.
 “Os venezuelanos e o Mundo inteiro sabem o que aconteceu”, disse Edmundo González, em declaração pública, após serem conhecidos os resultados. A conservadora María Corina Machado – proibida de se candidatar – garantiu, ao lado do antigo diplomata (substituiu-a na corrida) que a margem de vitória de González era esmagadora, já que a oposição tinha resultados da votação de cerca de 40% das urnas em todo o país, o que mostra que González teve 70% dos votos. Por isso, apelou às Forças Armadas a que fizessem respeitar a vontade popular.
 “O regime de Maduro deve entender que os resultados que publicou são difíceis de acreditar”, disse Gabriel Boric, líder esquerdista do Chile. “Não reconheceremos nenhum resultado que não seja verificável”, vincou. E Antony Blinken, secretário de Estado norte-americano, disse, falando a partir de Tóquio, no Japão, que os EUA têm “sérias preocupações de que o resultado anunciado não reflita a vontade ou os votos do povo venezuelano”.
Maduro celebrou os resultados e acusou inimigos estrangeiros de terem tentado sabotar o sistema de votação. “Esta não é a primeira vez que tentam violar a paz da República”, declarou, perante centenas de apoiantes no palácio presidencial, sem fornecer provas para sustentar estas afirmações, mas prometendo justiça para os que tentarem incitar a violência no país. Assim, adiciona seis anos à presidência de uma década, marcada pela crise política, social e económica, com milhões de venezuelanos caídos na pobreza e mais de 7,4 milhões de migrados.
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O período pré-eleitoral foi palco de perturbações que minaram a esperança de eleições livres. O governo proibiu a entrada de visitantes que, em nome de organizações políticas internacionais, iam acompanhar, solidariamente, os partidos da oposição. E um grupo que integrava elementos do Partido Popular Europeu (PPE), incluindo o português Sebastião Bugalho, depois de ter entrado, viu-se na necessidade de abandonar o país. 
María Corina Machado – ex-advogada e líder da oposição venezuelana – no dia 18, denunciou uma tentativa de assassinato, em Barquisimeto, no estado de Lara, após descobrir que os travões do seu carro tinham sido cortados. O incidente ocorreu um dia depois de o chefe de segurança da campanha, Milciades Ávila, ter sido detido, em resultado de discussão, num restaurante, quando regressavam de um comício com o colega da oposição Edmundo González. Corina Machado afirmou-se perseguida pelo chavismo, que mobilizava o eleitorado para lhe boicotar a campanha, e denunciou o assédio e o bloqueio, por militantes chavistas, dos espaços onde pretendia realizar os seus comícios. E o partido de oposição, Vente Venezuela, alertou para mais ameaças recebidas por personalidades em Guanare, capital do estado de Portuguesa, onde a candidata realizou os últimos eventos de campanha.
Também, no dia 26, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a proibição da candidatura presidencial de María Corina Machado, que contava com o apoio dos EUA e que vencera as primárias presidenciais independentes da oposição, com 90% dos votos a favor.
As primárias ocorreram meses depois de o presidente e a oposição, apoiada pelos EUA, chegarem a acordo (Acordo dos Barbados) para nivelarem as opções políticas antes das eleições, o que levou Washington a aliviar as sanções económicas à Venezuela. Por outro lado, a vitória da ex-advogada nas primárias ocorreu no momento em que o governo decretou a interdição de ela se candidatar a cargos durante 15 anos. E a candidata insistiu, durante a campanha, que nunca recebeu notificação dessa “Lei Seca” e afirmou que cabiam aos eleitores as legítimas decisões sobre a sua candidatura.
Corina Machado apresentara uma ação no STJ, em dezembro, aduzindo que a proibição era nula e solicitando ordem judicial para proteger os seus direitos políticos. Porém, o tribunal confirmou a proibição, que alega fraude e violações fiscais, e atribiu à candidata a responsabilidade pelas sanções económicas que os EUA impuseram à Venezuela, na última década.
Nas últimas duas semanas, Maduro, Saab e Jorge Rodríguez, líder da Assembleia Nacional e principal negociador do governo, ligaram apoiantes da oposição e pessoas próximas de Corina Machado a conspirações concebidas para assassinar o presidente e os seus círculos internos. Em Paralelo, um painel apoiado pela Organização das Nações Unidas (ONU), que investiga abusos contra os direitos humanos, determinou, em setembro, que o governo de Nicolás Maduro intensificou os esforços para limitar as liberdades democráticas, antes das eleições. Isso inclui detenção, vigilância, ameaças, campanhas difamatórias e processos penais arbitrários de alguns políticos, defensores dos direitos humanos e outros opositores.
As campanhas eleitorais na Venezuela envolvem entrega de alimentos, de eletrodomésticos e outros bens, em nome dos candidatos do partido do governo, que obtêm cobertura favorável da imprensa estatal. Os candidatos da oposição e apoiantes tentam encontrar locais para se reunirem, sem assédio dos ativistas do governo, e obter combustível para viajarem pelo país.
É prática governamental comum, para marginalizar os adversários, proibi-los de ocuparem cargos públicos, não se limitando às disputas presidenciais. A proibição foi usada retroativamente, em 2021, para destituir o candidato a governador Freddy Superlano, que estava à frente de um irmão de Hugo Chávez, mas ainda não tinha sido declarado vencedor. O substituto também foi expulso das urnas por sanção. E, no dia 26, o tribunal confirmou a proibição imposta ao ex-governador e bicandidato à presidência, Henrique Capriles, que abandonou a corrida primária antes da votação. “O que nunca poderão proibir é o desejo de MUDANÇA dos venezuelanos”, tuitou Carpiles. “Hoje, mais do que nunca, nada nem ninguém, nos tira da rota eleitoral.” 
Entretanto, Maduro, que chegou dizer que, se os resultados não lhe fossem favoráveis, não os aceitaria e que o país mergulharia num banho de sangue, acabou por dizer que os aceitaria e pediu que todos acatassem as indicações do CNE.   
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A União Europeia (UE) juntou-se ao crescente coro de vozes que exigem transparência para determinar o vencedor legítimo das eleições, que Bruxelas considera “marcadas por numerosas falhas e irregularidades”. No entanto, os apelos a novas sanções são “prematuros” nesta fase, disse o porta-voz da Comissão Europeia para a política Externa, Peter Stano, que insistiu na necessidade de se encontrar uma saída para a crise política”. Porém, Edmundo González e a sua aliança política, a Plataforma Unitária Democrática, contestaram vigorosamente os resultados, aduzindo que os números do CNE não correspondem às sondagens de opinião e às estimativas estatísticas.
A oposição diz ter obtido 73% dos boletins de apuração (ultimamente, fala-se em 84%), mostrando que González obteve 3,5 milhões de votos a mais do que Maduro. “Temos nas nossas mãos as folhas de contagem que demonstram a nossa vitória categórica e matematicamente irreversível”, disse González aos apoiantes.
Embora o ato eleitoral tenha sido saudado como um dos mais pacíficos dos últimos tempos, o rescaldo torna-se cada vez mais intenso, com os manifestantes a saírem à rua, com bandeiras, e a entrarem em confronto com a polícia. Os apoiantes da oposição consideraram o escrutínio como a oportunidade mais credível para pôr fim a 25 anos de governo de partido único.
Maduro condenou a manifestação de descontentamento, apontando o dedo aos EUA. “Está a ser feita uma tentativa de impor um golpe de Estado na Venezuela, novamente de natureza fascista e contrarrevolucionária”, atirou o presidente. “Já conhecemos este filme.”
Um dos pomos da discórdia é a recusa de o CNE divulgar os resultados detalhados de cada circunscrição, que podem ser usados para cruzar os números a nível nacional. O Carter Center, fundado pelo ex-presidente norte-americano Jimmy Carter, diz não poder verificar os resultados e acusa a administração de Maduro de “total falta de transparência”.
Josep Borrell, chefe da política externa da UE, apelou ao CNE para “exercer a máxima transparência no processo de apuramento dos resultados, incluindo a concessão de acesso imediato aos registos de votação de cada assembleia de voto e a publicação dos resultados eleitorais desagregados”. “A UE apela à calma e insta as forças de segurança a garantirem o pleno respeito pelos direitos humanos, incluindo o direito de reunião pacífica”, refere Borrell.
A declaração da UE estava para ser assinada pelos 27 estados-membros, mas a Hungria bloqueou a iniciativa. Este facto levou Borrell a publicar a declaração por sua conta, falando em nome do bloco. O veto é má notícia para qualquer reforço das sanções contra o regime de Maduro. As atuais sanções da UE datam de 2017 e incluem a proibição de exportar armas e equipamentos utilizados para reprimir os protestos de rua e a lista de 54 indivíduos acusados de minar a democracia e o Estado de direito da Venezuela.
Milhares de pessoas manifestaram-se nas ruas de várias cidades venezuelanas, após Maduro ter sido declarado vencedor das eleições presidenciais, com a oposição a acusá-lo de fraude. Na capital, a polícia dispersou os manifestantes a gás lacrimogéneo. Houve quem descesse as ruas a cantar e a bater em tachos e panelas, a queimar pneus e automóveis; e, segundo a PROVEA, organização venezuelana de direitos humanos, grupos armados pró-Maduro dispararam contra manifestantes pacíficos que desciam a Avenida Urdaneta. E Maduro revelou que houve “dezenas de detenções” (mias de 700) por ações “criminosas e terroristas”, responsabilizando a oposição.
Pelo menos sete pessoas foram mortas desde o início dos protestos. Sete jovens foram mortos violentamente às mãos de forças revolucionárias e paramilitares chavistas. Estátuas de Hugo Chávez foram derrubadas durante as manifestações contra a reeleição de Maduro.
Os eleitores votam por máquinas eletrónicas, que registam os votos e fornecem ao eleitor recibo em papel com a indicação do candidato da sua escolha. O eleitor deposita o recibo na urna. Após o fecho das urnas, cada máquina imprime a folha de registo com os nomes dos candidatos e os votos que receberam. Porém, o partido no poder faz apertado controlo no sistema de votação, através de um conselho eleitoral de cinco membros leais e de uma rede de coordenadores locais, de longa data, do partido, com acesso quase ilimitado aos centros de votação. Os coordenadores, alguns dos quais são responsáveis pela distribuição de benefícios governamentais, têm impedido os representantes dos partidos da oposição da entrada nos centros de votação (permitida por lei), para testemunharem o processo de votação, a contagem dos votos e, o que é crucial, para obterem uma cópia da folha de contagem final das máquinas.
Vários governos da América do Sul e o norte-americano não reconheceram os resultados. E a UE, tal como Joe Biden (dos EUA) e Lula da Silva (do Brasil), instou as autoridades da Venezuela a divulgarem os registos oficiais da votação. O Ministério dos Negócios Estrangeiros de Maduro vai retirar o pessoal diplomático de sete países das Américas, incluindo o Panamá, a Argentina e o Chile, pedindo a tais governos que fizessem o mesmo com seu pessoal na Venezuela. O governo do Peru rejeitou os resultados, o que levou ao encerramento da embaixada venezuelana em Lima.
De uma varanda no palácio presidencial, o presidente dirigiu-se à multidão que exigia a prisão de Corina Machado: “Até agora, temos estado contidos: vamos descobri-los e capturá-los a todos e seremos vitoriosos, mais uma vez vitoriosos”, prometeu Maduro. Porém, a líder da oposição prefere continuar no país, apesar do asilo oferecido pela Costa Rica.
Assim, um ato eleitoral para ditar a normalidade, acirra os ânimos e protela a democracia.

