domingo, 8 de dezembro de 2024

São Nicolau nas origens do Pai Natal

 

Consta que uma professora de crianças de tenra idade fora despedida, no Reino Unido, por ter dito às criancinhas que o Pai Natal não existe, o que lhes terá causado forte sentimento de desilusão.

Também há quem diga que mulheres louras inteligentes, homens carinhosos e Pai Natal são elementos de ficção. Não é bem assim. As mulheres não têm inteligência dependente da cor da pele ou dos olhos; os homens são dotados de sentimentos diversos com as mulheres, embora os possam exprimir de maneiras diferentes; e o Pai Natal tem a sua origem histórico-lendária.   

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A 6 de dezembro, celebrou-se a memória litúrgica de São Nicolau, que é festa em alguns lugares do Mundo – católico e ortodoxo. Comemora-se o dia em que o santo faleceu, em 343 (há quem diga 345 e 352). Contudo, para os eslavos orientais e para o povo de Bari, na Itália, também o dia 9 de maio é de festa em honra de São Nicolau.   

Embora não se saiba muito sobre a História de São Nicolau, que foi bispo de Mira, cidade grega da Anatólia, que hoje faz parte do território da Turquia, no século IV, há muitas histórias que explicam a sua fama de homem justo e íntegro, caridoso e operador de milagres.

Uma lenda diz que, durante uma fome em Mira, três crianças foram mortas e os seus corpos foram colocados, em sal, dentro de um barril de madeira para serem vendidas “presunto”. Por milagre do bispo, as crianças ressuscitaram e foram salvas.

A lenda tornou-se objeto de muitas representações de São Nicolau na arte, especialmente, durante a Idade Média. Algumas pessoas acreditam que as representações do bispo de Mira com as três crianças lhe deram a fama de protetor das crianças.

São Nicolau é figura unificadora entre cristãos católicos e cristãos ortodoxos, pois ambos o veneram. Na Igreja Ortodoxa Russa é conhecido como São Nicolau, o Taumaturgo, devido aos muitos milagres que lhe são atribuídos durante a vida e depois da sua morte. Os Ortodoxos entendem que são Nicolau deve ser homenageado, principalmente, pelas suas qualidades de santo bispo e de bom pastor do seu povo. E, no ciclo litúrgico semanal dos Ortodoxos, que dedica diferentes dias da semana a Jesus Cristo e a outros santos, só três são nomeados pelo nome: Maria Mãe de Deus, João, o Precursor (conhecido pelos católicos como João Batista) e Nicolau.

São Nicolau não deixou nenhum escrito teológico, mas, quando foi nomeado bispo, foi-lhe atribuído o crédito de ter dito que “esta dignidade e este ofício requerem um uso diferente, de modo que não se viva mais para si, mas para os outros”.

Devido à sua popularidade entre os cristãos ortodoxos, São Nicolau é um dos temas favoritos na iconografia. Entre as centenas de ícones que o representam, não há uma covinha na bochecha ou uma “barriga redonda” como no Pai Natal, mas tem uma barba branca.

Uma das lendas mais populares sobre Nicolau é que o santo, que dizem provir de uma família rica, ajudou secretamente um homem pobre que tinha três filhas. O pai não podia dar o dote adequado para as meninas se casarem e, sem maridos para sustentá-las, poderiam ser forçadas a dedicar-se à prostituição. Ao saber da situação, Nicolau enfiou, secretamente, pela chaminé, uma bolsa de moedas de ouro pela janela da família, enquanto eles dormiam. E a filha mais velha pôde casar. A mesma coisa sucedeu com a segunda. Porém, quando deixou uma segunda bolsa de moedas para a terceira filha, o pai, que havia passado a noite toda acordado, flagrou Nicolau com as “mãos na massa” a distribuir presentes, mas o bispo fê-lo prometer guardar segredo.

É provável que seja essa história que tenha inspirado a lenda do Pai Natal, de entregar presentes durante a noite.

Nas obras de arte de São Nicolau que aludem à lenda, as três bolsas de moedas são frequentemente representadas como três bolas douradas. As imagens de bolas douradas também foram usadas para marcar estabelecimentos de penhores ou de empréstimo. Provavelmente por isso é que Nicolau chegou a ser padroeiro dos agiotas.

