O
primeiro-ministro (PM), António Costa, compareceu no plenário da Assembleia da
República (AR) para o debate sobre política geral, a 22 de março, sendo os
principais temas em agenda o aumento do custo de vida e a habitação.
Paula
Santos, líder parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), abriu o debate,
apontando os lucros especulativos da distribuição, pois não há resposta do
Governo para a “valorização dos salários e pensões”. E, vincando que a inflação
não resulta da procura, mas do aumento das margens de lucro, acusou o Governo
de apoiar os grandes grupos económicos, não as famílias.
Sobre
a habitação, disse que o Governo alimenta a especulação, pois não põe os lucros
da banca a financiar a ajuda às famílias, para enfrentarem o aumento das taxas
de juro, e não revoga a lei Cristas. Enfim, promove o negócio da habitação e
não ajuda os portugueses.
Miranda
Sarmento, do Partido Social Democrata (PSD), convicto de que “os portugueses
estão a empobrecer”, frisou que “a inflação de bens alimentares foi de
21%, quase o triplo do que foi a inflação geral”, o que “o Governo
desvalorizou”. E, referindo que o Executivo engorda a receita fiscal
com a subida dos preços, lançou um tríplice repto ao PM: fazer como o governo francês,
que chegou a acordo com a distribuição e com a regulação de preços no setor;
dar apoios financeiros aos trabalhadores mais vulneráveis; e reduzir o imposto
sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) nos 4.º, 5.º e 6.º escalões,
para a classe média viver menos asfixiada.
E
questionou como é que o PM “passa de uma TAP que era estratégica, pública, para
uma TAP que agora é estratégica, mas privada”.
Por
sua vez, André Ventura, líder do Chega, acusando o Governo de estar
“fragilizado”, pelos casos surgidos ao longo da legislatura, chamou-lhe “balão
tóxico sobre os portugueses”. E, focando-se em João Cravinho e, em particular,
na derrapagem do custo das obras do hospital militar, interpelou o PM se “mantém
a confiança no seu ministro dos Negócios Estrangeiros”.
Quanto
à habitação, citou as críticas do Presidente da República (PR) às medidas anunciadas
pelo Governo, dizendo que a credibilidade das políticas e da ministra estão
irremediavelmente em causa e questionou o PM sobre se deixa cair o arrendamento
forçado de casas devolutas.
Rui
Rocha, líder da Iniciativa Liberal (IL), convidou o PM a “descer ao país real”
e muniu-se de exemplos (transportes públicos, educação, custo de vida, futuro
dos filhos), para dizer, com o português comum (e até com o PR, aliado de
sempre de António Costa), que “assim não dá”.
Trazendo
ao debate as PPP da Saúde, o deputado perguntou se o Governo, que gosta de
reverter decisões vai reverter esta, restituindo ao Hospital de Loures a PPP.
Sobre
o pacote “Mais Habitação”, com feição de “neogonçalvismo selvagem”, perguntou
se o PM vai “avançar com o arrendamento coercivo, com o ataque ao alojamento
local”, ficando sozinho nessa teimosia. E questionou se há uma central de
comunicação para difundir boas notícias do governo, empregando 15 pessoas.
Baseada
nos números do Conselho de Finanças Públicas (CFP), Catarina Martins, ainda
líder do Bloco de Esquerda (BE) acusou o Governo de usar o défice para “mais um
brilharete”, pois 3,5 mil milhões de euros davam “para dez vezes o que diz que
custava para repor o tempo de serviço dos professores”, mas é opção do Governo
deixar serviços públicos sem investimento, “quando tem uma recolha fiscal como
nunca”, devido à inflação – levando a greves e a manifestações.
Classificou
as atualizações salariais na função pública como “ridículas” e perguntou se o
Governo está disposto a alinhar os aumentos com a percentagem da inflação e com
retroativos a janeiro.
No
campo da habitação, disse que o programa do Governo subsidia preços que já
estão altos: “Ora subsidia a banca, ora subsidia os senhorios.” E “continua o
jogo dos benefícios fiscais” a não residentes, enquanto o Governo apresenta um
conjunto de propostas que “não tem nenhuma medida para baixar os preços da
habitação”.
