terça-feira, 14 de maio de 2024

Grande peregrinação festiva que deixou um forte apelo à paz

 

 

Nem o frio nem a ameaça de chuva demoveram os 450 mil fiéis que participaram nas celebrações da peregrinação internacional aniversária de maio, na Cova da Iria. Na noite do dia 12, a procissão das velas contou com 250 mil pessoas. E, no dia 13, o terço, a missa e a procissão do adeus tiveram a participação presencial de 200 mil fiéis.

“A peregrinação de 12 e 13 de maio a Fátima é a maior e mais significativa de todo o ano e esta peregrinação voltou a mostrá-lo. A multidão de peregrinos presentes superou as nossas expetativas”, referiu o reitor do Santuário de Fátima, no balanço dos dois dias de celebrações.

A estes números de presenças físicas, somam-se outros milhares que, por todo o Mundo, assistiram às transmissões online e via televisão.

“Esta foi uma grande peregrinação, um momento festivo intenso, em que estiveram presentes alguns dos grandes dramas e tragédias que se abatem sobre a humanidade, mas também as dores e a gratidão de cada um dos peregrinos presentes”, considerou o padre Carlos Cabecinhas, que se manifestou impressionado “pela quantidade de pessoas que fizeram a pé a sua peregrinação até Fátima, nomeadamente jovens”.

Estes 12 e 13 de maio ficam ainda marcados por um forte apelo à paz, que esteve presente nas palavras de D. José Ornelas, de Leiria-Fátima, na conferência de imprensa, no dia 12, e na palavra de despedida aos peregrinos, no final da grande celebração do dia 13.

O apelo à paz foi reiterado pelo presidente da peregrinação, o cardeal D. Juan José Omella, que, pondo de parte o texto homilético adrede preparado, optou por “falar de coração”, dizendo-se emocionado com as pessoas que tinha visto chorar, no dia anterior, durante a procissão das velas.

Por sua vez, a grande multidão que formou a assembleia da Cova da Iria mostrou-se sempre muito participativa e envolvida na celebração, marcando, com frequentes e fortes aplausos, as palavras e saudações que mais tocaram os corações. 

Pela relevância do seu conteúdo e pelo seu estilo vívido, passa-se à condensação da homilia que o cardeal D. José Omella escrevera para a Missa Internacional de 13 de maio, mas que substituiu por um não menos belo improviso, tendo pedido que fosse disponibilizada a que tinha preparado.

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É uma graça maravilhosa poder vir como peregrino e partilhar com os peregrinos e com a Virgem Maria, nossa Mãe, a ação de graças a Deus pelo dom da sua presença e da sua mensagem. Veio de uma terra muito mariana, de que São João Paulo II, em 1982, ao despedir-se, na sua viagem pastoral, disse: “Até sempre, Espanha! Até sempre, terra de Maria!”

A aldeia onde nasceu pertence à diocese de Saragoça, em cuja cidade arquiepiscopal está a grande basílica da Virgem Maria, sob a invocação do Pilar. Lá se faz memória da aparição da Virgem Maria reconhecida pela Igreja, por volta do ano 40 d.C.. Segundo a tradição, ali apareceu a Virgem ao apóstolo Santiago. Graças a esta visita, o apóstolo, segundo a mesma tradição, recuperou as forças para prosseguir o seu caminho de evangelização e ali recebeu a ordenação episcopal.

[Estranho, os apóstolos não se fizeram bispos segundo um rito litúrgico como o aplicado aos seus sucessores, mas através do sopro e da imposição das mãos, em Jerusalém, pelo próprio Cristo.]  

Antes de ser bispo, Juan José Omella foi, durante alguns anos, pároco de Calanda, da diocese de Saragoça, que é conhecida por um impressionante milagre. Aconteceu em março de 1640 e foi registado pelas autoridades civis e eclesiásticas. Ali vivia Miguel Pellicer, um jovem a quem tinha sido amputada uma perna, havia cerca de três anos. Tinha enorme devoção pela Virgem do Pilar. Uma noite, sonhando que vinha a Virgem repor-lhe a perna, foi despertado pelos seus pais, impressionados ao verem que o filho tinha recuperado a perna amputada. Foi o Milagre de Calanda, que o arcebispo incitou a pesquisar e a aprofundar pela Internet.

