De acordo com a agência
noticiosa alemã DPA, na noite de 20 de dezembro, um carro
atropelou, deliberadamente, um grupo de pessoas num mercado de Natal ao ar
livre, cheio de visitantes, em Magdeburgo,
cidade do Leste da Alemanha,
estando o caso a ser tratado de terrorismo pelas autoridades, que detiveram o
condutor. As primeiras informações davam conta de que havia, pelo menos, um
morto, assim como um número indeterminado de feridos.
O ataque aconteceu
um dia após o 8.º aniversário do ataque no mercado de Natal de Berlim, quando
um extremista islâmico atropelou um grupo, fazendo 13 mortos e muitos feridos.
Magdeburgo,
cidade a Oeste de Berlim, capital deste estado, tem cerca de 240 mil habitantes.
Testemunhas
declararam que o carro acelerou em direção à multidão que estava no mercado de
Natal e atropelou, deliberadamente, um grupo significativo de pessoas. E, segundo
o jornal alemão BILD, o condutor, que
foi detido, é um homem de 50 anos, originário da Arábia Saudita.
O mercado
foi encerrado pela polícia e os frequentadores aconselhados a deixar o centro
da cidade. “O que aconteceu é uma tragédia a poucos dias do Natal”, disse o
ministro-presidente da Saxónia-Anhalt, Reiner Haseloff, citado pelo jornal The Guardian.
A ministra
do Interior, Nancy Faeser, tinha dito não haver indicações de possíveis ataques
nos mercados de Natal este ano, mas que é melhor manter alguma vigilância.
O Chanceler
Olaf Scholz publicou no X: “Os meus
pensamentos estão com as vítimas e os seus familiares. Estamos ao seu lado e ao
lado do povo de Magdeburgo.”
A presidente
da Comissão Europeia e o secretário-geral da Organização do Tratado do
Atlântico Norte (NATO) também expressaram as suas condolências no X.
“Os meus
pensamentos estão hoje com as vítimas do ataque brutal e cobarde em Magdeburgo.
Este ato de violência deve ser investigado e severamente punido”, escreveu a
presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
“Cenas
horríveis de um mercado de Natal em Magdeburgo”, escreveu o secretário-geral da
NATO, Mark Rutte, garantindo: “A NATO está ao lado da Alemanha.”
A presidente
da Câmara de Magdeburgo, Simone Borris, disse que as autoridades planearam
organizar um memorial na catedral da cidade, no dia 21.
***
Entretanto,
a 21 de dezembro, as autoridades governamentais, que já tinham alertado para a possibilidade
de mais mortes, confirmaram o número de cinco mortos (as duas primeiras mortes confirmadas
eram um adulto e uma criança). E a agência
de notícias DPA avançava que o número
de feridos graves subiu para 41, contabilizando-se um total de 200 feridos.
O condutor
foi detido no local, pouco depois de o carro ter entrado de rompante no
mercado, por volta das 19h00 locais (18 horas em Lisboa). Imagens verificadas
de transeuntes, publicadas pela agência noticiosa alemã DPA, mostram a detenção do suspeito num passadiço no meio da
estrada. O polícia que se encontrava nas proximidades, apontando uma pistola ao
homem, gritou-lhe, enquanto este estava deitado de bruços. Rapidamente chegaram
outros agentes para o deter.
Numa
conferência de imprensa, Tamara Zieschang, ministra do Interior do Estado da
Saxónia-Anhalt, revelou que o suspeito é um médico saudita de 50 anos que se
mudou para a Alemanha em 2006. Tem exercido medicina em Bernburg, cerca de 40
quilómetros a Sul de Magdeburgo.
“Até ao
momento, trata-se de um criminoso solitário, pelo que, tanto quanto sabemos, não
há mais perigo para a cidade”, disse aos jornalistas o governador da
Saxónia-Anhalt, Reiner Haseloff, vincando: “Cada vida humana que foi vítima
deste ataque é uma tragédia terrível e uma vida humana a mais.”
O incidente
violento, que podia ter sido evitado, segundo alguns, chocou a cidade, levando
o presidente da Câmara à beira das lágrimas, pois estragou um evento festivo
que faz parte de uma tradição alemã secular, e levou várias outras cidades
alemãs a cancelar os seus mercados de Natal do fim de semana, por precaução e
em solidariedade com a perda de Magdeburgo.
