O primeiro-ministro português, António Costa, fez a sua primeira visita
oficial a Timor-Leste (ou Timor Lorosa’e), que é também a primeira de um chefe
de Governo estrangeiro, desde a tomada de posse do novo executivo timorense, a 1
de julho.
O objetivo desta visita de dois dias (25 e 26 de julho), no dizer de
António Costa, era identificar prioridades no quadro da cooperação estratégica dos
dois países no próximo quadriénio. “Esta visita destina-se sobretudo a
identificar quais são as prioridades do novo Governo de Timor[-Leste] para a
cooperação, de forma a que o próximo programa de cooperação 2024-2028
corresponda àquilo que são as prioridades do Governo de Timor[-Leste], já que
coincide, precisamente, com o [seu] mandato”, afirmou António Costa, após uma
reunião com o primeiro-ministro timorense, Xanana Gusmão.
Numa breve declaração aos jornalistas, sem direito a perguntas, o
governante português salientou que a “visita ocorre num momento muito
importante, em que o novo Governo de Timor-Leste está no início das suas
funções” e quando Portugal está “a preparar o novo programa estratégico de
cooperação, entre 2024 e 2028”. “É uma visita de amizade, de trabalho, mas
também de abertura de portas para que os nossos ministros e as nossas
embaixadoras possam desenvolver, depois, o trabalho e desenharmos o novo
programa estratégico de cooperação”, esclareceu.
Na agenda do dia 25, o destaque foi para os encontros com duas figuras
históricas de Timor-Leste: o presidente, José Ramos-Horta, e o
primeiro-ministro, Xanana Gusmão. E, no dia 26, sobressaiu a visita ao
cemitério de Santa Cruz, local do massacre de 12 de novembro de 1991, durante a
ocupação indonésia, onde morreram mais de 300 timorenses, bem como a presença do
chefe do Governo de Portugal no Parlamento Nacional, presidido por Fernanda
Lay, a primeira mulher a ocupar o cargo em Timor-Leste, país de 1,3 milhões de
habitantes, que ocupa o 140.º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano das
Nações Unidas.
A agenda do primeiro-ministro português contemplou, ainda, visitas a
instituições educativas, como a Escola Portuguesa de Díli, que tem o nome do
poeta Ruy Cinatti, a inauguração das novas instalações do Centro de Língua
Portuguesa, na Universidade Nacional Timor Lorosa’e, e ao Centro Cultural
Português, que passa a chamar-se Jorge Sampaio, bem como ao Centro Juvenil
Padre António Vieira e ao Externato São José.
A acompanhar António Costa, esteve o ministro dos Negócios Estrangeiros, João
Cravinho, que iniciou, no dia 24, uma visita oficial ao Sudeste Asiático, com
passagem pela Indonésia, por Timor-Leste e pelas Filipinas, para discutir a
intensificação das relações económicas, assim como a ministra do Trabalho, Solidariedade
e Segurança Social, Ana Mendes Godinho.
***
António
Costa, no último ato da sua visita oficial de dois dias ao país, afirmou a
importância de reforçar o ensino do Português em Timor-Leste. Assim, numa
intervenção perante os alunos do Externato São José, destacou a importância de
Timor-Leste ser o único país lusófono na Ásia, pelo que o Português “não é só
mais uma língua, é a língua que faz a diferença” e “que reforça a identidade de
Timor-Leste, faz a identidade de Timor-Leste”. E “foi esta identidade que fez
com que, na luta armada, na ação diplomática ou no trabalho cultural e
educativo, tenham resistido ao invasor e recuperado a liberdade e a independência”,
disse, em referência à ocupação indonésia entre 1975 e 1999.
O primeiro-ministro
português tinha afirmado o apoio ao alargamento do projeto bilateral dos
Centros de Aprendizagem e Formação Escolar – financiado conjuntamente por
Portugal e por Timor-Leste e cuja finalidade é capacitar professores timorenses
– a todos os postos administrativos no país, e prometido reforçar o apoio à
Escola Portuguesa de Díli, que visitou.
