Com as eleições para o Parlamento Europeu (PE) no
horizonte, sobressai a importância da governação económica da União Europeia
(UE). Com efeito, não sendo a única vertente da governação da UE, que é uma entidade,
fundamentalmente política, a economia é
um pilar fundamental da União Económica e Monetária (UEM). Aliás, a UE foi
precedida da criação da Comunidade Económica Europeia (CEE), que sucedeu à
Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), fundada a 18 de abril de 1951,
que estabelecia
a livre circulação de carvão, ferro e aço (matérias de alta importância
económica, ao tempo) entre os países-membros e defendia políticas para a
instalação de indústrias siderúrgicas.
Antes da
introdução do euro, a UE estabeleceu a arquitetura da união económica e
monetária, pelo Tratado de Maastricht, em 1992, visando a governação económica da
UE, bem como detetar e corrigir desequilíbrios económicos suscetíveis de
enfraquecer as economias nacionais ou de afetar outros países da UE com
repercussões transfronteiras. O quadro de governação económica refere-se a um
sistema de instituições e de procedimentos que a UE criou para coordenar as políticas económicas dos
estados-membros e para atingir os seus objetivos económicos. Compreendendo
um sistema complexo de coordenação e supervisão, assenta nos princípios
de acompanhamento, de prevenção e de
correção das tendências económicas suscetíveis de enfraquecer as
economias de cada estado-membro ou de se repercutirem noutras economias.
A
coordenação e a supervisão eficazes oferecem três vantagens principais:
assegurar a solidez e a sustentabilidade
das finanças públicas, no médio e no longo prazo para todos os estados-membros;
promover o crescimento económico
sustentável e a convergência; e corrigir os desequilíbrios macroeconómicos, com o apoio de
reformas e de investimentos que reforcem o crescimento e a resiliência. Em
conjunto com a moeda única na área do euro e com a política monetária que lhe
está associada, o quadro de governação económica da UE contribuiu para a estabilidade económica, para o crescimento e para
o aumento do emprego. Desde o Tratado de Maastricht, este quadro tem
evoluído gradualmente. Foram empreendidas reformas, em resposta a crises
económicas, como a crise financeira mundial de 2008.
A recuperação
após a pandemia de covid-19 e as consequências da guerra na Ucrânia lançam novos
desafios à economia da UE, no contexto de níveis de endividamento e taxas de
juro mais elevados e de novos objetivos, em investimentos e em reformas. O
quadro atual revelou-se demasiado rígido em tempos difíceis, o que leva o
cumprimento das regras pelos estados-membros a ser desigual. Por isso, a UE
atualizou o quadro de governação económica para o preparar para o futuro. A 10 de fevereiro de 2024, os negociadores
do Conselho e do PE chegaram a acordo político provisório sobre as novas
regras, que está bem encaminhado, para entrar em vigor ainda na primavera de
2024. A reforma tem como principais objetivos: garantir finanças públicas sãs e sustentáveis; promover o crescimento através de
reformas e investimentos. As novas regras visam contribuir para as prioridades
da UE de construir um futuro
digital, ecológico e mais resiliente, reforçando o apoio à competitividade e autonomia estratégica.
O Tratado sobre o Funcionamento da União
Europeia (TFUE) fixa valores de referência para o défice orçamental e
para os níveis da dívida pública: 3%, para a relação entre o défice orçamental programado ou
verificado e o produto interno bruto (PIB) a preços de mercado; e 60 %,
para a relação entre a dívida
pública e o PIB a preços de mercado.
Por seu
turno, o Pacto de Estabilidade e Crescimento
(PEC), que define as regras para o acompanhamento e para a coordenação das
políticas orçamentais e económicas nacionais, contém regras preventivas e corretivas. O PEC
aplica-se a todos os Estados-Membros da UE, mas só os países do euro estão
sujeitos a sanções no âmbito da vertente corretiva.
Os
regulamentos “pacote de seis” e “pacote
de dois” reforçam a supervisão orçamental e introduzem o
procedimento relativo aos desequilíbrios macroeconómicos, para assegurar a
supervisão dos desequilíbrios que surjam fora do âmbito das políticas
orçamentais.
Ao nível da prevenção, o PEC contém
um quadro de governação orçamental, também conhecido por “vertente preventiva”,
que visa assegurar a solidez das
finanças públicas e uma balança de pagamentos sustentável, bem como evitar défices orçamentais excessivos. É no âmbito do exercício anual
do Semestre Europeu que
a UE e os estados-membros fazem grande parte da coordenação das políticas
económicas e orçamentais, alinhando-as com as regras acordadas.
