quinta-feira, 6 de junho de 2024

BCE reduz taxas de juro em linha com as expetativas do mercado

 
Tal como amplamente esperado pelos analistas, o Banco Central Europeu (BCE), na sua reunião de junho, reduziu as taxas de juro em 25 pontos base.
Em comunicado, o conselho do BCE, reunido em Frankfurt, “decidiu hoje [6 de junho] reduzir as três taxas de juro diretoras em 25 pontos base [0,25 pontos percentuais]”.
Tendo avaliado “as perspetivas de inflação”, “a dinâmica da inflação subjacente [que não conta com os preços da comida e da energia]” e “a força da transmissão da política monetária”, o BCE diz que “é, agora, apropriado moderar o nível de restritividade da política monetária, após as taxas de juro terem sido mantidas constantes durante nove meses”. As três taxas estavam em máximos históricos ou quase históricos desde setembro de 2023.
Assim, com efeitos a partir de 12 de junho, foi reduzida, para 4,25%, a sua taxa principal de refinanciamento (taxa refi), para 4,50%, a taxa de juro da facilidade permanente de cedência de liquidez (taxa liqui) e, para 3,75%, a taxa de depósito (taxa depo), tal como amplamente foi assinalado, nas últimas semanas, pelos seus decisores políticos.
É de recordar que a taxa de depósito é, para o BCE, o indicador mais adequado para medir o custo efetivo do dinheiro e o poder de transmissão da política monetária. E essa taxa desce, assim, do atual máximo histórico de 4% para 3,75%.
Trata-se da primeira redução, desde março de 2016 (há mais de oito anos), para a taxa de juro das operações principais de refinanciamento e para a taxa de juro da facilidade permanente de cedência de liquidez, ao passo que, para a taxa de depósito, é a primeira redução desde setembro de 2019 (quase quatro anos).
O aumento global de 450 pontos de base implementado por Frankfurt, entre julho de 2022 e setembro de 2023m contribuiu para fazer descer a taxa de inflação global, na Zona Euro, de um pico de 10,6%, em outubro de 2022, para 2,6%, em maio de 2024.
Em março, Christine Lagarde, presidente da autoridade de política monetária da Zona Euro, indicou que, em junho, estariam disponíveis dados mais claros e suficientes. E esse momento chegou. Embora a inflação ainda não tenha atingido completamente o objetivo de 2%, a sua diminuição substancial assinala uma tendência descendente contínua, que deverá persistir nos próximos meses.
De acordo com as projeções do BCE de março de 2024, a taxa média de inflação deverá diminuir para 2%, em 2025, e para 1,9%, em 2026. Quanto à inflação subjacente, que exclui os preços da energia e dos produtos alimentares, as projeções apontam para 2,1%, em 2025, e para 2,0%, em 2026. Porém, em junho, os economistas desta rede formada pelo BCE e pelos bancos centrais nacionais projetam que “a inflação global seja, em média, de 2,5%, em 2024, de 2,2%, em 2025, e de 1,9%, em 2026”. Já “relativamente à inflação, excluindo preços dos produtos energéticos e dos produtos alimentares [inflação subjacente], projetam uma média de 2,8%, em 2024, de 2,2%, em 2025, e de 2%, em 2026”, revela o banco central presidido por Christine Lagarde.
O corte de 25 pontos base manterá as taxas de juro reais positivas, uma vez que as taxas nominais permanecerão acima da taxa de inflação atual. Assim, esse corte indica uma redução do grau de restritividade da política monetária, em vez de uma normalização mais alargada.
O custo crescente e elevado dos empréstimos criou um abrandamento no crescimento económico do bloco, contendo a procura e travando as pressões sobre os preços.
Embora a economia da área do euro tenha registado uma expansão de 0,3%, no primeiro trimestre de 2024, os dois trimestres anteriores foram marcados por contrações de 0,1%. O segundo trimestre de 2023 registou um ligeiro crescimento de 0,1% e o primeiro trimestre de 2023 e o último de 2022 registaram uma estagnação.