No segundo
dia da visita, o chefe do Governo português reuniu-se, ainda, com a presidente
do Parlamento Nacional e colocou flores na Cruz dos Mártires, no cemitério de
Santa Cruz, numa homenagem às mais de 300 vítimas mortais do massacre de 12 de
novembro de 1991, durante a ocupação indonésia. Nessa homenagem, disse, em
conversa com um dos sobreviventes do massacre, que a memória do massacre em
Santa Cruz deve ser mantida viva, pois “é uma forma de os homenagear e também
de dar força e consolidar os valores pelo qual deram a vida”.
No final de
uma reunião de trabalho com o primeiro-ministro timorense, no primeiro dia da
sua visita oficial de dois dias, António Costa declarou que a visita se destinava à
identificação das prioridades do novo Governo de Timor-Leste para a cooperação,
no horizonte do mandato do Governo que recentemente entrou em funções e no momento
em que também Portugal prepara o seu novo programa estratégico de cooperação. E
vincou a índole amiga da visita, que é também de abertura de portas para o desenvolvimento
conjunto do trabalho de cooperação.
Por sua vez,
o primeiro-ministro timorense sublinhou que “a amizade que sempre foi
demonstrada pelo povo português e pelo Governo português será mais uma vez
provada, na prática, no apoio a este jovem país, que quer ir para a frente, que
quer desenvolver-se, para que o povo sinta que a independência valeu a pena”.
No discurso
no jantar oferecido pelo primeiro-ministro de Timor-Leste, Xanana Gusmão, o
primeiro-ministro português afirmou que as empresas portuguesas devem aumentar
a sua presença no país e aproveitar a oportunidade criada pela entrada de
Timor-Leste na Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) – facto a que
João Gomes Cravinho, ministro português dos Negócios Estrangeiros deu especial
relevo, em declarações aos jornalistas.
Lembrando
que Portugal é o principal parceiro comercial europeu de Timor-Leste e conta
com uma presença significativa de empresas no país, afirmou a necessidade de
melhorar as relações comerciais e de investimento, contribuindo mais para o
desenvolvimento e crescimento do país.
A integração
de Timor-Leste na ASEAN é uma enorme oportunidade para a expansão e para o desenvolvimento
das empresas portuguesas em toda a região, um mercado que não conhecem e que
contam com Timor e com os timorenses para ajudar a conhecer e abrir as portas.
E Timor-Leste pode assumir-se, para Portugal e para os restantes países da
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), como porta de entrada num
importante mercado de 650 milhões de pessoas, bem como ser porta de entrada
destes grupos regionais nos países da mesma CPLP.
O
primeiro-ministro anfitrião disse que o seu Governo quer desenvolver a economia
azul (ecoeconomia do mar) para gerar desenvolvimento sustentável, afirmando o
desejo de colher a experiência, o conhecimento e a inovação portuguesa. E
referiu o objetivo de descentralizar a administração, podendo Timor-Leste
aproveitar a experiência portuguesa.
Em relação à
política de migrações, o primeiro-ministro português, no final da reunião com o
Presidente da República de Timor-Leste, José Ramos Horta, afirmou que foi
discutido o assunto da mobilidade e da exploração laboral de Timorenses em
Portugal e que os dois países estão a criar um modelo para combater circuitos
paralelos de imigração ilegal. “Desde o passado dia 10, voltámos a emitir
vistos” de entrada em Portugal, “agora de uma forma mais controlada”, disse,
acrescentando que “houve uma intervenção relativamente aos Timorenses que estavam
em território português” atraídos por melhores condições de vida, mas sem
emprego ou alojamento.
