segunda-feira, 18 de julho de 2022

Eventos que marcam a beatificação de João Paulo I a 4 de setembro

 

Faltam quase 50 dias para a beatificação do Papa João Paulo I, marcada para domingo, 4 de setembro, na Praça de São Pedro, às 10,30 horas (hora de Itália), sob a presidência de Francisco. Sobre o evento celebrativo, a Postulação da causa comunica algumas informações importantes sobre os três principais compromissos agendados para aqueles dias em Roma e em Canale d’Agordo, terra natal de Albino Luciani, que se tornou o Papa João Paulo I, o Pontífice cujo tão curto pontificado apenas lhe proporcionou a apresentação do alargado sorriso de Deus (sorriso de orelha a orelha). Não é por acaso que ficou a chamar-se o Papa do Sorriso.

Na Missa com o rito de beatificação, a petição de inscrição de João Paulo I no catálogo dos Beatos será proferida por Dom Renato Marangoni, bispo da Diocese de Belluno-Feltre, enquanto sede excecional da causa de canonização do venerável Papa Albino Luciani, juntamente com o postulador da causa, cardeal Beniamino Stella, e com a vice-postuladora, Stefania Falasca. 

Durante a beatificação, a Postulação doará ao Pontífice um relicário com uma relíquia do novo beato. Para participar na celebração, devem ser solicitados à Prefeitura da Casa Pontifícia os ingressos gratuitos, enquanto todos os bispos e sacerdotes que desejarem concelebrar e diáconos que pretendam participar devem inscrever-se diretamente no site respetivo. 

Na noite anterior, sábado, 3 de setembro de 2022, às 18,30 horas, será realizada a Vigília de Oração na Basílica de São João de Latrão, sob a presidência do cardeal Angelo De Donatis, vigário geral de Sua Santidade para a Diocese de Roma. É a Basílica, que custodia a Cátedra do Bispo de Roma, na qual João Paulo I tomou posse a 23 de setembro de 1978. O momento de oração será animado por cantos e leituras de trechos do seu magistério.

A Missa de Ação de Graças pela beatificação de João Paulo I será celebrada no domingo, às 16 horas de 11 de setembro de 2022, na Diocese de Belluno-Feltre, na praça de Canale d’Agordo, local de nascimento do novo beato, com a participação dos bispos e comunidades das três sedes episcopais em que o novo beato exerceu o seu ministério sacerdotal e episcopal: o patriarcado de Veneza, liderado por Dom Francesco Moraglia, a Diocese de Belluno-Feltre, com Dom Renato Marangoni e a Diocese de Vittorio Veneto, com o bispo Corrado Pizziolo. A Missa será presidida pelo patriarca Francesco Moraglia, metropolita da Província Eclesiástica de Veneza.

Nos dias que antecedem a beatificação, será realizada uma conferência de imprensa na Sala de Imprensa da Santa Sé, organizada pela Postulação, que também contará com a presença da menina argentina milagrosamente curada em 2011, graças à intercessão do venerável João Paulo I, Candela Giarda, a mãe Roxana Sousa e o padre José Dabusti, pároco da igreja próxima do hospital de Buenos Aires, onde Candela estava a ser tratada e que sugeriu invocar João Paulo I.

A causa de canonização foi aberta em 2003, vinte e cinco anos após sua morte, na sua Diocese natal de Belluno-Feltre, e foi concluída a 9 de outubro de 2017, com o decreto sobre as virtudes, sancionado pelo Papa Francisco.

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A abertura da causa – como sublinha a vice-postuladora Stefania Falasca, vice-presidente da Fundação vaticana João Paulo I – permitiu um trabalho fundamental que nunca havia sido realizado precedentemente e que permite falar de Luciani com conhecimento de causa: a aquisição das fontes, um trabalho de pesquisa, de tutela patrimonial, de estudo da sua obra e do magistério que hoje é realizado pela Fundação”.

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Foi publicado, em tempo, no jornal “Avvenire”, o prefácio de Francisco ao livro “O Magistério. Textos e documentos do Pontificado” de João Paulo I, um livro da Fundação Vaticana João Paulo I pelas edições Lev e Editora San Paolo, que reúne, além de notas e reflexões, as homilias, discursos, cartas, reflexões nas audiências gerais e no Angelus pronunciado ou escrito pelo Papa Albino Luciani nos seus 34 dias de Pontificado, de 26 de agosto a 28 de setembro de 1978.

