quarta-feira, 19 de junho de 2024

Medo de ideologias quererem impor a sua agenda no Sínodo

 

Com efeito, esses relatórios “contam, muitas vezes, a experiência de pessoas que fizeram uma verdadeira conversão pessoal”. “Outros, porém, falam de pessoas que continuam a experimentar confusão, preocupação ou ansiedade”, observou.

O purpurado reiterou que o Sínodo da Sinodalidade “não é sobre este ou aquele tema, mas sobre a sinodalidade, sobre como ser uma Igreja missionária em caminho. Todas as questões teológicas e propostas pastorais de mudança têm este objetivo”. “A assembleia será, sobretudo, um momento em que cada participante, situando-se num caminho iniciado em 2021 e trazendo a ‘voz’ do povo de Deus de onde provém, invocará a ajuda do Espírito Santo e a dos seus irmãos e irmãs, para discernir a vontade de Deus para a sua Igreja, e não uma oportunidade para impor a sua própria visão da Igreja”, explicou o cardeal.

Segundo informações da Secretaria-Geral do Sínodo divulgadas naquele dia 14, chegou ao fim o primeiro trabalho sobre o Instrumentum laboris 2 ou “instrumento de trabalho” para a segunda sessão do Sínodo da Sinodalidade por um grupo de teólogos, composto por bispos, sacerdotes, consagrados e leigos, que se reuniu em Roma, desde 4 de junho, para estudar os 107 relatórios das conferências episcopais e das Igrejas Orientais Católicas para o Sínodo da Sinodalidade, assim como as mais de 175 observações, provenientes de realidades internacionais, faculdades universitárias, associações de fiéis ou de comunidades e indivíduos.

Segundo o relator-geral da XVI Assembleia-Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, cardeal Jean-Claude Hollerich, “o santo povo de Deus pôs-se em movimento pela missão graças à experiência sinodal”, a qual conhece “respostas entusiásticas e criativas”, bem como “resistências e preocupações”. “A maior parte dos relatórios mostra, porém, a alegria do caminho feito, que deu nova vida a muitas comunidades locais e provocou também mudanças significativas no seu modo de viver e de ser Igreja”, explanou Hollerich.

Entre os temas estudados, estão “a formação para a sinodalidade, o funcionamento dos órgãos de participação, o papel das mulheres, os jovens, a atenção aos pobres, a inculturação, a transparência e a cultura da responsabilidade por parte de quem assume um ministério na Igreja”, bem como “a catequese e a iniciação cristã, a colaboração entre Igrejas, a figura do bispo, etc.”.

O processo de elaboração do Instrumentum Laboris 2 continuará: primeiro, o conselho ordinário fará um primeiro discernimento do que foi redigido pelos teólogos; depois, ocorrerão as fases de elaboração do documento propriamente dito e um sistema de verificação extensiva, até o conselho ordinário aprovar o documento, que será submetido ao Papa, com vista à aprovação final.

Monsenhor Riccardo Battocchio, secretário especial do Sínodo da Sinodalidade, observou que o Instrumentum Laboris para a segunda sessão “será diferente do anterior”. “Se, para a primeira sessão, era importante evidenciar a amplitude dos temas a tratar, o documento de trabalho para a sessão de outubro pretende, pelo contrário, evidenciar alguns nós a desatar, para responder à pergunta Como ser uma Igreja sinodal em missão”, explicou, para acrescentar: “Para isso, será levado em conta o caminho percorrido até agora e serão propostos argumentos teologicamente fundamentados, juntamente com algumas propostas concretas para ajudar ao discernimento confiado aos membros da assembleia.”

Os trabalhos, que decorreram na sede da Secretaria-Geral do Sínodo, foram conduzidos pelos dois secretários especiais, Monsenhor Battocchio e padre Giacomo Costa, e contaram com a presença dos cardeais Mario Grech e Jean-Claude Hollerich.

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Também a 14 de junho, a Santa Sé divulgou a lista dos teólogos encarregados de preparar o “Instrumentum Laboris 2”, documento no qual se basearão os trabalhos da segunda sessão do Sínodo da Sinodalidade, marcada para outubro próximo em Roma.

O teólogo italiano Dario Vitali participou da primeira assembleia de outubro de 2023. Na ocasião, no seu discurso à Assembleia Sinodal, fez referência à autoridade e às mudanças na Igreja institucional. Propôs “repensar a Igreja num sentido sinodal, para que toda a Igreja e tudo na Igreja – vida, processos, instituições – sejam reinterpretados em termos de sinodalidade”.

