quinta-feira, 16 de maio de 2024

Novo Aeroporto de Lisboa situar-se-á no Campo de Tiro de Alcochete

 

O anúncio chegou aos Portugueses, com pompa e circunstância, a 14 de maio, pela voz de Luís Montenegro Cardoso de Morais Esteves, o primeiro-ministro (PM) do XXIV Governo Constitucional, apoiado, na Assembleia da República (AR) pela Aliança Democrática (AD).

Com efeito, naquele dia, em sua reunião, na Residência Oficial do Primeiro-Ministro, o Conselho de Ministros (CM) aprovou três Resoluções do Conselho de Ministros (RCM).

A primeira RCM determina o desenvolvimento de um novo aeroporto de Lisboa (NAL), com a designação de Aeroporto Luís de Camões, localizado no Campo de Tiro de Alcochete, de forma a substituir, integralmente, o Aeroporto Humberto Delgado (AHD), para o que deliberou mandatar “o ministro de Estado e das Finanças e o ministro das Infraestruturas e Habitação” para praticarem os atos e realizarem as diligências necessárias à sua concretização, “com a máxima celeridade, racionalidade económica e eficiência”. 

De acordo com o respetivo comunicado do CM, “a decisão fundamenta-se numa apreciação do trabalho e [das] conclusões da Comissão Técnica Independente [CTI] que estudou, de forma profunda e participada, várias alternativas de localização”. E, quanto “à designação do novo aeroporto como Luís de Camões, pretende-se homenagear uma das mais notáveis figuras da história, cultura e língua portuguesas”.

A segunda RCM contempla “várias determinações para a concretização célere e efetiva da expansão da capacidade do Aeroporto Humberto Delgado”. Assim, “determina que a ANA – Aeroportos de Portugal, SA, desenvolva o Plano de Investimentos faseado para o Aeroporto Humberto Delgado, em estreita cooperação com as demais entidades competentes, tendo em vista atingir o objetivo de 46 a 48 movimentos por hora”.

Além disso, o CM deliberou que “a Navegação Aérea de Portugal – NAV Portugal, EPE, desenvolverá um plano de expansão da capacidade do espaço aéreo de Lisboa e que a Autoridade Nacional da Avaliação [Civil] [ANAC] apresentará alternativas que permitam maior utilização do espaço ao Aeródromo de Trânsito n.º 1”.

A terceira RCM mandata as Infraestruturas de Portugal, SA (IP) para concluir os estudos relativos à concretização da Terceira Travessia do Tejo (TTT), no eixo Chelas-Barreiro, e à ligação de alta velocidade [LAV] entre Lisboa e Madrid, devendo o estudo sobre as valências e caraterísticas topológicas da TTT ser concluído até final de 2024. 

O CM deliberou que “os demais Estudos de Procura e de Resiliência às Alterações Climáticas, a Análise Custo/Benefício, o Estudo Prévio e o Estudo de Impacte Ambiental” ficarão concluídos “no primeiro semestre de 2026” e que “os estudos sobre a ligação de alta velocidade serão realizados no pressuposto de um tempo de percurso Lisboa-Elvas/Badajoz em cerca de uma hora”.

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Ao fim de 55 anos de debate, dá-se por decidido, definitivamente, que o NAL vai ser construído no Campo de Tiro de Alcochete, como a CTI tinha recomendado, e que terá o nome do poeta Luís de Camões. Assim o PM, considerando ser essa a localização “mais adequada”, declarou que o AHD será desmantelado, quando o sucessor estiver pronto. Porém, o ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, avisou que, não só o aeroporto não fica pronto antes de 2034 (e não 2030 ou 2031, como estimara a CTI), como custará mais do que os seis mil milhões de euros previstos.

Luís Montenegro também anunciou que o AHD terá obras de requalificação, de modo a permitir “maior capacidade operacional em movimentos por hora”. O governo confiou à IP a conclusão dos estudos de construção da terceira ponte sobre o Tejo (Chelas-Barreiro), bem como das linhas de alta velocidade Porto-Lisboa e Lisboa-Madrid, para que sirvam de alternativa ao transporte aéreo. Os carris da ligação à capital espanhola terão bitola ibérica.

