Pedro Francisco Machado, referido como Peter
Francisco nos Estados Unidos da América (EUA), foi
um Português, nascido, a 9 de julho de 1760, na freguesia do Porto Judeu,
no concelho de Angra do Heroísmo, ilha Terceira, Açores, que se
destacou como herói na Guerra da Independência dos Estados Unidos da
América.
Conhecido
como “O Gigante da Virgínia”, o “Gigante da Revolução” e, ainda, como o
“Hércules da Virgínia”, era um órfão português que lutou ao lado do general
George Washington (líder político, militar,
agricultor, empresário do tabaco, um dos pais dos EUA e o seu primeiro
presidente) e do marquês de Lafayette, Marie-Joseph Paul Yves Roch Gilbert du Motier (“O Herói dos Dois Mundos”, aristocrata e militar
francês que lutou pelo lado revolucionário nos EUA e que foi importante figura
na Revolução Francesa, em 1789, e na revolução de julho, em 1830).
Tendo sofrido
inúmeros ferimentos no combate pela independência da sua pátria de adoção,
Pedro Francisco ainda hoje é homenageado pela comunidade portuguesa de New
Bedford, no Massachusetts, a 15 de março.
A sua
biografia está cercada de uma aura de lenda, sendo-lhe atribuídos feitos
extraordinários. As suas origens são algo obscuras. Sabe-se que foi encontrado
em tenra idade (presumivelmente, com cinco anos), na tarde de 23 de junho de
1765, a chorar, nas docas de City Point, na Virgínia. Quando se
acalmou o suficiente para conseguir falar, percebeu-se que não falava o Inglês,
mas uma língua parecida com o Castelhano (falava o Português). Nada
possuía que o identificasse, mas as suas roupas eram de boa qualidade e,
na fivela do cinto, liam-se as iniciais “P.F.”.
Terá sido
raptado por dois homens. Com efeito, parece que foi capaz de contar a sua
história: afirmou que “estava num
local lindo com palmeiras”, a brincar com a sua pequena irmã, quando
dois homens grandes os apanharam a ambos. A irmã conseguiu libertar-se dos
captores, mas o menino não, pelo que foi levado para um navio grande, que
acabou por o conduzir a City Point.
Quanto às
suas origens, o investigador John E. Manahan identificou, nos registos de
nascimentos na Ilha Terceira, nos Açores, a existência de um Pedro Francisco,
nascido em Porto Judeu, a 9 de julho de 1760.
Pedro Francisco acabou por ser acolhido pelo juiz Anthony
Winston (tio de Patrich Henry, figura
proeminente da revolução americana), de Buckingham County, na Virgínia.
Quando atingiu a idade de trabalhar, foi instruído como ferreiro, devido à sua
enorme força e tamanho (parece que ultrapassava os 1,98 metros e pesava 118 kg).
O escritor Samuel Sheperd, que o viu no trabalho, escreveu a seu respeito: “Os seus ombros são como os de uma antiga estátua, como uma figura
da imaginação de Miguel Ângelo, como o seu Moisés, mas não como David. A sua
queixada é longa, forte, o nariz imponente, a inclinação da testa parcialmente
ocultada pelo seu cabelo negro de aspeto desgrenhado. A sua voz era suave,
surpreendendo-me, como que se um touro ganisse.”
Aos
16 anos, com os rumores de secessão a alastrar entre a população da Virgínia,
Pedro Francisco alistou-se no 10.º Regimento da Virgínia. Estava presente
quando Patrick Henry proferiu o seu famoso discurso “Liberdade ou Morte”, junto
à igreja de St. John, em Richmond. Em setembro de 1777, serviu sob as ordens do
general George Washington em Brandywine Creek, na Pensilvânia, onde os
colonos tentaram deter o avanço de 12500 soldados britânicos que avançavam em
direção a Filadélfia.
