A China crescerá mais de 5%, neste ano. Apesar da guerra, a economia russa
está a recuperar. E a Zona Euro terá um dos crescimentos mais fracos, com a
Alemanha em recessão.
Apesar da revisão do produto interno bruto (PIB)
mundial em 0,2 pontos percentuais (pp), face às previsões de abril, a economia
mundial crescerá, em 2023, a ritmo inferior à média histórica, ficando abaixo
dos 3,5% registados em 2022. Neste sentido, o World Economic Outlook (WEO), ou
seja, o relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI), publicado a 25 de
julho, está mais otimista do que em abril, em relação à economia mundial.
O FMI, dirigido por Kristalina Georgieva, publica duas edições do WEO,
aquando das reuniões de abril e outubro, e duas atualizações intercalares das
previsões das grandes economias e da dinâmica mundial, em janeiro e em julho. Segundo a atualização de julho, a
economia mundial crescerá 3%, em 2023. É um nível de
crescimento “fraco em termos históricos”, comparado com a taxa
média de crescimento anual de 3,8%, no período de 2000-2019. Para 2024, as
previsões não sofrem alteração, mantendo-se nos 3%.
Entre as economias mais penalizadas, neste ano, figurará a
Alemanha, que,
em resultado da “fraqueza da produção industrial e da contração económica no
primeiro trimestre de 2023”, deverá entrar em recessão, contabilizando uma
evolução do PIB de -0,3% em 2023 (em abril, o FMI estimava uma contração de
-0,1%). Não obstante, a Zona Euro, apesar de registar
uma das economias com um crescimento mais fraco, conseguirá evitar uma onda
recessiva. O FMI até reviu em alta, em 0,1 pp, a taxa de
crescimento do PIB do espaço da moeda única, colocando o PIB da Zona Euro a aumentar 0,9%, em 2023, e 1,5%, em 2024. “As
previsões mantêm-se, em termos gerais, inalteradas, mas com uma alteração da
composição para 2023. Dado o reforço dos serviços e do turismo, o crescimento
foi revisto em alta em 0,4 pontos percentuais para a Itália e em um ponto percentual
para a Espanha”, justifica o FMI.
Também
do Reino Unido chega boa notícia, pois, em abril, a previsão era a de economia
em recessão, a afundar 0,3%, mas, agora, é a de que 2023 fechará com o
crescimento de 0,4%. Esta revisão de 0,7 pp para o PIB do
Reino Unido “reflete um consumo e um investimento mais fortes do que o previsto,
devido aos efeitos de confiança da queda dos preços da energia, de menor
incerteza pós-Brexit (na sequência do acordo do Quadro de Windsor) e de um
setor financeiro resiliente, à medida que a tensão bancária mundial de março se
dissipa”, vinca o WEO.
O crescimento da economia mundial deste ano continuará a ser
maioritariamente sustentado pelas economias emergentes. Este
WEO intercalar reflete um crescimento estável da generalidade das economias,
para 2023 e 2024, e um crescimento do PIB, em 2023, acima do registado em 2022,
ao invés do que sucede nas economias mais avançadas. As economias emergentes deverão crescer 4,1%, em 2023, isto é, 0,1
pp acima das previsões de abril, e um pp acima dos 3,1% de
crescimento registado em 2022. O destaque maior vai para as economias da região
asiática, que deverão crescer 5,3%, neste ano, e moderar para 5%, em 2024.
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No atinente às trocas comerciais, o FMI antecipa que
aumentem 2%, neste ano, e que a inflação mundial se fixe em 6,8%, em 2023, ou
seja, 0,2 pp abaixo das previsões de abril. E aponta para contração ainda maior do comércio internacional, neste ano,
com particular impacto nas economias emergentes, e para inflação mais modesta
do que a antecipada em abril.
Em
abril, previa que o volume de trocas comerciais aumentasse 2,4%, em 2023, depois de, em 2022, terem crescido 5,2%; agora, os analistas
antecipam que o comércio mundial cresça apenas 2%, neste ano,
ficando abaixo da média de 4,9% registado nas duas décadas no período
2000-2019. “O declínio em 2023 reflete, não só a trajetória da procura global,
mas também as mudanças na sua composição para serviços nacionais, os efeitos
desfasados da valorização do dólar americano, que abranda o comércio, devido à
faturação generalizada de produtos em dólares americanos, e o aumento das
barreiras comerciais”, indica o WEO intercalar.
