quarta-feira, 5 de março de 2025

Dívida pública aumentou 3,6 mil milhões de euros em janeiro

 
“Em janeiro de 2025, a dívida pública, na ótica de Maastricht, aumentou 3,6 mil milhões de euros, para 274,3 mil milhões de euros. Esta evolução refletiu, sobretudo, o acréscimo dos títulos de dívida (3,1 mil milhões de euros), maioritariamente de longo prazo, e dos certificados de aforro (0,4 mil milhões de euros)”, referiu, a 3 de março, o Banco de Portugal (BdP), na nota de informação estatística da dívida pública atualizada para janeiro de 2025.
De acordo com a mesma nota, “os ativos em depósitos das administrações públicas totalizaram 13,4 mil milhões de euros, o que corresponde a um aumento de 0,1 mil milhões de euros, relativamente ao final de 2024. Deduzida desses depósitos, a dívida pública subiu 3,5 mil milhões de euros, para 260,9 mil milhões de euros.
Assim, depois de 13 meses consecutivos marcados por correções homólogas, o stock da dívida pública contabilizou, em janeiro deste ano, o quarto mês seguido de aumentos, com a dívida das administrações públicas na ótica de Maastricht a registar um incremento homólogo de 1,81% e um aumento mensal de 1,34%. Atualmente, o stock da dívida pública está no valor mais elevado desde julho de 2024.
Ao crescimento do stock da dívida registado no mês de janeiro não é alheia a emissão sindicada de quatro mil milhões de euros de uma obrigação a 10 anos, realizada pela Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP) a 9 de janeiro.
Contudo, apesar desta tendência de subida, nos últimos quatro meses, o rácio da dívida pública não aumentou. Segundo os dados do BdP divulgados a 3 de fevereiro, a dívida pública caiu para 95,3% do produto interno bruto (PIB), no final de 2024, ficando abaixo das previsões do governo, que apontavam para os 95,9%. Um melhor desempenho económico em 2024 ajudou a baixar o rácio para o valor mais baixo desde junho de 2010, há 14 anos.
Em janeiro de 2025, a dívida das administrações públicas era de 274 279,65 milhões de euros, contra 251343,92 milhões de euros de janeiro de 2020. Por seu turno, a dívida das administrações públicas líquida de ativos em depósitos das administrações públicas, em janeiro de 2025, era de 260 867,61 milhões de euros, contra 234 109,3 milhões de euros de janeiro de 2020.
Em janeiro de 2025, o numerário e os depósitos somam 475,96 milhões de euros; os títulos de dívida, 3088,01 milhões de euros; e os empréstimos, 65,28 milhões de euros.
Se a tendência para a subida se mantém ou não ver-se-á a 1 de abril, quando o BdP publicar nova informação estatística.
***
É de recordar que, de acordo com a nota de informação estatística do BdP, referente a dezembro de 2024, publicada a 3 de fevereiro, “no final de 2024, a dívida pública na ótica de Maastricht totalizava 270,7 mil milhões de euros, mais 8,8 mil milhões de euros do que no final de 2023”, variação que “resultou, em grande medida, do aumento dos títulos de dívida (+7,5 mil milhões de euros), especialmente, de curto prazo (+5,9 mil milhões de euros), e dos empréstimos (+1,4 mil milhões de euros)”. E, “as responsabilidades em depósitos reduziram-se 0,1 mil milhões de euros, devido, sobretudo, à diminuição dos certificados do Tesouro (-1,3 mil milhões de euros), que foi parcialmente compensada pelo crescimento dos certificados de aforro (+0,7 mil milhões de euros)”.
Os ativos em depósitos das administrações públicas aumentaram 1,9 mil milhões de euros em 2024. A dívida pública deduzida de ativos em depósitos cresceu 6,9 mil milhões de euros, para 257,3 mil milhões de euros.
Considerando a estimativa do produto interno bruto (PIB) para 2024, a dívida pública era, no final do ano, em 95,3% do PIB, o que representa uma redução de 2,6% relativamente ao final de 2023.
Em dezembro de 2024, a dívida pública na ótica de Maastricht aumentou 1,5 mil milhões de euros, em relação ao mês anterior, para 270,7 mil milhões de euros, o que refletiu o acréscimo dos empréstimos (+1,1 mil milhões de euros), por via do recebimento de uma tranche 1,3 mil milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e de emissões de certificados de aforro (+0,4 mil milhões de euros).
Para o cálculo da dívida pública em percentagem do PIB, utiliza-se o valor nominal do PIB divulgado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). E, se o valor do PIB nominal para o trimestre mais recente não estiver disponível, à data da publicação da informação sobre dívida pública, é feita extrapolação com base na seguinte informação divulgada pelo INE: valor nominal do PIB do trimestre homólogo, variação homóloga em volume do trimestre mais recente e variação homóloga do deflator do PIB do trimestre anterior.
