Há
uns tempos, o governo de coligação do Partido Social Democrata (PSD) e do
partido do Centro Democrático Social – Partido Popular (CDS-PP) anunciou o
Anteprojeto de Lei da reforma da legislação laboral, designado “Trabalho XXI” e
conhecido por “Pacote Laboral”, sem que tal matéria constasse do programa com
que a coligação se apresentou ao eleitorado, nem do programa do governo que
passou no escrutínio parlamentar.
Várias entidades, nomeadamente, os sindicatos, manifestaram-se contra os conteúdos do anteprojeto, ficando em evidência pontos concretos que mereceram o repúdio de entidades e de organizações ligadas a diversos setores afetados por alguns conteúdos críticos, como a licença para a amamentação ou o luto gestacional.
Várias entidades, nomeadamente, os sindicatos, manifestaram-se contra os conteúdos do anteprojeto, ficando em evidência pontos concretos que mereceram o repúdio de entidades e de organizações ligadas a diversos setores afetados por alguns conteúdos críticos, como a licença para a amamentação ou o luto gestacional.
O
governo foi respondendo às críticas de forma evasiva e mantendo, no geral, os
mais de cem itens a alterar na legislação laboral em vigor.
Naturalmente,
a contestação foi ganhando pulso e, a 8 de novembro, ingente massa de
trabalhadores encheu a Avenida da Liberdade, em Lisboa, “Contra o Pacote
Laboral”, sob convocação da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses –
Intersindical Nacional (CGTP-IN).
Na
resolução que deu corpo à convocação da marcha de protesto, a CGTP-IN acusa o
governo de, com apoio do partido Chega (CH) e da Iniciativa Liberal (IL), ter
em marcha “uma política de assalto aos direitos fundamentais e de afronta à
Constituição da República Portuguesa [CRP] que atinge quem trabalha e
trabalhou, os serviços públicos e as funções sociais do Estado”.
Mais
refere que tal estratégia “procura fragilizar os direitos laborais, bem como o
direito à saúde, à educação, à proteção social, à habitação, entre outros”,
aliás, como foi clarificado na proposta de Orçamento do Estado para 2026 (OE2026)
que, a ser aprovada, “será mais um instrumento de degradação dos serviços
públicos”. Ou seja, na ótica desta organização sindical, esse pacote laboral,
se fosse levado à prática, “representaria um enorme retrocesso nos direitos dos
trabalhadores”, visto que “o seu conteúdo não só não dá resposta aos problemas
que, já hoje, existem na legislação laboral, com normas que agridem os
trabalhadores e os seus direitos e que precisam de ser revogadas, como os
agrava”, constituindo “uma resposta integral às pretensões do capital que os
patrões aplaudem”.
Sustenta
a CGTP que se trata de “ataque concertado a um conjunto alargado de direitos”,
contendo “propostas que visam a perpetuação e agravamento dos baixos salários,
intensificam a desregulação dos horários, multiplicam os motivos e alargam os
prazos para os vínculos precários, facilitam, ainda mais, os despedimentos e
limitam a defesa e [a] reintegração dos trabalhadores, procurando impor o
despedimento sem justa causa”. Por outro lado, há um ataque aos “direitos de
maternidade e [de] paternidade”, a promoção da caducidade/ destruição da
contratação coletiva, pondo em causa “o princípio do tratamento mais favorável
em mais matérias”, um ataque à “liberdade sindical e ao direito de greve”, com
a imposição de “limitações que ferem, de forma profunda, estes direitos
fundamentais”, ao arrepio do “exigido, para os trabalhadores e para o país”.
Por
conseguinte, a CGTP-IN exige ao governo “que retire o pacote laboral que
apresentou e que revogue as normas gravosas que, já hoje, existem na legislação
laboral e que tanto prejudicam os trabalhadores”. E, ao mesmo tempo, afirma o
desenvolvimento da luta reivindicativa e da mobilização dos trabalhadores, “pela
derrota do pacote laboral, por mais salário e direitos, contra o aumento do
custo de vida, em defesa dos serviços públicos e das funções sociais do Estado”.
