quarta-feira, 29 de maio de 2024

Megaplano para proteger fronteira com a Rússia e a Bielorrússia

 

O conflito bélico em curso na Ucrânia, desde a invasão russa, a 24 de fevereiro de 2024, tem vindo a mobilizar a solidariedade dos países do chamado Ocidente e, em particular, os países que fazem fronteira com a Rússia, entre os quais se destaca a Polónia, que se mostra altamente preocupada com o seu futuro.

Assim, a 18 de maio, em Cracóvia, o primeiro-ministro polaco, Donald Tusk, anunciou um megaplano para reforço da fronteira com a Rússia e com a Bielorrússia. “A Polónia está a investir cerca de 10 mil milhões de zlotys [cerca de 2,5 mil milhões de dólares ou 2,2 mil milhões de euros], para aumentar a segurança e a dissuasão ao longo da fronteira com a Rússia e [com] a Bielorrússia”, revelou o chefe do governo, vincando que o projeto Shield-East, que inclui a construção de fortificações militares, começara. E, salientando a posição estratégica da Polónia no flanco oriental da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e da União Europeia (UE), destacou a responsabilidade do país pela segurança da Europa.

“Tomámos a decisão de investir na nossa segurança e, em primeiro lugar, numa fronteira oriental segura, cerca de 10 mil milhões de zlotys [2,2 mil milhões de euros]”, afirmou, explicando que o projeto implica a construção de uma fronteira fortificada e ambientalmente modificada, para garantir a sua impenetrabilidade por potenciais inimigos. “Iniciámos estes trabalhos para tornar a fronteira da Polónia segura em tempos de paz e impenetrável para o inimigo em tempos de guerra”, acrescentou.

Falando às tropas polacas em Cracóvia, onde assinalou o 80.º aniversário da vitória dos Aliados na Batalha de Monte Cassino, durante a Segunda Guerra Mundial, o primeiro-ministro polaco declarou que a Polónia é um país seguro e impenetrável para o inimigo em tempo de guerra.

O anterior governo de direita da Polónia construiu um muro de 367 milhões de euros ao longo da fronteira com a Bielorrússia, para travar o afluxo maciço de migrantes, em 2021. Agora, o atual governo pró-UE considera que é também necessário um maior reforço na segurança e garante que a Polónia continua a ser um forte aliado da Ucrânia na sua defesa contra a invasão da Rússia.

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Na sequência desta comunicação do chefe do executivo, a 27 de maio, o ministro da Defesa polaco, Wladyslaw Kosiniak-Kamysz, ao pormenorizar ao megaplano, disse que se trata do maior programa de reforço do flanco oriental da NATO, desde 1945. Custará mais de 2 mil milhões de euros e deverá ser aplicado ao longo dos 700 quilómetros de fronteira com a Rússia e Bielorrússia, até 2028, para reforçar as capacidades de defesa militar da Polónia, aumentando a segurança das fronteiras com a Rússia e com a Bielorrússia. Assim, juntamente com a Aliança Atlântica, Varsóvia vai reforçar a vigilância antidrone, bem como as fortificações e barreiras no terreno.

“Nenhum país deve ter ilusões de que não defenderemos cada centímetro da nossa pátria e que estamos preparados para o fazer. Vamos implementar esta estratégia de dissuasão e defesa da NATO com todo o escrúpulo”, garantiu o ministro da Defesa polaco.

O pacote de medidas, denominado “Escudo Leste, um programa faz parte de uma infraestrutura de defesa regional conjunta com os Estados bálticos – a Lituânia, a Letónia e a Estónia –, será implementado ao longo dos 700 quilómetros de fronteira com a Rússia e a Bielorrússia e deverá ser aplicado até 2028. “É a utilização de tecnologia de ponta para a segurança e a construção de novas infraestruturas no Leste da Polónia”, sublinhou Kosiniak-Kamysz.

A Polónia, um dos países que mais se manifestaram contra a invasão da Ucrânia pela Rússia, diz estar a ser alvo de ações hostis da parte de Moscovo (Rússia) e de Minsk (Bielorrússia). Segundo as autoridades polacas, isso inclui ciberataquestentativas de fogo posto e desvio de migrantes que atravessam ilegalmente a fronteira. Varsóvia acusa a Rússia e a Bielorrússia de tentarem desestabilizar a UE, através de um dos membros dos 27.

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A preocupação espelhada nas comunicações em referência já não é de agora. A perpetuação da guerra na Ucrânia, com avanços, com recuos e com impasses, e as incertezas sobre o financiamento da NATO pelos Estados Unidos da América (EUA) reacenderam o debate sobre a capacidade da Europa para assegurar a sua própria defesa.

No dia 22 de abril, cerca de mil soldados de sete países europeus e dos EUA participaram num exercício defensivo da NATO, a 80 quilómetros a Sul do enclave russo de Kaliningrado (a antiga cidade de Könisberg – montanha do rei –, fundada em 1255, pelos cavaleiros teutónicos e que, em 1945, passou, com a região adjacente, a pertencer à então União Soviética).

O objetivo do exercício foi testar a interoperabilidade das forças e faz parte da operação “Steadfast Defender 2024”, a maior série de manobras da Aliança Atlântica desde o fim da Guerra Fria. “Em conformidade com o nosso plano regional, estamos a exercer a defesa do flanco oriental da Europa”, dizia o general Krzysztof Król, conselheiro do chefe do Estado-Maior do Exército Polaco, na ocasião.