E
a deputada do BE questionou o objetivo do Governo de ter 26 mil casas para
alojar pessoas que vivem numa situação habitacional indigna, a 25 de Abril de
2024. “Essas casas não existem”, referiu, afirmando que “um programa de
habitação sem nenhuma casa é só um mau PowerPoint”.
Já
Inês Sousa Real, líder e deputada única do PAN, saudou a abertura do Governo
para mexer no imposto sobre o valor acrescentado (IVA), mas perguntou se inclui
as despesas com animais de companhia neste conjunto de medidas. Sobre os bens
alimentares, defendeu que deve ser obrigatório um relatório que revele os
preços médios dos bens. Focada na habitação, perguntou que compromisso está o
Governo disposto a assumir quanto ao alojamento estudantil e porque é que a
bonificação dos juros não tem em conta a situação do agregado familiar.
E
Rui Tavares, do Livre, retomou o tema do défice e pede que, ao menos, metade da
almofada orçamental se aplique no aumento de pensões e de abono de família, e
não em brilharete orçamental. Com efeito, segundo as previsões do CFP, o défice
de 2022 situar-se-á em 0,5%.
Por
sua vez, Eurico Brilhante Dias, líder parlamentar do Partido Socialista (PS), recordou
Rui Nabeiro, que morreu a 19 de março. Depois, vincando que “o país tem desafios
a enfrentar”, afirmou que as dificuldades só se ultrapassam com “compromisso
político e estabilidade”, em diálogo social e institucional. E criticou a
oposição: “Por falar em melões, parece que alguns partidos ainda não recuperaram
desse melão de 30 de janeiro.”
Sobre
a habitação, relembrou que o PS aprovou medidas de outros partidos (como o
PSD): “Com este Governo não vai haver uma lei de bullying habitacional sobre os mais fracos.”
A
tudo isto o PM respondeu. Disse-se “perplexo” com as críticas do PCP às medidas
para a habitação, já que o pacote de medidas tem sido criticado por ser “comunista”.
Referindo
que o trabalho do Governo tem sido feito em várias dimensões, mais ou menos
visíveis, elencou um conjunto de medidas, feito com vários atores no combate à
inflação e à subida do custo de vida, como o trabalho da ASAE, para controlar
as margens de lucro, por exemplo. Houve um primeiro ponto de acordo muito
importante sobre a necessidade de haver mais transparência e de controlar a inflação
sobre bens alimentares.
E
disse que o Governo esperava ter, na semana seguinte, um conjunto de medidas
aprovadas neste sentido, mas aguardava os dados da execução orçamental de 2022
para decidir sobre as medidas para as famílias mais vulneráveis, sobretudo ao
nível dos rendimentos da Função Pública.
Rejeitando
as acusações do PSD, disse estar a trabalhar com o setor da distribuição para agir
sobre os preços e admitiu uma redução do IVA dos bens alimentares, desde que
haja “efetiva redução dos preços”. E afirmou que “todos desejam que a inflação
seja transitória”.
Sobre
a TAP, referiu que o que diz desde 2015 é que é “estratégico, para o Estado,
manter uma participação pública na TAP”: “A TAP deve manter uma participação
estratégica pública.” E acusou o Governo de Passos Coelho de ter cometido a “maior
violação da ética democrática de que alguém tem memória desde o 25 de abril”,
ao vender a TAP a privados “à 26.ª hora”.
Ao
líder do Chega reiterou que o arrendamento forçado está previsto na lei desde
2014, em diploma assinado por três pessoas sábias, não marxistas: Assunção
Esteves, presidente da AR, promulgado por Cavaco Silva, sábio dos sábios, e
pelo não menos sábio Pedro Passos Coelho. E disse: “Se Cravinho está em
funções, é porque mantém a minha confiança.”
E,
no atinente às PPP Saúde, explanou: “Fizemos uma avaliação objetiva das PPP, as
que foram positivas propusemos renovar. Renovámos a de Cascais. Não há uma
ideologia em Cascais e outra em Loures, o que há é privados que aceitaram os
contratos e outros que não os quiseram renovar nos termos avaliados
positivamente.”
