segunda-feira, 7 de abril de 2025

Acordo, na UE, sobre primeira ronda de tarifas de retaliação contra EUA

 

Os ministros do Comércio da União Europeia (UE), reunidos no Luxemburgo, a 7 de abril, chegaram a acordo sobre uma primeira ronda de uma lista de produtos norte-americanos a taxar, em resposta à decisão presidente dos Estados Unidos da América (EUA) de impor tarifas sobre o aço e sobre o alumínio. Porém, continua a ser debatida uma segunda ronda, destinada a responder aos direitos aduaneiros gerais de 20%, sobre outras importações do bloco, e a uma taxa fixa de 25%, sobre os automóveis.

A primeira ronda de contramedidas, a adotar, a 9 de abril, incluirá produtos norte-americanos como o uísque bourbon, embora tal inclusão continue a ser discutível, especialmente, após as ameaças de Donald Trump de impor tarifas de 200% aos vinhos e bebidas espirituosas europeias, se o uísque continuar na lista.

A França, a Itália e a Espanha lideram o apelo à retirada do uísque das medidas de retaliação, para evitar a escalada das tensões com os EUA. “Precisamos de encontrar o equilíbrio certo, para proteger as economias mais expostas da UE”, declarou um diplomata da UE à Euronews, referindo: “Estamos unidos no nosso desejo de uma resposta proporcional, porque as medidas de retaliação contra os produtos americanos terão efeito de dominó sobre as nossas indústrias.”

As tarifas de retaliação serão aplicadas, gradualmente, a partir de 15 de abril, com uma segunda vaga prevista para 15 de maio. O objetivo das medidas iniciais é levar os EUA para a mesa das negociações, assinalando a disponibilidade da UE para se manter firme no conflito comercial. Com efeito, embora se espere que o acordo sobre a primeira ronda de tarifas esteja concluído a 9 de abril, discute-se uma segunda fase da estratégia da UE. Este plano B abordaria as tarifas dos EUA sobre os automóveis e outros setores, mas os estados-membros estão divididos, quanto à abordagem. As maiores economias, como a França e Alemanha, estão abertas a contramedidas mais agressivas, como o bloqueio das empresas americanas a contratos públicos da UE, enquanto as mais pequenas, como a Espanha, a Itália e a Irlanda, preferem resposta mais cautelosa.

Apesar destas divisões, a UE tenta manter posição unificada. E, aprovada a primeira lista, a UE espera que esta sirva de alavanca em futuras negociações com os EUA, vincando a disponibilidade do bloco para uma escalada, se necessário. Contudo, os dirigentes querem evitar uma guerra comercial e estão determinados a encontrar o equilíbrio entre uma posição firme e a manutenção dos laços diplomáticos com Washington. “A Europa está sempre pronta para um bom acordo”, afirmou a presidente da Comissão Europeia, numa altura em que as tensões comerciais com os EUA atingem o seu ponto mais alto.

***

Entretanto, a Comissão Europeia propôs aos EUA um acordo para eliminar os direitos aduaneiros sobre todos os produtos industriais, no âmbito das negociações comerciais, afirmou Ursula von der Leyen, frisando a intenção de retaliar contra as políticas de Donald Trump, caso as negociações falhem.

Trump anunciou a aplicação da taxa alfandegária geral de 20% às importações da UE, para entrar em vigor a 9 de abril. O aço, o alumínio e os automóveis estão sujeitos à taxa separada de 25%. Serão afetados mais de 380 mil milhões de euros de produtos fabricados na UE. Os produtos farmacêuticos, o cobre, a madeira, os semicondutores e a energia ficaram isentos. “Estamos prontos para negociar com os EUA. De facto, propusemos tarifas ‘zero por zero’ para os produtos industriais, tal como fizemos, com sucesso, com muitos outros parceiros comerciais”, afirmou a presidente da Comissão, no dia 7, à tarde, vincando: “A Europa está sempre pronta para um bom acordo. Por isso, mantemo-lo em cima da mesa. Mas também estamos preparados para responder, através de contramedidas, e [para] defender os nossos interesses.”

