A 12 de junho de 1985, Portugal e a Espanha assinaram o Tratado de Adesão às então Comunidades Europeias (Comunidade Económica Europeia, Comunidade Europeia da Energia Atómica e Comunidade Europeia do Carvão e do Aço), tendo constituído o 3.º alargamento da Comunidade Económica Europeia (CEE), que se tornou, mais tarde, uma comunidade política sob a designação de União Europeia (UE). Nos termos do Tratado de Adesão, os dois países tornaram-se oficialmente estados-membros a 1 de janeiro de 1986,
As cerimónias de assinatura decorreram, respetivamente, no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, e no Palácio Real de Madrid. A delegação portuguesa era constituída por Mário Soares (primeiro-ministro), Rui Machete, vice-primeiro-ministro, Jaime Gama, ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, e Hernâni Lopes, ministro das Finanças e do Plano. Por sua vez, a delegação espanhola era constituída por Felipe González Márquez, primeiro-ministro, Fernando Morán López, ministro dos Negócios Estrangeiros, Gabriel Ferrán de Alfaro, representante permanente da Espanha junto da CEE, e Manuel Marín, secretário de Estado responsável pelas Relações com as Comunidades Europeias).
As celebrações destes 40 anos – sob logótipo específico, concebido e executado pela Universidade de Aveiro, em parceria com a Representação da Comissão Europeia em Portugal e com o comissário para as comemorações do 40.º aniversário da adesão de Portugal às Comunidades Europeias – constituem uma oportunidade para refletir sobre a transformação económica, social e política de Portugal, desde a adesão, para debater os desafios, as conquistas e o futuro da UE.
O logótipo, que acompanha cada evento, conferência ou ação de comunicação realizados neste contexto, reflete diretamente conceitos, como identidade, crescimento e sentido de pertença, mas também valores fundamentais, como a democracia e a liberdade, e conta com cores inspiradas nas bandeiras da UE e de Portugal.
No atinente a Portugal, do programa das comemorações, que inclui eventos, conferências e ações de comunicação de grande público, para envolver os cidadãos na reflexão sobre 40 anos de transformação económica, social e política do país e sobre os desafios, as conquistas e o futuro da UE, destaca-se:
* Na Feira do Livro de Lisboa, a 9 de junho, pelas 19 horas, conversa “40 Anos de Tradução em Língua Portuguesa na União Europeia”. Quatro décadas após o Português se tornar língua oficial da UE, tradutores portugueses que trabalham ou trabalharam na Comissão discutiram o papel central e, muitas vezes, invisível da tradução no funcionamento das instituições europeias, o impacto da tecnologia no setor e a importância da terminologia europeia no desenvolvimento da Língua Portuguesa.
* Na Feira do Livro de Lisboa, no dia 11 de junho, pelas 19 horas, conferência “40 Anos de Portugal na União Europeia: O Legado de Mário Soares e os Desafios do Futuro”.
Juntamente com o Instituto Diplomático, a Representação da Comissão Europeia em Portugal promoveu um debate sobre o papel determinante de Mário Soares na construção do caminho europeu de Portugal, assinalando, simultaneamente, os 40 anos de adesão à UE e o centenário do antigo Presidente da República.
* A 12 de junho, entre as 10h30 e as 19 horas, decorreu a inauguração do roadshow “40 Anos da Adesão de Portugal às Comunidades Europeias”, pela Agência Nacional Erasmus+ Juventude / Desporto e Corpo Europeu de Solidariedade, em parceria com a Representação da Comissão Europeia em Portugal. Composto por um espaço físico interativo instalado em locais públicos, com conteúdos multimédia, com sessões participativas e com dinâmicas de educação não formal, o roadshow pretendeu envolver jovens, decisores e comunidade numa reflexão crítica sobre o percurso europeu do país, sobre o impacto da adesão de Portugal à UE e sobre o futuro da Europa.
