As
delegações dos Estados Unidos da América (EUA), da Ucrânia e dos seus aliados
europeus encetaram, a 23 de novembro, em Genebra, na Suíça, novo debate sobre o
conflito na Ucrânia, na sequência do plano de paz de 28 pontos do presidente Donald
Trump, que apela à Ucrânia para ceder algumas das suas terras e para reduzir o volume
das suas forças militares.
O secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, e o enviado especial de Donald Trump, Steve Witkoff, lideram a delegação norte-americana que se reúne com altos funcionários do governo ucraniano, incluindo Andriy Yermak, chefe do gabinete de Volodymyr Zelenskyy.
O secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, e o enviado especial de Donald Trump, Steve Witkoff, lideram a delegação norte-americana que se reúne com altos funcionários do governo ucraniano, incluindo Andriy Yermak, chefe do gabinete de Volodymyr Zelenskyy.
Estão
presentes os conselheiros de segurança nacional dos países do grupo E3 – a França,
o Reino Unido e a Alemanha –, bem como Bjoern Seibert, chefe de gabinete da
presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e Pedro Lourtie,
principal colaborador do presidente do Conselho Europeu, António Costa.
O
plano de paz de 28 pontos, amplamente divulgado, que a Casa Branca diz ser o
resultado de um mês de trabalho entre Marco Rubio e Steve Witkoff, com a
contribuição de ucranianos e de russos, atrai críticas generalizadas nas
capitais europeias.
Donald
Trump quer que a Ucrânia aceite o plano até ao dia 27, Dia de Ação de Graças, levando
o líder ucraniano a avisar a nação de que enfrenta um dos momentos mais
difíceis da sua História.
No
dia 22, a União Europeia (UE), com os aliados da Ucrânia, resistiu à proposta
dos EUA, dizendo que a considerava um projeto e uma base para “trabalho
adicional”, uma vez que “inclui elementos importantes que serão essenciais para
uma paz justa e duradoura”. Porém, está de pé o princípio de que as fronteiras
não devem ser alteradas pela força”.
Com
o plano em referência, os EUA estão a ressurgir com o argumento de que o presidente
ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, não “tem as cartas” para continuar no campo de
batalha, pelo que deve chegar a um acordo que penda, fortemente, para o lado de
Moscovo.
Donald
Trump disse, no dia 21, que Zelenskyy “vai ter de aprovar”, mas, no dia 22, suavizou
o seu enunciado, vincando que “gostaria de chegar à paz”, e que esta não é a
sua oferta final. “Estamos a tentar acabar com isto. De uma forma ou de outra,
temos de acabar com isto”, disse o presidente dos EUA aos jornalistas, no
exterior da Casa Branca.
Horas
depois, senadores críticos de Trump disseram ter falado com o secretário de Estado,
que lhes revelara que o plano de paz que o presidente está a pressionar Kiev a
aceitar é uma “lista de desejos” do Kremlin, e não a proposta real que oferece
as posições de Washington, alegação que Marco Rubio e a Casa Branca desmentiram.
Segundo
Marco Rubio, a proposta de paz é da autoria dos EUA, é “um quadro sólido para
as negociações em curso” e baseia-se nas contribuições da parte russa” e em
contributos da Ucrânia.
Enquanto
se trava uma batalha feroz no Leste da Ucrânia, com as forças russas a tentar
apoderar-se de mais terras, em Zaporizhia e em Donetsk, parte da região
oriental de Donbass, as difíceis tentativas diplomáticas lideradas pelos EUA
estão a ser alvo de escrutínio e de críticas generalizadas.
No
dia 23, num dos seus maiores ataques até à data, contra uma central elétrica,
na da Rússia, a Ucrânia utilizou drones para atacar uma central térmica na
região de Moscovo, tendo provocado um grande incêndio e cortando o aquecimento
a milhares de pessoas. E a Rússia prosseguiu a sua barragem mortífera com
mísseis e com drones, na Ucrânia, sobre as infraestruturas elétricas e de
aquecimento ucranianas.