Todos os
anos, cada estado-membro recebe do Conselho Europeu (Conselho) orientações
sobre as suas políticas económicas, orçamentais, de emprego e estruturais, orientações
inicialmente, propostas pela Comissão e, em seguida, analisadas e debatidas
pelos peritos dos estados-membros e acordadas pelos ministros da Economia e das
Finanças (Ecofin), antes de serem debatidas pelos chefes de Estado ou de governo
da UE no Conselho e, por fim, formalmente adotadas por este.
A reforma acordada
do regulamento da vertente preventiva permitirá abordagem adaptada a cada estado-membro, considerando que as
situações orçamentais, os níveis da dívida pública e os desafios económicos são
diferentes por toda a UE, assim como assegurará a redução global dos rácios e défices da dívida para níveis prudentes, de
forma gradual, realista e favorável ao crescimento, bem como uma supervisão multilateral eficaz. A
adoção formal das novas regras está prevista para a primavera de 2024. Uma vez
adotados, os textos serão publicados no Jornal Oficial da União
Europeia e entrarão em vigor no dia seguinte ao da publicação.
A Comissão
enviará uma trajetória de referência baseada no risco e diferenciada, expressa
em termos de despesas líquidas plurianuais, aos estados-membros que apresentem
défice orçamental e dívida pública que excedam os valores de referência de
3 % e 60 % do PIB, respetivamente. Os estados-membros cumpridores
podem solicitar à Comissão informações técnicas sobre o saldo primário
estrutural necessário para assegurar que o seu défice nominal seja mantido
abaixo de 3 % do PIB. A trajetória assegurará que, após um período de ajustamento orçamental, a
dívida pública dos estados-membros apresente tendência descendente plausível ou
permaneça em níveis prudentes inferiores a 60 % do PIB a médio prazo. Além
disso, terá por objetivo assegurar que todos os défices orçamentais sejam
reduzidos e mantidos abaixo de 3 % do PIB.
O período
normal de ajustamento orçamental é de quatro anos. No entanto, os estados-membros
podem solicitar um período mais longo de, no máximo, sete anos. Esta prorrogação
será permitida se o estado-membro fizer reformas e investimentos que melhorem a
resiliência e o potencial de crescimento, apoiem a sustentabilidade orçamental
e contemplem as prioridades comuns da UE, como a transições ecológica e
digital, a segurança energética ou o reforço da capacidade de defesa.
A trajetória
de referência respeitará duas salvaguardas: a relativa à sustentabilidade da dívida e a relativa à resiliência ao défice. A
primeira assegurará que o rácio da dívida pública diminua segundo a média anual
mínima de 1 % do PIB, desde que o rácio da dívida do estado-membro exceda
90 %, ou de 0,5 % do PIB, desde que o rácio da dívida se mantenha
entre 60 % e 90 %. Esta salvaguarda não se aplica a países cujo rácio
da dívida seja inferior a 60 %. O escopo é reduzir os rácios da dívida para níveis prudentes, de forma
gradual e realista. Já a segunda salvaguarda proporciona a margem de segurança
abaixo do valor de referência de 3 % do défice previsto no TFUE. O escopo
é fazer orçamentos nacionais para o futuro, pela criação de reservas orçamentais.
No âmbito do
novo quadro, cada estado-membro elaborará um plano orçamental estrutural de
médio prazo, com a duração de quatro ou cinco anos, até 20 de setembro de 2024.
Este plano incluirá os compromissos
em matéria orçamental, de reformas e de investimento e contribuirá
para assegurar a redução coerente e gradual da dívida e promover o crescimento
sustentável e inclusivo. Com base na sua trajetória de referência ou em
informações técnicas, os estados-membros incorporarão nos seus planos
orçamentais estruturais nacionais de médio prazo a sua trajetória de
ajustamento orçamental, expressa como trajetória das despesas líquidas.
Estes planos
e as trajetórias das despesas líquidas têm de ser aprovados pelo Conselho, na
sequência de avaliação pela Comissão. Se um estado-membro solicitar prorrogação
do período de ajustamento, os compromissos em matéria de reformas e investimentos
subjacentes à prorrogação têm também de ser aprovados pelo Conselho. E, se o
plano orçamental estrutural nacional de médio prazo do estado-membro não
cumprir os requisitos, o Conselho recomendar-lhe-á que apresente um plano
revisto. E a Comissão utilizará uma conta de controlo para acompanhar os desvios cumulativos,
ascendentes e descendentes, dos estados-membros em relação às respetivas
trajetórias de despesas líquidas acordadas.