Também a 12 de junho, das 19h00 às 20h00, assistiu-se à emissão especial do programa “Prova Oral”, da Antena 3, com Fernando Alvim, ao vivo na Feira do Livro de Lisboa
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A cerimónia oficial
comemorativa dos 40 anos da assinatura do tratado de adesão de Portugal às
comunidades europeias arrancou às 10h00 e incluiu intervenções do
primeiro-ministro, Luís Montenegro, do Presidente da República, Marcelo Rebelo
de Sousa, e discursos de políticos portugueses ligados, no passado e no
presente, às instituições comunitárias: o antigo presidente da Comissão
Europeia, Durão Barroso, e o atual presidente do Conselho Europeu, António
Costa, bem como um vídeo que recorda os já falecidos Mário Soares e Ernâni
Lopes, que eram o primeiro-ministro e o ministro das Finanças, em 1985.O Presidente da República sustenta que há um consenso alargado, em Portugal, no respeitante à integração europeia; e, na intervenção com que encerrou a cerimónia, disse que ”as vozes que exigiam a saída da União Europeia são hoje inaudíveis”, entre os partidos com representação parlamentar, e enfatizou que Portugal é o único estado-membro não fundador a ter dois presidentes de instituições comunitárias: o ex-presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, e o atual presidente do Conselho Europeu, António Costa (esqueceu-se de Mário Centeno, que foi presidente do Eurogrupo). Depois, citou Fernando Pessoa no balanço das quatro décadas de integração europeia – “Tudo vale a pena quando a alma não é pequena” – e parafraseou o falecido Papa Francisco, preconizando que “é tempo de sermos todos, todos, todos europeus”, perante a necessidade de garantir a paz no continente, o que disse ser a “principal conquista” das instituições comunitárias a que Portugal se juntou, há 40 anos.
Do seu lado, António Costa, presidente do Conselho Europeu, referiu-se ao “ato refundador” de 12 de junho de 1985, com a assinatura do tratado de adesão de Portugal às comunidades europeias, como data que “abriu a porta do desenvolvimento”, cumprindo o terceiro “D” da Revolução de Abril, depois da democratização e da descolonização. E destacou a evolução nos indicadores do país, com o produto interno bruto (PIB) per capita a multiplicar-se 11 vezes, desde o início da integração europeia, o salário médio a ficar oito vezes maior e o elevado analfabetismo a dar lugar à grande percentagem de jovens com cursos superiores. Vincando que Portugal e a Espanha “acrescentaram democracia” àquilo que, hoje, é a União Europeia, o também antigo primeiro-ministro, que negociou o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), recordou que, neste momento, uma dezena de países tão díspares, como a Ucrânia e a Islândia esperam juntar-se a este espaço de “valores democráticos, prosperidade e paz”.
Já o primeiro-ministro destacou a “visão europeísta e reformista” de Cavaco Silva, primeiro-ministro, durante a primeira década de pertença de Portugal à Comunidade Económica Europeia, para a “dinâmica de contínuo crescimento e [de] profunda transformação” que decorreu da assinatura do tratado de adesão. Num discurso em que fez o balanço de 40 anos, nos quais ”Portugal percorreu um dos mais notáveis trajetos de desenvolvimento da Europa contemporânea”, Luís Montenegro chamou também a atenção para os “sérios desafios” do crescimento dos populismos e dos extremismos. Contra os que “só querem dividir”, o chefe do governo apelou ao empenho de todos ”para continuarmos a construir uma Europa próspera, mais justa e mais influente no Mundo”.
É de destacar a intervenção de Carlos Coelho, comissário das comemorações dos “40 Anos da assinatura do tratado de adesão de Portugal às comunidades europeias”, no início da sessão, a anunciar que a mesma caneta com que “quatro portugueses ilustres”, Mário Soares, Rui Machete, Ernâni Lopes e Jaime Gama, rubricaram o documento, há precisamente 40 anos, voltará a ser utilizada, nesta quinta-feira, para que Marcelo Rebelo de Sousa e Luís Montenegro subscrevam a Declaração de Lisboa, documento que reforça o empenho de Portugal na construção europeia. “A Europa não é um mero episódio na nossa História”, disse o também vice-presidente do Partido Social Democrata (PSD) e antigo deputado no Parlamento Europeu (PE).
