quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

Ucrânia: Natal em cativeiro e em sobressalto

 

De acordo com uma peça jornalística de Sasha Vakulina intitulada “Natal em cativeiro: a dolorosa realidade dos prisioneiros de guerra ucranianos e dos familiares” e publicada, a 24 de dezembro, pela Euronews, em todas as semanas, familiares, amigos de prisioneiros de guerra e muitos outros ucranianos organizam manifestações em diversas cidades ucranianas e no estrangeiro, a fim de sensibilizarem a opinião pública para os que permanecem em cativeiro russo, sem quaisquer notícias ou atualizações. Acima de tudo, os familiares estão preocupados com a saúde dos entes queridos e com as consequências para a saúde física e psicológica destes após o cativeiro.

Alguns dos slogans mostrados e bradados nestas manifestações semanais são: “O cativeiro mata.” “Enquanto eles são silenciados, nós gritamos por eles.” “Cada dia em cativeiro pode ser o último.” “Lutem por eles como eles lutaram por nós.”

Quase toda a gente que participa nestes protestos espera que alguém regresse. As crianças pequenas esperam pelos pais, as mulheres esperam pelos maridos. Mães e avós que, há meses ou mesmo anos, não têm notícias dos filhos ou dos netos vieram à mais recente manifestação, a 21 de dezembro, com os cartazes do género: “Estou à espera do meu neto e dos seus irmãos de armas.” “Sonho viver até ao momento em que o meu neto volte para casa.”

Naquela manifestação pré-natalícia, em Kiev, as mães dos prisioneiros de guerra mostraram cartazes com frases, como: “O meu filho está em cativeiro russo, há 940 dias, quanto mais tempo?” “Ajudem-me a trazer o meu filho de volta, já passaram dois anos e meio.”

As famílias que participam nestas manifestações semanais sustentam que, enquanto a maioria espera pelo Natal, elas esperam que os seus entes queridos “regressem do cativeiro russo”.

Muitos prisioneiros de guerra ucranianos vão passar o seu terceiro Natal em cativeiro. É o caso dos que defenderam a fábrica de aço Azovstal, em Mariupol, durante três meses, quando esta cidade portuária do Sul da Ucrânia estava sitiada.

Cerca de 2500 soldados ucranianos renderam-se à Rússia, por ordem do presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, durante o cerco à enorme fábrica de aço, em maio de 2022, e mais de 1300 continuam nas mãos dos russos. Por isso, os representantes da Associação das Famílias dos Defensores de Azovstal dizem não pensar num melhor presente de Natal do que ver os seus entes queridos vivos e de volta a casa. “Enquanto as crianças, na Europa e na América, sonham com presentes, milhares de crianças ucranianas sonham com ver os pais e mães em casa”, disse a porta-voz da associação, Marianna Khomeriki, segundo a qual o principal objetivo das manifestações semanais é não deixar que o Mundo se esqueça deles.

“Alguns dos filhos dos defensores de Azovstal capturados nasceram depois de terem sido levados para cativeiro. Muitas mães não veem os filhos, há anos, e não têm notícias deles desde o início do cativeiro”, declarou Khomeriki, relevando que “esta é uma tragédia que não deveria ter acontecido no Mundo moderno e o Mundo deve recordá-la” – sentimento comum dos Ucranianos.

Muitas das pessoas presentes nos protestos nem sequer falam com os seus entes queridos, desde que estes foram feitos prisioneiros de guerra. Muitas vezes, sabem mais notícias através dos que regressam a casa, após trocas de prisioneiros.

De acordo com o gabinete do procurador-geral da Ucrânia, nove em cada dez prisioneiros ucranianos são sujeitos a tortura física e psicológica, a violência sexual e a condenações ilegais. Alguns são executados antes de serem feitos prisioneiros. Os procuradores afirmam que, nos quase três anos da invasão, foram documentados 177 casos confirmados de execuções de prisioneiros de guerra ucranianos, 109 dos quais ocorreram neste ano. E, embora as provas visuais da morte de soldados ucranianos pelas tropas russas aumentem, é difícil provar estes crimes de guerra perante os tribunais internacionais, já que a recuperação dos corpos é muito difícil.

Segundo Khomeriki, resta às famílias esperar por novas trocas de prisioneiros. Porém, a Rússia não mostra muito interesse em recuperar os seus prisioneiros de guerra. E as organizações internacionais não estão a fazer o suficiente, sendo a única esperança das famílias que as forças ucranianas “reabasteçam o fundo de troca através da captura”.

