segunda-feira, 12 de maio de 2025

UE está a sentir o impacto da nova subida dos preços da energia

 
Nova subida dos preços da energia está a ter impacto na União Europeia (UE) e as circunstâncias de guerra podem induzir novas subidas.
Segundo o Eurostat, o gás atingiu o seu custo mais elevado de que há registo, no segundo semestre de 2024. E a taxa média é, agora, de 12,33 euros por 100 kWh (quilowatts-hora), contra 11,04 euros, no primeiro semestre de 2024.
Foi também a primeira vez que os preços subiram, na UE, após a crise energética de 2022. Todavia, ao contrário de há três anos, quando a guerra na Ucrânia e o corte nas importações de gás russo (de 45%, em 2021, para 13%, em 2025) fizeram disparar os preços, desta vez, os impostos são os principais responsáveis pelo aumento. “O aumento deve-se, em grande parte, ao aumento dos impostos em muitos países da UE, uma vez que as anteriores medidas de alívio foram reduzidas”, considera o Eurostat.
Por outro lado, tanto nos países da UE, como nos países terceiros, são enormes as diferenças de preços. Estes vão de 18,93 euros por 100 kWh, na Suécia, e 16,71 euros, nos Países Baixos, a 1,73 euros, na Geórgia, 2,13 euros, na Turquia, 3,15 euros, na Hungria, 4,56 euros, na Croácia, 4,92 euros, na Sérvia, 5,13 euros, na Bósnia-Herzegovina, e 5,41 euros, na Roménia.
Nenhum dos países com os preços de gás mais baratos – excluindo a Croácia e a Roménia – cortou o fornecimento de gás russo.
A situação é ligeiramente diferente, quando se tem em conta o poder de compra efetivo. Na UE, Portugal e Itália são, de facto, os países que pagam mais pelo gás natural. Já a Croácia e a Roménia podem reduzir a sua dependência da Rússia e manter os preços baixos, graças a estratégias energéticas ambiciosas de longo prazo.
O terminal crucial de gás natural liquefeito da Croácia em Krk ficou operacional em 2021, mas, agora, o país planeia aumentar a produção de gás em 82%, nos próximos três anos.
A Roménia é um dos países mais independentes da UE, em termos energéticos, e está a planear tornar-se completamente autónoma, em termos de gás.
O projeto Neptune Deep offshore é fundamental. Tem como objetivo duplicar a produção romena de gás e prevê-se que esteja operacional em 2027 e.
A crise energética foi desencadeada com a guerra na Ucrânia, iniciada a 20 de fevereiro de 2022, mercê da economia de guerra que se instalou e, sobretudo, das sanções económicas impostas à Rússia pela UE, aliás, como o dito Ocidente (com destaque para o Canadá e para o Reino Unido), designadamente, as atinentes à renúncia da UE à dependência energética europeia da Rússia e, posteriormente, à não renovação do contrato da Ucrânia com a Rússia sobre a passagem de gás russo pela Ucrânia para alguns países do Leste europeu. E, as sanções, em vez de enfraquecerem a economia russa, porque o país encontrou, rapidamente, novos clientes, o que lhe permitiu afinar a máquina de guerra, abateu-se, por ricochete, sobre as economias mais frágeis da UE.     
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Não obstante, a UE fixou o ano de 2027 como a data limite para os 27 estados-membros, do interior ao litoral, eliminarem, gradualmente, todas as compras de energia russa, nomeadamente, os carregamentos de gás natural liquefeito (GNL) que continuam a chegar às costas do bloco, apesar da guerra brutal na Ucrânia. Numa primeira fase, ocorrerá a proibição de contratos novos e de curto prazo, até ao final de 2025; e, na segunda fase, os contratos de longo prazo, que representam dois terços do gás russo, serão rescindidos até ao final de 2027.