No dizer do Papa, com ele, naquelas breves semanas de pontificado, o Senhor encontrou forma de nos mostrar que “o único tesouro é a fé, a simples fé dos Apóstolos, reproposta pelo Concílio Ecuménico Vaticano II”. No pouco tempo em que viveu como Sucessor de Pedro, João Paulo I “confessou a fé, a esperança e a caridade, virtudes dadas por Deus”, dedicando-lhes as suas catequeses de quarta-feira. E repetiu que a preferência pelos pobres é parte da fé apostólica, quando, na liturgia celebrada em São João de Latrão por ocasião da tomada de posse da Cátedra Romana, citou as fórmulas e orações que aprender em criança, para reafirmar que a opressão dos pobres e “não pagar o salário a quem trabalha” são pecados que bradam vingança diante de Deus.

E por causa da fé do povo cristão, a que pertencia, foi capaz de lançar um olhar profético sobre as feridas e os males do mundo, mostrando quanto e como a paz está no coração da Igreja, o que é testemunhado nas muitas expressões inseridas nos seus discursos públicos daqueles dias, que expressavam o seu apoio às negociações de paz de 5 a 17 de setembro de 1978, em Camp David, e que envolveram o presidente americano Jimmy Carter, o presidente egípcio Anwar al-Sadat e o primeiro-ministro israelita Menachem Begin. E, a 4 de setembro, a mais de uma centena de representantes de missões internacionais, expressou a esperança de que “a Igreja, humilde mensageira do Evangelho a todos os povos da terra, possa contribuir para criar um clima de justiça, fraternidade, solidariedade e esperança, sem a qual o mundo não pode viver”.

Assim, Luciani repetiu que o mais urgente, de acordo com os tempos, não é o produto de um dos seus pensamentos ou de um dos seus projetos, mas o simples caminhar na fé dos Apóstolos, a fé que recebeu como dom na sua família de operários e emigrantes, que conhecia as dificuldades da vida para levar o pão para casa. E deste dom da fé fazia parte a humildade, ou seja, “reconhecer-se como pequeno, não por esforço ou poses, mas em gratidão”, por experimentar a misericórdia sem medida de Jesus e o Seu perdão.

À morte do Papa Luciani, Óscar Arnulfo Romero – o arcebispo de San Salvador que foi assassinado no altar e agora é venerado como santo pelo povo de Deus – celebrou em memória do falecido pontífice. E Romero disse que João Paulo I, com a brevidade do seu pontificado, tinha tido “apenas tempo para dar ao mundo a breve, mas densa resposta que Deus dá ao mundo de hoje”. E observou que, em tão pouco tempo, com a morte de dois Papas e duas eleições papais”, a atenção do mundo foi chamada a olhar “para o topo da hierarquia da Igreja Católica”, aquela hierarquia que é colocada “sobre os ombros dos homens frágeis”, mas que é chamada a ser “o canal através do qual a Igreja é guiada e governada” e um “sinal sacramental” da “graça que é dada aos homens”. 

E diz o Papa que é o mistério do que Santo Inácio de Loyola chama “Nossa Santa Mãe Igreja Hierárquica”, mas adverte que, na Igreja, a hierarquia não é entidade isolada e autossuficiente, antes está dentro de um povo reunido por Deus “ao serviço do Reino e do mundo inteiro”, porque a Igreja “não é um fim em si mesma, muito menos a hierarquia: a hierarquia é para a Igreja e a Igreja é para o mundo”. Na circunstância da morte de João Paulo I – observava o santo mártir – foi fácil reconhecer que a Igreja não é construída pelo Papa nem pelos bispos: o Sucessor de Pedro é “a pedra de consistência” sobre a qual assume a unidade a Igreja que o próprio Cristo constrói, com o dom da sua graça. E, se as portas do inferno e da morte não prevalecerão, isto não acontece por causa dos “ombros frágeis” do Papa, mas porque este “é sustentado por Aquele que é a vida eterna, o imortal, o santo, o divino: Jesus Cristo, nosso Senhor” – mistério que transparece na história e nos ensinamentos de João Paulo I.