A 3.ª Convenção de Genebra – um de quatro tratados – estabelece regras para o tratamento dos prisioneiros de guerra, afirmando que devem ser tratados com humanidade, alojados de forma adequada e receber alimentação, vestuário e cuidados médicos suficientes. Nestes termos, não devem ser impedidas as atividades humanitárias, incluindo as da Cruz Vermelha Internacional (CICV) ou de qualquer outra organização humanitária imparcial, a realizar para proteger e aliviar os prisioneiros. Todavia, a CICV, apesar de ter visitado cerca de 3500 prisioneiros na Ucrânia e na Rússia, admite que, até à data, “não tem acesso total a todos os prisioneiros de guerra”.

Os soldados ucranianos que regressaram e as famílias dos que estão nas prisões russas afirmam não ter qualquer contacto ou informação sobre os prisioneiros detidos na Rússia, o que significa que nem sabem se estão vivos. E Moscovo está relutante em trocar os defensores de Mariupol, que, só excecionalmente, foram incluídos na recente troca de prisioneiros por soldados do checheno Ramzan Kadyrov, capturados no início da incursão de Kursk, em agosto. “De acordo com a informação pública da Sede de Coordenação para o Tratamento dos Prisioneiros de Guerra, só recebemos pedidos do lado russo para a troca de prisioneiros capturados no sector de Kursk”, disse Khomeriki, para quem as autoridades russas não estão interessadas “nos Russos capturados noutras regiões, o que, geralmente, mostra a atitude que têm com os próprios soldados”.

As manifestações semanais na Ucrânia são um lembrete constante para que os Ucranianos e os Europeus “mantenham a questão viva e para que as organizações internacionais sintam a pressão de serem responsabilizadas por garantir a segurança dos prisioneiros de guerra, em conformidade com a Convenção de Genebra”, diz Khomeriki, acrescentando que dão apoio moral às famílias que aguardam o regresso dos entes queridos e que familiares e amigos continuam a acreditar que os defensores regressarão o mais rapidamente possível.

Questionada sobre o que diria aos Europeus que celebram o Natal e as festas de fim de ano, Khomeriki pede que se lembrem de “todos os prisioneiros de guerra ucranianos e reféns civis e que usem toda a sua influência para garantir a sua libertação”. “Estas pessoas foram feitas prisioneiras, enquanto defendiam a Ucrânia, no território do próprio país, e a Rússia não tem qualquer fundamento legal para as manter reféns durante mais tempo”, vincou, acrescentando que o Mundo deve condenar esta situação, chamar a atenção para a violação dos direitos, para a tortura que estão a sofrer e fazer tudo para obrigar a Rússia a devolver os Ucranianos à Ucrânia.

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Contudo, também os Russos sofrem com a guerra, o que o Ocidente esquece. O seu Natal, a 7 de janeiro (segundo o calendário ortodoxo, que segue o calendário juliano) verá perturbada a “sochelnik” (consoada), em que as famílias se reúnem para uma refeição especial, com troca de presentes. Os Ucranianos queixam-se, com razão, mas retaliam com dureza.

Também a 24 de dezembro, como noticiaram os meios de comunicação locais, a Ucrânia lançou drones em direção a Millerovo, na região de Rostov, na Rússia, cidade que abriga uma base aérea militar. E, enquanto isso acontece, as tropas de Moscovo avançam na região de Donetsk e, segundo as forças armadas ucranianas, tentam controlar uma ponte na margem ocidental do rio Dnipro, na região de Kherson.

Embora se diga que não é uma invasão das forças russas em Kherson, a Ucrânia mantém-se cautelosa, em relação aos potenciais avanços de Moscovo. Com efeito, o exército russo avançou perto de Storozhevoye, em Donetsk, ao estabelecer um controlo com armas na estrada, entre Velikaya Novosyolka e a cidade de Gulyaypole, na região de Zaporijjia, como informou Vladimir Rogov, membro da Câmara Pública Russa, à agência de notícias Tass.

Enquanto as tropas de Moscovo progridem, os Estados Unidos da América (EUA) atribuem mais de 250 milhões de dólares, através da Lei de Produção de Defesa (DPA), para aumentar a produção de mísseis, parte da qual contribuirá para programas de assistência militar à Ucrânia, como informou o Pentágono, a 23 de dezembro. Entretanto, a Ucrânia recebeu mil milhões de dólares do Reino Unido e do Japão, através do programa DPL do Banco Mundial (BM). E a Itália manifestou intenções de alargar o apoio militar a Kiev, até 2025. Os fundos provindos do BM e da Itália serão utilizados para causas sociais e para reforço da economia de Kiev.

