A Aliança Democrática (AD – PSD/CDS)
venceu as eleições de 18 de maio, reforçando a posição do
primeiro-ministro (PM) demissionário, Luís Montenegro, e vincando a acentuada
derrota do Partido Socialista (PS), cujo secretário-geral, Pedro Nuno Santos
tirou as devidas consequências políticas, que o levaram à demissão do cargo
partidário.
A
AD, coligação do Partido Social Democrata (PSD) e do partido do Centro Democrático
Social (CDS), celebra clara vitória eleitoral, mas sem condições para a sua tão
desejada, mas pouco provável, maioria parlamentar, deixando seriamente
desiludido o Presidente da República (PR), Marcelo Rebelo de Sousa, o tão
autoapregoado paladino da estabilidade.
O
grande derrotado foi o PS, que pode ser a segunda força política no país, mas a
terceira força partidária na Assembleia da República (AR), pois, embora os 20
círculos cujos resultados já foram apurados (os 18 do Continente e os das duas
Regiões Autónomas) tenham ditado 58 assentos parlamentares, tantos como ao
partido Chega, é possível que os dois círculos da emigração deem mais deputados
ao Chega do que ao PS, embora a percentagem de votos deste seja ligeiramente
superior à do Chega.
O Chega, em termos de partido não
coligado, foi o grande vencedor do dia, passando de 50 deputados para 58 e
fazendo com que o país ficasse, epidermicamente, para Norte, em alerta laranja
(embora submerso no azul-escuro) e para Sul, pintado de azul-escuro, com uma
clareira rosa. “O Chega tornou-se nestas eleições o segundo maior partido desta
democracia. […] Que bom é olhar para o mapa de Portugal e ver tanta vitória do
Chega”, afirmou André Ventura aos apoiantes, reforçando que o resultado do
partido “acabou com o bipartidarismo”.
“Nós fizemos mesmo o que nunca nenhum
partido tinha feito em Portugal. Nós hoje podemos declarar, oficialmente e
perante o país todo e com segurança, que acabou o bipartidarismo em Portugal”,
sublinhou.
AD
é a vencedora das legislativas antecipadas, mas só consegue fazer maioria com o
PS ou com o Chega, não com Iniciativa Liberal (IL), que passou de seis para
nove deputados. O PS, embora possa viabilizar o programa do governo, não parece
disposto a acordo de incidência parlamentar com a AD. E esta, se for
consequente, não se junta ao Chega. Resta-lhe estabelecer acordos à esquerda ou
à direita, matéria a matéria. Ainda com os círculos da emigração por apurar, a
coligação formada pelo PSD e CDS-PP obteve o maior número de votos (32,72%),
uma subida superior a 4%, e de deputados (89) – em que se incluem
três da coligação regional PSD-CDS/PPM (Partido Popular Monárquico) –, mais
nove do que em 2024.
Dos demais partidos ressalta que o
Livre melhorou a sua representação parlamentar, obtendo seis mandatos, em vez
dos quatro anteriores, e que o partido regional Juntos pelo Povo (JPP) tem,
agora, representação parlamentar com um deputado. Ao invés, a Coligação
Democrática Unitária (CDU) perdeu um deputado, o Bloco de Esquerda (BE) ficou apenas
com um. Por sua vez, o partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) manteve a sua
deputada.
Para Luís Montenegro, os resultados
eleitorais são claros e reforçam a confiança dos Portugueses no governo e nele
próprio, reforçando que a responsabilidade é, agora, dos partidos da oposição,
que devem ser “capazes de colocar o interesse nacional” acima de tudo.
“A resposta [do eleitorado] foi
clara: o programa base da governação é o programa da AD. O primeiro-ministro é
o atual e todos devem ser capazes de colocar o interesse nacional acima de
qualquer outro”, afirmou o líder do PSD, reforçando: “Às oposições caberá,
igualmente, respeitar e cumprir a vontade popular, honrando os seus
compromissos e as suas propostas, mas adequando-os às circunstâncias nacionais
e coletivas. De uns e outros espera-se sentido de Estado, sentido de
responsabilidade, respeito pelas pessoas e, naturalmente, espírito de
convivência na diversidade, mas também de convergência e salvaguarda do
interesse nacional.”