O acordo “zero por zero” foi proposto, no passado, “repetidamente”, para o setor automóvel, “mas não houve uma reação adequada” de Washington. E a Comissão alargou a proposta a todos os produtos industriais, à medida que as conversações se intensificavam, como disse um porta-voz do executivo comunitário, sem fornecer mais pormenores.

Ursula von der Leyen, sustentando que é preferível “uma solução negociada”, advertiu que o seu executivo usará “todos os instrumentos” disponíveis para retaliar, “se necessário”, incluindo um instrumento de anticoerção,  introduzido em 2023, mas que nunca foi acionado. E descreveu as tarifas abrangentes de Trump como um “grande ponto de viragem” para os EUA, que teria “custos imensos”, para os consumidores e para empresas americanas e daria um golpe “massivo” na economia global. Enquanto Washington descreveu as tarifas como recíprocas, Bruxelas rejeitou a sua lógica como “não credível, nem justificada”.

Além do impacto imediato nos fluxos comerciais entre a UE e os EUA, que coloca milhares de milhões em risco de eliminação, a Comissão está preocupada com as potenciais ramificações que a decisão de Trump terá no comércio internacional, em particular na Ásia.

Os países asiáticos foram atingidos com taxas mais elevadas do que a UE: 24% para a Malásia, 26% para a Índia, 32% para a Indonésia, 36% para a Tailândia, 46% para o Vietname, 48% para o Laos e 49% para o Camboja, entre outros. A China foi alvo de uma tarifa recíproca de 34%, além da anterior taxa de 20%, o que perfaz um total de 54%. Pequim já ripostou.

Os níveis são tão proibitivos que Bruxelas receia que os países asiáticos, cujas economias dependem das exportações, fiquem excluídos do mercado americano e reencaminhem os seus produtos para a Europa. A China é muito preocupante, pois já é alvo de intenso escrutínio, por inundar o Ocidente com produtos de baixo custo e fortemente subsidiados.

Na sua intervenção no dia 7, Ursula von der Leyen anunciou a criação de uma nova “task force”, para acompanhar, de perto, as mudanças no comércio mundial. “Vamos também proteger-nos contra os efeitos indiretos do desvio do comércio. Para o efeito, vamos criar uma task force de vigilância das importações”, afirmou, garantindo: “Analisamos as importações históricas que temos e tivemos e [se] há um aumento específico repentino de um determinado produto ou de um determinado setor em relação ao qual temos de agir.”

***

As ações norte-americanas caíram mais, com o agravamento dos receios, em relação às tarifas, com o S&P 500 a entrar em território de mercado em baixa. E Trump defendeu novas barreiras comerciais, enquanto a Europa mostrou abertura para conversações. A queda do mercado bolsista norte-americano agravou-se, no dia 7, com os compradores relutantes em intervir, apesar das especulações sobre possíveis acordos comerciais e dos sinais de que a UE está pronta a aliviar as tensões, adotando um tom menos conflituoso. E relatos não confirmados de que o conselheiro económico da Casa Branca, Kevin Hassett, sugeriu a  pausa de 90 dias, nas tarifas, ofereceram uma breve centelha de esperança, mas o otimismo desvaneceu-se depressa.

Às 15h30, o S&P 500 tinha caído 1,3% para 5010 pontos, o nível mais baixo, desde o início de 2024, aumentando as perdas acumuladas do índice para quase 12%, desde o anúncio das tarifas em causa – uma das quedas mais acentuadas no pós-guerra, rivalizando com a segunda-feira negra de outubro de 1987 e com a crise financeira global de 2008. Desde o seu pico, em fevereiro, o índice de referência caiu 20%, marcando o início de um mercado técnico em baixa. As perdas continuaram a ser generalizadas entre os índices dos EUA, com o Dow Jones a cair 2% e o Nasdaq 100, de alta tecnologia, a cair 1%.

