domingo, 11 de maio de 2025

David Attenborough apresenta filme e livro sobre o oceano

 

Sir David Attenborough, o veterano da radiodifusão, para quem os oceanos são os locais mais importantes da Terra, considera o filme “Oceano”, um documentário sobre o mar aberto, apresentado a 6 de maio, por ocasião do seu 99.º aniversário – que ocorreu a 8 de maio – como o mais importante da sua carreira, pois acredita que ele poderá desempenhar papel importante na preservação da biodiversidade e na proteção do planeta contra as alterações climáticas.

Por isso, o filme constitui eloquente apelo aos líderes políticos para a firmeza na proteção da vida marinha, até pela importância dos ecossistemas marinhos como aliados na luta contra as alterações climáticas.

Esta peça cinematográfica, que apresenta as maiores descobertas da investigação marinha dos últimos 20 anos, foi lançada, a 8 de maio, juntamente com o livro “Oceano – O Último Reduto Selvagem”, escrito em coautoria com Colin Butfield.

No filme, que chegou, efetivamente, às salas de cinema britânicas, a 9 de maio, o cineasta mostra como a sua vida coincidiu com a era da descoberta dos oceanos. São mostrados, em sequências, recifes de coral, florestas de algas e o oceano aberto, para ilustrar como um oceano saudável mantém todo o planeta estável e próspero. Simultaneamente, revela-se a razão por que o oceano está em tão mau estado e, quiçá mais importante, mostra-se como ele pode recuperar-se. Este pode ser, efetivamente, o momento da mudança.

Os cineastas prometem “imagens impressionantes e comoventes” que mostram a vida sob o mar e retratam, de modo inédito, as realidades e os desafios que os oceanos enfrentam, desde métodos de pesca destrutivos até ao maciço branqueamento dos recifes de coral.

David Attenborough destaca histórias inspiradoras de toda a parte, mas a mensagem principal é que o oceano pode atingir uma grandeza que excede tudo o que qualquer ser vivo já viu.

O cineasta-escritor afirmou que, após quase 100 anos no planeta, compreendeu que o lugar mais importante da Terra não é a terra, mas o mar. Com efeito, nos últimos 100 anos, cientistas e exploradores descobriram novas espécies notáveis, migrações épicas e ecossistemas complexos e deslumbrantes que superam tudo o que o também naturalista britânico imaginaria, quando era jovem. “Neste filme, partilhamos algumas dessas descobertas maravilhosas, revelamos porque o nosso oceano está em tão mau estado e, quiçá o mais importante, mostramos como ele pode ser recuperado. Este pode ser o momento da mudança”, enfatiza David Attenborough, vincando: “Quase todos os países do Mundo acabaram de concordar, no papel, em atingir este mínimo e proteger um terço do oceano. Juntos, enfrentamos, agora, o desafio de colocar isso em prática.”

O filme contou com a consultoria de especialistas da Universidade de Exeter, no Reino Unido. O Dr. Casper van de Geer, que trabalhou no livro com o coautor, afirmou que o filme é direcionado a quem deseje saber mais sobre o estado atual dos oceanos e sobre o seu futuro, reunindo as maiores descobertas da ciência marinha dos últimos 20 anos. E a doutoranda Madi Bowden-Parry, que reviu o conteúdo do capítulo do livro sobre algas marinhas, afirmou: “O livro descreve algumas das descobertas mais inovadoras no campo da investigação marinha e da conservação da Natureza, nas últimas duas décadas, e inclui relatos pessoais das pessoas que as inspiraram.”

O filme será lançado noutros países, incluindo a Austrália, a Nova Zelândia, a França, o Canadá, a Alemanha, a Áustria, a Suíça, os Países Baixos, a Bélgica, o Luxemburgo, a Suécia, a Noruega, a Finlândia, a Dinamarca, a Islândia e a África do Sul, e estará disponível, ainda neste ano, em todo o Mundo na National Geographic, na Disney+ e na Hulu. E, em Portugal, o lançamento está previsto para junho, no canal Nat Geo e na plataforma de streaming Disney+.

