A
violência contra mulheres e meninas é, segundo a Organização das Nações Unidas
(ONU), a violação de direitos humanos mais disseminada. Em 2024, foram mortas 50
mil mulheres e meninas por parceiros íntimos ou por familiares, em todo o Mundo,
o equivalente a 137 mulheres e meninas, por dia, ou uma a cada dez
minutos, segundo os dados mais recentes divulgados pelo Escritório das Nações
Unidas sobre Drogas e Crime e pela ONU Mulheres.
E há mais dados: 38% das mulheres sofreram violência online e 85% presenciaram violência digital contra outras pessoas; a desinformação e a difamação são as formas mais comuns de violência online contra as mulheres, tendo 67% das mulheres e meninas que sofreram violência digital relatado ter sido vítimas dessa tática; entre 90% e 95% dos deepfakes (sínteses de imagens ou sons humanos) online são imagens pornográficas não consentidas, retratando mulheres cerca de 90% delas; 73% das jornalistas relataram terem sofrido violência online; e menos de 40% dos países possuem leis que protegem as mulheres contra o assédio ou contra a perseguição cibernética, o que deixa 44% das mulheres e meninas do Mundo (1,8 biliões) sem acesso à proteção legal.
E há mais dados: 38% das mulheres sofreram violência online e 85% presenciaram violência digital contra outras pessoas; a desinformação e a difamação são as formas mais comuns de violência online contra as mulheres, tendo 67% das mulheres e meninas que sofreram violência digital relatado ter sido vítimas dessa tática; entre 90% e 95% dos deepfakes (sínteses de imagens ou sons humanos) online são imagens pornográficas não consentidas, retratando mulheres cerca de 90% delas; 73% das jornalistas relataram terem sofrido violência online; e menos de 40% dos países possuem leis que protegem as mulheres contra o assédio ou contra a perseguição cibernética, o que deixa 44% das mulheres e meninas do Mundo (1,8 biliões) sem acesso à proteção legal.
Não
é, pois, sem razão que se assinala, a 25 de novembro, o Dia Internacional para
a Eliminação da Violência contra as Mulheres. Na sua mensagem, o
secretário-geral da ONU, António Guterres, sustenta que “a violência
contra mulheres e meninas é uma praga global” e que, “na nossa era digital,
está sendo amplificada pelo alcance e rapidez da tecnologia”. E, assinalando o 30.º
aniversário da Declaração de Pequim (documento de 1995, que estabeleceu o plano
de ação para promover a igualdade de género e o empoderamento de mulheres e
raparigas), apela ao Mundo para se unir e para acabar com a violência contra as
mulheres, em toda a parte.
Por
isso, a proteção online é o foco deste ano deste ano.
Com
efeito, O assédio online, as deepfakes e o discurso de ódio proliferam;
o conteúdo misógino desloca-se da marginalidade para o centro do discurso; e a
violência que começa no mundo digital pode transbordar para o mundo físico, sob
a forma de perseguição, de abuso e até de feminicídio (assassinato de mulheres
e meninas).
Acabar
com esta crise exige ação de todas as partes: os governos devem
criminalizar a violência digital e reforçar o apoio às vítimas e sobreviventes;
as empresas de tecnologia devem garantir que as suas plataformas são seguras e
responsáveis; as comunidades devem unir-se na política de tolerância zero, com
relação ao ódio online; enfim, não se podem permitir que os espaços
digitais se tornem um local onde mulheres e meninas não estão em segurança.
A
violência contra mulheres e meninas continua a ser uma das violações de
direitos humanos mais prevalentes e generalizadas. Quase uma em cada três
mulheres já foi vítima de violência física e/ou sexual, por parte de parceiro
íntimo, de violência sexual, por parte de alguém que não seja parceiro, ou
ambas, pelo menos, uma vez na vida. É flagelo que se intensificou em diferentes
contextos, mas sobressai no mundo digital, sendo ameaça grave e crescente que
procura silenciar as vozes de muitas mulheres, especialmente, daquelas com
forte presença pública e digital em áreas, como a política, o ativismo ou o
jornalismo. É forma de violência em ascensão, devido à fraca regulamentação
tecnológica, à falta de reconhecimento legal desse tipo de agressão, em alguns
países, à impunidade das plataformas digitais, às novas e rápidas formas de
abuso que utilizam inteligência artificial (IA), aos movimentos que se opõem à
igualdade de género, ao anonimato dos agressores e ao limitado apoio às vítimas
digitais.