As ações tecnológicas de grande capitalização permaneceram sob pressão. A Tesla caiu 5,5%, no próprio dia, e o seu valor caiu para metade, desde os máximos de 2024. A Apple perdeu 3,5%, elevando o seu declínio total para 30%, em relação aos níveis máximos. Em contrapartida, os investidores procuraram refúgio em nomes defensivos e contracíclicos. A Dollar Tree ganhou 7%, enquanto a Brown-Forman Corp subiu 4,7% e a GE Vernova subiu 4,4%, à medida que os investidores se deslocavam para setores mais resistentes, durante as recessões económicas.

Na semana anterior, Donald Trump anunciou nova vaga de tarifas aduaneiras abrangentes para vasta gama de produtos provindos da China, da UE e de outros grandes parceiros comerciais. E, no dia 7, publicou uma mensagem na plataforma Truth Social, dizendo: “Países de todo o Mundo têm vindo a falar connosco. Estão a ser definidos parâmetros duros, mas justos. Falei com o primeiro-ministro japonês, esta manhã. A única forma de curar este problema é com tarifas, que estão, agora, a trazer dezenas de milhares de milhões de dólares para os EUA.”

Trump defendeu ainda a estratégia tarifária. “Os Estados Unidos têm a oportunidade de fazer algo que deveria ter sido feito décadas atrás”, escreveu, enquanto criticava os desequilíbrios comerciais com a China, com a UE e com o Japão. “Não sejam fracos! Não sejam estúpidos! Não sejam panicanos", declarou Trump, cunhando um novo termo para os que se opõem às suas políticas comerciais. Afirmou ainda que as tarifas já estavam a gerar “dezenas de milhares de milhões de dólares” para os EUA e chamou-lhes “uma coisa bonita de se ver”.

Os principais bancos de investimento mundiais reviram, rapidamente, as previsões económicas à luz dos acontecimentos. O Goldman Sachs elevou para 45% a probabilidade de recessão nos EUA, citando os riscos de perturbação do comércio e o enfraquecimento da confiança das empresas. O JP Morgan foi mais longe, atribuindo a probabilidade de 60% de recessão, nos próximos 12 meses. De facto, o choque no mercado segue-se à declaração abrupta de Trump, relativa à aplicação de tarifas abrangentes sobre bens estrangeiros, uma medida protecionista que atraiu o escrutínio global. Enquanto a administração permanece firme, sinais de tom mais conciliatório surgiram da Europa. O vice-presidente e responsável pela pasta do comércio da Comissão Europeia, Maroš Šefčovič, manifestou disponibilidade para negociar. “Estamos prontos para discutir tarifas ‘zero por zero’, não só para os automóveis, mas também para outros produtos industriais”, destacou, frisando que 380 mil milhões de euros em exportações da UE para os EUA, equivalente a cerca de 70% do total das exportações do bloco, estão sujeitos a tarifas.

Todavia, criticou a falta de progresso nas conversações com Washington, afirmando que, apesar dos esforços da UE, não se assiste a compromisso que leve a “solução mutuamente aceitável”. E não aceitou as críticas ao regime europeu do imposto sobre o valor acrescentado (IVA), vincando a sua importância fiscal para os estados-membros. “O IVA é uma importante fonte de rendimento dos estados-membros da UE e não vamos alterar o nosso sistema de IVA”, explicitou.

Segundo Šefčovič, os mercados estão a reagir à mais importante mudança de paradigma desde a II Guerra Mundial. As ações europeias recuperaram, apenas ligeiramente, com estas notícias. O Euro STOXX 50 ficou 3,4% abaixo, superando quedas mais pesadas, durante a sessão.