Para
simplificar o quadro orçamental da UE e para aumentar a transparência, um indicador operacional único baseado
na sustentabilidade da dívida servirá de base para definir a trajetória das
despesas líquidas e fazer a supervisão orçamental anual para cada estado-membro:
o indicador de despesas líquidas, que terá por base as despesas primárias
líquidas financiadas a nível nacional, ou seja, as despesas excluindo as
medidas discricionárias do lado das receitas, as despesas com juros, as
despesas cíclicas com o desemprego, as despesas nacionais com o cofinanciamento
de programas financiados pela UE e as despesas com programas da UE inteiramente
cobertas por receitas provenientes de fundos da UE. O indicador de despesas
líquidas permitirá a estabilização macroeconómica, pois não será afetado por
estabilizadores automáticos, incluindo flutuações das receitas e das despesas
fora do controlo direto do governo.
O novo
quadro prevê a introdução de um relatório anual sobre os progressos realizados,
no qual cada estado-membro fornecerá informações sobre a execução do seu plano orçamental estrutural
nacional de médio prazo, incluindo a trajetória das despesas líquidas, e
sobre os progressos em matéria de reformas e investimentos. As regras preveem a
possibilidade de ativar a cláusula
de derrogação de âmbito geral, suspendendo as regras para todos os
estados-membros em caso de recessão económica grave na área do euro ou no seu
conjunto da UE, desde que tal não comprometa a sustentabilidade orçamental a
médio prazo. O período máximo de ativação da cláusula é de um ano, com a
possibilidade de prorrogação.
Ao abrigo
das novas regras, o Conselho pode ativar a cláusula de derrogação nacional, se tal for solicitado por um
estado-membro e recomendado pela Comissão. A cláusula suspenderá as regras só
para o estado-membro em causa, se houver circunstâncias excecionais fora do
controlo desse estado-membro que tenham impacto significativo nas suas finanças
públicas. A cláusula só será ativada, se tal não comprometer a sustentabilidade
orçamental a médio prazo, sendo o tempo limite para a sua ativação especificado
pelo Conselho.
Em
conformidade com o TFUE (artigo 126.º, n.º 1), os estados-membros têm
de evitar um défice orçamental e uma dívida pública excessivos. Ou seja, não
poderão exceder os valores de referência de 3 % do rácio do défice e de
60 % do rácio da dívida. As regras de execução neste domínio são
estabelecidas na vertente corretiva do PEC e devem ser reforçadas no âmbito do novo quadro de
governação económica.
O objetivo
do procedimento por défice excessivo, de assegurar a disciplina orçamental, visa evitar défices orçamentais excessivos e
incentivar a sua rápida correção, se ocorrerem; e reduzir, gradualmente a dívida de forma sustentável, até que
a dívida seja reduzida para um nível inferior ao valor de referência de
60 % do PIB previsto no TFUE.
O procedimento por défice excessivo, com base
no critério do défice, exige ajustamento estrutural anual mínimo de
0,5 % do PIB. O incumprimento pode resultar em multas até 0,05 % do
PIB, a pagar pelo estado-membro em causa, de seis em seis meses, até que o
Conselho confirme que foram tomadas medidas eficazes. A Comissão considerará a
possibilidade de iniciar procedimento por défice excessivo, com base no
critério do défice, se o rácio entre o défice orçamental e o PIB exceder o
valor de referência de 3 %. O procedimento
por défice excessivo, com base no critério da dívida, centrar-se-á
em desvios em relação à trajetória das despesas líquidas, considerando-se que a
relação entre a dívida pública e o PIB está a diminuir suficientemente e a
aproximar-se do valor de referência a um ritmo satisfatório, se o estado-membro
em causa respeitar a sua trajetória das despesas líquidas. A Comissão
considerará a possibilidade de iniciar o procedimento por défice excessivo, com
base no critério da dívida, se os desvios registados na conta de controlo do
estado-membro excederem 0,3 % do PIB, anualmente, ou 0,6 % do PIB,
cumulativamente.
Ao avaliar o
cumprimento do critério do défice e/ou da dívida por parte de um Estado-Membro,
o Conselho e a Comissão avaliarão vários fatores pertinentes, entre os quais: a
gravidade do desvio, os progressos na execução de reformas e investimentos, a
gravidade da situação da dívida pública e o aumento das despesas com a defesa
(se aplicável). A Comissão avaliará regularmente se o governo em causa tomou
medidas eficazes e formulará a recomendação ao Conselho, a quem caberá decidir
se pode por termo às sanções, ou se estas devem continuar e/ou ser
intensificadas.
O Conselho
deverá adotar o regulamento de alteração à vertente corretiva na primavera de
2024.
***
A seguir às eleições
de junho, inicia-se um novo mandato europeu de cinco anos, que se espera
próspero e capaz de responder a todos os desafios que a UE enfrenta, dentro de
si e perante o Mudo que a envolve.
2024.05.03 – Louro de Carvalho
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