Os mercados
de Natal são parte importante da cultura alemã, sendo tradição festiva anual
acarinhada desde a Idade Média e exportada, com sucesso, para grande parte do Mundo
ocidental.
***
As
autoridades detiveram o condutor no local do acidente e levaram-no sob custódia
para interrogatório e confirmaram que se trata de um cidadão saudita que vive
na Alemanha há quase 20 anos e trabalha como médico. Vários meios de
comunicação social alemães identificaram o suspeito como Taleb A., ocultando o
seu nome completo, devido a normas de proteção da vida privada. Os relatórios
indicam ainda que é um especialista em Psiquiatria e em Psicoterapia.
Ainda não
foi apurado o motivo que levou o suspeito a dirigir um automóvel contra a multidão
num mercado de Natal. Entretanto, o alegado autor do crime tem vindo a
partilhar opiniões islamofóbicas na Internet,
há vários anos.:01
Numa
entrevista ao FAZ, em 2019, Taleb Abdulmohsen descreveu-se a si próprio como “o
crítico mais agressivo do Islão na História”.
Fundou uma
plataforma na Internet para ajudar
cidadãos da Arábia Saudita a pedir asilo na Alemanha, alegando que o Estado
estava a dar asilo a “jihadistas sírios”. E acusou as autoridades alemãs de não
estarem a tratar adequadamente aquilo a que chamou o “islamismo da Europa”. Foi
também descrito como um ativista que ajudou mulheres sauditas a fugir do seu
país.
Taleb A.
manifestou, publicamente, o seu
apoio ao partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD) e,
recentemente, pareceu concentrar-se na teoria segundo a qual as autoridades
alemãs estariam a visar os requerentes de asilo sauditas.
Peter
Neumann, especialista alemão em terrorismo, comentou o perfil invulgar do suspeito.
“Depois de 25 anos neste ‘negócio, pensa-se que já nada nos pode surpreender.
Mas um saudita ex-muçulmano de 50 anos que vive na Alemanha de Leste, adora o
AfD e quer castigar a Alemanha pela sua tolerância para com os islamitas – isso
não estava no meu radar”, disse Neumann, diretor do Centro Internacional para o
Estudo da Radicalização e da Violência Política do King's College, em Londres.
Taleb A.
vive na Alemanha, desde 2006, e reside na Saxónia-Anhalt, o estado federado
onde se situa Magdeburgo, confirmou o governador do estado, Reiner Haseloff.
Nascido na
cidade saudita de Hofuf em 1974, Taleb terá saído da Arábia Saudita para
escapar às restrições impostas pelo país, por considerar impossível exprimir
abertamente as opiniões ateias numa nação onde o Islão é a única religião
legalmente reconhecida, segundo a BBC.
O Ministério
dos Negócios Estrangeiros da Arábia Saudita condenou, na rede X, o ataque, mas ainda não mencionou as
ligações do suspeito ao reino.
A Arábia
Saudita terá acusado Taleb A. de alegado terrorismo e de facilitar o
contrabando de mulheres dos países do Golfo para a Europa. Apesar destas
alegações, a Alemanha concedeu-lhe asilo, em 2016, e recusou-se a extraditá-lo
para a Arábia Saudita.
No entanto,
apesar das manifestas simpatias do suspeito pelo AfD, o partido convocou uma
grande manifestação na sequência do ataque a um mercado de Natal em Magdeburgo,
que deu azo à morte de várias pessoas e a centenas de feridos.
Num memorial
às vítimas, o colíder da AfD, Tino Chrupalla, apelou à ministra do Interior,
Nancy Faeser, para que tomasse medidas mais firmes para garantir a segurança
dos cidadãos alemães.
“Estou a
exigir respostas à ministra do Interior: O que é que se passa realmente neste
país? O que está realmente a acontecer neste país? Aguentamos isto, semana após
semana, aguentamos os ataques, aguentamos os assassínios do nosso próprio povo?