A 6 de junho, o BCE revelou que, segundo as novas previsões de junho, o crescimento económico da Zona Euro deverá aumentar para 0,9%, em 2024 (em março previa 0,6%), mas o crescimento previsto para 2025 foi revisto em baixa ligeira de 1,5% para 1,4%. O valor de 2026 ficou na mesma (1,6%).
Todavia, as recentes observações dos responsáveis do BCE sugerem que não haverá um compromisso prévio para futuros cortes depois de junho. Isto significa que um novo corte das taxas em julho permanece incerto, visto que o BCE pretende manter a flexibilidade nas suas decisões e continuar a monitorizar os dados económicos.
A inflação da Zona Euro aumentou, em maio, atingindo 2,6%, acima dos 2,5% esperados, enquanto a inflação subjacente subiu para 2,9%, contra 2,7%, em abril.
Espera-se que a presidente Lagarde assinale uma vez mais que estarão disponíveis mais informações em julho para orientar a próxima decisão, esperando-se uma clareza ainda maior em setembro. As novas projeções económicas de junho poderão sugerir um ligeiro ajustamento em alta do crescimento económico e da inflação para 2024, mantendo inalterada a previsão de inflação de 2%, para 2025.
O BCE enfrenta o desafio de equilibrar os riscos de uma redução excessiva das taxas com os de uma redução insuficiente. Se Frankfurt flexibilizar a política monetária, de forma demasiado rápida e significativa, provavelmente isso estimulará a procura dos consumidores e o investimento. No entanto, correrá o risco de reacender as pressões inflacionistas antes de o objetivo de 2% ser plenamente atingido. Por conseguinte, expor-se-á a incertezas relacionadas com os preços da energia e com as tensões geopolíticas com amortecedores reduzidos, o que poderá conduzir a efeitos indesejáveis na dinâmica dos preços.
Além disso, embora a presidente Christine Lagarde tenha sublinhado que o BCE é “dependente dos dados”, e não da Reserva Federal Americana (FED), a divergência entre as políticas dos dois principais bancos centrais do Mundo poderia ter impactos financeiros significativos, especialmente nas taxas de câmbio. Uma redução agressiva das taxas de juro pelo BCE, enquanto a FED mantém taxas de juro mais elevadas por um período mais longo, exerceria uma forte pressão no sentido da baixa do euro em relação ao dólar, com o risco de aumentar a pressão sobre os preços dos bens e serviços importados.
Inversamente, se Frankfurt mantiver uma política monetária restritiva durante demasiado tempo e reduzir as taxas menos do que o mercado espera atualmente, arrisca-se a asfixiar o crescimento económico na zona euro e a aumentar o fosso em relação aos Estados Unidos da América (EUA).
***
O BCE observa que, desde a reunião de setembro de 2023, “a inflação desceu mais de 2,5 pontos percentuais e as perspetivas de inflação melhoraram significativamente”. E “a inflação subjacente também abrandou, reforçando os sinais de enfraquecimento das pressões sobre os preços, tendo as expectativas de inflação baixado em todos os horizontes”.
Frankfurt congratula-se pelo facto de a política monetária ter mantido “as condições de financiamento restritivas”. “Ao atenuar a procura e manter as expectativas de inflação bem ancoradas, deu um contributo importante para a descida da inflação”, afirma o BCE.
No entanto, apesar deste sinal de descida nos juros, que muitas famílias, empresas e políticos reclamam, há muito tempo, o BCE alerta que, “não obstante os progressos realizados nos últimos trimestres, as pressões internas sobre os preços permanecem fortes, dado que o crescimento dos salários é elevado” (em Portugal, não). Assim, para o BCE é, “provável que a inflação se mantenha acima do objetivo, durante grande parte do próximo ano”. “As mais recentes projeções elaboradas por especialistas do Eurossistema para a inflação global e a inflação subjacente foram revistas em alta, para 2024 e para 2025, em comparação com as projeções de março.”