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De acordo com informação da Reuters, fiéis ucranianos participavam numa missa na catedral de St. Michael em Kiev, na véspera de Natal, quando foram surpreendidos por sirenes que alertavam a população sobre um possível ataque aéreo.

A maioria dos Ucranianos é ortodoxa, mas a principal Igreja do país concordou, em descartar, em 2024, o 7 de janeiro como o dia do Natal – trocando-o pelo 25 de dezembro. Para muitos fiéis, celebrar o 25 de dezembro significa unir-se ao Ocidente e distanciar-se da Rússia.

Na cidade de Kryvyi Rih, no centro da Ucrânia, uma pessoa morreu e outras 15 ficaram feridas após um ataque com mísseis balísticos atingir um prédio residencial, o que mostra que Moscovo está a pressionar a linha de frente de mil quilómetros ao longo do Leste e do Sul da Ucrânia, quase três anos após a invasão em larga escala (fevereiro de 2022), quando entrou no território por três frentes: a fronteira russa, a Crimeia e a Bielorrússia, país forte aliado do Kremlin. Forças leais a Vladimir Putin conseguiram avanços significativos, nos primeiros dias, mas a Ucrânia conseguiu manter o controlo de Kiev, ainda que a cidade tenha sido atacada. A invasão foi criticada internacionalmente e o Kremlin foi alvo de sanções económicas por parte do Ocidente.

Em outubro de 2024, após milhares de mortos, a guerra entrou no momento mais perigoso até então. As tensões elevaram-se quando o presidente russo ordenou o uso de um míssil hipersónico de alcance intermédio num ataque em solo ucraniano, carregando ogivas convencionais, mas capaz de levar material nuclear. O lançamento aconteceu após ofensiva da Ucrânia no território russo, usando armamentos fabricados por potências ocidentais (EUA, Reino Unido e França).

A inteligência ocidental denuncia que a Rússia usa tropas da Coreia do Norte na Ucrânia, o que não é negado, nem confirmado por Moscovo e por Pyongyang.

Putin, que substituiu o ministro da Defesa em maio, disse, embora sem detalhes, que as forças russas avançam muito mais efetivamente e que a Rússia atingirá todos os objetivos na Ucrânia.

Volodymyr Zelensky, segundo o qual morreram três mil militares ucranianos, disse acreditar que os principais objetivos de Putin são ocupar toda a região de Donbass, abrangendo as regiões de Donetsk e de Luhansk, e expulsar as tropas ucranianas da região de Kursk, na Rússia, partes das quais controlam, desde agosto. 

Vários mísseis balísticos e drones russos foram lançados, na manhã do dia de Natal sobre alguns pontos-chave na Ucrânia, como um complexo energético na região de Kharkiv, onde cerca de meio milhão de Ucranianos ficou sem eletricidade, o que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskiy, considera um ataque “desumano”. “Putin escolheu, deliberadamente, o dia de Natal para atacar. O que poderia ser mais desumano? Mais de 70 mísseis, incluindo mísseis balísticos e mais de cem drones”, disse Zelenskyy na rede social Telegram, acrescentando que as tropas ucranianas derrubaram mais de 50 mísseis, durante o ataque.

O ministério da Defesa russo reagiu à ofensiva, em comunicado, confirmando que as forças armadas “lançaram um ataque massivo com armas de precisão de longo alcance e ataques de drones contra instalações críticas da Ucrânia, que apoiam o trabalho do complexo militar-industrial”, tendo o objetivo sido alcançado, pois “todas as instalações foram atingidas”.

Na rede social X, Maxim Timchenko, CEO da DTEK, a maior empresa privada de energia da Ucrânia, cujo equipamento foi danificado, escreveu que “negar eletricidade e aquecimento a milhões de pessoas, enquanto celebram o Natal, é um ato depravado que deve ter resposta”. E a embaixadora dos EUA na Ucrânia, Bridget Brink, comentou o ataque da Rússia, dizendo que “o presente de Natal da Rússia para a Ucrânia: mais de 70 mísseis e 100 drones, dirigidos às famílias ucranianas que celebram nas suas casas. A Rússia faz do inverno uma arma”.

Na sequência dos ataques, quatro pessoas morreram e cinco ficaram feridas na cidade de Lgov.

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Como é possível um Natal de paz e de proximidade estar envolto em tantas guerras e com tanta gente fora das famílias? E o tempo messiânico foi inaugurado há 2024 anos!

2024.12.25 – Louro de Carvalho

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