Fazendo suas as palavras do Papa Bento XVI na sua peregrinação a Fátima, em 2010, disse: “Vim a Fátima para rejubilar com a presença de Maria e sua materna proteção […], para rezar, com Maria e tantos peregrinos, pela nossa Humanidade acabrunhada por misérias e sofrimentos.”

Agradeceu a Maria, por se encontrarem todos reunidos naquele lugar bendito, para que, unidos a Ela, aos anjos, aos santos e aos irmãos defuntos, se louve a Santíssima Trindade, pela sua infinita misericórdia; e a Jesus, por nos ter dado Maria como Mãe, na cruz, no momento culminante da sua entrega ao Pai pela nossa salvação. Desde então, Maria, nossa Mãe, vela e desvela-se por todos nós. Como boa Mãe, deseja a salvação de todos os filhos, salvação que vem de Deus e que temos de aprender a acolher guiados por seu Filho Jesus Cristo. Por Ele, constantemente, Maria quer-nos levar a conhecer, a amar e a seguir Jesus.  

O Mundo arde em muitos lados. O Papa Francisco sustenta que estamos a viver a terceira guerra mundial aos pedaços. O nosso coração está ferido e, por vezes, sucumbe à tentação e ao pecado, que geram a divisão no seio das famílias e nos ambientes sociais, que nos afastam de Deus e nos apagam a esperança; que conspurcam a nossa alma e nos roubam a alegria. 

Perguntamo-nos que podemos fazer, ante este Mundo que caminha perdido, para pôr fim às guerras na Ucrânia, na Terra Santa e em tantos outros lugares de África e do Mundo, para que as pessoas recuperem a alegria e a esperança, para vencermos a indiferença que, tão facilmente, se cola aos nossos corações e nos faz viver continuamente centrados em nós mesmos. A Virgem Maria, em Fátima, deu-nos a resposta. A sua mensagem continua a ser atual, porque é a mensagem de Cristo recolhida no Evangelho.

No princípio do século XX sofremos a 1.ª Guerra Mundial. Hoje, temos muitas guerras, por todo o Mundo, que nos inquietam. Os Portugueses sabem bem que esse tempo não foi fácil para si, nem para os países europeus. Além disso, neste país, tais conflitos coincidiram com a perseguição religiosa aos Católicos. Face a essa situação dramática, muitos perderam a esperança. Contudo, houve um “pequeno resto fiel” que confiou plenamente em Deus e nas suas promessas. Foram pessoas que, com profunda fé e insistência, iniciaram a cruzada de oração do Rosário. Pediam à Virgem que os filhos voltassem da guerra e que salvasse Portugal. Confiaram na maior intercessora. Foram fiéis e insistentes, e Santa Maria, Mãe de Deus e Nossa Mãe, não os defraudou. Ela é a nossa Mãe e nunca nos abandona.

Deus dispôs que Maria interviesse, mas fê-lo de modo inesperado, como gosta de fazer. E, sem lhes oferecer a solução para os problemas como esperavam, ofereceu-lhes um olhar de esperança sobre a realidade. E, como se isto não bastasse, disse-lhes: “Não vos abandono, caminho convosco, mas, se quereis o que pedis, tendes de colaborar comigo, com os anjos e com os santos.”

Podemos nos preguntar se rezamos com fé, se recorremos com insistência a Maria, se estamos dispostos a colaborar com ela.

E o purpurado exorta: “Sejamos parte desta humilde família que reza e se oferece pela salvação de toda a Humanidade.”

Depois, relata. Um ano antes das aparições da Virgem Maria, Deus enviou um anjo para preparar os pastorinhos para poder acolher a visita de Maria. Lúcia e os primos Jacinta e Francisco tinham uma vida de piedade e rezavam diariamente o terço, ainda que, por vezes, numa versão mais reduzida da Avé Maria. O Anjo comunicou com eles em três ocasiões. E disse-lhes: “Não temais, sou o Anjo da Paz, sou o Anjo de Portugal, sou o Anjo da guarda. Rezai, rezai muito. Rezai e pedi perdão pelos que não creem, não adoram, não esperam e não amam. Os Corações de Jesus e de Maria estão atentos à voz das vossas súplicas. […] Oferecei constantemente ao Altíssimo orações e sacrifícios. […] De tudo que puderdes, oferecei um sacrifício em ato de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido e de súplica pela conversão dos pecadores. […] Sobretudo aceitai e suportai com submissão o sofrimento que o Senhor vos enviar.