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O filme mostra a profunda transformação do oceano, ao longo dos últimos 100 anos, do branqueamento em massa dos corais, à força destrutiva da pesca de arrasto de fundo. Esta arte de pesca não só tem elevados custos socioambientais, como também liberta enorme quantidade de dióxido de carbono (CO2), o principal gás com efeito de estufa (GEE).

Quando as pesadas e vastas redes são arrastadas pelo leito do oceano, deixam para trás um extenso manto de destruição que faz libertar sedimentos do fundo do mar. O carbono enterrado tende a subir e a ser emitido para a atmosfera. O ecólogo marinho Enric Sala, explorador da Sociedade National Geographic e produtor executivo do filme, calcula que a pesca de arrasto custe à Europa 11 milhões de euros, por ano. E David Attenborough, sustentando que a pesca de arrasto de fundo deveria ser ilegal, mas não o é, considera: “A ideia de demolir uma floresta tropical causa indignação, mas fazemos o mesmo debaixo de água, todos os dias.”

Apesar das imagens desoladoras e revoltantes, “Oceano” deixa entrever uma mensagem de esperança de o oceano “voltar à vida”. Com efeito, vários países já se comprometeram a proteger 30% das águas marinhas, até 2030, a chamada meta 30x30, estabelecida em dezembro de 2022, no Quadro Global de Biodiversidade Kunming-Montreal, mas o apresentador-cineasta espera que o filme crie um sentido de urgência e encoraje os líderes políticos a agirem com firmeza e com ambição. Efetivamente, quando o documentário Blue Planet II foi emitido, há oito anos, teve tão grande repercussão que há quem julgue que a obra contribuiu para mudar a forma como as pessoas usam e descartam plástico. “Como parte do Blue Planet II, Sir David captou a beleza dos nossos oceanos e as ameaças que enfrentam, incluindo os impactos da poluição por plásticos – e isso ajudou a criar um impulso para um apelo global à ação”, afirmou Inger Andersen, diretora da agência das Nações Unidas para o ambiente (UNEP), ao diário britânico The Gaurdian.

No documentário em referência, o naturalista dá como exemplo de sucesso a campanha pela preservação das baleias. Há meio século, estavam à beira da extinção. Com a mobilização global e com a criação de regras internacionais, as baleias voltaram a singrar no oceano. Assim, é de crer que, se o oceano “for deixado em paz”, o ecossistema marinho pode recuperar e prosperar para lá de tudo “o que qualquer pessoa viva alguma vez viu”.

De facto, como sugere, no filme, o antigo radialista e diretor da cadeia britânica BBC – que acumula mais de sete décadas de trabalho na área da comunicação e na documentação da vida selvagem – um oceano mais saudável será um oceano com maior capacidade de reter carbono e de atuar como um agente termorregulador.

Enric Sala, citado pela Reuters, afirmou, numa entrevista: “Quando David Attenborough começou, havia dois canais de televisão e toda a gente o conhecia como a voz da Natureza. Agora, há centenas de canais, redes sociais, mas ele continua a ser a voz da Natureza.”

O filme foi apresentado, pela primeira vez, no dia 6, em Londres, no Reino Unido, em sessão que contou com a presença do Rei Carlos III de Inglaterra e John Kerry, antigo enviado dos Estados Unidos da América (EUA) para o clima. Chegou aos cinemas um mês antes da 3.ª Conferência do Oceano das Nações Unidas, que decorrerá, em junho, na cidade francesa de Nice. Nessa ocasião, espera-se que mais países ratifiquem o Acordo do Alto-Mar, assinado em 2023, o qual, até hoje, não reuniu as 60 ratificações necessárias para entrar em vigor.

