É
o que se pede a todos, quer se trate de cidadãos, quer tenhamos em mente as empresas
e os serviços, quer falemos dos governos e de outras estruturas dos Estados.
Porque,
muitas vezes, não se sabe, ou não se quer saber, definir prioridades para este
ou aquele momento, para este ou aquele setor, pessoas, empresas, serviços e
políticos andam à deriva, restando-lhes a navegação à vista.
Também
a Igreja e os seus cristãos – ou discípulos do caminho, como eram designados nos
primórdios – não conhecem, não assumem as prioridades do ser e missão da Igreja
e dos discípulos. Passam o tempo a conservar hábitos e práticas religiosas, sob
a onda de um supino “descafeinamento”, embora deixando algum tempo e algumas
energias para cumprimento de alguns laivos de caridade, o suficiente para
descarregar a consciência.
O
Evangelho do XIV domingo do Tempo Comum no Ano C (Lc 10,1-12.17-20) dá-nos a nota das prioridades.
A
primeira é o envio. Jesus enviou os
discípulos em missão, dizendo: “Ide, eu vos envio”. Isto quer dizer que, na
perspetiva cristã, o discípulo não pode guardar o que aprende para si próprio.
Deve partir para a missão – o cristão é peregrino, tal como a Igreja que
integra – e ensinar aquilo que aprendeu, isto é, tem de se considerar apóstolo
ou enviado junto de quem lhe for dado aproximar-se e conviver. E isto não se
aplica apenas a bispos, padres, diáconos, religiosas e religiosos, mas a todos
os batizados, que se matricularam, por essa via, na escola dos discípulos de Cristo
– o que leva a dar relevo à formação cristã, inicial e ao longo de toda a vida,
para que o apostolado seja eficaz, obviamente contando com a luz e a força da
graça do Espírito de Deus.
Na
missão, há uma prioridade de contacto e uma prioridade de conteúdo.
A
prioridade de contacto é desejar a paz,
de modo que os demais filhos da paz que recebam este desejo se associem à
missão em prol da paz, que é o apanágio do Reino.
Em
termos de conteúdo, o discípulo-apóstolo deve anunciar o Reino de Deus – “Tu anuncia o Reino de Deus” (Lc 9,60). E anuncia o Reino de Deus –
veja-se a metodologia sugerida – comendo do que lhe servirem na casa onde for
recebido, curando os enfermos que nela houver e dizendo: “Está perto de vós o
Reino de Deus”.
Quer
dizer que a prioridade é, ao fim e ao cabo, o Reino de Deus, que se prega com
ações de bem-querer e de bem-fazer, acompanhadas da palavra explícita.
Na
verdade, depois de João Batista haver sido preso, Jesus passou a ensinar as
multidões, nas cidades e aldeias, falando-lhes do Reino de Deus e curando,
entre o povo, todas as doenças e enfermidades (cf Mt 4,23). E o pregão era: “Completou-se o tempo e o Reino de Deus
está próximo, arrependei-vos e acreditai no Evangelho” (Mc 1,15). E, em Lucas, Jesus garantiu que se cumpriu em Si o que
Isaías profetizava sobre o conteúdo do Reino: anunciar a boa nova aos pobres, proclamar
a libertação dos cativos, dar vista aos cegos, mandar em liberdade os oprimidos
e proclamar o ano favorável da parte do Senhor (cf Lc 4,18-19).
É
claro que todas estas notas se aliam com o outro enunciado do conteúdo do Reino
de Deus: o perdão dos pecados. Com
efeito, Jesus pregava numa casa em Cafarnaum. Trouxeram-lhe um paralítico. E,
como não podiam entrar com ele, devido ao grande número de circunstantes,
desceram-no pela cobertura, depois de terem arrancado algumas telhas. E Jesus
disse ao paralítico: “Os teus pecados estão perdoados”. Porém, sentido o murmúrio
daqueles que se escandalizavam (escribas e fariseus) por um homem perdoar
pecados, atributo de Deus, perguntou: “Que é mais fácil dizer ‘os teus pecados estão
perdoados’ ou ‘levanta-te, pega no teu catre e anda’?”. Ora, “para que sabais
que o Filho do Homem tem, na terra, o poder de perdoar os pecados”, voltou-se
para o paralítico e disse “levanta-te, pega no teu catre e anda”. (cf Lc 5,17-24).
E
antes de subir ao Ceu, em conversa final com os discípulos, disse:
“Assim
está escrito que o Cristo havia de sofrer e ressuscitar dos mortos ao terceiro
dia e que havia de ser proclamada, em seu nome, a conversão para
o perdão dos pecados a todos os povos. Começando por Jerusalém, vós sois
testemunhas destas coisas.” (Lc 24,46-48).
E, em João, Jesus disse aos discípulos: “A paz
esteja convosco! Tal como o Pai me enviou, também Eu vos envio”. Tendo dito
isto, soprou e disse-lhes: “Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes
os pecados, ser-lhes-ão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, serão retidos”.
(Jo 20,21-23). É o itinerário
metodológico de Lucas no Evangelho desta dominga: paz-envio-perdão dos pecados
(ou Reino de Deus).
Enfim, a prioridade e a urgência do discípulo-apóstolo
é o Reino de Deus. Assim é que Jesus não quer que se leve bolsa nem alforge nem sandálias, nem
que se demore a saudar alguém pelo caminho ou que se ande de casa em casa.
Por outro lado, quer que os discípulos vão dois a dois, pois a missão não é
propriedade de ninguém, mas da comunidade que se referencia a Jesus Cristo, que
lha outorgou. Por isso, ainda que alguém trabalhe sozinho apostolicamente, deve
sentir-se unido à comunidade.
O Reino de Deus pede-se na oração dominical (cf Mt 6,10; Lc 11,2), assim designada por ter sido ensinada pelo Senhor (Dominus, em Latim). E Jesus proclamou o
código do Reino, as Bem-aventuranças:
“Felizes os pobres no espírito, porque
deles é o reino dos céus.
“Felizes os
que se lamentam, porque eles serão consolados.
“Felizes os mansos, porque eles
herdarão a terra.
“Felizes os que têm fome e sede de
justiça, porque eles serão saciados.
“Felizes os misericordiosos, porque
para eles haverá misericórdia.
“Felizes os puros de coração, porque
eles verão Deus.
“Felizes os que fazem a paz, porque
eles serão chamados filhos de Deus.
“Felizes os perseguidos por causa da
justiça, porque deles é o reino dos céus.
“Felizes sois quando vos insultarem,
vos perseguirem e mentindo disserem todo o mal contra vós por causa de mim. Alegrai-vos
e exultai, porque a vossa recompensa é grande nos céus, pois do mesmo modo
perseguiram os profetas antes de vós.” (Mt
5,3-12; cf Lc 6,20-26)
***
“Procurai, primeiro, o reino de Deus e a sua
justiça; e tudo isso vos será dado por acréscimo” (Mt 6,33).
2022.07.03 – Louro de
Carvalho
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