A 13 de maio de 1917, faz hoje 107 anos, Maria começaria a primeira das seis aparições aos pastorinhos. Que lhes disse a eles e o que nos continua a dizer, hoje, a nós? A nossa Mãe, a Virgem Maria, como já o tinha feito o seu Filho, pediu aos seus filhos e ao Mundo inteiro a conversão, a reconciliação, a renovação da vida cristã, a reforma dos costumes, a oração e o sacrifício pela conversão dos pecadores e pela reparação dos próprios pecados. Um precioso programa!

Face a este Mundo onde a paz está ameaçada e se perde a esperança, a Virgem Maria e os anjos da guarda recordam o que temos de fazer. Recordam o que Jesus nos disse e que os evangelistas recolheram: “Convertei-vos, crede em Mim, segui os meus mandamentos, anunciai a Boa Nova, sede misericordiosos e oferecei as vossas vidas pela salvação da Humanidade, sede coerentes com a fé que recebestes no Batismo.”

Como revela o livro do Apocalipse na primeira leitura desta Eucaristia, por detrás da cortina deste Mundo em que vivemos, trava-se um duro combate espiritual contra as forças do mal que resistem a Deus e ao seu plano. Embora tenham sido vencidas, querem morrer, matando, causando o maior dano possível às criaturas mais amadas por Deus: nós, os seres humanos. Ora, Maria veio para nos dizer que devemos juntar-nos a este combate, unir-nos a Deus, aos anjos, aos santos, oferecendo as nossas vidas pela salvação da Humanidade. A chave para vencer o mal é seguir a Jesus, o Salvador que nos foi dado através de Maria.

Na verdade, como nos disse São Paulo, na segunda leitura, graças ao Sim de Maria e ao Sim obediente de Cristo à vontade do Pai – a ponto de entregar a sua vida –, foram-nos dadas a salvação e a filiação divina. Somos filhos de Deus e fomos constituídos herdeiros. Mas, como filhos e herdeiros do Reino, também somos chamados a colaborar com o nosso irmão mais velho, Jesus Cristo, na obra de redenção da Humanidade. Não podemos ficar de braços cruzados. Cristo chamou-nos a participar na obra do Pai. E fazemo-lo com a oração, com o sacrifício, com a caridade aos que mais necessitam.

Maria, nossa Mãe, em Fátima e em tantas outras aparições reconhecidas pela santa Madre Igreja, indica-nos o caminho da colaboração, do serviço com Cristo ao Pai pelo bem da Humanidade. Este pequeno resto de fiéis a Deus está chamado a interceder e a oferecer-se por todos, tal como o fez Jesus Cristo. Só assim a paz e a salvação chegarão a toda a Humanidade.

Por fim, o celebrante enunciou a bem-aventurança que, hoje, nos ofereceu Jesus no Evangelho e que nos mostra o caminho da autêntica felicidade que todos desejamos: “Felizes os que escutam a Palavra de Deus e a põem em prática.” E exortou a que acolhamos a Palavra de Deus nas nossas vidas, a que deixemos Cristo falar-nos ao coração através destas mesmas palavras. Com efeito, a Palavra é o meio preferido por Deus para comunicar connosco.

***

O texto homilético do purpurado barcelonense previa a seguinte oração:

“Oração Lumen Fidei

Mãe, ajuda a nossa fé! Abre os nossos ouvidos à Palavra, para que reconheçamos a voz de Deus e o seu chamamento. Aviva em nós o desejo de seguir os seus passos, saindo da nossa terra e confiando nas suas promessas. Ajuda-nos a deixarmo-nos tocar pelo seu amor, para que possamos tocá-Lo na fé. Ajuda-nos a confiar plenamente n’Ele, a crer no seu amor, sobretudo nos momentos de tribulação e de cruz, quando a nossa fé é chamada a crescer e a amadurecer. Semeia, na nossa fé, a alegria do Ressuscitado. Recorda-nos que quem crê nunca está só. Ensina-nos a ver com os olhos de Jesus, para que Ele seja luz no nosso caminho. E que esta luz da fé cresça continuamente em nós, até que chegue o dia sem ocaso, que é o mesmo Cristo, teu Filho, e nosso Senhor. Amén.”

2024.05.14 – Louro de Carvalho

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