Serão introduzidas novas restrições para reprimir a frota sombra que transporta, secretamente, o petróleo russo e para impedir as importações de urânio russo e de outros materiais nucleares. E cada estado-membro será convidado a elaborar um plano nacional que especifique a forma como tenciona retirar do seu cabaz energético o gás, o nuclear e o petróleo russos.
Todas as medidas constam de uma estratégia global, apresentada pela Comissão Europeia, na tarde de 6 de maio. Porém, o roteiro, que precisa de ser plasmado em textos legislativos, estava previsto para os primeiros 100 dias da nova Comissão, mas foi adiado, várias vezes, devido à incerteza sobre o impulso de Donald Trump para lançar negociações entre a Ucrânia e a Rússia.
A retoma das compras de energia russa foi apresentada como possível condição para um futuro acordo de paz. Com a sua estratégia, Bruxelas exclui a ideia e institui as salvaguardas necessárias para, definitivamente, atirar os combustíveis fósseis russos para o passado.
“Mesmo que houvesse paz, amanhã, não seria sensato ficarmos, novamente, dependentes dos combustíveis russos”, afirmou Dan Jørgensen, comissário europeu para a Energia, esclarecendo:
“Antes de mais, [Vladimir] Putin mostrou que não se importa de utilizar o gás como arma. Não devemos voltar a colocar-nos numa posição vulnerável como essa. E, em segundo lugar, não queremos encher o seu baú de guerra e apoiar a sua economia de guerra, porque quem sabe que países serão os próximos.”
O consumo de energia russa tem estado no centro do debate político, desde o início da invasão da Ucrânia, quando a UE se viu a contar com a sua dependência de vários milhares de milhões de euros de Moscovo. Em reação, Bruxelas aprovou medidas sem precedentes para cortar as importações de carvão russo e de petróleo marítimo, mas o gás, grande fonte de receitas para o Kremlin, permaneceu visivelmente poupado às sanções.
Em 2024, a UE comprou 31,62 mil milhões de metros cúbicos (bcm) de gás russo por gasoduto e 20,05 bcm de GNL russo, o que representa 19% do consumo total de gás, mas o petróleo bruto russo passa pelo oleoduto Druzhba, isento de sanções, devido à pressão húngara.
No total, a UE gastou cerca de 23 mil milhões de euros em combustíveis fósseis russos, em 2024, superando o apoio militar prestado à Ucrânia, o que tem sido longa fonte de fricção entre os estados-membros, que, apesar dos constantes apelos de Kiev, nunca conseguiram chegar a um consenso para eliminar, totalmente, a energia russa.
No início deste ano, dez países da UE – a Chéquia, a Dinamarca, a Estónia, a Finlândia, a Irlanda, a Letónia, a Lituânia, a Polónia, a Roménia e a Suécia – assinaram carta conjunta a exigir a proibição total do gás russo, incluindo as importações de GNL, pois a capacidade da Rússia para sustentar o esforço de guerra está muito ligada às suas receitas energéticas. Em contraponto, a Hungria e a Eslováquia cerraram fileiras para se oporem às sanções, aduzindo que isso poria em perigo as suas economias nacionais e a competitividade da UE.
Os dois países sem litoral reagiram furiosamente, quando o presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, rescindiu o contrato com a Gazprom, fazendo cessar o trânsito de gás russo, através do território do seu país, no final de 2024. Porém, a Comissão Europeia absteve-se de criticar a medida de Zelenskyy, pois esta contribuiu para acelerar a eliminação progressiva. E o TurkStream, que atravessa a Turquia, rumo aos Balcãs e à Europa Central, é o único gasoduto que transporta gás russo para a UE, tendo os fluxos através dos gasodutos NordStream e Yamal-Europe cessado em 2022.
Como afirmou Jørgensen, as novas proibições serão adotadas por maioria qualificada, ao invés das sanções, que requerem a unanimidade, mas importando que todos cumpram.