Neste
ano, o Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres
marca o lançamento da campanha UNiTE 2025 (25 de novembro a 10 de
dezembro), ou seja, 16 dias de ativismo a culminar no dia que comemora o Dia
Internacional dos Direitos Humanos (10 de dezembro), procurando mobilizar
todos os membros da sociedade: governos, para acabarem com a impunidade, com
leis que a penalizem; as empresas de tecnologia, para garantirem a segurança
das plataformas e remover conteúdo prejudicial; os doadores, para financiarem
organizações feministas que trabalhem para erradicar essa violência; e as pessoas,
em geral, para levantarem as suas vozes para ajudarem as sobreviventes.
As
ferramentas digitais são cada vez mais utilizadas para perseguir, assediar
e abusar de mulheres e de meninas. Isso inclui: abuso baseado em imagens-compartilhamento
não consensual de imagens íntimas – ou seja, de pornografia de vingança ou
vazamento de nus; cyberbullying, trolling (provocar pessoas online)
e ameaças online; assédio online e assédio sexual; deepfakes gerados
por IA, como imagens sexualmente explícitas, pornografia deepfake e
imagens, vídeos ou áudios manipulados digitalmente; discurso de ódio e
desinformação nas plataformas de redes sociais; doxxing (publicar
informações privadas); perseguição online ou vigilância-rastreamento
para monitorar as atividades de alguém; aliciamento online e exploração
sexual; catfishing (falso perfil) e falsificação de identidade; e redes
misóginas, como manosfera (comunidade online de subculturas
masculinistas) e fóruns de incels (celibatários involuntários).
Estes
atos levam, frequentemente, à violência offline, na vida real, como
coerção, abuso físico e até feminicídio. Os danos podem ser duradouros e afetar
as sobreviventes, por um longo período.
A
violência digital atinge as mulheres mais do que os homens, em todas as esferas
da vida, mas especialmente, as que têm visibilidade pública ou online. O
impacto é ainda pior para mulheres que enfrentam formas interseccionais de
discriminação, incluindo raça, deficiência, identidade de género ou orientação
sexual.
***
Também
em Portugal, a situação é premente. Em 2025, até 30 de setembro, foram 19
as vítimas de homicídio, em contexto de violência doméstica, das quais 16
mulheres. Entre julho e setembro foram acolhidas na Rede Nacional de Apoio a
Vítimas de Violência Doméstica 1486 pessoas, sendo 794 mulheres, 670 crianças e
22 homens. Assim, a contribuir para o reforço da mobilização coletiva em prol
da prevenção e de combate à violência doméstica e a outras formas de violência,
a Comissão para a igualdade de Género (CIG) dá um novo impulso ao Pacto contra
a Violência, uma iniciativa que reforça o compromisso coletivo na prevenção e no
combate à violência contra as mulheres, à violência doméstica e ao tráfico de
seres humanos. A adesão a este pacto é um compromisso estratégico que valoriza
a dignidade humana, promove a igualdade e contribui para uma sociedade mais
justa e segura, onde todas as pessoas possam viver sem medo e com respeito
pelos seus direitos fundamentais.
A CIG organizou mais um evento para assinalar o Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres, com o propósito de alertar para a violência física, psicológica, sexual e social que atinge as mulheres, e que continua a ser uma das violações dos direitos humanos mais frequentes e generalizadas no Mundo. O evento realizou-se, a 25 de novembro, às 14h30, no MAAT Central, antigo Museu da Eletricidade.
A CIG organizou mais um evento para assinalar o Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres, com o propósito de alertar para a violência física, psicológica, sexual e social que atinge as mulheres, e que continua a ser uma das violações dos direitos humanos mais frequentes e generalizadas no Mundo. O evento realizou-se, a 25 de novembro, às 14h30, no MAAT Central, antigo Museu da Eletricidade.
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Entretanto,
o Relatório do Observatório de Mulheres Assassinadas (OMA), da associação União
de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), publicado a 24 de novembro, revela
que, pelo menos, 24 mulheres foram assassinadas, em Portugal, neste ano, das
quais 21 em resultado de violência de género.