“O governo assume o aeroporto único como a solução mais adequada aos interesses estratégicos do país”, afirmou o PM, em conferência de imprensa, e observou que Alcochete “garante margem de expansão física” da infraestrutura, permitindo que esteja apta a receber “praticamente o triplo” dos passageiros que aterram anualmente no AHD.

Além disso, frisou que Alcochete possibilita o crescimento do “hub” da TAP, além de ter a vantagem de ser construído em terrenos públicos, sem necessidade de expropriações, e lembrou que o local já teve uma declaração de impacto ambiental (DIA), entretanto caducada.

A opção Alcochete vai ao encontro da recomendação da CTI – que também tinha sugerido Vendas Novas – mas colide com a preferência da Vinci (dona da ANA), que queria o Montijo.

Todavia, após o anúncio, a ANA informou que está “inteiramente disponível para trabalhar, no imediato, nas soluções apresentadas”, pelo que “vai dar seguimento à decisão”.

Miguel Pinto Luz, contra o “enorme otimismo” da CTI, quanto aos prazos de conclusão e aos custos, disse que “não é possível” ter o novo aeroporto operacional, antes de 2034, e considerou que os seis mil milhões de euros de custo estimado pela comissão “podem não ser realistas”.

O governante, assegurando não querer “afetar, de maneira nenhuma, o Orçamento do Estado” com a construção do aeroporto, declarou: “Com a evolução dos recursos libertados pela concessão, acreditamos que é possível.”

A solução escolhida pelo governo é do agrado de quase toda a oposição. Só o PAN é contra. Pedro Nuno Santos lembrou que, há dois anos, enquanto ministro das Infraestruturas, avançou para a solução de Alcochete, num episódio que acabou por fazê-lo recuar. “Nunca tive dúvidas de que Alcochete era a melhor”. Pelo PS [Partido Socialista], é para “avançar sem demoras,”

André Ventura, do Chega, só vincou a falta de “plano detalhado sobre quando começa e quando vai acabar a obra”. Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda (BE), afirmou que Alcochete “foi sempre a decisão mais óbvia”. Para Rui Tavares, do Livre, a escolha “peca por tardia”, porque a alternativa do Montijo era pior. Segundo António Filipe, do Partido Comunista Português (PCP), foi a ação das câmaras comunistas que “impediu que se avançasse para uma solução desastrosa que era Portela+1”. A única a destoar foi Inês Sousa Real, do Partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), que não concorda com a opção: “Não tem em consideração as preocupações ambientais e com a qualidade de vida das populações.”

O ex-PM, António Costa, elogiou a decisão, que mostra a maturidade do atual executivo.

José Sócrates veio a terreiro afirmar que este governo resolveu em 30 dias o que os três anteriores não resolveram em oito anos. E lembrou que o seu governo decidiu, em 2008, pela localização do NAL em Alcochete, para o que foi elaborada uma DIA, que deixaram caducar, em dezembro de 2020, por falta de renovação, mandou fazer estudos para a TTT e começou o troço de alta velocidade Lisboa-Madrid, cujas obras foram interrompidas pela crise económico-financeira. Mais criticou o facto de alguns, que, então, criticavam tais obras como faraónicas, agora as julgam essências para o nosso país.

O presidente da Câmara Municipal de Alcochete, Fernando Pinto, ficou feliz com a escolha: “É positiva, para a minha terra e para a minha gente.” No entanto, a população da aldeia mais próxima do local do aeroporto vive uma sensação de insegurança e de incerteza.  

Para mostrar a necessidade de novo aeroporto, há um documento a referir que “só 52,5% dos aviões da Portela parte à hora prevista” e que Lisboa é “a segunda capital europeia com mais habitantes expostos a ruído aeronáutico”. O tráfego, em 2023, no AHD, foi de 33,6 milhões de passageiros, mais 7,7% do que em 2019. O governo estima que, em 2040, o número possa subir para subir para 41 a 64 milhões por ano. Após 2050, poderá, em tese, superar os 100 milhões.

A CTI ponderou 17 opções, oito das quais foram Alcochete, Vendas Novas, Portela+Alcochete, Portela+Vendas Novas, Portela+Montijo, Montijo+Portela, Santarém e Portela+Santarém.