Os analistas continuam a reforçar um abrandamento do índice de
preços no consumidor (IPC), situando a inflação mundial, em 2023, nos 6,8%,
cerca de 0,2 pp abaixo do que estimavam em abril, e nos 5,2%, em 2024 (em linha
com as previsões de abril). “Cerca de três quartos das
economias mundiais deverão registar uma inflação global média anual mais baixa
em 2023”, face aos níveis de 2022. E espera-se que o aumento da
restritividade da política monetária atenue, gradualmente, a inflação, mas um
dos principais fatores da desinflação projetada para 2023 é a descida dos
preços internacionais das matérias-primas.
O FMI sustenta que a inflação subjacente (que não
tem em conta os preços da energia e dos bens alimentares), apesar de
“permanecer muito acima das metas dos bancos centrais”, está a cair,
gradualmente, com os analistas a anteciparem a taxa de 6%, neste ano, e de
4,7%, em 2024 – uma revisão de 0,4 pp, face às previsões de abril. Porém, sublinha que, “numa base média anual, espera-se que cerca de
metade das economias não registe uma descida da inflação subjacente em 2023”. Entre
as mais visadas estão as economias avançadas, que fecharão 2023 com a taxa de
inflação subjacente de 5,1% e de 3,1%, em 2024. “Claramente,
a batalha contra a inflação ainda não está ganha”, vinca o
atual WEO, frisando que “a evolução do mercado de trabalho e a dinâmica salários-lucros
serão fundamentais para a persistência da inflação”.
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A mais importante boa notícia é a de que O FMI, mais otimista, prevê que, em
vez de 2,8%, a economia global deverá crescer 3%, neste ano, devido à resolução
rápida da crise financeira de março, ao acordo, em Washington, para evitar
um default pelo Tesouro dos Estados Unidos da América
(EUA), e à dinâmica do setor dos serviços. E a pior notícia é que a Alemanha, o
motor da Zona Euro, registará, em 2023, uma recessão, sendo o único caso de
contração nas grandes economias. O Reino Unido escapa à recessão prevista em
abril. E o desempenho do conjunto dos 20 países da moeda única europeia será
metade do dos EUA.
A revisão do crescimento global para 3%, em 2023, significa uma lufada de
ar fresco para o otimismo, embora ambíguo, das previsões do FMI. “A economia
global está no caminho certo”, disse Pierre-Olivier Gourinchas,
economista-chefe do Fundo e responsável pela equipa de previsões e por esta
atualização intercalar. O WEO de abril apontava para um crescimento mundial de
2,8%. Mesmo 3% fica muito abaixo da média anual, para o período de 2000 a 2019,
que inclui a recessão global de 2009.
As novas previsões antecipam que a China cumprirá a meta política de Pequim,
a de crescer, em 2023, acima de 5%, e que a Índia será a grande economia que
mais cresce (quase mais um pp do que a China). Os economistas do FMI fizeram
revisões em alta, em 16 casos, com destaque para o Brasil (revisão em alta de
1,2 pp) e para Espanha (subida de um pp). Uma das revisões que tiveram impacto
decisivo foi a melhoria da previsão para o Reino Unido: economia que, em abril,
era suscetível de entrar em recessão e para a qual, agora, se aponta um crescimento,
embora muito fraco, menos de metade do previsto para a Zona Euro. Fruto das
revisões em alta, a Rússia afasta-se do horizonte de recessão, em que mergulhou
em 2022 (queda de 2,1%), no ano do início da invasão da Ucrânia, e deverá
crescer 1,5%, em 2023, em vez da previsão inicial de 0,7%. O ritmo de
crescimento continuará no próximo ano, ainda que mais moderado.
Todavia, a economia global não está fora de perigo e é cedo para celebrar,
na ótica do referido economista-chefe. O FMI antecipa que a economia global não
acelera, em 2024 (o crescimento será igual ao de 2023), e que cinco das grandes
economias vão desacelerar, significativamente, em 2024: a China (desce do
patamar dos 5%), o México e o Brasil (deixam de crescer acima de 2%), e os EUA
e o Japão (baixam para 1%). O FMI cortou as previsões, para 2023, na Alemanha,
que registará recessão, e na Arábia Saudita, a economia líder do petróleo.