Um dos muitos milagres atribuídos a são Nicolau ocorreu no mar, durante uma viagem a bordo de um navio para a Terra Santa. Nicolau é o santo padroeiro dos marinheiros e viajantes, porque acalmou as águas tempestuosas que ameaçavam suas vidas, como se verá mais adiante.

Ser padroeiro dos acusados ​​falsamente pode ser atribuído a uma história em que Nicolau resgata três homens inocentes momentos antes da sua execução. O então bispo de Mira empurrou corajosamente a espada do carrasco, libertou os homens das suas correntes e repreendeu um juiz que havia aceitado suborno para os condenar. Porém, o que mais assinala a vida caritativa do santo é a entrega anónima de presentes a crianças necessitadas e, obviamente, nas festas, entre as quais ganha relevo a do Natal, até por cair em época de frio na Europa.

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O Pai Natal é uma das personagens mais emblemáticas das festas de final de ano. Nas últimas décadas, ganhou tanta fama e tornou-se tão eficaz para representar a diversão e os presentes que desvia o foco da verdadeira razão da alegria: Jesus que nasce em Belém. De acordo com vários historiadores, Pai Natal é a distorção – primeiro, literária e, depois, comercial – de São Nicolau, o generoso bispo de Mira, padroeiro das crianças, dos marinheiros e dos cativos.

Porém, há diferenças entre o Pai Natal e o santo bispo de Mira. E as principais são, de acordo com o ‘St. Nicholas Center’: o Pai Natal está associado à infância, enquanto São Nicolau é modelo de cristão para toda a vida; o Pai Natal, como o conhecemos, surgiu para aumentar as vendas e a mensagem comercial do Natal, ao passo que São Nicolau levou a mensagem de Cristo e a paz, a bondade e a mensagem cristã de esperança que o Natal traz; o Pai Natal incentiva o consumo, enquanto São Nicolau promove a compaixão e a partilha; o Pai Natal aparece, a cada ano, para ser visto ou sentido, por um curto período de tempo, ao passo que São Nicolau é parte da comunhão dos santos e nossa, pela oração e pelo testemunho; o Pai Natal “voa” pelos ares, vindo do Polo Norte, mas São Nicolau caminhou pela Terra, preocupando-se com os mais necessitados e ajudando-os; e, enquanto o Pai Natal, para alguns, substitui o Menino de Belém, São Nicolau assinala o Menino de Belém e conduz todos a Ele.

Há várias teorias sobre a origem da vulgarização do Pai Natal, para lá da que remonta a São Nicolau. A mais difundida é que foi a empresa Coca-Cola que inventou a personagem para promover o consumo de sua bebida, em 1920. Porém, já no século XIX, escritores de Nova Iorque tentaram dar um selo nacional às festas de Natal cheias de tradições cristãs dos migrantes europeus. Em pouco tempo, as celebrações deixaram de lado o caráter santo desta data e tornaram-se populares, desenfreadas, com bebedeiras e desordem pública.

Em 1821, foi publicado o livro de litografias para crianças “Pai Natal, o amigo das crianças”, no qual se apresentava uma personagem que chegava do Norte num trenó com renas e a voar. Esta publicação fez com a personagem aparecesse a cada véspera de Natal e não a 6 de dezembro, dia da festa do santo bispo. Um poema anónimo e as ilustrações dessa publicação tornaram-se a chave para a distorção de São Nicolau.

Segundo especialistas do ‘St. Nicholas Center’, foi a elite de Nova Iorque que conseguiu nacionalizar o Natal, através do Pai Natal e do apoio de artistas e de escritores como, Washington Irving, John Pintard e Clement Clarke Moore. Em 1863, durante a Guerra Civil, o caricaturista político Thomas Nast começou a desenhar o Pai Natal com os traços que agora se lhe atribuem: gorro vermelho, barba branca e barriga saliente. Junto com as mudanças de aparência, o nome do santo em inglês mudou para Santa Claus, alteração fonética do alemão “Sankt Niklaus”. Apenas em 1920, o Pai Natal apareceu pela primeira vez em um anúncio da Coca-Cola.

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“Seria um pecado não repartir muito, sendo que Deus nos dá tanto”, costumava dizer são Nicolau, padroeiro das crianças, das moças solteiras, dos marinheiros, dos viajantes, dos agiotas, dos acusados injustamente, da Rússia, da Grécia e da Turquia.