***
Entretanto,
as principais autoridades norte-americanas e ucranianas afirmaram, no dia 24,
ter feito progressos no sentido de pôr fim à invasão russa da Ucrânia, após
conversações de alto nível na cidade de Genebra.
O secretário de Estado norte-americano, que liderou a delegação dos EUA, afirmou que as conversações foram “muito proveitosas” e constituíram os dias mais produtivos, desde há muito tempo. No entanto, não deu muitos pormenores sobre o que seria o avanço das conversações com o seu homólogo ucraniano, referindo que os funcionários de alto nível terão, provavelmente, de continuar o debate, para calibrar as medidas.
O secretário de Estado norte-americano, que liderou a delegação dos EUA, afirmou que as conversações foram “muito proveitosas” e constituíram os dias mais produtivos, desde há muito tempo. No entanto, não deu muitos pormenores sobre o que seria o avanço das conversações com o seu homólogo ucraniano, referindo que os funcionários de alto nível terão, provavelmente, de continuar o debate, para calibrar as medidas.
Também
desvalorizou o prazo do dia 27, fixado por Donald Trump para que Kiev responda
à sua proposta, sublinhando que as autoridades querem pôr termo aos combates, o
mais rapidamente possível. “Este é um momento muito delicado. Parte disso é
semântica ou linguagem. Outros [pontos] requerem decisões e consultas de alto
nível. Outros, penso eu, precisam apenas de mais tempo para serem trabalhados”,
disse Marco Rubio.
O
presidente ucraniano afirmou que o seu país poderá ter de escolher entre
defender os seus direitos soberanos e preservar o apoio dos EUA de que tanto
depende, mas garantiu que os ucranianos “defenderão sempre” o seu país.
A
proposta norte-americana contempla muitas exigências russas, incluindo a
cedência de grandes parcelas de território, que Volodymyr Zelenskyy rejeitou
categoricamente, em nome da dignidade do povo e da nação.
Numa
declaração divulgada, no dia 23, à noite, após as conversações, a Casa Branca
disse que a delegação ucraniana “afirmou que todas as suas principais
preocupações – garantias de segurança, desenvolvimento económico, a longo
prazo, proteção de infraestruturas, liberdade de navegação e soberania política
– foram completamente abordadas durante a reunião”. E acrescentou que Kiev “manifestou
o seu apreço pela abordagem estruturada adotada para incorporar as suas reações
em cada componente do quadro de acordo emergente”.
A
Casa Branca afirmou que as alterações introduzidas na proposta refletem, agora,
“os seus interesses nacionais” e proporcionam “mecanismos credíveis e
aplicáveis para salvaguardar a segurança da Ucrânia, tanto a curto como a longo
prazo”. Todavia, a linguagem destes passos positivos só surgiu depois de se
terem intensificado as preocupações generalizadas com o plano original, que
ditava penosa submissão da Ucrânia à Rússia e aos EUA.
O
chanceler alemão, Friedrich Merz, disse que falou com Trump, deixando claro que
há partes do plano com as quais as principais nações europeias podiam
concordar, mas outras não. “Disse-lhe que estamos totalmente de acordo com a
Ucrânia, que a soberania deste país não deve ser posta em causa”, afirmou Merz,
numa entrevista a um órgão de comunicação social alemão.
Marco
Rubio considerou a proposta um “documento vivo”, que continuará a ser alterado,
e esclareceu que qualquer produto final, quando estiver pronto, terá de ser
apresentado a Moscovo: “Obviamente, os russos têm voto na matéria”, vincou.
A
avaliação cor-de-rosa do que foi discutido desafiou o próprio Donald Trump.
Antes do início das conversações, o presidente norte-americano criticou a
Ucrânia, pela falta de gratidão pela assistência militar dos EUA, evitando
criticar a Rússia. “A ‘liderança’ da Ucrânia expressou zero gratidão pelos
nossos esforços, e a Europa continua a comprar petróleo da Rússia”, publicou
Trump, no Truth Social.