O número não tem baixado e a tendência não é para abrandar. “Os dados de 2025 denotam que os feminicídios e as tentativas de feminicídio continuam sem abrandar, em Portugal”, lamentou Cátia Pontedeira, criminóloga e coordenadora do OMA, na apresentação do relatório, sustentando: “O número de mortes e o número de denúncias de violência de género e doméstica mostram a gravidade da realidade portuguesa. E a prevenção das mortes “não pode depender da coragem da vítima ou do acaso”.
O número não tem baixado e a tendência não é para abrandar. “Os dados de 2025 denotam que os feminicídios e as tentativas de feminicídio continuam sem abrandar, em Portugal”, lamentou Cátia Pontedeira, criminóloga e coordenadora do OMA, na apresentação do relatório, sustentando: “O número de mortes e o número de denúncias de violência de género e doméstica mostram a gravidade da realidade portuguesa. E a prevenção das mortes “não pode depender da coragem da vítima ou do acaso”.
Segundo
os dados apresentados, atinentes apenas a casos divulgados pela comunicação
social, das 24 mulheres assassinadas, de 2 de janeiro a 15 de novembro, 21
foram consideradas vítimas de feminicídio, ou seja, “todas as mortes
intencionais de mulheres relacionadas com questões de género”. Os outros três
casos foram classificados como assassinatos.
Dos
21 feminicídios, 16 ocorreram em relações de intimidade (namoro ou casamento) e
cinco em contexto familiar; em particular, neste ano, registaram-se casos de
filhos que atacaram as mães. Em todos os casos, os agressores foram homens; nos
74 casos analisados, 50 são tentativas de assassinato e 24 mortes efetivas; e,
em todas, o ofensor é um homem e a vítima uma mulher; logo, isto é,
marcadamente, violência de género”,
O
grupo de trabalho procurou perceber o contexto dos atentados pela descrição dos
crimes e, na maioria dos assassinatos ou de tentativas, a relação de “posse e
controlo do outro” foi o motivo predominante. E verificou-se que, em mais de
metade dos casos (57%), existia violência doméstica e que, em grande parte das
situações, havia conhecimento prévio, por parte de terceiros, como vizinhos,
familiares ou conhecidos. “Temos de quebrar o mito de ‘entre marido e mulher
não se mete a colher’ e perceber que é um problema sistémico”, insiste a
criminóloga.
Na
maioria dos casos, os crimes ocorreram na residência conjunta e, em 57% (cerca
de 12), a vítima foi morta, com recurso a arma branca, e com arma de fogo, em
19%. Também a asfixia, o estrangulamento, o espancamento e o overkill (excesso
de força) – mais do que uma forma de matar alguém – foram causas identificadas
de morte. Em metade dos casos identificados, a vítima e o agressor tinham
filhos em comum, sendo menores, em quatro desses casos. Em cinco dos casos
noticiados, “os perpetradores tentaram ocultar o crime, escondendo o corpo das
vítimas ou mentindo sobre as circunstâncias do crime”, lê-se no relatório.
Em
33% dos casos em que existia violência doméstica, já havia denúncia às
autoridades. “As vítimas terem sido sinalizadas e, mesmo assim, serem mortas é
uma falha de todos”, afirma Cátia Pontedeira, vincando: “Nas situações de
denúncia, falhamos na avaliação de risco; tem de haver formação sobre a
complexidade destas situações; não podemos achar que um estrangulamento no meio
de uma discussão é normal; não o é. É um caso grave de violência doméstica.”
A
criminóloga refere que o sistema falha na avaliação dos casos de violência
doméstica e que, tanto na atuação policial como na judicial, há tendência para
“suavizar”. Por isso, reforça que é preciso “aplicar, mais vezes, a prisão
preventiva e perceber que, na violência doméstica, há muita reincidência e que
não só as mulheres, mas também familiares e pessoas à volta estão em risco”.
A
coordenadora do OMA refere que há inúmeros casos de mulheres agredidas com
tesouras, com pedras ou com martelos que não são “considerados de grande
gravidade”. “Se uma mulher agredida com um destes objetos, ou com óleo a
ferver, e deixada à beira da estrada não são razões para colocar uma pessoa em
prisão preventiva, então quais são?”, questiona.