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A 13 de maio deste ano, Francisco enviou uma mensagem aos participantes do Simpósio “Os seis ‘queremos’. O Magistério de João Paulo I à luz dos documentos de arquivo”, iniciativa em vista da beatificação de Luciani, a 4 de setembro, que foi promovida pela Fundação Vaticana João Paulo I, em colaboração com o Departamento de Teologia Dogmática da Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma, como um dia de estudo dedicado ao Magistério de João Paulo I.

“Ao longo de sua vida, diz o Papa, ele constantemente procurou e apontou a substância do Evangelho como a única e eterna verdade, para lá de qualquer contingência histórica ou de moda. Homem sábio e humilde, dotado de boa cultura, soube falar de Deus com simplicidade evangélica, testemunhando a imagem de uma Igreja que não brilha com a sua própria luz, mas com a luz refletida, que não vem dos homens, mas do Senhor”.

Nesta perspetiva, o breve pontificado de João Paulo I distinguiu-se pelo compromisso de fazer compreender certos elementos fundamentais para a missão: estar ao lado da dor dos irmãos, a vontade de diálogo com o mundo, a busca da paz, a unidade dos cristãos, a colegialidade episcopal – temas que representam um ponto de referência seguro a fim de encontrar soluções concretas para as muitas dificuldades e desafios que a Igreja enfrenta hoje.

À luz da documentação do Arquivo Privado Albino Luciani – ora património da Fundação Vaticana João Paulo I e constituído por todo o material documental de 1929 a 27 de setembro de 1978 –, a conferência pretende percorrer e aprofundar as principais linhas do Magistério de João Paulo I, a partir dos seis “queremos” da mensagem Urbi et orbi pronunciada pelo Papa Luciani no dia seguinte à sua eleição, declinados no programa do pontificado.

O comité científico da Fundação, através de um cuidadoso trabalho filológico, também sobre manuscritos inéditos, publicou a primeira edição crítica dos textos e discursos escritos e proferidos por João Paulo I durante os 34 dias do seu pontificado.

É de recordar que a Fundação Vaticana foi criada, em 17 de fevereiro de 2020, pelo Papa Francisco com o objetivo de preservar o património dos escritos, promover o estudo e aumentar o conhecimento do legado e dos ensinamentos de João Paulo I.

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O grande desejo de Luciani era trazer a humanidade de volta para o seio da Igreja, pelo que, logo de início, não hesitou em convocar uma nova evangelização. Na contramão, enquanto o mundo duvidava da necessidade da Igreja, da necessidade de se voltar uma vez mais para Cristo e para os seus ensinamentos, João Paulo I levantava-se sob esta certeza: A Igreja Católica é garantia de paz e ordem. E essa certeza provinha do “encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo”.

Afamado desde o tempo de Patriarca de Veneza pela sua simplicidade e pobreza, o urgente desejo do Papa Luciani era levar o património espiritual da fé a toda a humanidade. Para tanto, equacionou seis eixos principais (os seis ‘queremos’) na elaboração do seu projeto pastoral.

O primeiro era prosseguir, sem paragens, a herança do Concílio Vaticano II. Neste aspeto, foi pioneiro na hermenêutica da continuidade, de modo que certo ímpeto, generoso, mas incauto, não deformasse o conteúdo do Concílio e que “forças exageradamente moderadoras e tímidas” não atrasassem o seu “magnífico impulso de renovação e de vida”.

Dois outros desejos eram conservar intacta a grande disciplina da Igreja, na vida dos sacerdotes e dos fiéis, e recordar a toda a Igreja que o seu primeiro dever continua a ser o da evangelização. De facto, uma Igreja apostólica nasce de uma Igreja disciplinada, consciente da sua vocação à santidade. E, quando se perde a dimensão espiritual, perde-se o significado da missionariedade.

A quarta vontade de João Paulo I era continuar o esforço ecuménico, na linha dos seus imediatos predecessores, velando, com fé intacta, com esperança invencível e com amor indeclinável, pela realização do grande mandamento de Cristo: Que todos sejam um (Jo 17,21). E, no mesmo sentido, seguia o desejo de prosseguir com paciência e firmeza naquele diálogo sereno e construtivo, que São Paulo VI pôs como fundamento e programa da sua ação pastoral.

And last, but not least, vinha a intenção de favorecer todas as iniciativas louváveis e valiosas de defesa e incremento da paz neste mundo conturbado.

2022.07.18 – Louro de Carvalho

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