Sem maioria sustentada na AR, o PM
foi questionado sobre se o “não é não” ao Chega se mantém, algo que não foi,
respondido de forma clara, sendo substituído pelo “sim é sim a Portugal”. Já
Paulo Rangel, em entrevista à Euronews,
afirmou que, tal como na legislatura anterior, “ficou claro que a AD não irá
fazer nenhuma coligação formal com o Chega. Por isso, temos de negociar cada
dossiê”.
Para o ainda ministro dos Negócios
Estrangeiros, apesar de a AD não alcançar maioria na AR, “os resultados são
claros”. “Acho que os resultados são claros. Seria muito estranho, diria até
politicamente inaceitável, que não pudéssemos formar governo ou ver o nosso
programa passar no Parlamento”, afirmou, reforçando que a anterior legislação
foi conseguida através da negociação com as diferentes forças políticas, o que
poderá acontecer novamente.
“Estamos abertos a falar com toda a
gente no Parlamento. Isto não é novo”, afirmou.
O PS ficou em segundo lugar,
com 23,38%,
quase menos 5% do que em 2024, o que se traduz em quase menos 420 mil votos e
em apenas
58 assentos parlamentares, ou seja, perdeu 20. Trata-se do seu pior
resultado eleitoral, desde 1987, ano da primeira maioria absoluta de Cavaco
Silva, quando o PS granjeou apenas 22,2% das preferências dos eleitores.
Não demorou muito até que Pedro Nuno
Santos anunciasse a saída da liderança do PS. “Assumo as minhas
responsabilidades como líder do partido. Vou, por isso, pedir eleições internas
à Comissão Nacional, às quais não serei candidato”, afirmou socialista, aduzindo:
“Como disse Mário Soares, só é vencido quem desiste de lutar. […] E eu não
desistirei de lutar. Até breve, obrigado a todos.”
O ainda secretário-geral do PS reconheceu
o mau resultado, mas garantiu, no que disse ser uma opinião pessoal, que não lhe
cabe a si, nem ao partido, sustentar um governo da AD, aduzindo que “Montenegro
não tem a idoneidade necessária para o cargo de primeiro-ministro e as eleições
não alteraram essa realidade”. Além disso, o socialista refere que o anterior
governo falhou, a vários níveis, e o programa apresentado pela AD vai “contra
os princípios e valores do PS”. Entretanto, vincou: “A minha posição é
muito clara, sobre essa matéria, e eu não quero ser um estorvo ao partido, nas
decisões que tiver de tomar. Eu não poderia nunca ser suporte deste governo,
acho que o PS também não o deveria ser.”
Segundo avançou o Expresso, José Luís Carneiro tenciona recandidatar-se
à liderança do PS, com o anúncio oficial a ser feito, no dia 24, na reunião da
Comissão Nacional.
Como já foi referido, outro dos vencedores
da noite eleitoral é o Chega (22,56%), o terceiro partido mais votado, com mais
175 mil votos do que em 2024 (a menos de 50 mil do PS), e que subiu mais de 4%,
igualando o número de deputados do PS. No entanto, a formação política liderada
por André Ventura pode passar a ter mais mandatos do que o PS, caso
volte a prevalecer nos círculos da emigração. Em 2024, o Chega arrecadou um
mandato no círculo da Europa e um outro no de fora da Europa, vencendo dois dos
quatro assentos conferidos pelos votos dos emigrantes e transformando-se no
primeiro partido, neste século, que não o PS ou o PSD (ou coligação liderada
pelo PSD) a eleger deputados nos círculos da emigração.