Em janeiro deste ano, falou sobre o diaconado feminino, numa entrevista ao Vatican News. Segundo o teólogo, a tradição “pensava no ministério diaconal como uma forma de serviço à comunidade; e, na tradição, havia também a presença de mulheres realizando esse serviço”, sendo “essa presença feminina na tradição que nos obriga a refletir se não podemos restaurar o diaconado também para as mulheres” – reflexão que nos deve permitir “encontrar um equilíbrio dentro da Igreja, respeitando todas as sensibilidades existentes”.

A teóloga holandesa Myriam Wijlens, professora de Direito Canónico na Universidade de Erfurt, na Alemanha, participa na preparação do documento e integra a Comissão Consultiva do Sínodo.

Numa entrevista em 2023, considerou que lhe não cabe a ela, mas ao sínodo, “discernir como responder à questão do diaconado feminino”, pedido que “não vem apenas das mulheres, mas de toda a comunidade”.

O teólogo australiano Ormond Rush entende que “o Concílio Vaticano II pode iluminar o debate sobre a tradição”. No seu discurso na Sala Paulo VI, n a primeira sessão do Sínodo da Sinodalidade, disse que a discussão sobre a Tradição que ocorreu durante o Concílio Vaticano II é a autoridade para as reflexões do Sínodo. Para ele, “a tradição não deve ser considerada apenas afirmativamente, mas também criticamente”.

D. Roberto Repole, arcebispo de Turim, na Itália, que confiou a gestão das paróquias aos leigos da diocese de Turim, é também um dos teólogos encarregados do Instrumentum Laboris 2. Foi um dos oradores da conferência intitulada “Igreja e Sínodo são sinónimos: estilos e formas de uma Igreja sinodal”, que aconteceu no dia 14 de outubro de 2023, em Roma. No seu discurso, alegou que o Concílio Vaticano II “não abraçou totalmente as realidades das Igrejas locais”. Por isso, defendeu a sinodalidade “para infundir o Evangelho na cultura em que operam as Igrejas locais, enfatizando a cultura democrática das Igrejas locais”.

O teólogo venezuelano Rafael Luciani disse, várias vezes, que as estruturas da Igreja precisam de “uma revisão sinodal”. Para Luciani, “a sinodalidade será talvez a contribuição epocal mais importante que os cristãos podem dar ao resto da humanidade”.

O teólogo definiu a sinodalidade como “o processo mais significativo de conversão e reforma que a Igreja Católica empreendeu depois do Concílio [Vaticano II]  para revisar as suas relações, dinâmicas de comunicação e estruturas”.

O teólogo argentino padre Carlos Maria Galli é um dos teólogos de referência do papa Francisco e colaborador de documentos relevantes do seu pontificado. É também autor de vários escritos nos quais defende a Teologia da Libertação.

Chegou a dizer que este Sumo Pontifice “superou” a conceção piramidal da Igreja e falou “de uma pirâmide invertida, onde a base se converte no cume”: o ministério dos bispos está ao serviço do povo de Deus. Quanto à “reforma da Igreja”, o padre Galli disse que não se trata só de mudar a estrutura, mas que “a reforma ou renovação da Igreja consiste numa mudança de atitudes em todos os membros do Povo de Deus”. Por outro lado, condenou a “teologia autoritária” e disse que o papa Francisco “acredita nos processos e quer que sejam irreversíveis”.

A irmã Gloria Liliana Franco Echeverri, presidente da Conferência Latino-Americana e Caribenha de Religiosos e Religiosas, lamentou, na sua intervenção na primeira sessão do Sínodo da Sinodalidade em Roma, que “o caminho das mulheres na Igreja está cheio de cicatrizes de situações que a levaram à dor e à redenção”. Frisou que existe um “desejo e imperativo de uma maior presença e participação das mulheres na Igreja”, mas que, ainda assim, “não há ambição de poder ou sentimento de inferioridade ou busca egoísta de reconhecimento”, defendendo “o direito à participação e à corresponsabilidade igualitária no discernimento e nas decisões”.

O Papa Francisco fez referência a estas declarações numa das suas intervenções no Sínodo da Sinodalidade de 2023: “Os ministros que se excedem em seu serviço e maltratam o povo de Deus, desfiguram o rosto da Igreja com atitudes machistas e ditatoriais.”

