terça-feira, 13 de maio de 2025

A Educação nas propostas dos partidos com assento parlamentar

 

Nos últimos anos, o debate político-partidário, em matéria educativa, nas campanhas eleitorais centrava-se na recuperação integral do tempo de serviço dos professores, congelado durante os três primeiros anos do consulado de José Sócrates e durante o período da crise financeira, até 1 de janeiro de 2018, quando, no dizer de António Costa, o relógio voltou a contá-lo.

Obviamente, estava em causa a contagem do tempo de serviço para efeitos de progressão na carreira docente, e não para efeitos de aposentação/reforma.      

Após ter sido alcançado, na brevíssima legislatura prestes a terminar, o acordo com os professores para a recuperação de todo esse tempo de serviço, prevendo a devolução faseada até 2027, o que trouxe alguma serenidade às escolas – embora isso tenha deixado de fora milhares de professores (os que se aposentaram, os que aderiram ao programa de rescisão por mútuo acordo e os que foram atingindo o topo da carreira demasiado tarde) –, os partidos políticos (ou as suas coligações) atualmente com assento parlamentar pensam, agora, noutras apostas, algumas das quais com muito pouca novidade.

Em termos genéricos, destaca-se o acesso universal e gratuito à educação pré-escolar, sendo a principal diferença se deve ser garantido, predominantemente, pelo setor público ou em parceria com o setor social e com setor privado. Paralelamente, respondendo ao aumento do número de estudantes estrangeiros no país, outro tema comum aos vários programas passa pelo reforço de meios para melhor integração escolar dos alunos migrantes, nomeadamente, através de programas intensivos para a aprendizagem do Português. E, ao mesmo tempo, evidenciam-se as diferenças ideológicas entre a esquerda e a direita (há sempre ideologia) em tópicos mais polémicos como a Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania, mormente, no que diz respeito à disciplina Cidadania e Desenvolvimento, sobretudo, no atinente à igualdade de género.

Sendo consensual o item da necessidade do alargamento da educação pré-escolar – tão propalado nas últimas legislaturas, mas que tem dificuldade em sair do papel, mercê da falta de instalações e de educadores/as suficientes, vejamos o que dizem os partidos sobre outros pontos da Educação.

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O partido Pessoas-Natureza-Animais (PAN) aposta no aumento do investimento público em Educação, de modo a atingir o valor de 6% do produto interno bruto (PIB), no final da legislatura. Quer proceder ao levantamento das escolas degradadas, com vista a uma urgente intervenção nessas infraestruturas, e pretende o cumprimento do rácio de um psicólogo, para 500 estudantes, com a contratação de profissionais para todas as escolas.

E, no ensino superior, o PAN propõe-se “tornar, progressivamente, as licenciaturas gratuitas” e rever o modelo de acesso a este nível de ensino, “não o centrando exclusivamente em resultados académicos”.

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O Livre (L) aposta na autonomia escolar e na flexibilidade curricular, para que as escolas desenvolvam as suas propostas pedagógicas, possibilitando aos alunos “maior liberdade no seu percurso de aprendizagem”, e diversifiquem os suportes de aprendizagem, garantindo um uso humanista e consciente das ferramentas digitais, nomeadamente, da inteligência artificial (IA), enquanto ferramenta potenciadora das aprendizagens e não como fim em si mesma.

Defende uma nova organização não baseada em turmas, mas em comunidades de aprendizagem, explicita e aponta à criação de mais espaços verdes, nas escolas, que permitam situações de aprendizagem que coloquem as crianças e jovens em “maior relação com as problemáticas da preservação da biodiversidade e das alterações climáticas”.

Outra proposta do Livre consiste em promover a literacia da informação, incentivando, desde o 1.º ciclo, hábitos de pesquisa, de avaliação e de seleção da informação, assim como incentivar a utilização de “ferramentas ludo-pedagógicas como estratégia de envolvimento dos alunos na experiência pedagógica e como métodos de aferição complementares de avaliação contínua, proporcionando uma abordagem mais holística da aprendizagem”.

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A Coligação Democrática Unitária (CDU) – formada pelo Partido Comunista Português (PCP) e pelo Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV), incluindo, normalmente, nas suas listas membros da Associação de Intervenção Democrática (AID) – além de manter a gratuitidade dos manuais escolares, pretende alargá-la aos livros de fichas, com a distribuição de manuais novos e respetivas fichas, no 1.º ciclo. Em nome da valorização da avaliação contínua, propõe-se eliminar os exames no 9.º, no 11.º e no 2.º ano e rever o regime de provas de aferição nos 2.º, 5.º e 8.º anos. Batalha por que os trabalhadores do ensino particular e cooperativo tenham salários, carreiras e condições de trabalho semelhantes aos das escolas públicas.