Por outro
lado, a Embaixada de Portugal em Díli tem já uma funcionária “para tratar
exclusivamente de temas de formação e de emprego”, “para que tudo seja tratado
diretamente através da Embaixada, evitando qualquer tipo de circuitos paralelos
de imigração ilegal, tráfico de seres humanos e exploração das pessoas”.
Nesta linha
de atuação, os dois países assinaram, ainda, um protocolo que “permitirá seguir
uma boa prática”, “que já estamos a praticar em Cabo Verde, de fazer formação
no país de origem, para as pessoas desenvolverem uma atividade profissional ou
no país de origem ou em Portugal, mas já com formação feita”, disse António
Costa, que sustentou a necessidade de a migração ser “feita por canais legais,
para que seja do benefício do próprio, para benefício do seu país de origem e
do país de destino, acrescentando que “a única a forma eficaz de combater a
imigração ilegal e o tráfico de seres humanos é termos canais legais de
migração”.
***
A ASEAN, com secretariado localizado em Jacarta,
na Indonésia, é uma organização intergovernamental regional de países do Sudeste
Asiático, que promove a cooperação intergovernamental e facilita a integração
económica, política, de segurança, militar, educacional e sociocultural entre os
seus membros e entre outros países da Ásia. E envolve, regularmente,
outros países da região Ásia-Pacífico e além. Principal parceira
da Organização de Cooperação de Xangai, a ASEAN mantém uma rede global de
alianças e de parceiros de diálogo, sendo tida por muitos como uma potência
global, a união central para cooperação na Ásia-Pacífico e uma organização
importante e influente. Está envolvida em vários assuntos internacionais e
hospeda missões diplomáticas em todo o Mundo.
No dia da
primeira conferência da ASEAN, em fevereiro de 1976, foi assinado o Tratado
de Amizade e Cooperação, com a descrição dos princípios a ser seguidos pelas
nações aderentes. Entre eles constam o respeito mútuo pela independência, pela soberania,
pela igualdade, pela integridade territorial e pela identidade nacional, bem
como o direito de cada nação de se guiar, livre de interferência, de subversão
ou de coerção exterior. Ficou também definido que nenhuma nação deve interferir
nos assuntos internos das restantes, que os desentendimentos devem ser
resolvidos de forma pacífica e que deve haver uma renúncia ao uso da força e
uma efetiva cooperação entre todos.
Em 1992,
os países participantes decidiram transformá-la em zona de livre-comércio, a
implantar gradativamente até 2008. Foi fundada, originalmente, pela
Tailândia, pela Indonésia, pela Malásia, por Singapura e pelas Filipinas.
A nível
económico, desde a sua fundação e através de vários tratados, cresceram
bastante as trocas comerciais entre os Estados-membros. Em 1992, foi criada a
uma zona de comércio livre, de modo a desenvolver a competitividade da região,
que assim passou a funcionar como um bloco unido. O objetivo foi o de promover
uma maior produtividade e competitividade. A nível de relações externas, a
prioridade da ASEAN é fomentar o contacto com os países da região
Ásia-Pacífico, mas foram também estabelecidos acordos de cooperação com o Japão,
com a China e com a Coreia do Sul. Atualmente, a organização é patrocinada por
134 empresas multinacionais e tem acordos militares e económicos com
os EUA. E tentou um acordo com os EUA, sob sigilo, para
desregulamentar os mercados.
***
É, pois,
compreensível que a visita de uma comitiva governamental portuguesa tenha
estado em Timor-Leste a assinalar a entrada deste país naquela organização asiática.
E, obviamente, é plausível que dois países, geograficamente tão distantes, mas
historicamente tão próximos, tenham intensificado a cooperação em temas tão importantes
como a estratégia, a formação, a economia azul e circular (esta implica a redução
do desperdício ou dos resíduos ao mínimo, pela reciclagem e pela reutilização), a educação, a promoção da Língua Portuguesa e a
política das migrações. Que esta cooperação se perpetue e sirva de exemplo consolidado
de solidariedade!
2023.07.27 – Louro de Carvalho
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