Enquanto as compras de gás russo por gasoduto caíram para mínimos históricos, os navios que transportam GNL russo continuam a entrar nos terminais da UE, em volumes ainda maiores, sem qualquer impedimento, causando engulhos a Bruxelas.
De acordo com o Centro de Investigação sobre Energia e Ar Limpo (CREA), as importações de GNL russo pela UE, em 2024 aumentaram 9%, em relação a 2023. Quase 90% destas compras chegaram à França (7,7 bcm), à Espanha (5,7 bcm) e à Bélgica (5,1 bcm).
A ausência de restrições permitiu que as empresas europeias assinassem, livremente, contratos com os fornecedores russos, alguns dos quais com duração até 2040. Com efeito, a Rússia, que está altamente dependente do mercado da UE, para as exportações de gás, forneceu 52% das suas receitas de exportação de GNL.
De acordo com o plano da Comissão Europeia, a proibição de comprar gás russo será suficiente para as empresas da UE declararem força maior e libertarem-se de compromissos legais. No entanto, a opção corre o risco de ser contestada em tribunal, podendo resultar em sanções pesadas para os Europeus. Com efeito, segundo a Reuters, os litígios judiciais entre empresas da UE e fornecedores russos ascendem já a 18,5 mil milhões de euros. Para Elisabetta Cornago, investigadora principal do Centro para a Reforma Europeia (CER), o método mais seguro para invocar a força maior e desafiar os processos em tribunal seria a aprovação de sanções a nível da UE, mas as posições da Hungria e da Eslováquia tornam isso impossível.
A apresentação do novo plano de proibições ocorre numa altura em que acontecem negociações comerciais entre a Comissão Europeia e a Casa Branca. Donald Trump lançou a ideia de aumentar as vendas de GNL de fabrico americano para reequilibrar o excedente de bens com a UE.
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Robert Fico, primeiro-ministro da Eslováquia, criticou o plano da UE para acabar com as importações de gás natural russo, até ao final de 2027, para privar o presidente Vladimir Putin das receitas que ajudam a alimentar a guerra na Ucrânia, considerando o plano “absolutamente inaceitável” para o seu país e dizendo que o seu governo estava pronto para o vetar. Isto, porque, na sua ótica, a medida seria prejudicial para a Eslováquia e para toda a UE, uma vez que o preço do gás aumentaria em consequência. Por outro lado, a Eslováquia tem um acordo de fornecimento de gás com a Rússia que expira em 2034, o que levará Fico a pedir indemnização por danos, se o plano for avante. E Fico também rejeitou uma proposta de suspensão das importações de petróleo e de combustível nuclear da Rússia para a UE.
Todavia, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse ao Parlamento Europeu (PE), a 7 de maio, em Estrasburgo, que a Rússia provou, repetidamente, não ser fornecedor de energia fiável, sendo a dependência do país má para a segurança e para a economia europeias.
A Hungria e a Eslováquia, cujos líderes são considerados os aliados mais próximos de Putin na Europa, bloquearam a assistência militar da UE à Ucrânia e esperava-se que se opusessem aos planos de gás da Comissão Europeia, como efetivamente se opõem.
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Ursula von der Leyen excluiu, inequivocamente, a possibilidade de retoma da compra de combustíveis fósseis russos, após o fim da guerra na Ucrânia, advertindo que isso representaria um “erro de dimensões históricas” para a Europa. “A era dos combustíveis fósseis russos, na Europa, está a chegar ao fim”, declarou aos eurodeputados em Estrasburgo.
A sua recusa categórica surge a par do esforço de Donald Trump para chegar a acordo de paz entre a Rússia e a Ucrânia, tentativa que tem visto a Casa Branca acolher muitos pontos de vista do Kremlin, como as reivindicações sobre a Crimeia e sobre os territórios ocupados.
A diplomacia de Trump alimentou a especulação de que a energia russa poderia fazer parte de um futuro acordo, dado o papel fundamental das exportações de combustíveis fósseis no orçamento de Moscovo e o desejo de Vladimir Putin de reanimar a sua precária economia.