2024.07.30 – Louro de Carvalho


terça-feira, 30 de julho de 2024

Capelães apoiam atletas e assistentes nos Jogos Olímpicos Paris 2024

 

Há, nos Jogos Olímpicos de Paris 2024, um conjunto de 120 capelães de cinco religiões, que atendem os atletas na tenda do Centro Multirreligioso, na Cidade Olímpica. O centro, que ficará aberto até ao fim das Paraolimpíadas, a 8 de setembro, tem uma área de receção e uma sala para cada uma das religiões representadas: cristianismo, judaísmo, hinduísmo, budismo e islamismo.

Os atletas podem rezar, participar em cerimónias e falar com os respetivos capelães. Segundo a Associated Press (AP), agência de notícias americana, os organizadores descobriram que os pedidos por capelães olímpicos ultrapassaram oito mil, nos jogos realizados antes da pandemia de covid-19. O padre Jason Nioka, ex-campeão de judo, que se tornou capelão-coordenador dos 40 padres, freiras e leigos católicos que participam no grupo, disse à AP que os capelães “precisam de trazer [os atletas] de volta à Terra, porque pode parecer o fim do Mundo, depois de trabalhar nessa meta durante quatro ou cinco anos”. E, em eco desse sentimento, o padre Xavier Ernst, pároco da igreja de São João Bosco, em Paris, em artigo publicado na Agência Salesiana de Informação (ANS), escreveu que o “serviço dos capelães é estarem presentes”.

“Os atletas sabem que, na Cidade Olímpica, há esse espaço, um lugar de escuta, compartilhamento e relacionamento. O nosso ambiente é decorado com ícones, com móveis simbólicos e com a Bíblia. […] Todas as manhãs, haverá um momento de lectio divina, de leitura e de partilha do Evangelho, um momento que será ecuménico, afirmou. “E, todos os dias, celebraremos a Eucaristia, não no centro multirreligioso, mas na igreja ao lado da Cidade [Olímpica]”, esclareceu.

Na vizinha catedral de Saint-Denis, celebrou-se missa de vigília, em que se fizeram orações pela bênção dos atletas e se procedeu à distribuição de medalhas milagrosas, a 25 de julho, na noite anterior à cerimónia de abertura.

A igreja de La Madeleine, dedicada a Santa Maria Madalena, no centro de Paris, oferece aos participantes e atletas um local de oração e de contemplação, durante os Jogos Olímpicos, com a capela especial dedicada a “Nossa Senhora dos Atletas”. Inaugurado em setembro de 2023, o espaço permite que os visitantes rezem, acendam velas, enviem intenções de oração e busquem apoio espiritual. E La Madeleine foi o local da missa solene de 19 de julho, para iniciar a trégua olímpica, período de paz que pede a suspensão dos conflitos entre os países do Mundo, durante os Jogos Olímpicos – celebrada pelo arcebispo de Paris, D. Laurent Ulrich, e pelo Bispo de Digne, Emmanuel Gobilliard, representante especial da Santa Sé para os Jogos Olímpicos de Paris 2024.

O arcebispo enfatizou, na homilia, que “as guerras em curso não cessam durante os jogos, mas o desejo de paz se espalha através dos encontros que elas possibilitam nesses eventos desportivos”.

Entretanto, o já referido padre francês, Jason Nioka, ordenado há um mês, tem como primeira missão passar o verão em Paris, como encarregado da delegação de capelães católicos dos Jogos Olímpicos composto por 40 padres, auxiliados por religiosos e leigos. Em entrevista a Catherine Hadro, no EWTN News in Depth, disse que é “um presente muito maravilhoso de Deus fazer parte desta aventura”. Os atletas olímpicos são convidados a reunir-se no Centro Multirreligioso, na Cidade Olímpica, numa área para atletas cristãos – católicos, ortodoxos e protestantes – onde podem ler a Bíblia juntos, participar na lectio divina e prestar culto. Também se celebra missa diária numa igreja católica próxima, em diferentes idiomas, como francês, espanhol, italiano e português. E o ex-campeão de judo, tornado padre, sente-se especialmente qualificado para a tarefa, graças à sua experiência como atleta. “Acho que, para mim, é um grande desafio, porque conheço o desporto. […] Os atletas não precisam ouvir algo especial. A primeira missão do capelão é apenas ouvir.”

“Primeiro, convidamos o Espírito Santo a estar no comando”, disse o sacerdote. “Alguns terão sucesso. Sabemos que alguns também terão alguma dificuldade, mas, se lhes dermos a palavra de esperança e de força, talvez isso os ajude a dar o melhor de si e a serem os melhores atletas durante as Olimpíadas.” E Nioka assentou em que, antes de mais, o seu trabalho “é rezar por eles e cuidar deles também”. E considera o seu papel “uma graça”.

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Enquanto Paris estava na fase de partida para os Jogos Olímpicos de 2024, que se iniciaram a 26 de julho, foi lançada a trégua olímpica na icónica igreja La Madeleine, no coração da capital francesa, a 19 de julho. O arcebispo de Paris e o Bispo de Digne, representante especial da Santa Sé para os Jogos Olímpicos de Paris 2024, celebraram uma missa solene na presença de mais de uma centena de delegações diplomáticas. “Bem-aventurada a sabedoria que também preside ao espírito olímpico e habita em nossos corações, quando nos voltamos para o Senhor para dar graças e para Lhe implorar em nome do nosso Mundo”, disse o arcebispo Ulrich, na homilia.

O Papa considerou, a 21 de julho, durante a oração do Angelus, que o desporto “tem grande poder social e pode unir, pacificamente, pessoas de diferentes culturas”, disse esperar que os atletas “possam ser mensageiros de paz e modelos autênticos para os jovens” e, em particular, desejou que os “Jogos Olímpicos sejam uma ocasião para pedir o cessar-fogo nas guerras, demonstrando um desejo sincero de paz”.

Segundo o Comité Olímpico Internacional (COI), a tradição da trégua olímpica, ou Ekehheiría, em Grego, foi estabelecida na Grécia antiga, no século IX a.C., por assinatura de tratado entre três reis – Íphitos de Elis, Cleóstenes de Pisa e Licurgo de Esparta – para permitir a participação segura nos Jogos Olímpicos a todos os atletas e espectadores destas cidades-estado gregas, que eram, de outra forma, quase constantemente envolvidos em conflitos entre si.

Foram o francês Pierre de Coubertin, pai dos Jogos Olímpicos modernos, e o seu amigo, o padre dominicano Henri Martin Didon, que reiniciaram a ideia, nos tempos modernos, em 1896. E, na década de 1990, o conceito foi revivido, “para aproveitar o poder do desporto para promover a paz, o diálogo e a reconciliação de forma mais ampla”, segundo o COI. E, desde então, é apoiado pelas Nações Unidas.

Em Paris, a trégua olímpica de 2024 foi, oficialmente, lançada na igreja La Madeleine, com 700 pessoas presentes – entre elas Thomas Bach, presidente do COI, e Anne Hidalgo, prefeita de Paris.

O arcebispo vincou, na homilia, que “as guerras em curso não cessam durante os Jogos, mas o desejo de paz se espalha através dos encontros que tornam possíveis nestes eventos desportivos”.