Não se sabe se foi nessa batalha que Pedro Francisco salvou a
vida de Washington, embora se saiba que o jovem foi aqui alvejado. Segundo
alguns relatos, tornou-se o guarda-costas pessoal do general Washington. Para
outros, era apenas um soldado vigoroso e agressivo que lutou ao lado de
Washington. O certo é que o general ordenou a confeção de uma espada adequada
ao tamanho de Pedro Francisco, sendo que esta espada, com 6 pés de comprimento
(1,82 metros), terá aterrorizado os britânicos. E Washington escreveu acerca do
jovem: “Sem ele teríamos perdido duas batalhas cruciais, provavelmente a
guerra e, com ela, a nossa liberdade. Ele era verdadeiramente um Exército de um
Homem Só.”
Pedro Francisco serviu nesta comissão durante três anos, após
o que se realistou e combateu numa das maiores derrotas dos colonos no
conflito, na batalha de Camden, a 16 de agosto de 1780, tal como na
batalha de Guilford Courthouse, em 15 de março de 1781. Em Camden, terá
realizado um dos seus feitos mais célebres, quando, depois de os colonos se
terem retirado do combate diante dos britânicos, deixaram para trás uma peça de
artilharia com aproximadamente mil libras. Afirma-se que Pedro Francisco a
colocou às costas e a transportou, para que não caísse em mãos inimigas. Em
homenagem a esse ato, em 1974, os correios dos EUA emitiram um selo
comemorativo.
Em pouco tempo, as histórias e feitos de Pedro Francisco
espalharam a sua bravura e o seu vigor, tendo sido divulgadas em jornais e
romances da época, para incentivar a resistência entre as forças dos colonos. É
verdade que algumas destas histórias carecem de fontes documentais. Tanto assim é que Frances Pollard, da Virginia Historical Society, que
apresentou uma exposição sobre o conflito que incluiu uma secção sobre Pedro
Francisco com o colete gigante
que costumava usar, afirmou: “Acho que uma das coisas que tive dificuldade
em documentar foi a sua participação em muitas das batalhas onde realizou
feitos históricos. Nunca consegui separar a lenda dos factos, nem encontrar
provas da sua participação em algumas destas batalhas. Acho que existe alguma
mitologia associada a alguém com aquele tamanho tão fora do vulgar.”
Não
obstante, posteriormente, em 1850, o historiador Benson Lossing registou
no “Pictorial Field Book of the
Revolution”: Um bravo
virginiano deitou abaixo 11 homens de uma só vez com a sua espada. Um dos
soldados prendeu a perna de Pedro Francisco ao seu cavalo com uma baioneta.
E enquanto o atacante, assistido pelo gigante, puxava pela baioneta, com uma
força terrível, Francisco puxou da sua espada e fez uma racha até aos ombros na
cabeça do pobre coitado!”
Mais tarde,
enquanto se recuperava, Pedro Francisco tornou-se amigo de Lafayette, ao lado
de quem lutou pela causa da independência norte-americana.
Francisco
sofreu mais seis ferimentos enquanto estava ao serviço do seu país, tendo morto
um número incerto de britânicos e sido condecorado ao final do conflito por
generais estadunidenses que se certificaram de que ele estava presente na rendição
do general Charle Cornwallis e dos britânicos em Yorkton,
a 19 de outubro de 1781.
De acordo
com a tradição, após o conflito, devido às lendas criadas em torno de si,
muitos aventureiros foram ao seu encontro para testarem a sua força. Neste
período foi apelidado de “o homem mais
forte da América”, enquanto as crianças aprendiam sobre a sua forças e
bravura nas escolas primárias do novo país.
Eventualmente
tornou-se um homem abastado, sendo nomeado beleguim da Câmara de
Representantes da Virgínia, mantendo-se uma figura lendária até à sua morte.
Foi sepultado com honras militares no Cemitério Shockoe Hill em Richmond,
na Virgínia.
A 18 de
janeiro de 1831, o periódico “Richmond Enquirer”, anunciou a sua morte,
ocorrida a 16: “Exmo. Sr. Peter
Francisco, beleguim da Câmara de Representantes e soldado da Guerra da
Revolução Americana, enaltecido pela sua coragem intrépida e pelos seus feitos
brilhantes.”