O peso da dívida pública no PIB reduziu-se de 97,9%, em 2023, para 95,3%, em 2024, abaixo do previsto pelo governo, que apontava para os 95,9%, e o valor mais baixo, desde junho de 2010 (93,6%).
***
A 1 de março, na sua comunicação ao país, o primeiro-ministro (PM) agitou uma das bandeiras da sua governação, enfatizando que a dividida externa correspondia a 60% do PIB, contra os mais de 100% do PIB, em 2010.
Obviamente, o PM falou de coisas diferentes. Há diferença, não pequena, entre dívida pública e dívida externa. Nas páginas do BdP e na Pordata, encontramos esclarecimento sobre a matéria   
A dívida pública corresponde às responsabilidades financeiras do setor das administrações públicas e é um dos indicadores macroeconómicos mais relevantes utilizado para avaliar a saúde financeira das administrações públicas de um país e, frequentemente, do próprio país como um todo. Há várias formas de a medir. Nos países da União Europeia (UE), utiliza-se uma definição harmonizada que é, comummente, designada por “dívida de Maastricht”.
De acordo com esta ótica, a dívida externa engloba as responsabilidades em numerário e em depósitos constituídos junto das administrações públicas (como os certificados de aforro ou do Tesouro), os títulos de dívida emitidos pelas administrações públicas (destacando-se, entre outros, as obrigações e os bilhetes do Tesouro) e os empréstimos obtidos por estas entidades. Não são incluídos alguns instrumentos financeiros, tais como as ações e outras participações, os derivados financeiros e os outros débitos/créditos (nos quais se incluem as dívidas comerciais).
Este conceito de dívida é calculado de forma consolidada, ou seja, exclui as dívidas de entidades das administrações públicas que sejam detidas por outras entidades deste setor e adota como regra de valorização o valor nominal, ou seja, o que as administrações públicas (emitentes/devedores) deverão amortizar no termo do contrato.
O valor da dívida pública é expresso em unidades monetárias mas, para fins de análise, é, frequentemente, apresentado em percentagem do produto PIB.
Os estados-membros da UE, no Tratado da União Europeia (TUE), acordaram em manter a dívida pública em valor inferior a 60% do PIB e défice orçamental inferior a 3% do PIB. No Pacto de Estabilidade, os estados-membros comprometeram-se a manter a situação orçamental positiva ou próxima do equilíbrio. Tais valores estão definidos no Protocolo anexo ao TUE sobre o procedimento relativo aos défices excessivos (PDE), referindo que os estados-membros devem enviar à Comissão Europeia informação do défice e da dívida do respetivo país. De acordo com a legislação em vigor, o Eurostat analisa e valida a informação transmitida por cada país.
Para lá do conceito da dívida de Maastricht, há outras formas de medir a dívida pública. As principais diferenças entre as diversas alternativas assentam, essencialmente, nas entidades abrangidas, nos instrumentos considerados e nos critérios de valorimetria utilizados.
O indicador do endividamento das administrações públicas tem duas principais diferenças, face à dívida de Maastricht: considera também as responsabilidades das administrações públicas em dívidas comerciais; é calculado de forma não consolidada, ou seja, inclui a dívida de entidades das administrações públicas detida por outras entidades deste setor. Adicionalmente, é divulgada informação sobre o endividamento do setor público não financeiro, que inclui, além do setor das administrações públicas, as sociedades não financeiras públicas.
O indicador dos passivos das administrações públicas resultantes das contas nacionais financeiras é uma medida alternativa da dívida deste setor e inclui as responsabilidades sob a forma de derivados financeiros, de ações e de outras participações e de outros débitos (incluindo as dívidas comerciais), que complementam os instrumentos incluídos na dívida na ótica de Maastricht (depósitos e equiparados, títulos de dívida e empréstimos). A informação produzida no âmbito das contas nacionais financeiras é avaliada ao valor de mercado e engloba juros vencidos por pagar, constituindo mais um ponto de divergência face à dívida de Maastricht.