Isabelle Boüan desenhou e produziu as casulas para os celebrantes da missa de 19 de julho e das missas celebradas durante os Jogos Olímpicos, criando um logótipo de casula especial. Mostra um círculo com cinco pombas nas cores dos anéis olímpicos, voltadas para fora, cada uma a carregar um ramo de oliveira no bico, como se partisse para o levar para longe, em sinal de paz. “Foi, realmente, a paz que esteve no centro da oração, nesta missa”, explicou Boüan ao OSV News (agência de notícias nacional e internacional que informa sobre questões católicas e ou que afetam os católicos). “Então pensei que as pombas eram o motivo perfeito para essas casulas. Evocam a paz de uma forma clara para todos, crentes e não crentes.”

“Mas este círculo de pombas está bordado numa faixa de cruzes douradas”, acrescentou Boüan.

“Para nós, cristãos, a fonte da paz é Cristo, que morreu na cruz e ressuscitou. É dele que pode vir a paz que tentamos transmitir”. “Este espírito, que vem do alto, orienta as nossas ações nestes dias que estamos prestes a viver, e rezamos para que inspire tantas pessoas que assistirão a estes Jogos, sejam organizadores, competidores ou espectadores”, preconizou o arcebispo Laurent Ulrich.

No final da missa, após a execução do hino olímpico nos órgãos históricos, os celebrantes dirigiram-se ao pátio onde o arcebispo de Paris, o prefeito da cidade e o presidente do COI soltaram cinco pombas sob aplausos.

A igreja de Santa Maria Madalena, cuja festa se celebra a 22 de julho, é conhecida mundialmente como La Madeleine e é um dos principais clássicos dos roteiros espirituais e turísticos da capital francesa, reconhecida pelo seu estilo neoclássico, que lembra a antiguidade grega e romana. Para os Jogos Olímpicos, tornou-se sede do projeto Jogos Santos, lançado pela Igreja Católica. Uma das capelas da igreja foi dedicada aos atletas como centro espiritual dos Jogos.

Os Jogos Santos responderam a um pedido do COI para uma capelania na Cidade Olímpica, que recebe mais de 10 mil atletas, de 26 de julho a agosto. Foi projetada, ao Norte de Paris, uma vasta estrutura de 4300 pés quadrados, para acomodar os representantes das religiões cristã, judaica, muçulmana, hindu e budista. Cerca de 40 capelães católicos especialmente treinados, que amam o desporto, revezar-se-ão no serviço, durante os Jogos Olímpicos.

Os Jogos serão movimentados, para D. Gobilliard, que é o representante do Vaticano para as Olimpíadas de Paris 2024. Vindo da Diocese de Digne, no Sul da França, não longe da fronteira italiana, é um fã de desportos e grande esportista. “Acho que a ideia de me nomear para as Olimpíadas remonta a outubro de 2018, quando participei no Sínodo para a Juventude em Roma”, disse ao OSV News, referindo-se ao Sínodo sobre os Jovens, a Fé e o Discernimento Vocacional.

“Eu organizei um torneio de futebol entre jovens e bispos. Certamente entenderam, no Vaticano, que eu amava o desporto”, apontou, para vincar, a seguir, que o desporto é a sua paixão, uma fonte de equilíbrio pessoal e uma oportunidade de conhecer pessoas, inclusive as que estão distantes da Igreja. “Quase todo a gente está interessada em desporto. É uma ótima maneira de alcançar as pessoas”, justificou.

Desde criança joga futebol, ténis e rúgbi, esquia e pratica caraté, judo e paraquedismo. É membro do Variétés Club de France, clube de futebol de ex-jogadores famosos e personalidades dos media. Neste verão, residirá na Cidade Olímpica de Saint-Denis.

“O coração da minha missão estará no centro multiconfessional da Cidade Olímpica”, disse D. Gobilliard ao OSV News. “Há sempre uma capelania entre as instalações oficiais durante os Jogos. É uma oportunidade maravilhosa para receber atletas e sua equipa e ajudá-los a encontrar Cristo.”

Além da Cidade Olímpica, várias paróquias de Paris receberão visitantes como parte do projeto Jogos Santos, lançado pela arquidiocese de Paris. “A atenção aos pobres andará de mãos dadas com a atenção aos atletas”, explicou D. Gobilliard. “As paróquias de Paris estarão abertas à visita e, especialmente, ao acolhimento dos pobres e dos sem-abrigo, graças à ajuda dos patrocinadores que se mobilizaram para a ocasião. Os salões paroquiais serão disponibilizados às pessoas que vivem nas ruas, para que possam assistir aos jogos numa atmosfera calorosa.”

Foi instalado na cripta da igreja de La Madeleine um “restaurante solidário”, que “vai receber pessoas de todas as classes sociais”. “Estão envolvidos chefs de alto nível e a comida é muito boa. Durante os Jogos, os atletas serão convidados especialmente para uma visita, e as pessoas que moram na rua poderão vê-los perto”, disse D. Gobilliard ao OSV News.

Os Jogos Paraolímpicos, marcados para 28 de agosto a setembro, seguir-se-ão os Jogos Olímpicos. Para D. Gobilliard, os atletas paralímpicos estão no seu coração, pois, em 2018, passou meses no hospital após um acidente de moto, ameaçado de amputação de uma perna, o que acabou por não acontecer. Para ele, os Jogos de Paris são “uma oportunidade para relembrar a estreita ligação entre o dominicano francês (pai) Henri Didon e os Jogos Olímpicos”.

É ao padre Didon que se atribui o estabelecimento do lema olímpico moderno em Latim – citius, altius, fortius (mais rápido, mais alto, mais forte) –, que promoveu, primeiro, entre os alunos da escola católica que dirigia. Para o Padre Didon, “mais alto” era o convite para elevarem a alma a Deus, frisou D. Gobilliard. “Da minha parte, estarei ocupado, neste verão, a estender a mão aos que amam o desporto, para lhes proclamar Cristo”, disse o bispo. “Essa será a minha missão!”

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Sob a bandeira olímpica alçada num estádio perto da Tour Eiffel e com o fulgor da chama olímpica e o calor da pira, é possível fazerem-se tantas coisas boas pelas pessoas, pela religião, pela cultura, pelo desporto e pela paz, em vez de se insistir no amuo por causa de um episódio antirreligioso, ainda que lamentável. O Mundo precisa de mais e de melhor!   

2024.07.30 – Louro de Carvalho

O relevante e diversificado papel das Forças Armadas Portuguesas

 

Nos últimos tempos, as Forças Armadas (FA) estiveram, pela mão do governo, no centro das atenções da opinião pública. Com efeito, de uma penada, o Conselho de Ministros adotou, a 26 de julho, um pacote de nove medidas com peso na remuneração dos militares das FA e no benefício dos Antigos Combatentes.

Ainda que telegraficamente, vale a pena recordá-las: aumento do suplemento da condição militar; equiparação salarial entre FA e Guarda Nacional Republicana (GNR); ajuste no suplemento de residência; aumento do suplemento de serviço aéreo; aumento do suplemento de embarque; criação do suplemento de deteção e inativação de engenhos explosivos; criação do suplemento de operador de câmara hiperbárica; nova compensação especial por invalidez permanente ou morte; e comparticipação em medicamentos para antigos combatentes.

Entretanto, a 30 de julho, foi notícia que o ministro da Defesa Nacional, Nuno Melo, após o acompanhamento de uma patrulha na mata nacional, na Marinha Grande, relevou o papel das FA na prevenção e deteção dos incêndios rurais. “Os militares não estão nos quartéis, estão, todos os dias, a trabalhar para o benefício das populações. Isso vale para a prevenção dos fogos, como vale para as ações de busca e de salvamento, para a emergência médica, para o transporte de órgãos, para o combate ao tráfico de pessoas ou combate ao tráfico de drogas”, frisou Nuno Melo.

O governante, para quem as FA “estão sempre lá”, o que “é muito relevante”, considerou que o papel delas é o de “deteção de incêndios, em colaboração com o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas [ICNF], juntamente com outras entidades, para que, de forma articulada, seja mais eficaz essa missão”, de modo a que, no final da época de incêndios, “eles não tenham acontecido”. E, se não aconteceram, é porque “houve prevenção e essa prevenção dá muito trabalho e implica muito investimento e muito esforço coordenado”.

Há 32 patrulhas na vigilância do território florestal, no apoio ao ICNF. “Temos também os destacamentos de engenharia, que são essenciais para moldar o terreno, para que os bombeiros consigam fazer o ataque ao próprio incêndio. Depois temos os nossos pelotões, que fazem o rescaldo, a vigilância e mitigam possíveis reacendimentos”, explicou o coronel Tiago Lopes, comandante da Unidade de Apoio Militar de Emergência.

Nuno Melo salientou que a sua presença numa das patrulhas mostra aos Portugueses que “os militares, em tempo de paz, desempenham múltiplas tarefas em benefício diário das populações e entre essas tarefas, ações de prevenção de incêndio”. “E, quando os incêndios não acontecem em Portugal, muitas vezes, é precisamente porque as forças armadas, a par de outras entidades, estão empenhadas nestas ações, que são fundamentais”, vincou o governante, que desvaloriza o número baixo de municípios que tem protocolo com o exército (nove municípios: Braga, Boticas, Loulé, Mafra, Monchique, São Brás de Alportel, Sintra, Tavira e Viana do Castelo). “Não diria que é exatamente curto, se tivermos em conta que os militares estão nas zonas mais críticas. O risco de incêndio acontece no plano nacional, mas há locais de maior risco do que outros e os militares estão certamente nos pontos de maior risco dando o seu contributo”, adiantou, ao garantir que as FA, “por vocação e natureza”, estão “disponíveis para aquilo a que possam ser úteis, quando chamadas”.