A Irmã Maria Cimperman, membro das Religiosas do Sagrado Coração de Jesus e professora de Teologia Moral, Ética Social e Vida Consagrada na União Teológica Católica de Chicago, lida com a sustentabilidade e com a ecologia. Para esta freira, autora do livro “Comprometendo-se com a diversidade. Interculturalidade e vida consagrada hoje”, a justiça social e o cuidado do meio ambiente são expressões fundamentais da fé cristã.

O padre jesuíta de Burkina Faso Padre Paul Béré, que foi o primeiro africano a ganhar o prestigiado Prémio Ratzinger, em 2019, mostra-se a favor da adaptação do ensino cristão às culturas locais e sustenta que é necessária uma “africanidade” dentro da abordagem católica para resolver problemas regionais.

Além dos citados, pertencem a este grupo os professores de Teologia Dogmática da Pontifícia Universidade Gregoriana Giuseppe Bonfrate e Padre Pasquale Bua, bem como os seguintes: o arcebispo de Perth, na Austrália, D. Timothy John Costelloe; Clarence Sandanaraj Davedassan, professor de Teologia Moral na Academia Alfonsiana de Roma; Paolo Foglizzo, especialista do sínodo; o bispo de Xai-Xai, em Moçambique, D. Lúcio Andrice Muandula; a Irmã Josée Ngalula, professora de Teologia Dogmática na Universidade Católica do Congo; Gilles Routhier, professor de Eclesiologia e de Teologia Prática na Universidade de Laval, no Canadá; Péter Szabó, professor de Direito Canónico na Universidade Católica de Budapeste, na Hungria; e Felix Wilfred, professor emérito de Filosofia e Pensamento Religioso na Universidade Estadual de Madras, na Índia.

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A 5 de junho, noticiava-se que cerca de 20 teólogos estavam em Roma, para dez dias de trabalho preparatório com vista à elaboração do documento que orienta a próxima assembleia do Sínodo da Sinodalidade. A reunião a portas fechadas de 4 a 13 de junho de especialistas em teologia, eclesiologia e direito canónico decorreria na cúria geral dos jesuítas, perto do Vaticano. A Secretaria do Sínodo dizia esperar divulgar um documento sobre a reunião, no início de julho.

O texto inicial prepara o caminho para a elaboração do documento – o “Instrumentum Laboris 2” – que vai guiar os trabalhos da segunda sessão do Sínodo da Sinodalidade, em outubro, revelava, em comunicado à imprensa, o padre jesuíta Giacomo Costa, secretário especial do Sínodo da Sinodalidade, acrescentando que o grupo de teólogos se reunira para “uma primeira análise” dos relatórios das comunidades locais e para discernir sobre as suas “questões e reflexões teológicas”.

A assembleia sinodal de outubro continua o sínodo plurianual da sinodalidade, que começou em outubro de 2021 e incluiu etapas de discernimento e discussão em vários níveis da Igreja. A primeira sessão da assembleia sobre sinodalidade no Vaticano aconteceu em outubro de 2023.

Teólogos e outros especialistas da Igreja estão a ler e a discutir novos relatórios das Igrejas locais, subsequentes ao relatório de síntese de 41 páginas divulgado no final da reunião de outubro. Os participantes também estão a considerar a questão “como ser uma Igreja sinodal em missão”. Além disso, estão a ler e a refletir sobre o material compartilhado por ordens religiosas femininas, faculdades universitárias, associações religiosas e outros, bem como relatórios de uma sessão de escuta com 300 párocos que aconteceu perto de Roma, na cidade de Sacrobano, de 28 de abril a 2 de maio deste ano. “O material recebido, muitas vezes, acrescenta testemunhos reais sobre como as Igrejas particulares, não apenas entendem a sinodalidade, mas também como já estão a colocar esse estilo em prática”, disse o secretário-geral do sínodo, cardeal Mario Grech, em comunicado à imprensa, acrescentando: “Não estamos a deixar nada ao acaso. Cada documento deve ser lido com atenção com o objetivo de que, ao final deste encontro, o grupo apresente um texto que reflita o trabalho, as perguntas e os insights recebidos das bases.”

Segundo a Secretaria-Geral do Sínodo, o encontro de teólogos começou com um retiro espiritual, que durou a metade de um dia, e inclui missa diária e tempo para oração pessoal.

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Eis um exemplo de uma Igreja que ora, reflete e estuda o legado do seu fundador e guia permanente, ancorada no senso do santo Povo de Deus.

2024.06.19 – Louro de Carvalho

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