Toby Nowlan, que produziu o documentário, diz que a obra não é um filme típico de David Attenborough. “Não se trata de ver novos comportamentos de História Natural. É a melhor mensagem que ele já contou”, esclareceu, citado pela BBC.

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David Attenborough é um naturalista e radialista britânico. A sua carreira representa a voz e o rosto dos programas sobre História Natural, nos últimos 60 anos. Os seus inúmeros trabalhos foram feitos para a rede britânica de televisão BBC, de que foi diretor, de 1965 a 1972.

Após sair da Marinha, foi contratado por uma editora para a qual escreveu livros escolares sobre ciência. Porém, desiludido com esse trabalho, tentou outra oportunidade. Em 1950, tornou-se produtor de rádio na BBC. Embora rejeitado, de início, o seu currículo atraiu o interesse de Mary Adams, chefe de departamento da BBC. Como a maioria dos britânicos, ao tempo, não possuía televisão e só assistira a um programa televisivo, até então. Porém, aceitou a oferta para três meses de treino e, em 1952, juntou-se à BBC, em definitivo. Inicialmente desanimado, por não aparecer ante as câmaras, porque Mary Adams pensou que os seus dentes eram demasiado grandes, tornou-se produtor para o Talks Department, no qual realizou todas as transmissões de não-ficção.

A associação de David Attenborough com programas de História Natural iniciou-se com a produção e com a apresentação de uma série de três partes “The Pattern of Animals”. Falava sobre os animais do jardim zoológico de Londres, com o naturalista Julian Huxley e discutiu temas como a camuflagem, o aposematismo (mostra de sinais de autodefesa) e outros mecanismos de defesa animal. E, por causa desse programa, realizou, junto do curador da casa de répteis do jardim zoológico, Lack Lester, a série “Zoo Quest”, com a primeira transmissão em 1954.

David Attenborough foi convidado a participar na BBC Natural History Unit, formalmente criada, em 1957, foi em Brsitol, mas recusou, não querendo mudar-se de Londres, onde ele e a família já estavam estabelecidos. Ao invés, formou o seu próprio departamento, a Travel and Exploration Unit, o que lhe permitiu continuar à frente da “Zoo Quest” e produzir outros documentários, como “Travellers’ Tales” e “Adventure”.

No início de 1960, desligou-se do quadro permanente da BBC para fazer uma pós-graduação em Antropologia Social, na London School of Economics, intercalando o estudo com as filmagens. Porém, aceitou convite para voltar à BBC, como diretor da BBC 2 antes de terminar a pós-graduação. Assim, entre 1965 e 1969, foi diretor da BBC 2. Durante esse tempo foram exibidos diversos programas, como “Match of the Day”, “Civilisation”, “The Ascent of Man”, “The Likely Lads”, “Not Only… But Also”, “Man Alive”, “Masterclass”, “The Old Grey Whistle Test” e “The Money Programme”. Tal diversidade reflete o pensamento de Attenborough de que a programação da BBC 2 deve ser a mais variada possível. Em 1967, sob o seu comando, a BBC 2 foi o primeiro canal de TV no Reino Unido a transmitir a cores.

Entre 1969 e 1972 foi diretor de programação da BBC Television. Por fim, rejeitou a proposta de promoção para diretor-geral da BBC e voltou a ser criador e apresentador de programas.

No início, os principais documentários de David Attenborough incluíam temas respeitantes ao impacto da sociedade humana no Mundo natural. Por exemplo, o último episódio de “The Living Planet” focaliza, quase inteiramente, a destruição do ambiente pelo homem e as soluções a tomar poderiam para amenizar ou até acabar com o problema. Apesar disso, os seus programas foram criticados por não terem uma mensagem mais explícita sobre a crise. Alguns ambientalistas sentem que os seus documentários dão um retrato falso da região selvagem e não fazem o bastante para mostrar que tais áreas estão a ser cada vez mais invadidas por humanos.