Assim,
“para responder a este enorme ataque aos direitos e para abrir caminho para um
outro rumo para o país”, assume “a elevação e a ampliação da luta organizada,
com a mobilização e a adesão à ‘Greve Geral – Contra o Pacote Laboral! Não
ao retrocesso e à exploração. Por mais salário, mais direitos, mais serviços
públicos’, que vamos realizar no próximo dia 11 de dezembro”.
***
Entretanto,
o candidato presidencial Luís Marques Mendes, em entrevista à RTP 1, lançou
um apelo ao governo, no sentido de ter em conta a relevância da União Geral de
Trabalhadores (UGT), por se tratar de uma central sindical que sempre tem estado
presente nas negociações com o governo e assinado os respetivos acordos.
O governo, pela voz do primeiro-ministro (PM), pede às centrais sindicais responsabilidade num momento em
O governo, pela voz do primeiro-ministro (PM), pede às centrais sindicais responsabilidade num momento em
que o país se debate com graves desafios, não entende a razão
pela qual é convocada uma greve geral e avisa que “não há razão” para greve geral, porque a lei
laboral está em negociação.
Esquece,
porém, que a negociação está a encaminhar-se no sentido contrário ao que
desejam e do que precisam os trabalhadores.
Por
seu turno, o Presidente da República (PR) pediu “espírito de concertação social”,
para se obter “o máximo consenso possível” sobre as alterações à legislação
laboral, considerando que ainda há tempo para se ponderar e para se debater.
O
chefe de Estado considerou que, sendo a greve um direito, “a greve geral é
um direito com maior amplitude, porque reúne o maior número de trabalhadores ou
o maior número de confederações sindicais”. Por outro lado, salientou que o
processo de revisão da legislação laboral – lançado pelo governo, em julho,
através de um anteprojeto – “ainda está longe da sua conclusão”, porque “tem de
ir à Assembleia da República [AR], tem de ir à concertação social”.
Maria
do Rosário Palma Ramalho, ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social,
prometeu não mexer, em demasia, na proposta inicial do governo, visando a maior
flexibilização laboral. Todavia, o governo foi sensível à marcação de greve
geral, o que não se via, desde 2013.
Para
convencer a UGT a recuar na paralisação, o executivo desiste da ideia de poder
dar dois dias extra de férias sem direito a remuneração, beneficiando, ao
invés, o trabalhador que não falte durante o ano a conseguir três dias de
férias extra. Repõe a ideia das 40 horas de formação (antes, propunha
20) e pressupõe que duodécimos no Natal e de férias dependem de acordo entre
trabalhador e empregador.
No
entanto, é no processo de simplificação do despedimento com justa causa,
nomeadamente, com a inexistência de obrigação de testemunhas, que é feita a
grande mudança. Permanece a ideia de simplificação, mas baixa o índice.
Antes, seriam afetadas empresas até 250 trabalhadores; agora, só abaixo de 50
poderá ser efetuada a simplificação. É uma resposta clara à reivindicação
das centrais, quanto à crítica às grandes empresas e aos despedimentos
coletivos, pressupondo recorrer a outsourcing. Nesse capítulo, o governo
não recua, contrariando a lei atual, que impede o recurso a outsourcing,
nos 12 meses subsequentes a um despedimento coletivo. E também não há recuo, no
fim da obrigatoriedade de reintegração, em caso de despedimento fraudulento.
Como
havia sido anunciado, o trabalhador poderá escolher a jornada contínua e
abdicar de pausa, para sair mais cedo do trabalho. Mais recuos significativos
veem-se na amamentação: apesar de exigir atestado na dispensa para a
lactação, passa a ser necessário o comprovativo apenas após o primeiro ano da
criança.
“Tivemos
uma conversa com o governo, há dois ou três dias, em que surgiu uma nova
proposta”, afirmou, no dia 13 de novembro, Mário Mourão, líder da UGT. Porém,
as suas declarações à agência Lusa reiteraram a intenção de manter a
greve geral. “Não há ainda matéria em cima da mesa que deixe a UGT
confortável para desmarcar a greve. É muito pouco”, frisou.