Subidas na votação tiveram também
a IL
(5,53%), à direita, que conquistou mais um deputado e tem agora
nove, embora não consiga maioria com a AD, e o Livre (4,20%),
à esquerda, que passa de quatro para seis lugares na AR. As restantes forças de
esquerda saíram derrotadas. Tanto a CDU (3,03%), como o BE (2%), desceram
em número de votos e de deputados: os comunistas tinham quatro parlamentares e
ficam, agora, com três, ao passo que os bloquistas sofrem uma derrota ainda
maior, diminuindo de cinco para apenas um.
Já o PAN (1,36%),
apesar de perder mais de 45 mil votos, manteve Inês de Sousa Real como
deputada. Um assento no hemiciclo tem agora igualmente o JPP (0,34%), que
se tornou o primeiro partido regional a chegar à AR. O JPP, sediado na Madeira
e que teve um aumento de quase mil votos, elegeu Filipe Sousa, presidente da
Câmara Municipal de Santa Cruz.
Com estes resultados, a AR passa a
ter 10 partidos, ainda que três (BE, PAN e JPP) sejam representados apenas por
um deputado.
***
O povo decidiu, está decidido. Portanto, nada mais há a fazer, senão
respeitar a vontade popular e adaptar programas, ambições e promessas às
exigências da soberania popular.
Contudo, há indicações de que muitos Portugueses estão receosos com a
ascensão do Chega a segunda força política e com a pesada derrota da esquerda.
Com efeito, não é bom augúrio a reedição de novo
governo minoritário, nem o novo impulso à viragem da Europa para a
extrema-direita, no quadro de três eleições gerais muitas próximas no tempo,
que deram pouca esperança para acabar com o pior período de instabilidade
política, desde há décadas.
No dizer de
uma residente em Lisboa, que sentiu “desilusão e tristeza”, após as eleições, “estamos a perder o
Mundo e não estamos a criar um Mundo decente para os nossos filhos”, sendo
muito preocupante o aumento do apoio ao Chega e a ascensão da extrema-direita,
na Europa. E um jovem de 27 anos, também residente em Lisboa, diz sentir
preocupação pelo seu futuro, como jovem, “pelas gerações ainda mais jovens do
que ele, que estão, agora, a começar a estudar e a começar a viver, e pelas
pessoas que vêm em busca de um melhor estilo de vida e melhores oportunidades
aqui no nosso país”.
O resultado
do Chega abalou o tradicional
equilíbrio de poder, tendência já vista noutros países da Europa, com
partidos como o Rassemblement National, em França, os Irmãos de Itália e a
Alternativa para a Alemanha, que ascenderam ao mainstream político.
Nos últimos
50 anos, o PSD (sozinho ou em coligação) e o PS têm alternado no poder
executivo, em Portugal. O Chega diz ter alterado tal dinâmica partidária –
ainda não alterou –, conseguindo o mesmo número de assentos na AR que o PS (58)
e podendo reivindicar o estatuto de
segunda força política quando forem distribuídos os quatro lugares
dos círculos da emigração, cujos resultados serão conhecidos em breve, passando
a ser o líder nominal da oposição.
Sozinhos,
PSD e PS não perfazem a maioria de dois terços para aprovar uma revisão
constitucional, bem como para aprovar ou para confirmar algumas das leis
ordinárias estruturantes da República. E há quem ache que é um perigo, para todos, que aquelas pessoas “sem
pés nem cabeça” tenham representação parlamentar. Não será bem assim. O
Chega não é um epifenómeno como foi o Partido Renovador Democrático (PRD) do
tempo do general Ramalho Eanes: nasceu, atingiu o cume e caiu – um meteoro.
O Chega foi
a votos, pela primeira vez, há apenas seis anos, quando conquistou um assento
na AR, e tem vindo a alimentar-se
da desaprovação dos eleitores, face aos partidos tradicionais mais moderados,
bem como da cerca discursiva e institucional que lhe tem sido feita e da arte
do espetáculo que sabe fazer em política. Fazendo campanha com os slogans “Limpar Portugal” e “Salvar
Portugal”, descreve-se como partido nacionalista, tendo como bandeiras o controlo da imigração e o combate à corrupção. E desta vez,
convenceu muita gente ao pôr na ribalta que PSD e PS, em 50 anos, nada mais
fizeram do que repartir o bolo orçamental pelos dois partidos e suas
clientelas, pelo que este partido, um subproduto do PSD e afins, reivindica o
direito de governar.