Após
essa publicação, Zelenskyy aplaudiu os esforços liderados pelos EUA, em matéria
de segurança, sublinhando que “o cerne de toda a situação diplomática é que foi
a Rússia, e apenas a Rússia, que começou esta guerra”. “A Ucrânia está grata
aos Estados Unidos, a todos os corações americanos e, pessoalmente, ao
presidente Trump”, escreveu Zelenskyy, num post, no Telegram,
acrescentando: “Agradecemos a todos na Europa”.
Depois,
clarificou: “É importante não esquecer o objetivo principal – parar a guerra da
Rússia e impedir que ela se inflame, novamente.”
***
Enquanto
se desenrolava o plano de paz proposto por Washington para a Ucrânia, começava,
a 22 de novembro, em Joanesburgo, na África do Sul, a primeira conferência do
G20 (os líderes da UE – entre os quais, o presidente do Conselho Europeu e a
presidente da Comissão Europeia – e os líderes das principais economias e das
economias emergentes) a realizar-se em África, desta feita, sem a participação
dos EUA, cujo presidente já tentara bloquear a COP30.
Os líderes do G20 adotaram uma declaração que aborda a crise climática e outras questões globais e que “reiterou que a implementação de elementos relacionados com a União Europeia e com a NATO [Organização do Tratado do Atlântico Norte] necessitaria do consentimento dos membros da UE e da NATO, respetivamente”.
Os líderes do G20 adotaram uma declaração que aborda a crise climática e outras questões globais e que “reiterou que a implementação de elementos relacionados com a União Europeia e com a NATO [Organização do Tratado do Atlântico Norte] necessitaria do consentimento dos membros da UE e da NATO, respetivamente”.
O
porta-voz do presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, disse aos jornalistas
que a declaração adotada na cimeira sobre a crise climática “não pode ser
renegociada”, ao referir-se à linguagem a que Washington se opôs. “Tivemos o
ano inteiro a trabalhar para esta adoção e a última semana foi bastante intensa”,
afirmou o porta-voz.
No
seu discurso de abertura, Cyril Ramaphosa frisou a importância da reunião para o
continente. “Como esta é a primeira cimeira de líderes do G-20 realizada em
África, ela carrega as esperanças e deve refletir as aspirações dos povos deste
continente e do Mundo”, afirmou, sustentando que é responsabilidade de todos os
participantes “não permitir que nada diminua o valor, a estatura e o impacto da
primeira presidência africana do G20”.
Por
seu turno, Ursula von der Leyen, no seu discurso, na sessão do G20, sublinhou a
importância da cimeira, apelando a um “crescimento económico inclusivo e
sustentável que não deixe ninguém para trás”. “A resolução dos desequilíbrios
mundiais exige uma ação coordenada e cooperativa: com a ajuda das nossas
instituições internacionais – o FMI [Fundo Monetário Internacional], a OMC [Organização
Mundial do Comércio] e o Banco Mundial – devemos proceder a uma avaliação
genuína dos desequilíbrios globais, em que as causas profundas sejam debatidas”,
afirmou a presidente da Comissão Europeia, acrescentando que “a Europa tem de
assumir as suas responsabilidades e impulsionar o investimento”, embora esta
seja, efetivamente, uma responsabilidade coletiva.
Graças
à presença de vários líderes europeus, apesar do boicote dos EUA, o plano de
paz proposto por Washington para a Ucrânia foi muito debatido nos bastidores da
cimeira.
O
primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, o presidente francês, Emmanuel
Macron, e o chanceler alemão, Friedrich Merz, reuniram-se para encontrarem
alternativas ao plano dos EUA, que representem a justa defesa dos interesses da
Ucrânia e o papel da Europa na defesa e na segurança de todo o bloco europeu,
bem como o seu estatuto de aliado do país invadido.
A
resposta ao plano em causa surge numa altura em que os países europeus,
confrontados com a sua própria participação futura na luta da Ucrânia contra a
Rússia, insistem em ser consultados nos esforços de paz.
As
conversações do dia 23, à margem do G20, em Joanesburgo, foram também uma
demonstração de apoio a Kiev, depois de Ursula von der Leyen e de António
Costa, terem falado com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, por
telefone, na véspera.