Desde 15 de maio, momento em que as FA passaram a integrar o Plano de apoio ao Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais (DECIR), foram empenhadas na vigilância do território nacional 659 patrulhas, que percorreram 86 mil quilómetros, num total de 1500 militares envolvidos.

Na verdade, os elementos do DECIR e os seus recursos são provenientes dos Bombeiros, da Força Especial de Proteção Civil, da GNR, da Polícia de Segurança Pública (PSP), do ICNF e da AFOCELCA. E existe o contributo das FA, nomeadamente por parte da Força Aérea Portuguesa (FAP) no atinente aos concursos para contratação dos meios aéreos de combate a incêndios e na dimensão de vigilância aérea, que é articulada com a GNR. O Exército e a Marinha desenvolvem ações de vigilância ativa, no pós-rescaldo dos incêndios de maiores dimensões.

Por fim, confrontado com as queixas das associações profissionais militares, Nuno Melo relevou que o secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional, Álvaro Castelo Branco as recebeu e ouviu, “entregaram um caderno de encargos”, sendo que “vários dessas propostas foram tidas em conta e muitas melhorias acabaram por acontecer”. “Portanto, foram ouvidas. Foram até mais do que isso, foram escutadas. É importante que todos sejam considerados, porque todos são absolutamente essenciais. E fico muito satisfeito por aquilo que foram vitórias muito justas também das forças de segurança”, rematou.

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As FA  constituem o conjunto das organizações e forças de combate e de defesa. Dependendo do país, podem adotar designações alternativas como “forças de autodefesa”, “forças militares” ou “exércitos”. Na maioria dos casos, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade direta do ministro da Defesa ou equivalente e sob autoridade suprema do  chefe de Estado ou de governo, conforme o regime político. Destinam-se, essencialmente, à defesa militar do país, podendo, se a lei o determinar ou permitir, cooperar na garantia dos poderes constitucionais e na defesa da lei e da ordem interna.

São instituições nacionais autorizadas pela nação a usar a força, pelo emprego de armas, em defesa do país (incluindo atacar outros países, em defesa dos interesses nacionais), fazendo-o pelo combate real ou pela ameaça do uso da força. Muitas vezes, funcionam como sociedade dentro da sociedade, com as suas próprias comunidades, servidas de leis (Código de Justiça Militar, Regulamento de Disciplina Militar, Estatuto dos Militares da Forças Armadas, Tribunais Militares, sobretudo em tempo de guerra), de economia, de educação, de saúde e de outras áreas.

Ao estudo das FA, do seu uso, da estratégia e da tática, das metodologias e das técnicas, das ações, dos símbolos e das solenidades, chama-se “ciências militares”, as quais enquadram três níveis de atuação ofensiva e defensiva – o estratégico, o tático e o operacional – para atingir os objetivos.

Normalmente, as FA dividem-se em três grandes organizações (forças, componentes, exércitos ou ramos) a cada uma das quais corresponde um ambiente específico de atuação: o mar, a terra e o ar. Assim, temos: a força naval, marinha ou armada; a força terrestre, exército ou exército de terra; e a força aérea, aeronáutica ou exército do ar. Porém, há países com quatro e cinco ramos; outros não têm marinha, por falta de ação com o mar; outros constituem uma única organização; e outros não dispõem de FA, confiando a sua defesa militar a outro país (um vizinho poderoso).

Nas FA de maior dimensão, a diferença de doutrina e de cultura entre ramos pode ser acentuada, apesar da tendência de integração que vem ocorrendo desde a II Guerra Mundial. No passado, os ramos eram quase autónomos, havendo poucos ou nenhuns órgãos de coordenação central. Até era comum os ramos serem tutelados por diferentes ministros  (por exemplo, Portugal no Estado Novo). Porém, desde a II Guerra Mundial, os países concentraram a tutela das FA num só ministro e criaram órgãos de comando conjunto. Assim, na maioria dos países, o conjunto das FA encontra-se sob a tutela de um membro do governo, o ministro da Defesa, sob a direção política do governo; e existe um órgão militar central (em Portugal, o EMGFA – Estado-Maior Geral das Forças Armadas, dirigido pelo CEMGFA) que comanda ou coordena a ação dos ramos. Em Portugal, após as últimas alterações legislativas nas FA, o EMGFA passou a deter superior poder de comando e direção, ficando reduzida a autonomia dos estados-maiores dos ramos.  

Conforme o nível de profissionalização do pessoal, as FA podem ser permanentes, milicianas ou semipermanentes. As permanentes são constituídas por militares profissionais que não dispõem de outra profissão a não ser a de se prepararem e de se empenharem em operações de guerra. Em eficiência, é o melhor modelo, pois os especialistas dedicam-se, por inteiro, à atividade militar.

As milicianas são compostas por cidadãos que exercem as mais diversas profissões e que só servem as FA em períodos de instrução ou por mobilização, em caso de necessidade. É o modelo mais económico e envolve a maioria dos cidadãos na defesa. Tem a desvantagem da falta de eficiência por não haver profissionais dedicados exclusivamente às FA. Outra desvantagem é a necessidade da conscrição, obrigando ao alistamento de muitos cidadãos contra a sua vontade, muitos com pouca ou nenhuma vocação militar.

Entre os dois anteriores, situa-se é o modelo de FA semipermanentes. Dispõem de um pequeno quadro de militares profissionais (normalmente, oficiais e sargentos) que servem de esqueleto para instruir, enquadrar e aprontar uma força maior. Em guerra ou em caso de exceção, o esqueleto é preenchido por conscritos ou por reservistas mobilizados. Neste modelo, existe o serviço militar obrigatório (SMO), em que os cidadãos recebem treino militar, de modo a estarem aptos para a mobilização. Este sistema permite eficiência elevada em algumas unidades constituídas apenas por profissionais e mantém a capacidade das FA aumentarem, rapidamente, de tamanho, em caso de necessidade. Era o modelo português até 2004, quando o SMO acabou.

O benefício óbvio é a proteção que as FA oferecem contra ameaça estrangeira. Mas há outros. Por exemplo, ultimamente, as FA têm sido empregues em operações de emergência civil em larga escala, como o socorro a grandes catástrofes. Por outro lado, a posse de FA eficientes dá à política diplomática e económica externa de um país mais prestígio e eficácia. Além disso, as FA, por lidarem com situações de vida ou de morte, onde não pode haver falhas, desenvolvem sistemas tecnológicos e procedimentos de vanguarda, que são aplicados no âmbito civil. De facto, através de empresas derivadas, muitas inovações tecnológicas, originalmente desenvolvidas para uso militar, foram transferidas para o uso civil, com as necessárias adaptações. Por fim, a capacidade de organização e de liderança revela-se em tempo de crise. Em Portugal, foram militares que geriram a distribuição e a aplicação de vacinas contra a covid-19.

Como não há bela sem senão, é óbvio que as FA implicam avultados custos em instalações, em equipamento, em tempos de missão e em remunerações, tal como absorvem recursos humanos especializados que seriam necessários noutras áreas.

Portugal escapa aos modelos indicados. Tem um escol de oficiais e de sargentos com formação académica e recruta um conjunto de voluntários a quem dá qualificação e contrata por limitado período de tempo, dificultando o ingresso no trabalho ao regressarem à vida civil. Tem muitos comandados e poucos comandados. E já pôs a GNR em ações de combate, em vez das FA.  

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Em suma, nos termos da Constituição da República Portuguesa (CRP), às FA (cuja organização “é única para todo o território”) “incumbe a defesa militar da República”, bem como satisfazer os compromissos militares internacionais do Estado e participar em missões humanitárias e de paz assumidas pelas organizações internacionais de que Portugal faça parte. Obedecem aos órgãos de soberania, estão ao serviço do povo, são apartidárias e os seus elementos não podem aproveitar-se da arma, do posto ou da função para intervenção política. E podem ser incumbidas de colaborar em missões de proteção civil, em tarefas conexas com a satisfação de necessidades básicas e com a melhoria da qualidade de vida das populações, e em ações de cooperação técnico-militar, no âmbito da política nacional de cooperação. E as leis dos estados de sítio e de emergência fixam as condições do emprego das FA nessas situações (cf CRP, artigo 275.º).

No estado de sítio, é estabelecida a subordinação das autoridades civis às autoridades militares ou a sua substituição por estas; e as forças de segurança ficarão colocadas, para efeitos operacionais, sob o comando do CEMGFA, por intermédio dos respetivos comandantes-gerais. No estado de emergência, reforça-se o poder das autoridades administrativas civis e o apoio às mesmas da parte das FA (cf Lei n.º 44/86, de 30 de setembro, artigo 8.º e 9.º).

Tudo isto é assumido como missão das FA no artigo 24.º da Lei de Defesa Nacional e no artigo 4.º da Lei Orgânica de Bases da Organização da Forças Armadas.

2024.07.30 – Louro de Carvalho

segunda-feira, 29 de julho de 2024

Foi lançada, oficialmente, na Catedral de Myeongdong, em Seul, a JMJ 2027

 

Na tarde do dia 28 de julho, na histórica Sé Catedral de Myeongdong, em Seul, capital da Coreia do Sul, sob o tema “Hope Ignites in Seoul. Success for WYD Seoul 2027” (“A esperança acende-se em Seul. Sucesso para a JMJ Seul 2027”), foi lançada, oficialmente a Jornada Mundial da Juventude de 2027 (JMJ 2027), em grande cerimónia de celebração da juventude, da cultura e da esperança, com a presença do núncio apostólico na Coreia, arcebispo Giovanni Gaspari, e do secretário do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, Dr. Gleison De Paula Souza.