Entretanto, a sua mensagem de encerramento de “State of the Planet” foi bem franca: “O futuro da vida na Terra depende da nossa habilidade de reagir a problemas. Muitos indivíduos estão a fazer o que podem, mas o sucesso real só pode acontecer, se houver uma mudança na nossa sociedade, na economia e na política. Eu fui afortunado em poder ver, na minha vida, alguns dos maiores espetáculos que a Natureza tem a oferecer. Certamente, nós temos a responsabilidade de deixar para as gerações um planeta saudável e habitável por todas as secies.”

Desde de 1980, tornou-se cada vez mais franco na sustentação de causas ambientais. Em 2005, ingressou no projeto Birdlife International, para cessar a matança dos albatrozes brancos por barcos pesqueiros. Apoiou, publicamente, uma campanha da WWF (Fundo Mundial para a Natureza) para que 220 mil quilómetros quadrados da floresta tropical de Bornéu fosse protegida. E passou a integrar o grupo Fauna na Flora International, de que foi vice-presidente.

Disse, por diversas vezes, que a superpopulação humana é a origem de muitos dos problemas ambientais. Em ambas as séries, a já mencionada “State of the Planet” e “The Life of Mammals” e, no respetivo livro, fez um apelo para que os humanos freassem o crescimento populacional, caso contrário outras espécies não poderão sobreviver.

Tem escrito e falado sobre a certeza que tem de o aquecimento global ser causado pelos humanos e de ser um perigo real para a nossa espécie e para todo o planeta. No documentário “State of the Planet”, completa com esse tema a mensagem mencionada acima: “No passado, nós não conhecíamos os efeitos das nossas ações e, assim, plantámos o vento e, agora, literalmente, colhemos o furacão. Mas não temos mais tempo para essa desculpa: agora, reconhecemos as consequências de nosso comportamento e, certamente, devemos agir para o mudar, individual e coletivamente, nacional e internacionalmente. Ou daremos às gerações futuras a catástrofe.”

Em entrevista à revista BBC Wildlife, em 2005, considerou George W. Bush o maior “vilão ambiental” dos tempos atuais.

Em 2005, numa entrevista com Simon Mayo para a BBC Radio Five Live, considerou-se agnóstico. E, questionado se a sua observação da Natureza lhe deu fé num criador, afirmou sentir que toda a evidência da evolução no planeta mostra, claramente, ser esta a melhor maneira de explicar a diversidade da vida e que, havendo um ser superior, “teria escolhido a evolução orgânica como uma maneira de trazer a existência do mundo natural”.

É certo que os documentários expuseram a milhões de pessoas a diversidade da vida na Terra, incluindo os defensores do criacionismo, mas David Attenborough pouco fala dos mecanismos da evolução, exceto em “Life on Earth”, série sobre a evolução da vida. Em vez disso, descreve as vantagens de cada adaptação, em maior detalhe, como porque têm as flores certas formas num determinado caso, porque migram as aves e outros animais, como podem os mecanismos de mimetismo proteger ou atrair insetos e outros animais, e assim por diante. E, em 2022, juntou-se ao esforço de clérigos e de cientistas contra a inclusão do criacionismo no currículo das escolas.

Ao contrário dos seus equivalentes nos EUA, a maior parte das igrejas da Grã-Bretanha, tal como as principais correntes da Igreja Católica, já abraçou, há muito tempo, a evolução como o mecanismo responsável pela diversidade biológica na Terra, apesar da oposição de uma minoria fundamentalista. A única ressalva que fazem é que, segundo a fé, Deus está por de trás de toda a génese e evolução da vida, o que não contraria a evolução, como afirmava Santo Agostinho ou Teilhard de Chardin.

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É cada vez mais urgente cuidar do planeta, pois, só articulando economia e ecologia, se fará, de forma eficaz, o cuidado integral das pessoas e das comunidades.

2025.05.10 – Louro de Carvalho

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