Entre as grandes economias, o espaço da moeda única europeia regista dos
crescimentos mais baixos, globalmente, em 2023: o PIB só crescerá 0,9%. A
desaceleração em relação ao ano passado é acentuada: de 3,5% para quase um
quarto da dinâmica. Porém, a previsão foi ligeiramente melhorada, em relação a
abril. E o Reino Unido, que escapa à recessão, e a África do Sul crescem menos
do que a Zona Euro e desaceleram significativamente.
A situação da Zona Euro, como referido, ficará marcada, este ano, pela
recessão na Alemanha, a sua maior economia, e por uma diversidade de ritmos de
crescimento diferentes, que vão de 2,5%, em Espanha (que registou uma das
maiores revisões em alta), a 0,8%, em França.
Esta atualização de previsões só abrangeu as quatro maiores economias da
Zona Euro e não incluiu Portugal. A previsão para o crescimento da nossa economia,
avançada em junho (na análise anual do FMI), é otimista: 2,6%, uma décima
abaixo da do Banco de Portugal (BdP).
No entanto, as previsões de 25 de julho antecipam que o ritmo de
crescimento da Zona Euro acelerará para 1,5%, em 2024, com a Alemanha a sair da
recessão e a crescer 1,3%. A confirmar-se a projeção, Zona Euro crescerá, no
próximo ano, mais do que os EUA, o Japão, o Reino Unido e o Canadá. No quadro
do euro, entre as grandes economias, a Espanha continuará a liderar o
crescimento, projetando-se 2%.
Gourinchas advertiu que a economia mundial “ainda não está fora de perigo”,
pois os riscos são diversos. O processo de desinflação (de redução do aumento
dos preços no consumidor) continua a não dar mostras de ser sustentado. Essa
persistência do surto inflacionista implica um aperto monetário prolongado da
parte dos bancos centrais, que o FMI considera “ter trazido os juros para
território contracionista”. O que, sendo necessário, implica uma fatura:
começam a ver-se “sinais crescentes de que a atividade económica global está a
perder impulso”.
Assim, a China enfrenta vários desafios, que podem levar a maior
desaceleração, em 2024, e envolver uma contração do muito sensível setor
imobiliário. A fragmentação geopolítica do Mundo alimenta uma crescente
“fragmentação geoeconómica”, com o risco de a economia mundial se dividir em
“blocos separados”. Essa fragmentação pode ser intensificada por um agravamento
da guerra russa em curso na Ucrânia (com implicações económicas, militares e
geopolíticas mais extensas) e por “outras tensões geopolíticas”, que o FMI não
especifica. Pode esperar-se, se esse agravamento se concretizar, mais
protecionismo, mais restrições ao comércio internacional, sobretudo em exportações
estratégicas (como na tecnologia e nos minérios críticos), e aos fluxos de
investimento e mais volatilidade nos preços das matérias-primas.
Depois, os impactos da mudança climática trarão mais fenómenos extremos,
exacerbarão a seca e a fome e pressionarão os preços das matérias-primas. “Um
progresso insuficiente na transição climática deixará os países pobres mais
expostos a choques climáticos cada vez mais severos e a temperaturas cada vez
mais altas, apesar [de esse grupo de países] representar uma pequena fração das
emissões globais”, acentua o WEO.
Há, ainda, o risco de crise de dívidas nas economias pobres e, até, em
mercados emergentes. “A parcela de economias emergentes e em desenvolvimento
com spreads de dívida acima de 1000
pontos-base (10 pp) mantém-se em 25%, comparando com 6,8% de há dois anos
[2022]”, refere o documento divulgado pelo FMI. Há 18 economias
sobreendividadas que requerem uma solução global, que ainda não viu a luz do
dia na recente reunião de ministros das Finanças e banqueiros centrais na
Índia. E, apesar de os riscos para a estabilidade financeira mundial terem sido
apaziguados após a crise de março, o FMI sinaliza a possibilidade de pressão
sobre os bancos e sobre o setor financeiro não bancário, em particular, os mais
expostos ao imobiliário. E não descarta a possibilidade de contágio. Por isso,
a otimista recomendação de cautela.
2023.07.25 – Louro de Carvalho
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