O evento decorreu depois de o Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida se ter reunido com o Comité Organizador Local (COL) de Seul, nos dias 27 e 28 de maio, encontro para o qual foi convidado também o COL de Lisboa, aquando da realização do Congresso Internacional de Pastoral Juvenil, em Roma. E, no final do mês de janeiro, a Arquidiocese de Seul tinha realizado a primeira reunião da Equipa de Pesquisa Preliminar de preparação da JMJ 2027, constituída por 40 elementos.

A cerimónia de lançamento, que se iniciou às 14 horas, contou com a participação de mais de mil jovens e com a presença de vários convidados importantes: representantes diplomáticos de oito países; Yong Ho-sung, vice-ministro da Cultura, Desportos e Turismo; 19 membros da Assembleia Nacional; e 9 membros do Conselho Municipal de Seul.

O evento também contou com a presença de um grupo especial de jovens, formado por desertores norte-coreanos, jovens com deficiência e soldados do Exército, Marinha e Força Aérea, simbolizando unidade e inclusão.

A cerimónia de lançamento começou com um desfile de jovens coreanos, ao lado de jovens de vários países, carregando 193 bandeiras, enquanto entravam  na Catedral de Myeongdong. A presença de cada bandeira simbolizou a resposta positiva ao convite do Papa Francisco para que Seul sediasse a JMJ 2027.

Destaque significativo é devido à cerimónia foi a Declaração de Lançamento, momento crucial liderado pelo arcebispo Peter Soon-taick Chung, presidente do COL para a JMJ Seul 2027, ao lado de dois jovens delegados coreanos. A declaração marcou o início oficial dos preparativos para o evento de 2027 e simbolizou o compromisso coletivo da Igreja e dos jovens com esta jornada mundial.

Também foi destacada, durante a cerimónia, a importância económica da JMJ Seul 2027. A análise da KDI Escola de Políticas Públicas e Gestão revelou consideráveis efeitos económicos, prevendo um total de 11,3698 triliões de wons em impactos de produção, 1,5908 triliões de wons em efeitos de valor agregado e a criação de 24725 empregos. 

Após a cerimónia, foi celebrada a Missa presidida pelo arcebispo Peter Soon-taick Chung e concelebrada pelo cardeal Andrew Soo-jung Yeom, pelos bispos Job Yo-bi Koo, Paul Kyung-sang Lee (coordenador geral do Comité Organizador Local da JMJ Seul 2027) e Titus Sang-Bum Seo, bispo do Ordinariato Militar da Coreia. Na homilia, o arcebispo Chung afirmou ter “uma profunda aspiração de que a Igreja ofereça uma plataforma para os jovens do nosso tempo, um palco onde possam emergir como protagonistas de suas próprias narrativas. E afirmou: “Estou confiante de que este palco servirá como uma oportunidade e um espaço de esperança para todos vós. Desejo que, juntos, cultivemos esta esperança compartilhada por meio da JMJ. Acredito que a JMJ representa uma oportunidade inestimável para jovens de todo o Mundo, incluindo os nossos jovens coreanos, de refletirem e se envolverem nessas tarefas desafiadoras. É imperativo que unamos os nossos corações, que, rezemos juntos e que discirnamos a orientação do Espírito Santo enquanto nos preparamos sinceramente para esta jornada.”

A Oração Universal foi conduzida em vários idiomas por jovens de diferentes países, simbolizando a unidade global abraçada pela JMJ.

A Missa concluiu com agradecimentos do núncio apostólico na Coreia e do secretário do Dicastério para Leigos, Família e Vida.

O arcebispo Giovanni Gaspari destacou a profunda conexão entre o Papa e os jovens, sustentando: “Os jovens inspiram esperança e simpatia no coração do Papa. Isso atinge a grande simpatia e paixão com que ele fala sobre os jovens e para os jovens. O Papa olha para vós, os jovens da Coreia, com grande confiança e afeição. Ele reconhece a contribuição essencial que vós podeis dar à Jornada Mundial da Juventude Seul 2027 e acompanha-vos com as suas orações.”

Já o Dr. Gleison De Paula Souza expressou gratidão e otimismo, vincando que “o Papa Francisco escolheu Seul como a cidade-sede da próxima Jornada Mundial da Juventude, ciente das ricas História e Cultura da Coreia. É uma cidade que incorpora o espírito de inovação e esperança, valores que são intrínsecos à nossa missão. A todos os jovens presentes e àqueles que não puderam juntar-se a nós, desejo, fervorosamente, que esta jornada seja de descoberta, de crescimento e de alegria para vós. Que vós retorneis para vossas casas, inspirados e motivados para efetuardes mudanças nas vossas comunidades e no Mundo em geral. Como o tema de hoje proclama, ‘A esperança se acende em Seul!’ Que nossos corações também sejam acesos em antecipação a esta experiência maravilhosamente imaginada que nos levará a 2027.”

Em antecipação à JMJ Seul 2027, o lema do evento será revelado em setembro. E os dois símbolos da JMJ – a cruz peregrina e o ícone de Nossa Senhora, vão ser entregues, cerimonialmente, pelos jovens portugueses aos jovens sul-coreanos, a 24 de novembro, em Roma, constituindo outro marco significativo nesta jornada inspiradora.

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Logo no dia seguinte, a 29 de julho, a agência Ecclesia considerava que os Salesianos, os Focolares e o Corpo Nacional de Escutas (CNE) são três movimentos católicos que se envolveram na realização da edição internacional da Jornada Mundial da Juventude em Portugal e que partilham, neste primeiro aniversário, memórias e desafios da JMJ Lisboa 2023.

“Vivemos dias onde nos podemos alimentar, de facto, todo este ambiente que foi construído entre nós, entre vários movimentos, onde esteve mais de um milhão de pessoas. E, obviamente, que guardar isto em nós acaba por não concretizar absolutamente nada”, disse Bernardo Graça, dos jovens do Movimento dos Focolares, esta segunda-feira, em entrevista à agência Ecclesia.

A primeira edição internacional da Jornada Mundial da Juventude em Portugal, a JMJ Lisboa 2023, decorreu de 1 a 6 de agosto de 2023, na capital portuguesa, e na semana anterior, de 26 a 31 de julho, 17 dioceses católicas do território continental e ilhas receberam milhares de jovens na pré-jornada, os ‘Dias nas Dioceses’.

“Mesmo que nesses dias se tenha feito muita coisa, já foi feito, neste ano, um longo trabalho e acho que foi de tal maneira importante que nos vai alimentar a todos durante anos e anos sem fim. E vai-nos dar sempre confiança e motivação para continuar a fazer estes trabalhos no futuro, porque tudo o que eu gostaria na vida era de voltar a sentir este ambiente que senti naqueles dias aqui em Lisboa”, explicitou o jovem focolarino.

João Fialho, da Pastoral dos Salesianos de Lisboa, realçou a importância de “colher também estes frutos” que aprenderam com JMJ Lisboa 2023 e realçou que “interessa muito mais agora tudo o que é o processo”.

“O trabalhar em rede, todas estas competências transversais, viver em comunhão eclesial. Acho que isso é o que também nos fica enquanto membros destes grupos ou destes movimentos. Sabemos que podemos contar uns com os outros, que estamos a trabalhar em conjunto e que não vivemos só de eventos separados”, observou.

Por sua vez, Tomás Serra, escuteiro do CNE, há 11 anos, relevou que a JMJ Lisboa 2023 “foi algo extremamente valorativo” para a associação, pois, sendo “o maior movimento de educação não formal que existe, a nível mundial”, pôde “capacitar os jovens na envolvência, na comunidade e na preparação de uma atividade desta magnitude”, que dá “imensas ferramentas, desde liderança, coordenação, que são essenciais no dia-a-dia”.

“Depois, ajuda-nos muito no sentido de pertencer a uma comunidade. Apesar de termos algumas dinâmicas de promoção da paz, aquilo que foi pedido aos jovens foi que se pudessem envolver nas suas comunidades, dessem tudo aquilo que têm nos locais onde residem. Porque, no fundo, este é o grande momento de servir”, acrescentou.

O Movimento Juvenil Salesiano (MJS) levou “cerca de 8 mil jovens a Lisboa”, e João Fialho, da Pastoral dos Salesianos de Lisboa, destaca que “ficaram muitas coisas boas”, desta participação, onde os jovens portugueses estiveram mais na parte da organização, “em termos de liderança, de assumir o primeiro lugar em determinados processos, mesmo em coordenações de atividades”.

“Depois, [com] esta marca dos grandes encontros, ficámos todos com esta sede de ‘vamos continuar a estar juntos, vamos continuar a fazer festa, vamos continuar aqui a fazer uma grande fonte de alegria’. E isso é muito bom, é muito positivo, olhando para trás”, desenvolveu, realçando que nos ambientes Salesianos, neste pós-JMJ, durante este ano letivo e pastoral, “muitas escolas, realidades pastorais, realizaram missões de voluntariado”.

A Ecclesia enfatiza que Lisboa acolheu o maior encontro mundial de jovens com o Papa Francisco, mais de 1,5 milhões de pessoas participaram nas celebrações conclusivas, presididas pelo Santo Padre, no Parque Tejo.

A próxima edição internacional da JMJ realiza-se em Seul, na Coreia do Sul, em 2027, como anunciou o Papa, a 6 de agosto de 2025, esperando-se que as JMJ se tornem um mecanismo vivo de vivência e empenho eclesiais.