Porém, de acordo com as previsões de junho, acima indicadas, a vitalidade da economia parece estar a ganhar alguma cor, mas muito pouca, tendo em conta o ritmo muito baixo da atividade, sobretudo este ano.
Os programas extraordinários lançados desde 2014 (crise do euro) e 2020 (pandemia) continuam a ser esvaziados, com o BCE e restantes bancos centrais nacionais a venderem o que ainda têm em dívida pública dos países. Estes programas, que muito ajudaram países, como Portugal, a conseguir baixar as taxas de juro soberanas e a despesa com juros (fazendo menor pressão sobre as contas públicas), estão na sua fase final. 
A carteira do APP (o gigantesco programa de compra de ativos, APP – asset purchase programme, lançado para terminar com a crise do euro) “está a diminuir a um ritmo comedido e previsível, dado que o Eurossistema deixou de reinvestir os pagamentos de capital de títulos vincendos [que chegam à maturidade]”, reafirma o BCE.
Quanto ao enorme programa de compras de dívida, criado para ajudar os governos a pagar as medidas de combate aos efeitos da pandemia, logo a partir de março de 2020, o esvaziamento continua, mas de forma mais suave, pois o BCE ainda não terminou a fase dos “reinvestimentos” das obrigações, até que elas atinjam a maturidade. Assim, o BCE confirmou que “reduzirá as posições do Eurossistema em títulos adquiridos, ao abrigo do programa de compra de ativos, devido a emergência pandémica (pandemic emergency purchase programme – PEPP), em média, em 7,5 mil milhões de euros por mês durante o segundo semestre do ano”.
***
A 27 de maio, já havia indicações de que o BCE estaria a planear reduzir as taxas de juro na sua do mês de junho.
Numa entrevista ao Financial Times (FT), o economista-chefe do BCE, Philip Lane, afirmou: “Se não houver grandes surpresas, nesta altura, há elementos suficientes para eliminar o nível máximo de restrição.”
Com efeito, já se sabia que a inflação da Zona Euro caíra de mais de 10%, no seu pico de 2022, para um mínimo de quase três anos de 2,4% em abril. E as previsões apontavam para um aumento para 2,5% quando os dados de maio fossem divulgados a 1 de junho.
Um corte na reunião de 6 de junho, durante as eleições europeias, significa que o BCE, criticado por ter sido demasiado lento a aumentá-las, depois de a inflação ter disparado, há três anos, estaria a cortar, agora, as suas taxas, antes de qualquer outro banco central importante.
A inflação da Zona Euro caiu agora para perto do objetivo do BCE de 2% e os investidores acreditavam que isso deixa espaço para o banco central cortar a sua taxa de depósito de referência em 0,25%. Embora alguns bancos centrais já tenham reduzido o custo dos empréstimos, a FED e o Banco de Inglaterra ainda não tomaram qualquer medida.
Quando lhe perguntaram se estava satisfeito com o facto de o BCE poder reduzir as taxas mais cedo do que os outros bancos, Lane respondeu: “Os banqueiros centrais aspiram a ser tão aborrecidos e eu espero que os banqueiros centrais aspirem a ter o menor ego possível.”
Lane explicou que, devido ao facto de a Europa ter sido tão gravemente afetada pela guerra entre a Rússia e a Ucrânia, a inflação caiu mais rapidamente do que noutros países. “Lidar com a guerra e com o problema da energia tem sido dispendioso para a Europa”, disse. “Mas, em termos do primeiro passo [começar a cortar as taxas], isso é um sinal de que a política monetária tem estado a dar resultados, garantindo que a inflação desce em tempo útil. Nesse sentido, penso que fomos bem-sucedidos.” E explicou ainda que era importante manter as taxas de juro apertadas, para que a inflação não voltasse a subir e ultrapassasse o objetivo do banco. Tal seria “muito problemático e provavelmente muito doloroso de eliminar”.
***
Trata-se de um corte ainda pequeno, mas, como sinal, já constitui um alívio.

2024.06.06 – Louro de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário