O primeiro-ministro (PM) de Portugal, Luís Montenegro, participou, pela
primeira vez, na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em
Nova Iorque – a 79.ª sessão
– e, num discurso de cerca de 15
minutos, proferido em língua portuguesa, levantou várias lebres, em que tem
especial destaque a pretensão de que “o Português passe a ser língua oficial da
ONU”.
Com efeito, os demais quesitos foram apresentados em nome de Portugal, ao
passo que este representa uma aspiração da Comunidade de Países de Língua
Portuguesa (CPLP).
“É com muito orgulho que falo em Português. Além de ser
o quarto idioma mais falado no Mundo, a língua portuguesa é a língua oficial em
33 organizações internacionais. É legítima a aspiração desta comunidade de que
o Português passe a ser língua oficial da ONU”, vincou.
Entretanto, revelou que Portugal vai
candidatar-se a membro não permanente do Conselho de Segurança da ONU, no
biénio 2027-28. “Move-nos contribuir para uma ordem mundial mais justa e
inclusiva”, afirmou, recordando que Portugal integrou o Conselho de Segurança,
como membro eleito não permanente, nos biénios 1979-1980, 1997-1998 e
2011-2012.
Ainda sobre o Conselho de Segurança, Luís Montenegro
defendeu uma “reforma”, sugerindo que a “sua composição está desatualizada”,
pois “algumas regiões não estão representadas”, por exemplo a Índia e o Brasil,
que querem ser membros permanentes.
O líder do governo português também quer maior
escrutínio do direito de veto – a que podem recorrer os membros permanentes:
Estados Unidos da América (EUA), Federação Russa, França, Reino Unido e
República Popular da China –, para que nenhuma parte do conflito seja julgador
e julgado e para “que o Conselho de Segurança seja eficaz”, pois tem estado
quase paralisado.
Luís Montenegro, que iniciou a sua intervenção a dizer
que o incansável “António Guterres pode contar com o apoio de Portugal”, falou
sobre o “momento exigente” em que vivemos, “marcado pela confluência de
múltiplos desafios e crescentes tensões geopolíticas”.
Salientou que a “agressão da Rússia à Ucrânia é uma
violação do direito internacional” e manifestou profunda preocupação “com a
situação humanitária e [com] a escalada no Médio Oriente”. “Condenamos os
ataques terroristas do Hamas e não nos conformamos com o crescimento de vítimas
em Gaza. É um urgente um cessar-fogo”, afirmou, defendendo uma solução de dois
Estados na Palestina.
Enfim, Montenegro considerou que a paz deve ser o objetivo
principal da ONU e apontou o dedo à comunidade internacional, que acusou
de não ter sido capaz de resolver conflitos “que
se prolongam por décadas”, nem de evitar novos focos de tensão. E condenou, “de forma veemente”, a agressão da Rússia à Ucrânia e
lamentou os efeitos negativos desta guerra: a crise alimentar, energética e
inflacionista que se alastrou pelo Mundo inteiro.
Pediu uma limitação e um maior escrutínio ao direito de veto –
questão que já tinha sido levantada por Zelensky, em relação à Rússia
– para evitar que “uma parte num conflito se constitua simultaneamente como
juiz e julgado”. E criticou ainda o silêncio do Conselho de
Segurança, em relação a esta guerra, apelando a que a ONU
possa ter um papel mais ativo, agora, com a escalada do conflito no Médio
Oriente, com o qual também manifestou profunda preocupação.
Disse, a este respeito, “condenar firmemente os horríveis
ataques terroristas” levados a cabo pelo Hamas a 7 de outubro de 2023,
exigindo, além da libertação dos reféns, que cessem todas as hostilidades, de
forma que também seja possível a entrada de ajuda humanitária em Gaza.
Luís Montenegro reafirmou apoio à solução de dois Estados, que considerou
ser a única que poderá “trazer paz e estabilidade à região”. “É imperativo cessar, incondicionalmente, as
hostilidades, garantir a entrada de ajuda humanitária e o respeito pelo Direito
Internacional Humanitário. É, igualmente, imperativo retomar negociações com
vista à implementação da solução dos dois Estados – a única que poderá trazer
paz e estabilidade”, disse.