Pinto Luz diz que a ligação Lisboa-Madrid representa, hoje, dois milhões de passageiros/dia (40 voos), ao passo que a ligação Porto-Lisboa equivale a 1,1 milhões (20 voos). O investimento nos comboios de alta velocidade junto ao novo aeroporto trará alternativas de transporte.

O tempo de viagem previsto em LAV é: de 0h50, Porto / Vigo; 1h15, Porto / Lisboa; 1h00, Lisboa / Elvas; e 3h00, Lisboa /Madrid.

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Só faltava que o governo, tendo o Partido Social Democrata (PSD) lá liderado, pelo atual PM, cooperado para a constituição da CTI, o governo não tivesse, agora, seguido a indicação técnica, a qual, embora também considerasse como boa a solução de Vendas Novas, apontava a vantagem de não ser necessário proceder à expropriação de terrenos. No entanto, há que dar a compensação adequada à Força Aérea e proceder à limpeza do campo de tiro, sobretudo no atinente a munições que por lá tenham ficado sem rebentamento.     

Designar o NAL por Luís de Camões é algo que me apraz, em razão da relevância histórica e literária do poeta épico e um dos melhores líricos da Literatura Portuguesa, o qual, assim como inúmeros Portugueses, ficou em pedaços pelo Mundo repartido. Todavia, penso que seria mais adequado dar ao NAL o nome de Mário Soares, nosso contemporâneo, que se fartou de correr Ceca e Meca, de avião, pelo nome político de Portugal, aliás um anúncio feito pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Terá sido esta a vingança de Montenegro pelo apontamento presidencial de comportamentos rurais?

Quanto ao caráter definitivo da decisão em causa, sinto-me cético. Se não, vejamos:        

Em 1969, nasce o Gabinete do Novo Aeroporto de Lisboa (GNAL), para estudar quatro localizações a sul do Tejo: Fonte da Telha, Montijo, Porto Alto e Rio Frio. E, em 1971, optou-se por Rio Frio. Porém, em 1978, é desativado o GNAL e as suas funções são integradas na ANA, que relança o processo. Cai a hipótese da Margem Sul e as atenções viram-se para a Ota, em Alenquer, de modo que, em 1999, após analisar os estudos de viabilidade económica e ambiental, o governo de António Guterres decide construir o aeroporto na Ota.

Depois de mais alguns anos de debate, em 2008, o governo de José Sócrates troca a Ota por Alcochete, mas em 2010, suspende o projeto, até que o país supere a crise financeira.

Passada, tecnicamente, a crise, em 2014, o governo de Passos Coelho volta a suspender a construção na Margem Sul e começa a falar-se na opção Portela+1.

Em 2018, António Costa defende a solução Portela+Montijo, mas algumas autarquias lideradas por elementos da Coligação Democrática Unitária (CDU) da região travam Montijo e preferem Alcochete. Em 2021, o governo e o PSD decidem as opções a estudar. Em 2022, após acordo entre o PS e o PSD, é criada a CTI, para estudar a melhor localização. Em 2023, esta conclui que Alcochete e Vendas Novas são as melhores opções. Já neste ano, o relatório final reafirma-o.

Por outro lado, o cronograma do desenvolvimento projeto é muito fragmentário, só diz respeito ao tempo de candidatura: relatório inicial (seis meses); preparação da candidatura (30 dias); relatório das consultas (seis meses); relatório sobre o local selecionado e estudo de impacto ambiental (12 meses); relatório técnico (18 meses); relatório financeiro (24 meses); e candidatura completa (36 meses). Além disso, não está corrigida a estimativa da CTI do custo de 3231 milhões de euros, para a pista 1 (em 2031), e de 2874 milhões, para a pista 2 (em 2031), num total de 6105 milhões de euros.

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Como todas as deliberações anteriores eram tidas como definitivas e não o foram, não sei se esta o será. Pelo menos, o projeto está numa fase incipiente. Nem dispõe de DIA atualizada. Por isso, não sei quando poderei ir de Metro até ao Aeroporto Francisco Sá Carneiro, viajar de avião para o Aeroporto Luís de Camões, seguir para Madrid, também de avião, e regressar, via Lisboa, em LAV, até ao Porto, voltando para casa de Metro. É difícil uma obra sair do papel, mas esta nem no papel está. E este governo, altamente minoritário, não estará a contar com um milagre!

2024.05.16 – Louro de Carvalho

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