Durante décadas, a UE foi o maior cliente da Rússia, mas esta relação comercial colapsou no início de 2022, com a invasão russa da Ucrânia e com a UE a adotar medidas inéditas para reduzir o consumo de combustíveis fósseis russos, incluindo proibições abrangentes sobre o carvão e o sobre o petróleo transportado por via marítima.
Com os responsáveis norte-americanos a apontarem para o alívio das sanções, como incentivo ao presidente russo para aceitar um cessar-fogo duradouro, o que este vem recusando, o conjunto de medidas impostas pela UE está prestes a ser analisado. Assim, para o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, a aproximação entre Washington e Moscovo abordou o futuro dos gasodutos Nord Stream, que ligam a Rússia à Alemanha e que estão fechados.
“Provavelmente, será interessante, se os americanos usarem a sua influência na Europa e a obrigarem a não recusar o gás russo”, destacou Lavrov, no final de março.
Porém, Ursula von der Leyen traçou uma linha vermelha sobre o tema. “Há quem continue a dizer que devemos reabrir a torneira do gás e do petróleo russos. Isso seria um erro de dimensões históricas. E nós nunca o permitiremos”, afirmou, lembrando que “a Rússia já provou, vezes sem conta, que não é um fornecedor fiável”, visto que Vladimir Putin já cortou os fluxos de gás para a Europa, em 2006, em 2009, em 2014, em 2021 e durante a guerra.
Com o objetivo de colmatar as lacunas existentes, a Comissão Europeia apresentou um roteiro ambicioso para eliminar todas as aquisições de energia russa, incluindo o GNL, o petróleo e os materiais nucleares, o mais tardar até ao final de 2027. Este novo plano prevê uma proibição das importações de gás russo, que as empresas da UE utilizarão para invocar força maior e quebrar os contratos de longo prazo com os fornecedores (estes contratos são regidos por cláusulas de take-or-pay que implicam pesadas sanções em caso de incumprimento).
Ao invés das sanções, cuja aprovação requer unanimidade e são vulneráveis a vetos nacionais, as proibições ao gás russo basear-se-ão na política energética e comercial, que requer uma maioria qualificada. A Hungria e a Eslováquia, dois países sem litoral, que dependem de Moscovo, já criticaram o roteiro, sustentando que poria em risco a competitividade da UE.
No seu discurso ante o PE, instituição que defende, há muito, a eliminação total dos combustíveis russos, Ursula von der Leyen manteve-se fiel à sua estratégia, descrevendo-a como um elemento indispensável para garantir uma paz justa e duradoura na Ucrânia. “Temos de fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para reforçar a posição da Ucrânia. Porque todos nós já vimos como a Rússia negoceia. Bombardeando. Intimidando. Enterram as promessas debaixo de escombros”, afirmou, vincando que Moscovo “quer forçar a Ucrânia a aceitar o inaceitável”, pelo que a tarefa, neste ponto, é ajudar a Ucrânia a manter-se forte, a desafiar Vladimir Putin e a iniciar conversações de paz sem condições prévias.
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Está visto. Para a UE, a obsessão de cercear a ação da Rússia sobrepõe-se a tudo: criação de outras dependências, quiçá tão ou mais onerosas; aumento do custo de vida, pelo preço dos produtos ou pela carga fiscal; eliminação dos combustíveis fósseis, sem cuidar do custo das fontes alternativas de emergia ou sem ter em conta as pessoas de carteira quase vazia.  
Enfim, hoje, somos forçados a renunciar aos combustíveis fósseis. Teremos, amanhã de renunciar ao lítio, à platina, ao ouro, ao Sol, ao vento, ao mar? Talvez o melhor seja a utilização variada e equilibrada dos recursos. Na guerra não vale tudo e a experiência mostra-o!  

2025.05.12 – Louro de Carvalho


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