Isto tem de ser esclarecido agora, e estas frases dos políticos de que as
coisas não podem continuar assim, que voltei a ouvir hoje, são de facto
perturbadoras”, disse Chrupalla à imprensa no local.
Segundo
vários observadores, o ataque foi objeto de alguns pré-avisos.
No
X, o próprio suspeito declarou que “o projeto secreto e criminoso de Merkel é
islamizar a Europa”. Lamentou que a pena de morte já não exista. E escreveu,
ainda, em Inglês: “Mas se a pena de morte for reintroduzida, merece ser morta.
Também é um sinal de radicalização.”
De
acordo com as agências noticiosas alemãs, houve também vários avisos às
autoridades alemãs. A revista Spiegel
refere um total de três avisos enviados à Alemanha, a partir de Riade, a
capital da Arábia Saudita. O conteúdo exato destes avisos ainda não é
conhecido, apenas se sabe que se referiam às opiniões extremistas do homem. E,
no dia D, um editor do Die Welt partilhou
um e-mail em que uma mulher da Arábia
Saudita queria avisar as autoridades alemãs. No entanto, o e-mail não foi enviado para a polícia de Berlim, mas para uma
esquadra da comunidade de 7500 habitantes de Berlim, em Nova Jersey, nos EUA.
Há também relatos, no X, de que a
mulher terá tentado, em vão, contactar o Gabinete Federal para a Migração e os
Refugiados (BAMF).
Taleb A. era
conhecido das autoridades alemãs. Em 4 de setembro de 2013, o tribunal
distrital de Rostock condenou-o a 90 dias de prisão, alegando que perturbara “a
paz pública, através da ameaça de infrações penais”. “Foi feita uma tentativa, há um ano, de realizar um endereço de perigo”,
disse Tom-Oliver Langhans, diretor da Polícia de Magdeburgo, em conferência de
imprensa no dia 20. Na altura, a polícia não quis fornecer quaisquer pormenores
sobre a razão para tal – ou porque é que o discurso acabou por não se realizar.
Um
“Gefährderansprache” é um aviso verbal dado pela polícia a alguém que pode
representar um perigo para os outros. O objetivo é transmitir que a pessoa está
sob observação especial e que, por isso, deve contar com um risco acrescido de
ser detetada, quando comete delitos.
Em
13 de agosto deste ano, o suspeito publicou, em Árabe, no seu perfil do X: “Garanto-vos: Se a Alemanha quiser
guerra, tê-la-emos. Se a Alemanha nos quiser matar, nós massacramo-los,
morremos ou vamos para a prisão com orgulho.”
Se
as fantasias violentas deste homem tivessem sido levadas a sério, que medidas
poderiam ter sido tomadas para evitar o crime? De acordo com o direito penal
alemão, o legislador não reconhece a ameaça de violência como infração penal
autónoma, mas ela é punível como coação com uma multa ou, em alternativa, com
uma pena de prisão máxima de três anos.
Devido
ao aumento do risco de ataques nos últimos anos, os locais públicos nas cidades
alemãs foram protegidos com pilaretes e com barreiras. Porém, há corredores de
salvamento, e foram esses caminhos que Taleb A. utilizou. As entradas dos corredores de fuga e de salvamento são,
normalmente, vigiadas por veículos da polícia. Segundo a polícia, o autor do
crime não foi mandado parar, porque se comportou de forma discreta e conduziu
dentro do limite de velocidade normal da zona 30. Nenhum dos polícias presentes
esperava que ele acelerasse de repente e fosse contra a multidão. E, de acordo com o diretor da polícia de Magdeburgo,
Tom-Oliver Langhans, o tumulto começou às 19h02. Às 19h05, o homem foi mandado
parar pela polícia e detido. Três minutos em que percorreu 400 metros, matando
cinco pessoas e ferindo 200, algumas (41) delas com gravidade.
Entretanto,
o chanceler alemão, em visita ao local, apelou à união de todos.
***
Não há
segurança absoluta. Os atacantes sabem simular. E os governos, parecendo não
conhecer a realidade dos seus territórios, não têm detentores dos cargos à
altura das responsabilidades. Será esta a União Europeia (UE) que desejamos, em
vez da livre, segura e democrática?
2024.12.21 – Louro de Carvalho
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