A dívida direta do Estado corresponde à dívida em que o subsetor Estado é o devedor efetivo, isto é, inclui apenas os passivos deste subsetor. A dívida direta do Estado é também apurada de forma não consolidada, ou seja, inclui os passivos deste subsetor detidos por outros subsetores das administrações públicas.
Já a dívida externa envolve outro conceito mais abrangente. Mede, para um determinado horizonte de tempo, o endividamento dos residentes num país, em relação aos residentes no resto do Mundo.
A dívida externa bruta é o valor presente das responsabilidades (passivos) atuais e não contingentes que exigem o pagamento do capital em dívida, ou de juros, pelo devedor residente a um credor não residente, em algum ou alguns momentos do tempo. E inclui a dívida pública e privada de residentes em Portugal, face aos residentes no resto do Mundo, que engloba as responsabilidades em títulos de dívida, empréstimos, dívidas comerciais e depósitos.
São exemplos de stocks considerados no cálculo da dívida externa:
1. Os títulos de dívida emitidos por residentes e detidos por não residentes, por exemplo, os títulos de dívida pública portuguesa adquiridos por um fundo de investimento na Alemanha ou obrigações emitidas por uma empresa portuguesa adquiridas por uma família americana;
2. Os empréstimos concedidos por um banco em Espanha a uma empresa em Portugal;
3. Os créditos comerciais concedidos por um fornecedor angolano a uma empresa em Portugal;
4. Os depósitos que uma família do Brasil constituiu num banco em Portugal.
Não são incluídos no cálculo os passivos constituídos por instrumentos de capital (por exemplo, as ações de empresa portuguesa detidas por um investidor estrangeiro) e derivados financeiros.
Além da dívida externa bruta é referida a dívida externa líquida, que corresponde à dívida externa bruta deduzida do mesmo tipo de ativos que os residentes detêm sobre não residentes.
São exemplo de ativos de dívida sobre o exterior:
1. Os títulos de dívida emitidos por não residentes e detidos por residentes em Portugal, como, por exemplo, títulos de dívida pública italiana detidos por um fundo de pensões em Portugal ou obrigações de uma empresa alemã detidas por um banco em Portugal;
2. Os empréstimos concedidos por um banco em Portugal a empresa em Cabo Verde;
3. Créditos comerciais concedidos por um fornecedor em Portugal a empresa no Reino Unido;
4. Os depósitos de uma família em Portugal num banco na Suíça.
A dívida externa líquida está muito associada à posição de investimento internacional (PII). Na realidade, a dívida externa líquida corresponde ao simétrico de um subconjunto dos ativos e passivos considerados na posição de investimento internacional. Não são incluídos no cálculo da dívida externa líquida os ativos e passivos de instrumentos de capital e derivados financeiros e os ativos de ouro em barra.
dívida externa bruta assume sempre valores positivos. Em 2024, a dívida externa bruta de Portugal atingiu 419 469 milhões de euros, representando 147,7% do PIB.
dívida externa líquida pode assumir valores negativos ou positivos, consoante os ativos de dívida sejam maiores ou menores que os passivos de dívida. Assim, a dívida externa líquida é positiva, quando os passivos de dívida são superiores aos ativos de dívida e significa que o país tem uma responsabilidade líquida face ao exterior. Porém, é negativa, quando os passivos de dívida são inferiores aos ativos, indicando que existe um ativo líquido sobre o exterior.dívida externa líquida de Portugal é positiva, o que significa que Portugal é um país devedor, face ao exterior. Em 2024, a dívida externa líquida atingiu 44,5% do PIB.
Em contraponto, quanto à PII, o ativo líquido era -58,33% do PIB, no último trimestre de 2024, contra os -74,75% em igual período de 2023.
Em 2023, Portugal apresentara a 3.ª maior dívida externa líquida (53%) em percentagem do PIB da UE, situando-se atrás da Grécia (124%) e da Finlândia (57%). O Luxemburgo (-2289%), Malta (-926%) e a Irlanda (-222%) são exemplos de países com dívida externa líquida negativa, o que significa que têm ativos de dívida superior aos seus passivos, apresentando-se assim como países credores, face ao exterior.
Nestes termos, o valor percentual apontado pelo PM será um valor peregrino.
***
Enfim, Portugal está melhor, mas não pode embandeirar em arco, porque o vento pode arrancar a vela e a embarcação pode meter água.

2025.03.05 – Louro de Carvalho


Sem comentários:

Enviar um comentário