Kiev
e outras capitais europeias ficaram alarmadas com o projeto de 28 pontos para
travar a agressão do Kremlin. Num vídeo solene, o líder da Ucrânia afirmou que
a sua nação poderá ter de tomar uma decisão difícil entre defender os seus
direitos soberanos e manter o apoio americano necessário.
O
plano de paz dos EUA prevê a entrega de parte do território ucraniano à Rússia,
algo que Kiev exclui, com razão, reduz a dimensão do seu exército, bloqueia o
seu caminho para a adesão à NATO e oferece à Ucrânia garantias de segurança
limitadas.
Os
europeus insistem em que quaisquer decisões relacionadas com sanções económicas
contra a Rússia (designadamente, os ativos russos imobilizados) e com a adesão
da Ucrânia à UE, da responsabilidade direta do bloco, devem ser tomadas com o
consentimento total, em qualquer plano de paz para pôr fim à guerra. Por isso, exigem
ser plenamente envolvidos nas negociações.
Efetivamente,
tais questões foram incluídas no plano inicial de 28 pontos elaborado
pelos EUA e pela Rússia sem a participação europeia, o que suscitou
preocupações de que a UE pudesse ser colocada à margem das negociações sobre a
segurança do continente.
Aliás,
não se entende como um dos aliados da Ucrânia se atreve a negociar um
armistício, com vista a um tratado de paz, nas costas do país invadido e nas
dos outros aliados. Por outro lado, o plano norte-americano (e russo) aceita a adesão
da Ucrânia à UE, mas não a sua integração na NATO, o que dá a estender que a NATO
oferece verdadeiro perigo para a Rússia, ao passo que a UE é insignificante.
O
controverso modelo foi discutido, no dia 23, entre funcionários
norte-americanos, ucranianos e europeus, em Genebra. E, em resultado das
conversações, o texto foi alterado, mas espera-se que continue a sofrer
alterações nos próximos dias. “Há um novo impulso nestas negociações”, afirmou
o presidente do Conselho Europeu, na tarde do dia 24, acrescentando: “Os
Estados Unidos e a Ucrânia informaram-nos [de] que as discussões foram
construtivas e [de] que se registaram progressos em várias questões.”
António
Costa falou à imprensa, após uma reunião especial dos líderes da UE em Luanda,
Angola.
“A
União Europeia está empenhada em continuar a prestar ao presidente Zelenskyy
todo o apoio de que ele necessita: apoio diplomático, apoio militar, apoio
económico. […] A paz não pode ser uma trégua temporária. Tem de ser uma solução
duradoura. A Ucrânia escolheu a Europa e a Europa estará ao lado da
Ucrânia”, disse António Costa.
A
seu lado, a presidente da Comissão Europeia, repetiu a mensagem de “bons
progressos”, mas alertou que “ainda há trabalho a fazer”. E defendeu que
qualquer acordo de paz só deverá limitar a dimensão das forças armadas
ucranianas, se Kiev consentir, mudança notável, em relação à sua postura
do dia 23, quando declarou que “não pode haver limitações” ao exército
nacional.
“O
território e a soberania da Ucrânia devem ser respeitados. Só a Ucrânia,
enquanto país soberano, pode tomar decisões, relativamente às suas forças
armadas. A escolha do seu destino está nas suas próprias mãos”, afirmou a
chefe do executivo europeu, sublinhando a “centralidade” da UE, no futuro
pós-guerra da Ucrânia, e apelando ao regresso das crianças ucranianas raptadas
pelas forças invasoras russas.
Um
acordo de paz entre a Ucrânia e a Rússia, se vier a concretizar-se,
repercutir-se-á em todo o bloco europeu e terá implicações duradouras. Por
isso, Ursula von der Leyen sentenciou, no dia 24: “Temos de permanecer unidos e
de continuar a colocar os interesses da Ucrânia no centro dos nossos esforços. […]
Trata-se da segurança de todo o nosso continente, agora e [no] futuro.”
***
Chegar
a uma paz justa e duradoura é difícil. Não sei se alguma guerra termina de forma
justa e definitiva. Aliás, a justiça humana, além de cega, é deficiente e, às
vezes, dura.
2025.11.24
– Louro de Carvalho
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