O
relatório mostra que, além das mortes concretizadas, houve 50 tentativas, das
quais 40 foram consideradas feminicídios. Mais uma vez, a maioria (38 casos)
ocorreu em contexto de relações de intimidade: 30 em relações atuais, seis em
relações passadas e um decorrente de uma relação de intimidade pretendida, em
que o ofensor não aceitou a rejeição por parte da vítima.
“Destas
40 tentativas, apenas 24 resultaram em prisão preventiva. E os outros? Alguém
que tenta matar e que, por sorte ou acaso, não consegue, ainda assim permanece
em liberdade. […] Ficam com uma medida de coação de afastamento da vítima, mas
não ficam imediatamente em prisão; isto diz muito sobre como estamos a encarar
esta situação”, critica a criminóloga.
Cátia
Pontedeira aponta falhas no entendimento da gravidade destas situações e adverte:
“Não podemos continuar a assistir a casos em que agressões graves e tentativas
de homicídio resultam em medidas de coação insuficientes e penas suspensas.”
Na
conclusão do relatório, o conceito-chave é a “prevenção”, que, para a coordenadora
do OMA, deve começar nas escolas e na educação. “Só trabalhando com as pessoas
o que são relações saudáveis e abusivas, só treinando isto na sociedade, é que
vamos conseguir terminar este flagelo social”, considerou, lembrando que a
violência doméstica é transversal a todas as idades e estatutos socioeconómicos
e que é necessário “romper esta lógica de poder e [de] controlo numa das partes
da relação”.
Já
em fevereiro de 2025, a UMAR apresentou um Estudo Nacional de Violência no
Namoro que revela o aumento da legitimação de comportamentos violentos entre os
jovens. “Mais de 70% dos jovens de 15 anos não identificaram certas
circunstâncias no namoro como abusivas, como o controlo – com quem se sai,
querer ver as redes sociais, por exemplo – e isto ajuda-nos a perceber que
estes jovens vão iniciar relações sem noção destas questões e, portanto, vão
normalizar situações que não devem ser normalizadas”, observou Cátia Pontedeira.
Há
clara manifestação de diferentes formas de violência de geração para geração,
sempre com a profunda marcação da desigualdade de género. A sociedade
patriarcal, do controlo do homem, continua a reproduzir-se de geração em
geração, favorecida por algum discurso político e pela prática política e empresarial.
Poucos têm dúvida de que a violência física é abusiva, mas praticam-na e adotam
outras manifestações que são normalizadas, como certos comportamentos de
controlo, de ciúme, de humilhação e de violência psicológica. Em contraponto, há
muito pouca vontade de investir na prevenção destas situações, porque os
resultados não são imediatos, mas, a longo prazo, fariam toda a diferença.
O
relatório apela a respostas articuladas entre as várias autoridades e à
especialização de profissionais, como polícias, magistrados, equipas médicas,
sociais e educativas, para que tenham capacidade de compreender sinais de risco
e padrões de violência, a fim de salvar vidas. Com efeito, há muito caminho a
percorrer na luta pela eliminação da violência contra as mulheres.
Por
isso, como já referimos, a CIG organizou, em Lisboa, pelas 14h30, um evento, no
MAAT Central, a alertar para a violência física, psicológica, sexual e social
que atinge as mulheres. A UMAR promoveu, em cidades, como Lisboa, Porto,
Leiria, Funchal, Seixal ou Figueira da Foz, marchas e debates sobre o tema, sendo
de salientar que, no Porto, a UMAR, organizou a sua 14.ª Marcha contra a
Violência Doméstica e de Género, pelas 19h00, que teve o ponto de encontro na
Praça da Batalha e foi até ao Mercado do Bolhão. E é de destacar a “Marcha pelo
Fim da Violência Contra as Mulheres”, organizada por 18 associações feministas.
Por
seu turno, o Presidente da República associou-se ao apelo da ONU, no combate ao
“flagelo da violência contra as mulheres e as raparigas”, neste ano, orientado
para o combate à violência digital. E a Presidência da República assinalou este
“Orange Day” da ONU, iluminando o Palácio de Belém de cor de laranja, “para dar
visibilidade à causa”.
***
A
violência feminina e a doméstica atentam contra a pessoa e contra a família.
2025.11.25
– Louro de Carvalho
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