Não é, pois,
um novo PRD, mas um alinhado com a extrema-direita internacional, que o apoia.
O PS
insistiu no caso da “Spinumviva”, que ensombrou o PM. Todavia, não houve explicação
clara ao eleitorado sobre tudo o que se passou em detalhe, a nível legal,
político e ético. Apenas houve enunciados a modo telegráfico, pouco mais
esclarecedores do que as evasivas do PM. Além disso, o secretário-geral, que
fez tão grande finca-pé na comissão parlamentar de inquérito (CPI), admitiu, em
campanha eleitoral, sem explicação convincente, que poderia vir a prescindir
dela.
***
Não partilho
da convicção de que o PS salvaria o governo, se tivesse optado pela abstenção
na aprovação da moção de confiança que o governo apresentou na AR. Ao invés,
penso que, se o PS viesse a persistir na CPI, nos teríamos confrontado com um
pedido de demissão do PM. Assim, em minha opinião, a AD obteve a vitória
eleitoral, pela via da vitimização do governo, pela propaganda com base nas
medidas-cartaz avançadas pelo executivo, nos 12 meses de governação, pela resolução
epidérmica de problemas em alguns setores, eclipsando outros (que estão pior), e
pela perceção de que o caso da “Spinumviva” não fora tão grave como o pintavam
ou, pior ainda, de que problemas de ética e de corrupção pouco dizem ao país.
Os
escândalos de corrupção têm atormentado a política portuguesa, nos últimos
anos, ajudando a alimentar a ascensão do Chega, que também foi atingido por escândalos, devido à
alegada má conduta dos seus próprios deputados e dirigentes, por exemplo,
no furto de malas, na taxa-crime de álcool e na prostituição de menores.
***
No dia 19 de
maio, dia subsequente às eleições, a imprensa nacional e a internacional davam
relevo às nossas eleições, sublinhando-se, em Espanha, o “triunfo conservador”,
a “forte ascensão dos ultras” e
o “revés histórico da esquerda”, bem como a “revalidação da direita”.
A BBC referiu as eleições portuguesas,
vincando: “Partido do primeiro-ministro de Portugal vence eleições, mas fica
aquém da maioria.” Depois, chama ao Chega de “novato” e dá ênfase à demissão de Pedro Nuno Santos.
O The Guardian deu destaque ao tema, com
uma nota sobre a vitória da AD num pequeno quadrado também dedicado às eleições
na Roménia e na Polónia: “Partido de centro-direita vence eleições portuguesas
enquanto a extrema-direita quebra recordes novamente.”
Em França, o
Le Monde evidencia o “colapso da
esquerda para proveito da extrema-direita”.
Em Itália,
o Corriere della Sera escreve
sobre o “colapso histórico dos
socialistas”.
Os jornais
brasileiros falam eleições portuguesas, referindo que “Portugal vê ultradireita igualar cadeiras socialistas em derrocada da
esquerda” ou que, “em Portugal, vitória de centro-direita e avanço da direita radical escancaram
derrocada da esquerda”.
Nos Estados
Unidos da América (EUA), as nossas eleições não tiveram o mesmo destaque, em
órgãos como a CNN, o New York Times ou a Fox News, que o da vitória do partido de centro na Roménia. Porém,
a ABC News e The Washington Post publicaram notícias de agências internacionais,
como a Associated Press (AP).
Já em
Portugal, o tema foi explorado até ao tutano, com notícias, com reportagens, com
análises, com comentários, com previsão de cenários e com a definição de nova
agenda.
2025.05.19 – Louro de Carvalho
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