O posto fronteiriço de Goldap, situado a dois quilómetros do enclave russo de Kaliningrado, está fechado desde o início da invasão russa da Ucrânia. A proximidade das forças da NATO é um elemento tranquilizador, mas os habitantes querem estar preparados para qualquer eventualidade.

Piotr Bartoszuk, diretor de uma escola secundária profissional em Goldap, na sala de tiro virtual instalada na cave da escola, revelou que a formação militar, subsidiada pelo Ministério da Defesa, passou a integrar o currículo, a partir deste ano. “Estamos a fazer tudo para preparar a nossa sociedade para se defender, em caso de ataque”, afiançou Bartoszuk.

“A lei da defesa civil que está a ser processada na Polónia exige que eduquemos as pessoas e que construamos abrigos e sistemas de alerta na Polónia. Quer se trate de um cenário de ficção científica em que Putin nos vai atacar, quer não, é bom estarmos preparados”, disse o diretor da referida escola polaca.

A Polónia é o maior contribuinte europeu de ajuda militar à Ucrânia e tem vindo a exortar os seus parceiros da UE a intensificarem o apoio à Ucrânia e a aumentarem os orçamentos de defesa.

 

Sobre a atual situação, o vice-ministro polaco da Defesa, Cezary Tomczyk, admitiu: “Nunca tivemos uma sensação tão grande de ameaça imediata. Se não pararmos esta guerra feroz que está a acontecer nas fronteiras da Polónia, da Lituânia, da Letónia e da Estónia, poderemos, em breve, enfrentar uma ameaça muito maior. E é uma ameaça para todos os países europeus.”

Depois, comentou: “A União Europeia é a maior economia do mundo, atualmente. Somos capazes de construir as capacidades que permitirão à Europa ser uma zona segura e não olhar para o Mundo para o fazer.”

Atualmente, 80% das aquisições de armas provêm de fora da Europa, 60% das quais dos EUA.

Em março último, a Comissão Europeia propôs uma nova estratégia destinada a reforçar a indústria de defesa da UE.

Para o especialista em defesa Łukasz Maślanka, do Centro de Estudos Orientais de Varsóvia, as ambições da UE são demasiado modestas e “perigosamente lentas” na sua concretização. Com efeito, ouvimos da França, da Itália e da Alemanha, palavras sobre a defesa europeia, mas, na perspetiva de Łukasz Maślanka, “essas palavras não são seguidas de atos”.

“Hoje, não nos parece provável que Putin comece outra guerra com um país da NATO. Mas quem sabe o que acontecerá daqui a dois anos? Não sabemos quem será o presidente dos Estados Unidos, ou se não haverá um governo populista num país europeu importante, o que poderia dificultar os esforços europeus para contrariar a agressão de Putin. Isto pode criar condições muito confortáveis para que ele prossiga a sua agressão na Europa”, alertou o especialista.

Um sentimento partilhado por muitas pessoas na Polónia. Cada vez mais cidadãos se alistam nas Forças de Defesa Territorial polacas. “O risco é muito sério, porque a Ucrânia está a perder a guerra e o Ocidente não a está a ajudar suficientemente. O risco de uma invasão no nosso país é muito elevado”, considerou Grzegorz Szczepański, voluntário da Defesa Territorial Polaca. 

“Há consciência da ameaça do ‘Grande Urso’ do Leste, que está a virar-se para nós. É por isso que a sociedade começou a preparar-se para o pior cenário possível”, disse o cabo Przemysław Łuszczki, porta-voz da Brigada de Defesa Territorial de Varsóvia, porfiando: “Não queremos que a Rússia volte a conquistar a Europa. Seremos os primeiros a defendê-la.”

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A par do megaplano, há intervenções episódicas da parte da Polónia. Por exemplo, na noite de 25 para 26 de maio, aviões militares polacos e aliados patrulharam a parte Sudeste do país, devido à intensa atividade aérea de longo alcance das forças russas.

O exército de Varsóvia comunicou a ocorrência, explicando que tinha registado um aumento de tráfego aéreo militar russo nas proximidades. Segundo a Defesa polaca, Moscovo tinha efetuado ataques com mísseis contra instalações na parte ocidental do território ucraniano.

A operação de vigilância aérea terminou algumas horas mais tarde, já que o exército informou que os ataques de mísseis russos tinham concluído no dia 26, de manhã.

A última atividade da aviação russa relacionada com ataques no território da Ucrânia ocidental foi registada na noite de 7 para 8 de maio deste ano, informou posteriormente o exército, explicando que tinham sido ativados todos os procedimentos necessários para garantir a segurança do espaço aéreo polaco.

O estado de alerta na Polónia aumentou em março, quando um míssil russo entrou no espaço aéreo polaco, antes de atingir a região ocidental ucraniana de Lviv.

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A incerteza sobre quem ganhará as próximas eleições nos EUA, a lentidão concretizadora das medidas tomadas na UE e as ameaças de Moscovo à NATO e aos pequenos países, no caso de fornecerem armamento à Ucrânia são fatores que levaram Volodymyr Zelensky a procurar novos apoios (por exemplo de Portugal, de Espanha, de Bruxelas e da Suécia) e a Polónia e os países vizinhos antirrussos a reforçar as suas fronteiras e a vigiar permanentemente o seu espaço aéreo.

Enfim, há países em guerra aberta, países em regime de pré-guerra e países em guerra à distância. E a paz está longe de ser uma realidade.  

2024.05.29 – Louro de Carvalho

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