Além disso, a CDU quer revogar o Estatuto do Aluno e Ética Escolar (EAEE) e apostar em “mecanismos de participação estudantil”, reduzir o número de alunos, por turma, em todos estabelecimentos de educação e ensino. E pretende, em articulação com a comunidade envolvente, criar um Programa de Tempos Livres (PTL), até aos 12 anos, que “promova a formação integral das crianças e jovens, eliminando e substituindo as atividades de enriquecimento curricular (AEC), no 1.º ciclo.

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O Bloco de Esquerda (BE) insiste na meta de investir, pelo menos, 6% do PIB na Educação e em reverter a municipalização, criando um modelo de descentralização, baseado na autonomia das escolas. Pretende rever o EAEE, para valorizar a participação e os direitos, proceder ao fim das provas nacionais do 9.º ano realizar provas de aferição por amostragem e reforçar os materiais pedagógicos adaptados e diferenciados para alunos com necessidades educativas especiais.

O BE propõe incluir a desmaterialização dos manuais escolares no processo de transição digital e rever os modelos de AEC, de Componentes de Apoio à Família (CAF) e de Atividades de Animação de Apoio à Família (AAF), de modo a valorizar as atividades lúdicas, combatendo a excessiva curricularização e a precariedade dos vínculos dos profissionais. E propõe-se estender aos alunos do 1.º e 2.º ciclos restrições, nos períodos de intervalo, ao uso de smartphones em vigor nas horas letivas, o reforço do número de psicólogos escolares, para atingir o rácio de um psicólogo, por cada 500 alunos, ou a criação, na escola pública de cursos pós-laborais dirigidos aos adultos que pretendam melhorar a sua escolaridade.

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A Iniciativa Liberal (IL) está focada em “dar liberdade às famílias para escolherem as escolas que melhor servem os seus filhos, promovendo diversidade e inovação no sistema educativo”, tal como defende um modelo em que todas as creches licenciadas, independentemente da sua natureza, possam ser escolhidas pelas famílias.

Em nome de maior autonomia dos agrupamentos escolares, em matéria pedagógica, financeira, organizacional e de gestão de recursos, de modo que as escolas possam adaptar estratégias às necessidades dos seus alunos, a IL quer os apoios focados nas escolas e nos alunos com maior défice de aprendizagem, através de “planos de ação concretos, mensuráveis e acompanhados”.

Isso já está em marcha, há bastante tempo.

A IL quer integrar a literacia digital e financeira no ensino obrigatório, substituir a disciplina de Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) por um novo modelo de ensino tecnológico (ensino computacional e inteligência artificial) e promover o ensino profissional como via prioritária para empregabilidade jovem.

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O partido Chega (C) quer rebatizar o atual Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) em Ministério do Ensino. Por outro lado, fala em “combater o desperdício financeiro causado pela máquina burocrática intermédia” e em extinguir todos os organismos ministeriais que não sejam “absolutamente fundamentais”, para alocar as verbas orçamentais, o mais diretamente possível, aos alunos, aos professores e às escolas. Pretende manuais gratuitos também para os alunos do privado e o aumento do limite máximo das deduções, no imposto sobe os rendimento das pessoas singulares (IRS), das despesas com mensalidades ou com propinas, desde o ensino pré-escolar ao superior.

No campo da (in)disciplina e da violência nas escolas, pede “tolerância zero” e maior agilidade nos processos burocráticos associados às participações disciplinares. Além disso, quer mais meios humanos e materiais para o programa Escola Segura da Guarda Nacional Republicana (GNR) e Polícia de Segurança Pública (PSP) e a recuperação do programa de vigilantes nas escolas, “especialmente, naquelas onde se verifiquem maiores índices de violência”.

Além de passar a opcional a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento (com “neutralidade ideológica”), o Chega assegura aos encarregados de educação o direito de escolha sobre a participação em atividades pedagógicas baseadas em ideologia de género e o levantamento concreto e detalhado da identificação das escolas onde há casas de banho e balneários mistos e de género neutro, não podendo estas ser as “únicas opções disponíveis”.

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O Partido Socialista (PS) pretende corrigir os desequilíbrios e colmatar as carências existentes na rede pública do ensino básico e do secundário, expandindo a oferta atual em territórios que registam uma maior pressão demográfica; quer reforçar o programa de requalificação de escolas do 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e concluir as intervenções em escolas secundárias; e propõe-se aperfeiçoar a constituição de turmas, para assegurar “maior heterogeneidade, do ponto de vista da integração de alunos de diferentes estratos socioeconómicos.

Pretende avaliar o impacto das recomendações de interdição da entrada e de uso do telemóvel nos espaços escolares, admitindo a sua interdição efetiva, pelo menos, até ao 2.º ciclo do ensino básico. Outro ponto em que insiste é o incentivo à constituição de parcerias entre as escolas profissionais, o tecido empresarial local e as instituições de ensino superior, melhorando a articulação entre o planeamento da rede e as necessidades das empresas. Ao invés, para “promover uma escola que forme cidadãos”, defende a valorização da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento e pondera o reforço do seu ensino no secundário.