À
deputada do BE o PM vincou que “há indicações de que o défice fique aquém da
última previsão”, o que “não resulta de um corte na despesa”, pois houve o
recorde do investimento público em 2022. E, quanto às atualizações salariais,
pediu compreensão, já que as medidas, “por respeito”, serão apresentadas aos
sindicatos, primeiro.
Relevou
que o programa de alojamento estudantil tem metas e que há um aumento previsto
de 15 para 26 mil camas para estudantes. Apontou que “muitos municípios estão
empenhados” neste plano, mas “outros não e até obrigam o Estado a reduzir o número
de camas disponíveis”.
Vincou,
depois, o impacto: “A adesão tem sido tão forte que já houve um reforço dos 300
milhões do PRR, de 73 milhões do OE, para corresponder a esse objetivo
fundamental.”
Falou
num “conjunto vasto de medidas para reduzir o preço da habitação” como um “conjunto
de benefícios muito fortes para colocação no mercado de casas em arrendamento
acessível”. E, quanto aos 26 mil fogos, admitiu que não estejam prontos a
tempo, mas garantiu que o objetivo se mantém.
A
Rui Tavares o PM garantiu que o compromisso é que “toda a receita extraordinária
que decorreu da inflação” seja “redistribuída aos portugueses”.
Ao
PS o chefe do Governo agradeceu a sua intervenção, coerente com a ação do
partido; disse que “as oposições estão bastante nervosas, porque vivem na ânsia
e não na serenidade que se recomenda, sobretudo nos momentos mais difíceis”; e
reafirmou a necessidade das “contas certas”, que “sintetizam a boa política que
permite adotar as boas medidas”.
Instado
por questões levantadas, em segunda ronda, pelos deputados, António Costa respondeu.
Reiterou
a confiança na administração da Caixa Geral de Depósitos (CGD), o “banco de todos
os portugueses”.
Quando ao
“simplex ambiental”, apontado a “abater e a destruir” o património natural,
disse que visa “agilizar” os procedimentos para apostar em gases renováveis,
nomeadamente o hidrogénio verde, assim como a energia solar.
Sobre
o Sistema Nacional de Saúde (SNS) de Marta Temido ou de Manuel Pizarro, respondeu,
distinguindo entre quem sempre apoiou o SNS e quem sempre o quis enfraquecer.
Esclareceu
que os preços da eletricidade e do gás não baixarão enquanto a guerra não terminar.
Acusado
de ser “o timoneiro de uma barca que está a meter muita água”, referiu que, “numa
sociedade democrática, que elegeu o grupo parlamentar do Chega ou a maioria
absoluta do PS”, as manifestações são normais, os governos não são “nomeados ou
desnomeados” com base nelas. Do caso da Transtejo, disse acreditar que o
Conselho de Administração da Transtejo “agiu de boa-fé”. A decisão de compra
dos dez navios foi “correta e ambiciosa”, pois apostou em tecnologia que “não
estava ainda madura”. Atendendo à descida dos preços das baterias dos carros
elétricos nos últimos anos, era de esperar que tal sucedesse com os barcos, o
que levou a Transtejo a separar a aquisição dos barcos e a das baterias.
E
aos prejuízos da Segurança Social com a falência do Credit Suisse contrapôs os lucros
anteriores e os riscos do investimento, sendo que a Segurança Social está
dotada de regras precisas e sólidas.
Em
relação à lei que aborda a distribuição dos processos judiciais, que falta
regulamentar, disse que a portaria respetiva será publicada “muito em breve”.
E,
ainda no campo da habitação, questionado pela Il sobre quantos edifícios
devolutos entram na bolsa de imóveis para arrendamento coercivo, disse que o
número disponível é o dos municípios, contabilizados para efeitos de
agravamento do IMI: 10 mil habitações.
***
Uma
maratona de perguntas e respostas, equacionadas em três horas, mas que levam
muito tempo a sair para o papel e do papel para a prática. Mas do debate nasce
a luz e a ação.
2023.03.25 – Louro de Carvalho
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