2024.07.29 – Louro de Carvalho

A revolucionária chama olímpica de Paris 2024 brilha para todo o Mundo

 

Os Jogos Olímpicos de Paris 2024 prometeram inovar e, depois da cerimónia de abertura, sobressai a chama olímpica como algo de inédito. O que parece ser fogo é, na verdade, uma mistura de luz e vapor, tudo gerado com eletricidade. É uma criação da empresa francesa de energia EDF (Électricité de France), com o objetivo de tornar os Jogos mais sustentáveis.

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A tocha com a chama olímpica remonta aos tempos da Grécia Antiga, onde o fogo era considerado divino pela mitologia grega, segundo a qual Zeus retirou o fogo aos homens. Porém, foi devolvido por Prometeu, que recuperou o elemento, aproximando uma tocha do Sol e acendendo-a.

Nos Jogos Olímpicos da Antiguidade, acendia-se, tradicionalmente, uma chama em homenagem à deusa Hera, esposa de Zeus, e mantinha-se durante toda a duração dos jogos.

A tradição da chama olímpica nos Jogos Olímpicos Modernos começou em Amsterdão, nos Países Baixos, em 1928. E, em 1936, nos Jogos Olímpicos de Berlim, na Alemanha, surgiu a prática do revezamento da tocha.

Nos Jogos Olímpicos da modernidade, reproduz-se a tradição de acender a tocha olímpica por meio dos raios solares, ato realizado por atrizes que envergam trajes típicos representar as sacerdotisas de Héstia, deusa grega do fogo.

A cerimónia para acender a tocha ocorre, em Olímpia, a aproximadamente 100 dias do início dos Jogos Olímpicos (a data exata varia consoante a duração do percurso até ao Estádio Olímpico). Após a cerimónia, começa um revezamento, sendo a tocha conduzida por atletas e convidados do Comité Olímpico Internacional (COI) num percurso que tem origem na Grécia. Em seguida, passa por várias cidades do país, incluindo Atenas, antes de seguir rumo ao local que sediará os Jogos Olímpicos. Porém, como prevenção, uns dias antes, acende-se uma chama, usando o mesmo método, que se mantém acesa para ser usada, caso o céu esteja nublado no dia da cerimónia. Para os Jogos Olímpicos de Inverno, o procedimento é semelhante, exceto a passagem da chama para o primeiro estafeta, que é feita em frente ao monumento que homenageia Pierre de Coubertin, impulsionador dos Jogos Olímpicos Modernos.

A chama Olímpica viajou de barco, pela primeira vez, para atravessar o Canal da Mancha, em 1948, e teve o primeiro voo rumo a Helsínquia, em 1952. Devido às restritivas leis de quarentena em vigor na Austrália, nos Jogos Olímpicos de Verão, em 1956, os eventos de hipismo foram transferidos para Estocolmo e o revezamento foi feito somente a cavalo até à cidade.

Em 1976, foram usados meios espetaculares para o transporte da chama. O fogo foi transformado num impulso elétrico, enviado de Atenas, via satélite, para o Canadá, onde foi reacendido por um feixe de laser. Em 2000, a tocha foi transportada debaixo de água por mergulhadores na Grande Barreira de Coral. Outros meios de transporte foram pirogas, camelos e o supersónico Concorde.

Quando chega ao destino, a tocha acende a pira olímpica, que permanece acesa durante todos os dias da competição. A primeira pira olímpica data de 1928, nas Olimpíadas de Amsterdão.

O ritual do acendimento da pira olímpica na cerimónia de abertura tornou-se original e espetacular a cada edição, chegando a ter significados específicos. E, nos Jogos Olímpicos do México 1968, Enriqueta Basilio entrou para a História como a primeira mulher a acender a pira olímpica.

Em Berlim 1936, estando a Península da Coreia sob o domínio do Japão, o coreano Sohn Kee-chung, foi obrigado a integrar a delegação japonesa, usando o nome de Kitei Son. Ganhou a medalha de ouro na maratona e, no pódio, baixou a cabeça enquanto era tocado o Kimi ga Yo. Depois, três jovens acenderam a pira, simbolizando o desporto, a música e as artes do país.

O corredor japonês Yoshinori Sakai, que nasceu em Hiroshima, a de 6 de agosto de 1945, às 8h16, hora em que explodiu a bomba nuclear que destruiu a cidade, simbolizou o renascimento do Japão após a II Guerra Mundial, o tema principal dos Jogos de Tóquio 1964.

Nos Jogos de Montreal 1976, dois adolescentes, um da parte francófona e outra da parte anglófona do Canadá, simbolizaram a união do país.

Em Moscovo 1980, Sergei Belov subiu à pira por um caminho formado por placas seguradas pelos jovens que formaram os painéis durante a cerimónia de abertura.

Em Seul 1988, quem adentrou pelo  Estádio Olímpico a carregar a tocha foi Sohn Kee-chung, considerado o maior herói olímpico da história da Coreia do Sul.

Em Barcelona 1992, o arqueiro paraolímpico Antonio Rebollo atirou uma flecha com fogo na Pira Olímpica. Em Lillehammer 1994, a tocha Olímpica entrou no estádio levada por um saltador de esqui, e o Príncipe Haakon da Noruega acendeu a Pira Olímpica.

Em Atenas 2004, a pira veio, pela primeira vez, receber o fogo, simbolizando o retorno das Olimpíadas à Grécia. E, enquanto Nikolaos Kaklamanakis cruzava o corredor no meio dos atletas, a pira curvava-se para receber o fogo.

Em Pequim 2008, a tocha foi levada por Li Ning, que, suspenso por cabos, deu uma volta sobre o teto do estádio.

Mas nem sempre tudo corre bem. Nos Jogos de Sydney 2000, o mecanismo que transportava a parte superior da pira travou, ficando suspenso durante cerca de três minutos, após o que a parte superior subiu e foi montada a pira. Nos Jogos de Vancouver 2010, no revezamento final dos atletas, enquanto a pira olímpica se levantava do chão da BC Place, ocorreu uma avaria no sistema hidráulico que sustentava três dos quatro braços que faziam a pira levantar-se. Não funcionou o braço destinado à patinadora de velocidade Catriona Le May Doan, a qual, por sua vez, agiu com naturalidade e posicionou-se de acordo com a forma combinada nos ensaios. Depois, a tocha foi levada para o lado de fora do estádio e Wane Gretzky acendeu a pira permanente ali localizada. O erro foi corrigido, 15 dias depois, quando Le May Doan acendeu a pira interna no encerramento.

Com o tempo tornou-se tradição que o último dos portadores fosse um atleta ou ex-atleta famoso. O primeiro foi o campeão Olímpico Paavo Nurmi, em 1952. E, entre esses últimos portadores da tocha, sobressaem Michel Platini, nos Jogos Olímpicos de Inverno, em 1992, e o campeão olímpico na categoria de pesos pesados de boxe, Muhammad Ali, em Atlanta 1996.

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A cada edição dos Jogos Olímpicos, a tocha ganha um novo design que faz, por vezes, alusão à cidade ou ao país sede do evento, mas mantendo o cunho originário de símbolo dos Jogos. Prometeu aproximou a tocha do sol, acendendo-a para devolver o fogo à Humanidade, o que ficou como ponto comum ao método atual de acender a chama da tocha: o Sol.

Para acender a chama olímpica, punha-se a tocha diante de um espelho côncavo chamado skaphia, que, concentrando e direcionando os raios solares, fazia com que o fogo se acendesse (o meu avô paterno acendia o cigarro por este processo, com uma lente dos óculos). O procedimento acontecia em cerimónia realizada por mulheres no santuário de Olímpia, na Grécia, em frente dos templos dos deuses Zeus e Hera. Essa chama era mantida acesa durante todo o tempo dos Jogos Olímpicos. Durante a cerimónia, os sacerdotes acendiam uma tocha que, posteriormente, seria passada para o vencedor de uma corrida, a quem era concedida a dádiva de usar a tocha para acender o altar onde seria feito e oferecido um sacrifício a Zeus (deus dos céus, dos raios e dos relâmpagos, que mantêm a ordem e a justiça), o pai dos deuses e dos homens.

O revezamento das tochas era tradição dos rituais gregos, mas, originalmente, não fazia parte dos Jogos Olímpicos. Aconteceu, pela primeira vez, em 1936, em Berlim, Alemanha. A abertura do evento foi realizada sob o comando do então Terceiro Reich, liderado por Adolf Hitler. Por isso, acredita-se que o revezamento da tocha olímpica tenha sido usado como estratégia nazista criada para promover a imagem do Terceiro Reich como um estado moderno, economicamente dinâmico e em crescente expansão internacional. O objetivo de Hitler era impressionar os estrangeiros que estivessem em visita na Alemanha. Assim, foram planeados, minuciosamente, todos os detalhes.

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Pela primeira vez, o evento de abertura dos Jogos Olímpicos foi realizado fora de um estádio, com o rio Sena como palco principal. No entanto, o que realmente captou a atenção do Mundo foi a inovadora chama olímpica, que prestou homenagem à História de França, ao mesmo tempo que olhava para o futuro.

Mathieu Lehanneur, o criador do caldeirão olímpico, inspirou-se nos irmãos Montgolfier, pioneiros franceses dos balões de ar quente. O resultado é uma criação única na História dos Jogos Olímpicos: uma chama que se eleva no ar.

O caldeirão, com uma altura total de 30 metros, sobe mais 30 metros, durante a noite, atingindo uns impressionantes 60 metros acima do solo. Na sua base, um anel de sete metros de diâmetro simboliza a fraternidade, um dos valores fundamentais da República Francesa.