No entanto, o líder do governo português manifestou
esperança, recordando que, neste ano, se celebra o 50.º aniversário da
liberdade em Portugal: “Temos confiança na força da liberdade, do
multilateralismo e da responsabilidade coletiva.”
“Portugal é um defensor intransigente do
multilateralismo, por isso apoiamos o Pacto do Futuro, que reflete uma renovada
fonte de esperança nos pilares das Nações Unidas: desenvolvimento sustentável e
paz”, acrescentou, apostando, ainda, na “mediação de conflitos em África” e na
vontade de “erradicar a fome e a pobreza” e de combater o aumento das
“clivagens socioeconómicas” e a fragilização da proteção dos direitos humanos.
Sobre a crise climática, referiu que Portugal apoia a
“gestão sustentável dos oceanos” e está “empenhado em investir em renováveis”,
porque as “alterações climáticas são ameaça existencial”. “Portugal
mantém-se empenhado em investir em energias renováveis e na supressão dos
combustíveis de origem fóssil. Queremos incorporar 47% de renováveis no consumo
final de energia até 2030”, revelou.
Parte do discurso foi ainda dedicada a apelar a um “combate sem tréguas” a todas as formas de discriminação e de ódio que
“minam as sociedades”, sobretudo o desrespeito pelos direitos das mulheres e as
“perseguições por motivos religiosos ou sexuais”, que têm vindo a acentuar-se.
***
“Tem sido, francamente, muito favorável a Portugal o acordo de mobilidade
com os países da comunidade lusófona”, afirmou Luís Montenegro. Disse que o
governo tenciona “abrir mais capacidade” nos postos consulares, para as
respostas aos pedidos de visto serem “mais rápidas”.
O primeiro-ministro elogiou o acordo de mobilidade na
CPLP, considerando que tem sido muito favorável a Portugal, e disse esperar
conseguir, também com o apoio do Brasil, que o Português se torne língua
oficial da ONU.
Luís Montenegro, em Nova Iorque para
participar na 79.ª sessão da Assembleia-Geral da ONU, assumiu estas posições em
entrevista à ONU News, gravada no dia
26 de setembro.
Nesta entrevista, o chefe do governo referiu que
contava “aflorar esses assuntos”, da imigração e da língua portuguesa, com o
presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, num evento comum na sede da
ONU. “Não seria má altura para nós podermos
dar um passo que nunca conseguimos, mas que, creio, o presidente Lula tem
carinho pela ideia, que era conseguirmos que o Português fosse também uma
língua oficial das Nações Unidas”, declarou.
Interrogado sobre que balanço faz do acordo de
mobilidade na CPLP, respondeu: “Tem sido, francamente, muito favorável a
Portugal o acordo de mobilidade com os países da comunidade lusófona.”
“Este governo não alterou – e é bom que isto fique
muito claro, de uma vez por todas, para toda a comunidade lusófona –, não
alterou as regras [do acordo], e tenciona, inclusivamente, abrir mais
capacidade nos nossos postos consulares, para que as respostas aos pedidos de
visto sejam mais rápidas e para que a mobilidade possa ser mais célere também”,
realçou.
O PM mencionou que o governo português tem tentado,
com vários governos da CPLP, que haja “mecanismos de formação profissional nos
países de origem”, no quadro deste acordo de mobilidade, para aumentar a “facilidade
de integração no mercado de trabalho”.
Luís Montenegro fez questão de dizer que “isso
também era uma estratégia que já vinha do anterior Governo, e boa”. “Nós temos já um bom exemplo em Cabo Verde,
com uma escola profissional que forma pessoas na área do turismo, e que, quando
chegam a Portugal, já têm um emprego garantido, já vão, digamos, com a sua
perspetiva de vida adiantada. Estamos, agora, também a desenvolver isso em
Angola, já falei com o presidente de Moçambique”, acrescentou.
O PM de Portugal defendeu que falar a mesma língua é
uma condição “facilitadora da integração de alguém que vem do estrangeiro
trabalhar para um outro país”, assim como conhecer a História e a Cultura, mas
ressalvou que não quer “fechar a porta a pessoas de outras nacionalidades” não
falantes de Português.
Em concreto sobre “a intensificação muito grande do
fluxo migratório” do Brasil para Portugal, nos últimos anos, fez uma avaliação
positiva da cooperação com as autoridades brasileiras e resumiu: “As coisas,
globalmente, sinceramente, têm corrido muito bem.”
Luís Montenegro justificou as
mudanças legais feitas em matéria de imigração, argumentando que “as
regras estavam muito facilitadoras, de uma forma generalizada”, e que o
seu executivo herdou “400 mil processos pendentes no âmbito do acolhimento de
imigrantes”.
O PM disse que a sua política é “regulamentar
mais para valorizar a dignidade das pessoas, para as pessoas estarem seguras”,
chegarem, quando uma “oportunidade esteja disponível”, e não “de olhos
fechados à procura de uma coisa que não sabem o que é e, depois, ficarem
completamente abandonadas”.
***
O primeiro-ministro pediu, no dia 26, ao Conselho de
Segurança da ONU que seja ativo para conter a violência no Líbano e defendeu um
uso restrito do direito de veto e maior responsabilização deste órgão.
Numa intervenção num debate aberto do Conselho de
Segurança sobre liderança para a paz, na sede da ONU, Luís Montenegro criticou
a inação deste órgão em relação a conflitos violentos. “Enquanto a guerra prossegue,
com consequências terríveis, dentro e fora da Ucrânia, o Conselho de Segurança
tem estado, muitas vezes, em silêncio. Em relação a Gaza, pouco diz e sempre
demasiado tarde. Esperamos que, agora, na situação do Líbano, o Conselho de
Segurança possa ser ativo nos esforços de contenção que evitem uma escalada de
violência”, declarou.
Segundo o PM de Portugal, este órgão da ONU “encontra-se,
frequentemente, paralisado”, graças ao “uso indiscriminado do direito de veto”
– a que podem recorrer os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança. O
chefe do governo português deu eco aos “apelos à restrição do uso do veto”, no
quadro mais alargado da ONU, que tem 193 países membros, e considerou que é
evidente “um consenso crescente sobre a necessidade de restringir o uso do
veto, no estrito respeito pela Carta [das Nações unidas]”.
Luís Montenegro salientou que “a Carta prevê, no artigo
27.º, uma abordagem de boa-fé, em que as partes em litígio devem abster-se de
votar”, mas que se tem assistido “a um aumento do uso do veto, bem como a
situações em que membros do Conselho se tornam parte de um conflito, sendo
simultaneamente juiz e jurado”. “O direito de veto, à semelhança da assunção de
um lugar à mesa do Conselho de Segurança, antes de constituir um privilégio,
representa uma responsabilidade e é assim que deve ser exercido. É também
necessário reforçar a responsabilização deste órgão perante a Assembleia Geral
e [perante] a comunidade internacional”, explicitou.
***
Para lá de aplaudir, genericamente, as opções do PM em
relação à ONU, é de relevar a importância a língua portuguesa. Penso que deve
ser língua oficial nos diversos areópagos internacionais em que participem
países da CPLP e, obviamente na ONU. Contudo, é de exigir a todos os escalões
da sociedade, mormente aos decisores políticos e ao setor académico, o culto e
a promoção do Português. É execrável que rodem cursos superiores em Inglês e se
obriguem alunos a fazer trabalhos académicos, fora do ensino das línguas
estrangeiras, em Inglês, alegadamente por a ciência e a técnica se escreverem
em Inglês, bem como institutos politécnicos, faculdades e outras escolas universitárias
exporem em Inglês as suas designações identitárias.
Os Gregos diziam que o Latim não tinha capacidade para
exprimir conceitos filosóficos. Contudo, os filósofos medievais e os
renascentistas souberam utilizar o Latim neste campo. E os nomes científicos das
espécies e dos géneros da fauna e da flora são latinos. Assim se vê a
fragilidade de alguns mitos convenientes!
2024.09.27 –
Louro de Carvalho
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