Por se tratar de um santo dos primeiros séculos, pouco se sabe com exatidão a respeito dele, salvo que nasceu na Licia, na Anatólia (atual Turquia), numa família muito rica. Tinha um tio bispo que o ordenou sacerdote. Os seus pais morreram a ajudar os doentes de uma epidemia e deixaram uma fortuna para Nicolau. Entretanto, o jovem decidiu reparti-la pelos pobres e tornar-se monge. Mais tarde, peregrinou ao Egito e à Palestina, onde conheceu a Terra Santa. De retorno, chegou à cidade de Mira, na Turquia, onde os bispos e sacerdotes discutiam, no templo, sobre quem devia ser eleito novo Bispo da cidade. Ao final, decidiram que seria o próximo sacerdote que ingressasse no recinto. Nesse momento, são Nicolau entrou e foi eleito bispo por aclamação de todos.

Porém, teve início uma perseguição promovida pelo imperador Diocleciano contra os cristãos e ele foi preso, sendo libertado, apenas quando o imperador Constantino subiu ao trono.

“Graças aos ensinamentos de Nicolau, a metrópole de Mira foi a única que não se contaminou com a heresia ariana, que a rejeitou firmemente, como se fosse um veneno mortal”, dizia são Metódio. O arianismo negava a divindade de Jesus Cristo. Todavia, São Nicolau combateu incansavelmente o paganismo, tal como o fizera Santo Atanásio.

Defensor da justiça, salvou três jovens de serem executados, vítimas de um suborno do governador Eustácio, que logo se arrependeu, ao ser repreendido por são Nicolau. Três oficiais foram testemunhas destes factos e, posteriormente, quando estavam em perigo de morte, rezaram a São Nicolau. O santo apareceu em sonhos a Constantino e ordenou-lhe que os libertasse, porque eram inocentes. Após os soldados dizerem ao imperador que tinham invocado São Nicolau, ele libertou-os, com uma carta ao bispo, em que lhe pedia que rezasse pela paz no Mundo.

O santo é patrono dos marinheiros porque, no meio de uma tempestade, alguns marinheiros começaram a clamar: “Oh Deus, pelas orações do nosso bom bispo Nicolau, salva-nos”. Então, pairou São Nicolau sobre o navio, abençoou o mar, que se acalmou. Depois, o bispo desapareceu.

Segundo o costume do Oriente, os marinheiros dos mares Egeu e do Jónico têm uma “estrela de são Nicolau” e desejam boa viagem dizendo: “Que São Nicolau leve o teu leme”.

São Nicolau morreu a 6 de dezembro, mas não sabe com exatidão se foi no ano 345 ou 352. Mais tarde, a sua devoção aumentou e foram reportados inúmeros milagres. No século VI, o imperador Justiniano construiu uma Igreja em Constantinopla (hoje, Istambul) em sua honra e o santo tornou-se popular em todo o Mundo.

São Nicolau é, como ficou dito, patrono da Rússia, Grécia e Turquia. Além disso, é honrado em cidades da Itália, da Holanda, da Suíça, da Alemanha, da Áustria e da Bélgica.

Em 1087 os seus ossos foram resgatados de Mira, que já estava sob domínio dos muçulmanos, e levados para Bari, na costa da Itália. Por isso, é chamado são Nicolau de Mira ou são Nicolau de Bari. As suas relíquias repousam na Igreja de “San Nicola de Bari”, na Itália.

Dos seus restos mortais brota um azeite conhecido como o “Manna di S. Nicola”. Em Mira, dizia-se que “o venerável corpo do bispo, embalsamado no azeite da virtude, suava uma suave mirra que lhe preservava da corrupção e curava os doentes, para glória d’ Aquele que tinha glorificado Jesus Cristo, nosso verdadeiro Deus”.

A sua figura bondosa e caridosa passou a ser associada, em muitos lugares, à figura do Pai Natal nos países latinos, que traz presentes para as crianças na Noite de Natal. Na Alemanha, é Nikolaus, e nos países anglo-saxões, Santa Claus. Neste período, o simbolismo deve remeter para São Nicolau e, assim, recordar a todos o amor e a caridade para com as crianças e para com os mais pobres, além da alegria de servir a Deus.

2024.12.08 – Louro de Carvalho

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