Para os alunos que frequentaram o ensino básico, durante a pandemia, o PS pretende que continuem a dispor de um acompanhamento continuado do seu desempenho, mediante realização de testes de diagnóstico e a adoção de planos personalizados de recuperação de aprendizagens.

Por outro lado, aposta num novo Plano Tecnológico da Educação (PTE) – pelo reforço das infraestruturas e equipamentos, a par da dotação adequada em pessoal qualificado que assegure a sua manutenção – e na expansão da Rede de Laboratórios Digitais Escolares (RLDE), com o objetivo de garantir que todos os agrupamentos de escolas públicas tenham, até 2030, pelo menos, um espaço pedagógico equipado com tecnologia atualizada e “orientado para o desenvolvimento das competências digitais do século XXI”.

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A AD – Coligação PSD/CDS (Partido Social Democrata/CDS - Partido Popular), atualmente num governo minoritário de gestão, aponta para um novo modelo de autonomia e gestão das escolas para lhes “robustecer” a autonomia financeira, pedagógica e de gestão de recursos humanos, bem como para melhorar o sistema de transferência de competências para as autarquias e para atribuir às Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) responsabilidades de planeamento na definição da rede escolar e dos investimentos em infraestruturas. Além disso, pretende criar um Estatuto do Diretor, “indexando a sua remuneração ao escalão mais elevado da carreira docente e implementando um modelo de avaliação dos diretores das escolas.

Refira-se que já está implementando o modelo de avaliação dos diretores. Por outro lado, o estatuto remuneratório do diretor, como foi indicado, vai desencadear uma corrida inadequada ao cargo, bem como a corrida à respetiva formação específica, paga pelos potenciais candidatos. 

A AD propõe-se também proceder à avaliação das aprendizagens essenciais de todas as disciplinas do ensino básico e secundário, incluindo a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, e o reforço do ensino experimental das Ciências e o ensino de literacias (financeira e digital). Quer proibir, no recreio, o telemóvel até ao 6.º ano e um uso limitado até ao 9.º ano.

Para alunos carenciados ou em risco, propõe-se criar um serviço online gratuito de apoio ao estudo (“de qualidade e personalizado”), melhorar o sistema de apoio a essas famílias, mesmo que frequentem o ensino particular e cooperativo, e combater a segregação social entre escolas com avaliação das regras de prioridade nas matrículas, na transparência na alocação dos alunos e na publicação das áreas de influência geográfica das escolas da rede pública.

No âmbito das parcerias com o ensino particular e cooperativo, pretende “revisitar e atualizar” os modelos dos contratos de associação (obviamente, em desprimor da escola pública). E aponta à otimização da rede de oferta de ensino profissional, alinhando-a com as estratégias de desenvolvimento das regiões e com as necessidades do tecido empresarial, consolidando a implementação do novo Catálogo Nacional de Qualificações (CNQ) e o investimento nos Centros Tecnológicos Especializados (CTE), alterando o seu modelo de financiamento.

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A AD, o Chega e a IL perfilham, claramente, uma ideologia de privatização de áreas fundamentais do Estado, como a Saúde, a Educação e a Segurança Social. Contraditoriamente, defendem a manutenção do Estado em áreas de interesse público. Quer dizer que, por absurdo, a Saúde, a Educação e a Segurança Social não são de interesse público.

A AD quer retomar os contratos de associação com escolas privadas, independentemente de haver na mesma localidade oferta pública de ensino.

É excessiva a proposta do Chega de selecionar o ensino profissional como via única para a empregabilidade jovem; e é extemporânea e perniciosa a recuperação dos “vigilantes” nas escolas (há outras formas de eliminar ou reduzir a violência escolar). Aliás, que fariam os vigilantes contra atos de violência perpetrados por agentes do exterior? Porém, é importante a aposta na redução da burocracia e na simplificação dos processos disciplinares dos alunos.

Para a direita, a Cidadania é um cancro ideológico (pelo que deve ser abolida, reescrita ou tornada opcional); para a esquerda, ela deve ser alargada a todos os níveis de educação e ensino.   

Por fim, é de referir que a municipalização da educação está a ter resultados asfixiantes para a escola, tornando-a arena de disputa político-partidária e açoteia de defesa de interesses e abrindo caminho à privatização (Nesse aspeto, a AD e o PS estão juntos). Além disso, nenhum dos partidos se propõe restaurar a autoridade do professor e a sua autonomia profissional, valorizar, a sério, a formação e o recrutamento de professores e cuidar de promover a atratividade da carreira docente, em termos salariais, de condições de trabalho, de reforma-aposentação em idade adequada e de serenidade da docência, livre de interferências abusivas dos poderes públicos e de muitos encarregados de educação.  

2025.05.13 – Louro de Carvalho


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