A
reformulação do Pacote Laboral foi pedida por todos os partidos da oposição.
Para o Chega, a questão da amamentação era pilar essencial. Para o Partido Socialista
(PS), o despedimento coletivo simplificado e a ausência de reintegração eram os
grandes celeumas. A esquerda, generalizadamente, falou de grave ataque aos “direitos
dos mais jovens trabalhadores, das mulheres trabalhadoras, das famílias e dos
mais vulneráveis”, criticando a subserviência, quanto às confederações
empresariais. Também o PR, pediu concertação social para o efeito, pressionando
o governo a ajustar algumas das medidas anunciadas, já desde julho.
***
Do
seu lado, a UGT reafirma a autonomia e responde às declarações do PM sobre a
greve geral.
A UGT rejeita, categoricamente, qualquer insinuação de que esteja “refém” de partidos políticos ou de governos, pois “nunca esteve, não está e não estará submetida a interesses partidários”. Ao invés, é “uma central sindical livre, democrática e autónoma”, cuja ação “é orientada pelos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras portugueses”.
A UGT rejeita, categoricamente, qualquer insinuação de que esteja “refém” de partidos políticos ou de governos, pois “nunca esteve, não está e não estará submetida a interesses partidários”. Ao invés, é “uma central sindical livre, democrática e autónoma”, cuja ação “é orientada pelos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras portugueses”.
Em
declarações à Antena 1 e à TSF, o secretário-geral da UGT recordou
que a central “já assinou acordos” com governos sociais-democratas, com
governos socialistas e com o atual, porque não está “para servir governos, nem
partidos”, mas “para servir os trabalhadores portugueses”.
Face
às recentes asserções do PM, Mário Mourão sustenta que “revelam um
desconhecimento profundo sobre o ADN da UGT”. E explicitou: “Provavelmente, não
conhece aquilo que é o ADN da UGT, mas tem de se esforçar um pouco mais, porque
a UGT, por acaso, também tem no seu seio os trabalhadores sociais-democratas
(TSD). Ninguém resgata a UGT, porque a UGT responde apenas àqueles que
representa.”
O
líder desta central sindical sublinhou que “são os interesses daqueles que
representamos – nós e os nossos sindicatos – que orientam a ação sindical” e
que isso “nunca pode estar em causa, independentemente do partido que esteja no
governo ou de qualquer outra organização”.
Sobre
o processo negocial em curso, destacou a dimensão e a gravidade do pacote
laboral que está em cima da mesa. “O pacote contém mais de 100 artigos para serem
alterados. É muita coisa, e há situações gravíssimas que a UGT jamais poderá
aceitar”, vincou.
Mário
Mourão reafirmou que a UGT nunca se fechou ao diálogo: “Sempre lá estivemos.
Ainda na última reunião, estivemos. Vamos continuar a estar. Nós não vamos
ameaçar abandonar a Concertação Social, nós nunca fechámos a porta.”
Por
isso, a UGT exige clareza ao governo, quanto à sua estratégia e quanto aos interlocutores,
face a declarações públicas da ministra do Trabalho, que assumiu ter negociado
com o Chega. “Se essa é a opção do governo, então que a assuma claramente.
Assim, evitavam-se falsas expectativas junto dos trabalhadores, dos sindicatos
e do país.”
A
UGT considera que o governo deve reforçar o compromisso com soluções justas,
equilibradas e negociadas, e reafirma o seu princípio central e inegociável: “defender
os direitos e os interesses de quem trabalha, com autonomia, independência e
liberdade. Sempre.”
Em
rejeição firme da reforma laboral proposta pelo governo e exigindo verdadeira
negociação, a UGT decidiu, a 13 de novembro, em reunião do seu conselho geral,
convocar uma greve geral para o dia 11 de dezembro, em resposta ao Anteprojeto
de Lei da reforma da legislação laboral apresentado pelo governo, designado
“Trabalho XXI”.