Porém, o que torna esta chama olímpica verdadeiramente revolucionária é o seu funcionamento 100% elétrico. Em vez de combustíveis fósseis, a chama utiliza uma combinação de luz e de água para, criar um efeito deslumbrante e amigo do ambiente: 40 luzes LED (díodo emissor de luz) iluminam uma nuvem de vapor de água; 200 bicos de alta pressão produzem o efeito de fumo; e a eletricidade e a água são fornecidas do solo para a estrutura do balão.

Esta inovação, desenvolvida em colaboração com a EDF, representa um passo significativo em direção a uns Jogos Olímpicos mais sustentáveis.

Luc Rémont, presidente e diretor executivo da EDF, descreveu o feito como uma “revolução elétrica”. E Mathieu Lehanneur afirmou que o caldeirão representa “luz, magia e unidade”, atuando como “um farol à noite e um sol ao alcance da mão durante o dia”.

A chama olímpica de Paris 2024 não só ilumina os Jogos, como também aponta o caminho para um futuro mais sustentável e inovador para o movimento olímpico.

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Há, pois, nos Jardins Tuileries, uma grande estrutura que se assemelha a um balão de ar quente; e, por baixo, um anel mostra a chama olímpica que se tornou sustentável, com o evoluir dos tempos. Em vez de estar no Estádio Olímpico, a chama olímpica está num dos pontos mais centrais e turísticos da cidade, podendo ser visitada durante a competição. À noite, voa para os céus de Paris. E o que parece ser uma chama acaba por, na realidade, ser uma mistura de luz e vapor gerada através de eletricidade. Sem a utilização de combustíveis fósseis, são 40 as luzes LED que iluminam o vapor, com 200 bicos de alta pressão a formarem o efeito do fumo.

O que ainda impressiona mais é o facto de esta estrutura, a cada pôr do sol, subir para os céus de Paris, voltando a descer por volta das duas da manhã. Assim, para lá dos 30 metros de altura, a chama irá subir mais 30 metros e o anel de fogo na sua base estará visível a partir do ar para todos os Parisienses e para aqueles que visitam Paris, durante os jogos.

Uma outra curiosidade é a localização da chama. Colocada nos Jardins Tuileries, como se disse, a estrutura está alinhada com o célebre Museu do Louvre (considerado o maior museu de arte do mundo e um monumento histórico em Paris) e com o mais do que trimilenário obelisco da Concórdia e dos Campos Elísios (Champs-Élysées), dando um simbolismo especial aos Jogos Olímpicos organizados dentro da cidade de Paris.

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Paris, a Cidade da Luz, não podia deixar o seu crédito inovador (em luz e som) por mãos alheias. E a França, como protagonista do iluminismo que gerou, em termos modernos, a trilogia “liberdade, igualdade fraternidade” (agora, acompanhada da sororidade: amizade/amor entre irmãs), apesar de alguns boicotes (alta velocidade e telecomunicações) não podia deixar de oferecer ao Mundo um ambiente de cosmopolitismo, magia, de liberdade e de união.

2024.07.29 – Louro de Carvalho

Deus quer saciar a fome de todos os seus filhos, o que postula a partilha

 

Efetivamente, na primeira leitura (2Rs 4,42-44) do 17.º domingo do Tempo Comum no Ano B, Eliseu manda distribuir pelas pessoas que o rodeiam os pães que lhe foram oferecidos. O profeta, como sinal vivo de Deus para a Humanidade tem um gesto que é lição de Deus: “ensina a partilha, a generosidade, a solidariedade”.

Os “ciclos” proféticos de Elias e de Eliseu ocupam significativo espaço nos livros dos Reis (cf 1Rs 17,1-21,29; 2Rs 1,1-13,21), num período conturbado, política e religiosamente, do Reino do Norte (Israel). Elias exerce a missão profética nos reinados de Acab (874-853 a.C.) e de Acazias (853-852 a.C.); e Eliseu, nos reinados de Jorão (853-842 a.C.), de Jeú (842-813 a.C.) e de Joacaz (813-797 a.C.).

Os reis, com mira na viabilidade e no desenvolvimento do reino, estabelecem relações comerciais, económicas, políticas e militares com os povos circunvizinhos, o que teve custos no atinente à vivência religiosa, pois os cultos aos deuses estrangeiros, com entrada livre no país, começaram a ocupar lugar significativo na vida dos Israelitas. É uma época de instabilidade social e política, em que se multiplicam as injustiças contra os pobres e as arbitrariedades contra os fracos. Os Israelitas fiéis viam nisto um quadro de infidelidades contra Deus e contra a Aliança. É contra esta situação que se erguem as vozes de Elias e de Eliseu, em representação dos Israelitas fiéis aos valores tradicionais, incompatíveis com a coexistência de Javé e de Baal no horizonte da fé.

Eliseu, o ator principal da primeira leitura desta dominga, integrava a comunidade de “filhos de profetas” (“benê nebi’im” – 2Rs 2,3; 4,1), uma comunidade de homens que viviam pobremente e que seguiam incondicionalmente Javé. O Povo consultava-os e e buscava, neles, apoio, face aos abusos dos poderosos. Eliseu é apresentado, muitas vezes, como um profeta “dos milagres”, cujas ações poderosas mostram a presença da força e da vida de Deus no meio do seu Povo. Outras vezes, é o profeta da intervenção política; a sua ação ultrapassa as fronteiras físicas de Israel e chega a Damasco. O cenário do episódio da primeira leitura é, provavelmente, Guilgal, santuário do Leste de Jericó, onde tinha sido erguido um monumento de pedra para comemorar a passagem do Jordão pelos Israelitas à entrada na Terra Prometida. Havia ali uma comunidade de “filhos de profetas” que Eliseu visitava.

O trecho em apreço narra como um homem de Baal-Shalisha (perto de Guilgal) trouxe a Eliseu o “pão das primícias”: 20 pães de cevada e de trigo novo. Estes pães, feitos com a farinha dos primeiros frutos da colheita, deviam ser apresentados e consagrados a Deus. Depois, revertiam para os sacerdotes. Será este costume que está subjacente à entrega dos pães a Eliseu. No entanto, Eliseu mandou repartir estes dons pelos que o rodeavam. O servo do profeta não acreditava que os 20 pães oferecidos chegassem para saciar cem pessoas, mas chegaram e sobraram.

Sucedem-se gestos reveladores da generosidade e da vontade de partilhar: do homem que leva os dons ao profeta e do profeta que os manda partilhar com as pessoas que o rodeiam. A descrição desta miraculosa multiplicação de pães sugere que, se o homem é capaz de sair do egoísmo e está disponível para partilhar os dons que recebeu de Deus, esses dons chegam a todos e sobram. A generosidade, a partilha, a solidariedade, não empobrecem, antes geram Vida em abundância.

Este relato fornecerá aos autores neotestamentários o modelo literário para apresentarem os relatos evangélicos de multiplicação dos pães e dos peixes.

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No Evangelho (Jo 6,1-5), Jesus proporciona aos discípulos e à multidão o sinal da multiplicação dos pães e dos peixes, que se concretiza na partilha. O seu gesto “abre os olhos” dos discípulos e fá-los perceber que só a lógica da partilha, da gratuitidade, do dom, do serviço multiplicam o pão que sacia as fomes. É esta lógica que permite passar da escravidão dos bens à liberdade do amor e que fará nascer um Mundo mais humano, solidário, fraterno e sorereno.

O cenário situa-nos “na outra margem” do Lago de Tiberíades, no cimo de um monte não identificado. A tradição cristã considera que tal margem não seria o lado oriental do lago, mas a zona de Tabga, não longe de Cafarnaum. Em termos cronológicos, João nota que estava perto a Páscoa, a festa mais importante do calendário judaico, que celebrava a libertação do Povo de Deus da opressão do Egito. A referência à Páscoa funcionará, nesta catequese joânica, como convite ao leitor para entender a cena como figura da Páscoa e da instituição da eucaristia.

Há paralelos entre a cena da multiplicação dos pães e a libertação do Povo de Deus da escravidão do Egito, com Jesus no papel de Moisés, o libertador. Assim, o evangelista vê a ação de Jesus como libertação do novo Povo de Deus da escravidão para rumar à Vida nova.

A referência à “passagem do mar” até à “outra margem”, em alusão à passagem do Mar Vermelho por Moisés com o Povo libertado do Egipto, mostra que o objetivo de Jesus é levar o Povo que o acompanha a passar da terra da escravidão para a terra da liberdade (a “outra margem”).

Como aconteceu com Moisés, com Jesus vai grande multidão, que pretende “ver os milagres que Ele realizava nos doentes (“astheneîs”)”. O termo grego utilizado “asthenês” (“enfermo”) designa alguém em situação de grande debilidade. A multidão segue Jesus, pois quer ver os sinais (“sêmeîa”) que Ele faz e que representam a libertação do homem da sua debilidade. O povo que vai atrás de Jesus para a outra margem é marcado pela opressão e quer experimentar a libertação. Aquela gente percebeu que só Jesus a ajudará a superar a sua condição de miséria e de escravidão.

Chegados à outra margem, Jesus subiu a “um monte e sentou-se lá com os discípulos”. A referência ao monte evoca a Aliança do Sinai, onde Deus ofereceu ao Povo, por Moisés, os mandamentos. Isto quer dizer que Jesus realiza a nova Aliança entre Deus e o Povo de gente livre que “atravessou o mar”, com Jesus, rumo à terra da liberdade.