***

Elon Musk, o multimilionário conselheiro do presidente dos EUA, falou através de ligação vídeo numa conferência do congresso federal da Liga Norte, de Matteo Salvini, em Florença, na Itália, a 6 de Abril. Anunciado por Matteo Salvini, que subiu ao palco, após o convite de Giancarlo Giorgetti, Musk falou sobre a relação entre os EUA e a UE, após as tarifas de Donald Trump, mas também sobre a imigração, sobre guerra e sobre o seu papel no Departamento de Eficiência Governamental (DOGE). “É difícil reduzir a burocracia e as despesas do Estado, porque há uma oposição muito forte, mesmo quando cortamos coisas que não fazem sentido. Tudo o que fazemos é publicado na Internet e na conta X, para sermos mais transparentes, mas continuamos a ser acusados de tudo. Mesmo que façamos cortes, eles atacam-nos”, afirmou Musk.

O braço direito de Trump voltou a um tema muito caro à Liga de Salvini. “A imigração em massa é coisa louca e vai levar à destruição de qualquer país que a permita. O país deixará de existir, é uma situação muito difícil. Há oito mil milhões de pessoas no Mundo e, se formos um país de 50 ou 60 milhões de pessoas, mas mesmo para um país tão grande como os EUA, se houver uma pequena percentagem do resto do Mundo que se desloca, transforma-se num país diferente”, declarou, acrescentando: “O país não é a geografia, mas as pessoas que o habitam.”

Musk salientou o alarme na Europa, face ao terrorismo. “Os meios de comunicação social tentam reduzir os números de ataques terroristas, mas a matança de pessoas é cada vez mais frequente e, eventualmente, na Europa assistiremos a ataques em massa. […] Os vossos amigos, as vossas famílias, todos eles estarão em risco, os números falam por si”, sustentou.

Apesar de os EUA terem anunciado a imposição de direitos aduaneiros de 20% aos países da UE, Musk espera que os EUA e a Europa alcancem uma parceria muito estreita. “Já existe uma aliança, mas espero que se torne mais estreita e mais forte. E no atinente aos direitos aduaneiros, passaremos no futuro à situação de direitos nulos, a uma zona de comércio livre. É essa a minha esperança para o futuro. E também mais liberdade para circular entre a Europa e a América do Norte. Os que querem trabalhar na América do Norte, os que querem trabalhar na Europa devem poder fazê-lo, na minha opinião. Foi esse o conselho que dei ao presidente, disse Musk, ao que Matteo Salvini respondeu, imediatamente: “Perfeito, aceitamos com entusiasmo.”

O chefe da Tesla e da SpaceX comentou, depois, a evolução do conflito entre Moscovo e Kiev. “Chegou a altura de parar, esta máquina de guerra tem de parar. Os que são a favor da guerra parecem ter empatia pelos imigrantes, mas isso é hipocrisia, porque a empatia é outra coisa”, disse, vincando: “Devíamos estar preocupados com os que estão a morrer nas trincheiras, na Ucrânia e na Rússia. São obrigados a matar-se uns aos outros, porquê? E durante quanto tempo mais? É altura de dizer basta.”

Não tem respeito pelos que encorajam a guerra, que querem que ela continue para sempre, nem pelas suas razões. E, alinhado com Salvini, critica a esquerda, que diz não poder ceder-se à Rússia, tal como critica a UE, pelo seu plano de rearmamento, enquanto Trump trabalha num acordo de paz, entre Putin e Zelensky. E, depois de parecer estar em contradição com Trump, na aliança UE-EUA, disse que ele tem razão, pois “temos de conseguir a paz e está na altura de acabar com o massacre de todos estes jovens e menos jovens”.

A intervenção de Musk marca nova aproximação entre a Liga e Musk e o provável afastamento de Giorgia Meloni, depois de as relações com a primeira-ministra terem sido postas em causa, pela vontade do governo de confiar à Starlink uma encomenda de 1,5 mil milhões de euros de sistemas de segurança por satélite.

2025.04.07 – Louro de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário