Devido ao risco de assédio digital das crianças
na escola e de falta de concentração, alguns países europeus introduziram, a
partir de 1 de setembro de 2024, a proibição de utilização dos smartphones nas escolas. Em Portugal,
não há indícios de proibição, mas simples recomendação do governo para a sua proibição
no primeiro ciclo e no segundo. Marques Mendes dixit!
O risco de assédio digital das crianças na escola e a falta de concentração
são algumas razões que levaram alguns países europeus a introduzir a proibição
dos smartphones nas escolas a partir de 1 de setembro de 2024.
Para garantir o cumprimento da lei, os professores e outros membros escolares
têm o direito de revistar a mala dos alunos.
Em Portugal a medida ainda não foi adotada, apesar dos apelos do Movimento Menos Ecrãs, Mais Vida, como
noticiado, a 2 de setembro, pela agência portuguesa Lusa.
Em 2023, o ministério da Educação pediu ao Conselho das Escolas (CE) –
órgão consultivo que representa as escolas da rede pública – que fizesse um
estudo sobre a utilização de telemóveis em contexto escolar e o CE considerou
que a solução não passa por proibir o uso destes dispositivos nas escolas. No
seu parecer, o CE ressalvou que “as escolas e agrupamentos têm atuado de acordo
com os seus contextos e no quadro da sua autonomia”, reforçando que cabia a
cada agrupamento a “imposição, ou não, de restrições à utilização do telemóvel
no espaço escolar”.
É de referir, também, que a utilização dos telemóveis nos espaços escolares
está regulamentada, desde 2012, no Estatuto
do Aluno e da Ética Escolar (Lei n.º 51/2012, de 5 de setembro), o qual reforça
que o aluno não deve “utilizar quaisquer equipamentos tecnológicos,
designadamente telemóveis, equipamentos, programas ou aplicações informáticas,
nos locais onde decorram aulas ou outras atividades formativas ou reuniões de
órgãos ou estruturas da escola em que participe, exceto quando a utilização de
qualquer dos meios acima referidos esteja diretamente relacionada com as
atividades a desenvolver e seja expressamente autorizada pelo professor ou pelo
responsável pela direção ou supervisão dos trabalhos ou atividades em curso”.
Porém, cabe ao aluno o cumprimento da lei sem que lhe ser vedado o acesso
ao equipamento.
Na Hungria, a medida já entrou em vigor, mas nem toda a gente é a favor. Em
Budapeste, o diretor de uma escola secundária demitiu-se do cargo, por se opor
à medida, o que suscitou uma manifestação de apoio à porta da escola. “No
início da aula, o professor pedia-nos para colocarmos os telemóveis em cima da
mesa, ou na mesa do professor, e nós fazíamos isso e a aula funcionava
perfeitamente. Por isso, penso que essa teria sido uma solução muito melhor
para o problema”, conta um aluno.
A Grécia foi um dos países que já anunciou que adotaria esta medida, assim
que iniciasse o ano letivo, a 11 de setembro. Os alunos podem levar os telemóveis
para a escola, mas “devem mantê-los dentro das mochilas, durante todo o dia de
aulas”, anunciou o primeiro-ministro grego, em Atenas, a 31 de agosto, ao
anunciar a campanha “Telemóvel na mochila”. “Os dados científicos sobre a forma
como a utilização de telemóveis durante o dia escolar afeta o próprio processo
de aprendizagem são avassaladores”, vincou.
Os alunos que não cumprirem as regras terão um dia de suspensão da escola e,
em caso de reincidência, os professores podem suspender os alunos das aulas,
durante vários dias.
A utilização do telemóvel para filmar colegas ou professores, sem
autorização, pode valer a expulsão do aluno da escola. “Não esperamos
necessariamente um cumprimento a 100%, desde o primeiro dia, mas queremos que
as crianças, os seus pais e educadores compreendam a importância de os alunos
se concentrarem inteiramente no processo educativo na escola”, afirmou o
primeiro-ministro Kiriakos
Mitsotakis.
Nos Países Baixos, a medida para as escolas básicas e secundárias já tinham
entrado em vigor, em janeiro, mas, a partir da primeira semana de setembro, os
alunos do ensino primário também deixam de poder levar telemóveis para a sala
de aula. No entanto, o acordo nacional entre as escolas e o governo permite
alguma margem de manobra em que as escolas são livres de decidir como aplicar a
proibição dos telemóveis. Se um telemóvel for considerado necessário para o
conteúdo da aula, por exemplo, numa aula sobre literacia mediática, a escola
pode conceder uma exceção. A escola também abrirá exceções para os alunos dependentes
do telemóvel, por razões médicas ou devido a deficiência. Os alunos deixam o
telefone em casa ou trancam-no num cacifo.
A Dinamarca também vai experimentar a proibição em cerca de 200 escolas, neste
ano. A primeira-ministra dinamarquesa, Mette Frederiksen, é defensora da limitação do uso de
telemóveis inteligentes nas escolas. Várias escolas na Dinamarca são a favor da
proibição dos telemóveis, durante as aulas, e esperam que esta medida melhore a
saúde mental e as relações entre os alunos. Na Escola Secundária de Esbjerg, os
alunos são obrigados a colocar o telemóvel num “cofre para telemóveis”. “Não
sei se vai haver mais silêncio durante as aulas, porque as pessoas ainda podem
usar os seus computadores. Podemos aceder ao Snapchat no computador e conversar com as pessoas que lá estão”,
diz um aluno.
Em França, onde a proibição de telemóveis nas escolas secundárias foi
consagrada na lei, em 2018, cerca de 200 escolas secundárias comprometeram-se a
ir mais longe este ano, testando uma “pausa digital” total. Cerca de 50 mil dos
alunos terão de deixar os seus telemóveis à entrada da escola e recolhê-los no
final do dia. De acordo com o ministro da Educação francês, esta medida poderá
ser generalizada, já em janeiro de 2025.
Na Bélgica, 373 escolas da Valónia francófona e da capital, Bruxelas, tomaram medidas
contra os telemóveis. Os alunos
são avisados de que, se o seu telemóvel for confiscado, os pais terão de o ir
buscar à escola. “Estamos lá para aprender e não para olhar para o telemóvel”,
afirma uma aluna da Athénée Royal de l’Air Pur, vincando: “Acho que é uma boa
ideia proibir os telemóveis.”
A proibição foi reforçada por um incidente que ocorreu no ano passado,
quando um vídeo de um professor a repreender um aluno foi colocado online, sem o seu conhecimento. E o
diretor de Estudos do Athénée explica que o incidente “teve um impacto no
estado de espírito do professor e causou alguns danos”. Em Portugal, filma-se
tudo e nada acontece!
No mês de outubro, o ministro italiano da Educação, Giuseppe Valditara,
anunciou a proibição de telemóveis em todas as salas de aula das escolas.
Os smartphones vão ser proibidos nas escolas primárias e
secundárias, em Itália.
Cada vez mais escolas na Croácia estão a implementar a proibição. As
escolas de Split, Zagreb, Osijek e Rijeka proibiram a utilização de telemóveis
durante as aulas, bem como nos intervalos entre elas. Os alunos estão
autorizados a ter o telemóvel consigo, mas a utilização do aparelho é proibida.
A proibição não se aplica aos alunos que sofrem de diabetes e que precisam do
telemóvel para medir o nível de açúcar no sangue.
De acordo com inquérito recente do Instituto de Investigação Social (IIS),
os professores de todas as regiões apoiam, em geral, a proibição, enquanto as
reações dos alunos continuam divididas.
***
Telemóveis e tablets fazem parte do quotidiano de
muitas crianças e, segundo peritos, os utilizadores são cada vez mais jovens. Segundo
uma pesquisa conduzida, em 2019, pela associação digital Bitkom, uma criança em
cada duas, entre seis e sete anos de idade, passa algum tempo em frente ao
telemóvel. Em 2014, isto afetava uma em cada cinco crianças.
O estudo adianta que,
aos 10 anos de idade, a maioria das crianças já teria o seu próprio telemóvel
com acesso à Internet. Ora, Para
Thomas Fischbach, presidente da Associação Profissional de Pediatras, trata-se
de tendência preocupante. Numa entrevista concedida ao jornal alemão, “Neue
Osnabrücker Zeitung”, Fischbach recomenda que os telemóveis devem ser dados aos
jovens só a partir dos 11 anos e, mesmo assim, não deveriam ter acesso à Internet. Por isso, apela aos pais no
sentido de não cederem à tentação de deixar as crianças interagir com estes
dispositivos. O risco é o que Fischbach designa de “estado permanente de
sobrecarga sensorial”, que poderá refletir-se nos resultados escolares, entre
outras coisas.
Quase metade dos cidadãos europeus não tem
conhecimentos básicos tecnológicos. Ainda assim, a tendência nas escolas europeias
é proibir o uso dos telemóveis nas salas de aula.
As principais razões são a distração constante, pelo ciberbullying, e a adição tecnológica.
Nos Países Baixos, desde janeiro de 2024, os telemóveis foram proibidos,
por lei, nas salas de aula para os alunos do 3.º ciclo e ensino
secundário. Também já neste ano, o Reino Unido passou nova diretriz que permite
que os diretores das escolas decidam a interdição dos telemóveis durante o
período escola – podendo, inclusive, incluir o tempo de recreio.
Segundo o Eurostat, em 2023, apenas 55% das pessoas entre os 16 e os 74
anos na União Europeia (UE) têm pelo menos capacidades de uso digital básicas. Enquanto
isto, e até 2030, a UE quer que, pelo menos, 80% das pessoas sejam
competentes digitalmente.
Uma das investigadoras do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da
Universidade Nova de Lisboa à questão “Num Mundo cada vez mais digital, fará
sentido afastar o smartphone da educação escolar?”, garante que “depende sempre
da postura”.
Eduarda Ferreira afirma: “Se temos uma aula meramente expositiva, em que o
professor vai transmitir conteúdo aos alunos, o smartphone vai perturbar a sala
de aula. Se temos uma sala de aula em que há metodologias ativas, em que se
envolvem os alunos na produção de conhecimento, o smartphone é um recurso
valiosíssimo na produção desse conhecimento.”
Em 2023, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (UNESCO) lançou um estudo em que recomenda
a proibição global dos smartphones na sala de aula. O estudo “Tecnologia na
educação: uma ferramenta em que termos?” indica que, apesar de a tecnologia
prometer uma melhoria no processo de aprendizagem, o tempo é necessário.
Em Bruxelas, na Escola Bois Sauvage, foi
decidido, em 2020, fechar os smartphones a cadeado, durante o período de aulas.
A ideia de usar bolsa com sistema semelhante ao antirroubo utilizado nas lojas
de roupa surgiu depois de Constantin Ullens ver o seu uso num espetáculo de
comédia de Florence Foresti. O codiretor da escola garante: “Quando anunciámos
este novo sistema, os pais reagiram muito bem. Estávamos um pouco reticentes,
em relação à reação dos alunos, mas eles mesmos perceberam que era necessário.”
Arthur Houtart, aluno
da escola, reconhece a existência de um “antes e o depois” da proibição de
smartphones. “Antes, todas as pessoas estavam agarradas ao telemóvel, tanto nas
aulas como no recreio, durante o tempo de convívio. Por exemplo, antes eu
costumava brincar no telemóvel com os meus amigos, enquanto estávamos na mesma
escola. Agora, conversamos, rimos e, para dizer a verdade, divertimo-nos mais
agora. Antes era menos divertido.”
Há escolas em Portugal em
que os alunos têm esta experiência e gostam!
Apesar de não existir
um consenso a nível europeu, os smartphones
não serão os únicos aparelhos tecnológicos cujo uso as escolas terão de regular.
Segundo a UNESCO, a literacia digital cresce quanto mais formação tiver o
utilizador.
O relatório da UNESCO, “A
Tecnologia na educação”, alerta para a utilização excessiva de aparelhos
eletrónicos, como os smartphones e os computadores, na educação. Os
benefícios destas tecnologias desaparecem, quando são utilizadas em excesso ou
sem a orientação do professor.
***
Em Portugal, o Estado
perdeu autoridade e retirou-a aos professores. Se estudos internacionais, incluindo
a UNESCO, sustentam que telemóveis e tablets
dispersam a atenção do aluno, devem ser proibidos, sem deixar isso aos diretores,
que sentem a pressão dos pais (eles mandam), cuja vida gravita em torno do telemóvel,
que serve de entretenimento para a criança. A família vive unida em casa, mas
dispersa, agarrada ao telemóvel, a toda a hora. Pobre Estado sem músculo!
2024.09.12 – Louro de Carvalho
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