A referência à proximidade da Páscoa seria inútil fora do contexto da libertação do Povo da escravidão. Para os contemporâneos de Jesus, a Páscoa era a festa da libertação e da constituição do Povo de Deus, bem como do anúncio do tempo futuro em que o Messias ia libertar, em definitivo, o Povo de Deus. Pela Páscoa, o Povo devia subir a Jerusalém para celebrar, no monte do Templo, a libertação; mas João põe a multidão a ir atrás de Jesus para outro monte, do outro lado do mar. Este Povo começa, pela palavra e pela ação de Jesus, a libertar-se do jugo do judaísmo e a perceber que Jesus quem inaugurará os tempos novos da liberdade e da paz.

Aquela multidão tem fome e não tem que comer. Estamos, de novo, remetidos ao deserto do Êxodo, quando o Povo a caminhar para a terra da liberdade sentiu fome. Foi Deus quem respondeu a esta necessidade, dando comida em abundância; aqui, é Jesus que Se apercebe da fome da multidão e lhe dá resposta. Mostra, assim, o rosto do Deus do amor e da bondade, sempre atento às necessidades dos seus filhos.

Todavia, na resposta à fome daquela gente, Jesus envolve o grupo dos discípulos (“onde havemos de comprar pão para lhes dar de comer?”). Com efeito, os membros da comunidade de Jesus não podem passar ao lado das multidões esfomeadas, como se isso não lhes dissesse respeito; mas devem sentir-se responsáveis pela fome das pessoas e assumir a missão de lhes saciar a fome.

Ao implicar os discípulos no problema, Jesus convida-os a sugerirem soluções. João esclarece que Jesus queria “experimentá-los”, talvez para descobrir se tinham interiorizado os valores do Reino de Deus. O problema pode ser posto assim: “Como pretende a comunidade dos discípulos – formados na escola e nos valores de Jesus – responder à fome do Mundo? Recorrendo ao sistema económico vigente, baseado no egoísmo e no poder do dinheiro, pondo os bens nas mãos de poucos e gerando a lógica de opressão, de dependência e de necessidade? Será este o sistema desse Mundo novo e livre que Jesus deseja instituir? Os discípulos de Jesus alinham com o sistema opressor, baseado na compra e venda e no lucro, ou perceberam que Jesus tem proposta nova a fazer, geradora de libertação e de Vida em abundância para todos?”

Filipe, em nome dos discípulos, verifica a impossibilidade de resolver o problema no quadro económico vigente: “duzentos denários não bastariam para dar um pedaço a cada um”. Um denário equivalia ao salário base de um dia de trabalho; assim, nem o dinheiro de mais de meio ano de trabalho daria para resolver o problema. Ou seja, confiando no sistema instituído (o da compra e venda, que supõe o sistema económico regido pelo lucro egoísta), é impossível resolver o problema da necessidade dos esfomeados. Porém, André vislumbra uma solução diferente. Representa os discípulos que aderiram a Jesus de forma convicta, que têm grande intimidade com Ele e que estão mais cônscios da proposta de Jesus. Refere “um menino” que pode fornecer solução diferente, mas não está convicto do resultado (“o que é isso para tanta gente?”). E Jesus provará que é possível encontrar um sistema que reparta vida e que elimine a lógica da exploração.

A figura do “menino”, que só aparece na cena da multiplicação dos pães na versão joânica, não é necessária do ponto de vista da narração. Para o resultado, tanto dava que o possuidor dos pães e dos peixes fosse criança ou adulto. Contudo, a criança, pela idade e pela sua condição, é “débil”, física e socialmente. Representa a debilidade da comunidade de Jesus, face às enormes carências do Mundo. O termo grego utilizado por João para falar da criança (“paidárion”) significa, simultaneamente, “menino” e “servo”. Assim, a comunidade, representada no “menino”, é, para o Mundo, um grupo socialmente humilde, sem pretensão de poder e de domínio, dedicada ao serviço dos homens. É a comunidade simples e humilde, vocacionada para o serviço, que é chamada a resolver a questão da necessidade dos pobres e a instaurar um novo sistema libertador.

Os números “cinco” (“pães”) e “dois” (“peixes”) não aparecem por acaso: a soma dá “sete”, o número que significa totalidade. Ou seja: é na partilha da totalidade do que a comunidade possui que se responde à carência dos homens. É uma totalidade fracionada e diversificada, mas que, posta ao serviço dos irmãos, sacia a fome do Mundo.

Sobre os alimentos disponibilizados pela comunidade, Jesus pronuncia a “ação de graças”. “Dar graças” significa reconhecer que os bens são dons de Deus. Ora, reconhecer que os bens vêm de Deus significa desvinculá-los do possessor humano, para reconhecer que são dom gratuito de Deus aos homens; e Deus não os oferece a uns e não a outros. “Dar graças” é, pois, reconhecer que os bens recebidos pertencem a todos e que quem os possui é só administrador encarregado de os pôr à disposição de todos, com a gratuitidade com que os recebeu. Os bens são, assim, libertos da posse exclusiva de alguns, para serem dom de Deus para todos. É este o sistema que Deus quer instaurar no Mundo; e a comunidade cristã é chamada a praticar esta lógica.

Saciada a fome do Mundo, através dos bens que a comunidade recebe de Deus e que põe ao serviço de todos, os discípulos são chamados a outras tarefas. As sobras não se podem perder, mas devem ser o princípio de outras abundâncias. É preciso multiplicar incessantemente o amor e o pão. E a comunidade, percebido o projeto de Jesus, deve usar o que tem, para continuar a oferecer a Vida aos homens. A referência aos doze cestos recolhidos pelos discípulos pode ser uma alusão a Israel (as doze tribos): se a comunidade dos discípulos souber partilhar o que recebeu de Deus, pode satisfazer a fome de toda a gente.

Alguns dos que testemunharam a multiplicação dos pães e dos peixes têm consciência de que Jesus é o Messias que devia vir para dar ao Povo vida em abundância e querem fazê-lo rei. Jesus não aceita, porque não veio resolver os problemas do Mundo, instaurando um sistema de poder, mas veio convidar os homens a viverem a lógica de partilha e de solidariedade, que se faz dom e serviço humilde aos irmãos. É assim que Se propõe – com a cooperação dos discípulos – eliminar o sistema opressor, responsável pela fome e pela miséria. O Mundo novo de Jesus veio não assenta no poder, mas no serviço simples e humilde que leva a partilhar a vida com os irmãos.

Face ao sistema do lucro e da exploração, Jesus propõe a substituição do egoísmo pelo amor e pela partilha fraterna. Quem quiser acompanhar Jesus passará da escravidão do lucro para a liberdade da partilha, do serviço, da solidariedade, do amor aos irmãos. O que resultará daí é a Humanidade totalmente livre da escravidão dos bens: os necessitados tornam-se livres, porque têm o necessário para viverem uma vida digna e humana; e os que repartem libertam-se da lógica egoísta dos bens e da escravidão do dinheiro e descobrem a liberdade do amor e do serviço.

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Na segunda leitura (Ef 4,1-6), Paulo lembra aos crentes algumas exigências da vida cristã. Recomenda-lhes a humildade, a mansidão e a paciência – atitudes que não se coadunam com esquemas de egoísmo, de orgulho, de autossuficiência, de preconceito, em relação aos irmãos.

Começa por aludir ao facto de estar preso “pela causa do Senhor”, o que dá uma autoridade especial às suas recomendações: o que diz são palavras de alguém que leva tão a sério a proposta de Jesus, que é capaz de sofrer e de arriscar a vida por ela.

Os cristãos de Éfeso – como os cristãos de todos os tempos e lugares – receberam um chamamento (“klêsis”) de Deus. Ao responder positivamente a esse chamamento, passaram a integrar a Igreja (“ekklêsía”) de Jesus, a comunidade dos chamados, o que exige que vivam unidos em Cristo.

De forma prática, o emitente da carta refere atitudes e comportamentos que são condição necessária para que a unidade em Cristo seja efetiva. Antes de mais, vem a humildade, pois só ela supera o egoísmo, o orgulho, a arrogância, a autossuficiência, que afastam os irmãos e que erguem muros de separação; depois, vem a mansidão, irmã da humildade e que facilita a convivência e abre as portas à comunhão; e vem a paciência, que permite ser tolerante e compreensivo para com as falhas dos irmãos e que ajuda a entender e a aceitar os diferentes modos de ser e de agir. Pede-se, ainda, aos irmãos que se preocupem uns com os outros, apoiando-se, ajudando-se e cuidando-se mutuamente. É viver o mandamento do amor, como Cristo mandou. Os chamados a integrar a Igreja devem testemunhar a unidade e a comunhão.

Para reforçar a obrigatoriedade da unidade dos crentes, o autor da carta menciona os fundamentos da unidade: “há um só Corpo e um só Espírito, como há uma só esperança” na vida a que todos os crentes foram chamados; “há um só Senhor, uma só fé, um só Batismo; há um só Deus e Pai de todos, que está acima de todos, atua em todos e em todos se encontra”. A menção do Pai, do Filho e do Espírito sugere que a Trindade é a fonte última e o modelo da unidade que os cristãos devem viver, na sua experiência de caminhada comunitária, em que pontifica a partilha fraterna. 

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Abris, Senhor, as vossas mãos e saciais a nossa fome. Graças Vos deem, Senhor, todas as criaturas
e bendigam-Vos os vossos fiéis.

2024.07.28 – Louro de Carvalho