Desde
a confrontação com esta proposta, em julho de 2025, na Comissão Permanente de
Concertação Social, a UGT tem manifestado oposição firme e fundamentada a um
documento que julga “desequilibrado, regressivo e prejudicial para quem
trabalha”. Com efeito, na sua ótica:
*
reflete opção clara a favor dos empregadores, aumentando o poder unilateral das
empresas em áreas, como banco de horas individual, contratação a termo,
despedimentos, outsourcing, parentalidade ou formação profissional;
*
fragiliza os trabalhadores e a ação sindical, atingindo a negociação coletiva,
o exercício do direito à greve e a intervenção dos sindicatos nos locais de
trabalho;
*
ignora prioridades essenciais para o país, como salários e rendimentos,
políticas de migração, habitação ou atualização de acordos essenciais à
concertação social.
Apesar
da sua tradicional postura de diálogo e de abertura negocial, a UGT assinala
que, ao longo das últimas reuniões, o governo passou de posição de suposta
disponibilidade para negociar para a imposição de “linhas vermelhas”,
condicionando qualquer evolução à assinatura de um acordo fechado,
independentemente da justiça ou do equilíbrio das matérias em causa. Assim, a UGT
considera que este comportamento configura simulacro de negociação,
desvirtuando o papel da concertação social e pondo em causa a confiança entre
os parceiros sociais. E proclama o óbvio: “A UGT quer negociar, mas não
negoceia sozinha.”
Por
isso, está “contra uma reforma laboral que não pode avançar, contra um ataque
sem precedentes aos trabalhadores e sindicatos, contra a indiferença, face aos
problemas reais dos portugueses, contra o simulacro negocial”; e “por um
verdadeiro diálogo e uma negociação com resultados, por uma legislação que
responda aos verdadeiros desafios do presente e do futuro do trabalho, por um país
mais justo, em nome de quem trabalha e quer dignidade no seu trabalho.”
Perante
o contexto atual, o Conselho Geral da UGT, sob proposta do Secretariado
Nacional aprovou, por unanimidade: a convocação de uma greve geral para 11 de
dezembro de 2025; e o início de contactos com outras estruturas representativas
de trabalhadores, com vista à construção de uma plataforma de convergência
na ação sindical.
Em
suma, a UGT “reafirma o seu compromisso com a defesa dos trabalhadores e com a
construção de soluções que respondam aos desafios atuais e futuros do mundo do
trabalho, rejeitando quaisquer retrocessos na legislação laboral”.
***
A
situação é muito grave. Os direitos dos trabalhadores, embora protegidos constitucionalmente,
estão cada vez mais exíguos; as condições de trabalho estão sufocantes; o salário
médio não dá para sobreviver condignamente e o salário mínimo dá para sobreviver
por milagre, mercê do custo de vida e, em especial, dos custos de alimentação, de
medicação e de habitação; é cada vez mais difícil congraçar a vida profissional
com a vida pessoal e familiar; a precariedade cresce e recrudesce; e o apoio à
natalidade é contraditado por medidas laborais e pelos custos da infância, não
fazendo inverter o inverno demográfico e a prevalência de uma população envelhecida.
O patronato parece considerar que não precisa dos trabalhadores; e os governos, em vez de promoverem o bem-estar geral, estão ao serviço do patronato, tantas vezes, anónimo, em resultado de um capitalismo financeiro sem rosto, que subjuga os cidadãos, aos quais acusa de iliteracia financeira. É para isto que elegemos os nossos representantes, que, sem contestação de jeito, dizem ou permitem que se diga que precisamos de “Três Salazares”?
O patronato parece considerar que não precisa dos trabalhadores; e os governos, em vez de promoverem o bem-estar geral, estão ao serviço do patronato, tantas vezes, anónimo, em resultado de um capitalismo financeiro sem rosto, que subjuga os cidadãos, aos quais acusa de iliteracia financeira. É para isto que elegemos os nossos representantes, que, sem contestação de jeito, dizem ou permitem que se diga que precisamos de “Três Salazares”?
As
greves incomodam, mas são um direito; e esta é mais que justa e vem a tempo!
2025.11.14
– Louro de Carvalho
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