Uma capa de
uma edição de 2006 da “Military History” levantou uma questão de retórica que
sugeria que ele poderia ter sido o maior soldado da história
americana. A seu respeito, Joseph Gustaitis referiu, na American
Magazine: “Um Hércules de 6 pés e meio
de altura que empunhava um sabre de seis pés de comprimento, Peter Francisco
foi provavelmente o soldado mais extraordinário da Guerra da Revolução
Americana.”
***
A vida deste Português que lutou sob o comando de George
Washington na revolução americana, foi matéria de cinema, num filme produzido
por Travis Bowman, trineto do herói português, e custou 15 milhões de dólares
(13,5 milhões de euros).
A ideia foi produzir um filme independente com as caraterísticas
cinematográficas de grandes dramas históricos, como “Braveheart” e “Gladiador”,
a partir do livro que Travis Bowman publicou em 2009 sobre o seu antepassado,
com o título “Hércules da Revolução”.
“Estamos a trabalhar no financiamento e temos o City National
Bank em Beverly Hills, que vai financiar 10 milhões”, explicou o produtor do
filme, em 19 de outubro de 2019, adiantando que contava com a realização de
Diogo Morgado e com a participação de Daniela Ruah, de Sónia Braga e de Fredy
Costa, e do Brian Patrick Wade no papel principal.
Travis Bowman e Brian Patrick Wade estiveram em Portugal para
participarem em reuniões com o Instituto do Cinema e do Audiovisual, que tinha
um programa de incentivos para produções estrangeiras, e com a NOS, para
assegurar a distribuição na rede de cinemas nacionais.
A 12 de outubro daquele ano, estiveram presentes na 23.ª gala
anual do Conselho de Liderança Luso-Americano dos Estados Unidos (PALCUS), que
decorreu em Sacramento, a fim de promoverem a produção do filme.
“A minha avó falava muito do Peter Francisco quando eu era
novo”, referiu Travis Bowman, que já trabalhava no projeto, havia cinco anos.
Logo na logo na altura em que o escreveu deu conta de que a história “tinha
todos os ingredientes para ser um blockbuster”,
sendo “incrível que nunca tenha sido feito”. E vincou: “Talvez fosse necessário
alguém com paixão, um descendente do Peter como eu sou.”
Depois de ter escrito o livro, realizou um minidocumentário
para o Canal de História que era, até então, o único registo dedicado ao herói
açoriano da revolução americana. “Ele foi raptado em criança e cresce para se
tornar um gigante”, contou o descendente.
George Washington, o primeiro presidente norte-americano,
disse que sem Peter Francisco os EUA poderiam ter perdido a guerra da revolução
contra os britânicos – citação inscrita no monumento erigido em honra do
português em New Bedford: “É verdadeiramente um exército de um homem só”, disse
o presidente, que mandara fazer uma espada de 1,80 metros para ele.
Há vários outros monumentos em sua honra na Carolina do
Norte, em Nova Jersey, em Rhode Island e na Virgínia; e, em 1976, foi emitido
um selo na coleção bicentenária dos EUA com a cara de Peter Francisco, um
"soldado extraordinário".
Vários estados norte-americanos assinalam o Dia de Peter
Francisco a 15 de março, aniversário da batalha de Guilford Courthouse, em
Greensboro, em que o gigante açoriano matou 11 soldados britânicos e quase
morreu dos ferimentos sofridos.
Com o início das filmagens no primeiro trimestre de 2020, em
Portugal, na Virgínia e na Carolina do Norte, a equipa de produção apontava
para o lançamento internacional em 2022, tendo sido fechados, ainda antes, os
acordos de distribuição nos mercados fora dos EUA, nomeadamente em Portugal e no
Brasil. E Bowman referia ter grandes expectativas para “Luso” – título que se
refere à alcunha que Peter Francisco recebeu do general Lafayette. “Quando se
olha para filmes como ‘O Patriota”’, ‘Gladiador’ ou até ‘Guerra das Estrelas’,
vemos uma personagem a ultrapassar dificuldades, tem sempre uma pitada de
romance e um sentimento de patriotismo”, descreveu.
***
É a saga de um Português que luta num país estrangeiro que
lhe coube como pátria.
2023.09.12
– Louro de Carvalho
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