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O espírito da adesão à UE está bem patente na tirada conclusiva do
discurso de Mário Soares,
primeiro-ministro, na cerimónia da assinatura da adesão às comunidades
europeias, no Mosteiro dos Jerónimos, a 12 de junho de 1985: “Que este dia fique a
assinalar, na História da Comunidade Europeia, uma data de bom augúrio para o
futuro europeu, um futuro que desejamos solidário e de unidade, capaz de
propiciar aos povos das Comunidades progresso e justiça social e de ser um fator
de paz e de estabilidade no Mundo conturbado dos nossos dias.”Mário Soares sabia do que falava. Com efeito, não foi um caminho fácil. Era preciso negociar, para garantir que o acordo seria bom para o país e para a comunidade europeia. Nisso teve papel relevante António Marta, economista e gestor que integrou o grupo que preparou a adesão de Portugal à UE e que foi o último presidente da Comissão de Integração Europeia.
Foram, pois, oito anos (desde 1977) de conversações com Bruxelas, recorrendo também a encontros paralelos com Espanha, com o objetivo de acelerar também o processo de integração europeia do país vizinho, uma vez que a comunidade europeia queria que a adesão dos dois países ocorresse ao mesmo tempo, facto que, segundo João Vale de Almeida, pode ter atrasado a entrada de Portugal, em “um ano ou dois”.
O embaixador Seixas da Costa, que era cético, a princípio, que viria a negociar o Tratado de Amesterdão, entre 1995 e1997, e o Tratado de Nice, em 2000, não participou nas negociações da pré-adesão, mas não hesitou em frisar a complexidade e a dificuldade da tarefa. “Não participei nessa negociação, mas tenho um imenso respeito por quem a protagonizou. Foi um trabalho de grande dimensão e risco, que merece um grande respeito e gratidão do país.”
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A
adesão à UE e o trabalho dos políticos e técnicos é obra de muitos. Não vale a
pena atribuir louros especiais a estes ou àqueles.Por conseguinte, penso excessivo salientar o espírito mobilizador de Cavaco Silva. Escreveu, recentemente, um artigo em que enfatizava a gigantesca transformação do país, nomeadamente, em infraestruturas, o que é verdade. Porém, esquece a acusação, algo pertinente, de que se aproveitou, sem disfarçar, da assinatura do Tratado de Adesão para colher os fundos comunitários.
Também criou e engrossou a onda das privatizações de empresas, no prossuposto de que os privados gerem melhor, abandonou a ferrovia e, sobretudo, fez de Portugal um inimaginável “bom aluno” da Europa, sustentando que os fundos comunitários trouxeram o progresso ao país. Teria sido melhor que eles tivessem servido para colocar o país na rota do progresso e, a seguir, a República e o tecido social e empresarial se consolidassem, principalmente, pelos seus próprios recursos e sinergias. Porém, os sucessores seguiram o criticado trilho de Cavaco Silva,
De mau gosto foi, a meu ver, o seu encontro, em Toledo, com Felipe González, por serem ambos chefes de governo, aquando da entrada dos dois países na CEE, a 1 de janeiro de 1986. Esta é a hora da assinatura do Tratado de Adesão. O encontro dos dois antigos chefes de governo poderia ter esperado por janeiro.
Durão Barroso tem razão no que diz. Contudo, ao falar dos “generosos apoios comunitários”, esquece duas coisas: os fundos comunitários estão sujeitos ao regime complexo de candidatura – e bem –, mas a excessiva burocracia torna difícil tanto o êxito da candidatura como a sua execução (muitas verbas se perdem por deficiente execução física e financeira), o que leva empresários com capacidade de manobra a locupletar as suas empresas e a alguns a desviar verbas dos fins a que são destinadas; e, por outro lado, a UE tenta-se a castigar, com medidas austeritárias, os países periféricos, sob a capa de alegada ajuda, em tempo de crise, mas, na realidade, para salvar as deficiências da banca europeia e de outras instituições.
Seja como for, esperamos que a permanência na UE seja irreversível, que o Brexit seja um abre-olhos. Porém, os estados-membros e as instituições europeias devem estar atentos e vigilantes para que a paz regresse em toda a linha à Europa, para que se esbatam as desigualdades (que o neoliberalismo e um capitalismo financeiro sem rosto engrossam) e para que se multiplique e reforce a solidariedade dentro dos países, no bloco europeu e na relação com o planeta, a Casa Comum, na terra, no ar e no mar. É preciso edificar verdadeiros Estados de Direito – ecoeconómicos, sociais e solidários. Caso contrário, nunca haverá verdadeira paz.
2025.06.12 – Louro de Carvalho
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