A Comissão para o Meio Ambiente e Ecologia e a
Comissão de Justiça e Paz da Conferência Episcopal Católica da Coreia do Sul
reafirmaram, a 24 de agosto, a sua firme oposição ao despejo de água tratada
radioativa no mar, autorizada pelo governo japonês.
Os dois órgãos eclesiais, com mais 42 organizações
diocesanas do país, manifestaram a “extrema preocupação” com tal decisão do
governo, apesar da opinião contrária de grupos ambientalistas, cientistas e
comunidades de pescadores, assinalou o portal “Vatican News”.
Os grupos católicos, a partir das convicções de
cientistas, de académicos e dos pescadores, rejeitam as asserções do governo de
que “a contaminação causada pelo derrame radioativo está a diminuir e [de que] a
área de Fukushima é segura”.
A declaração conjunta cita o ‘Relatório de Análise
sobre Contaminação Radioativa de Produtos Agrícolas e Pecuários Japoneses’,
divulgado pelo Centro de Monitoramento de Radiação Cidadã e pela Federação
Coreana para Movimentos Ambientais, em abril de 2023, que alerta para “uma
ampla gama de contaminações radioativas em produtos alimentícios”: 5,3% de
produtos marinhos, 21,1% de produtos agrícolas e 2,6% de produtos de origem
animal – dados que
levam à adoção do princípio de prudência e de cautela relativamente à saúde
humana e ao ecossistema, que ainda necessita de ser aplicado.
Como informou a agência de notícias Kyodo, a 24 de agosto, o Japão começou a
despejar mais de um milhão de toneladas de água radioativa, no Oceano Pacífico,
da central nuclear de Fukushima Daiichi, destruída no terramoto e no tsunami,
de março de 2011.
A Tokyo Electric
Power Company
(TEPCO), operadora da central nuclear, “bombeou uma pequena
quantidade de água”, dois dias depois de o governo japonês ter aprovado a
operação, o que gerou indignação, nos países vizinhos, e preocupação, especialmente
entre os pescadores,
angustiados com o colapso da reputação e, portanto, do consumo, dos seus
produtos.
Já em 2021, os bispos coreanos e japoneses publicaram
uma declaração conjunta em que se manifestavam contra o despejo de
água da central de Fukushima no mar, assinalando que a saúde da humanidade e a
vida da Criação são os bens a proteger, lembra o portal “Vatican
News”. E já a 25 de novembro de 2019, o Papa se encontrara com um
grupo de vítimas do “triplo desastre” de 2011 – terramoto, tsunami e acidente
nuclear –, no Bellesalle Hanzomon, um centro de convenções de Tóquio, pedindo a
abolição das centrais nucleares.
O debate político que se desencadeou,
no país, tem sido particularmente acirrado, com o governo do presidente Yoon
Suk-yeol no centro de fortes críticas à aprovação de Tóquio. “Pretendemos responsabilizar
o governo pelo não cumprimento dos seus deveres”, disse Lee Jae-myung, líder do
Partido Democrata, qualificando o plano do Japão de despejar água da central de
Fukushima de “um ato de terror”. E grupos ambientalistas, conselhos estudantis,
organizações da sociedade civil manifestaram-se no Japão e, especialmente, na
Coreia do Sul, onde a Federação Coreana para Movimentos Ambientalistas denunciou
a medida de Tóquio, que “ameaça os produtos da pesca e põe em risco a segurança
dos países do Pacífico”. E, nos últimos dias, a Federação promoveu marchas de
rua e manifestações noturnas silenciosas, à luz de velas, com uma marcha
pacífica em direção ao gabinete presidencial, afirmando que “o Japão está a
provocar uma calamidade irreversível para a Coreia do Sul e [para] os países do
Pacífico”, e definindo o despejo no mar da água de Fukushima como “um ato lento
e silencioso de terrorismo nuclear”.
***
A 11 de março
de 2011, o Japão viveu o seu pior terramoto registado. Com magnitude 9,1 graus
na escala de Richter, o sismo gerou tsunamis e o pior acidente nuclear desde
Chernobyl, em 1986. O terramoto
de Fukushima ou Grande Terramoto de Tohoku, na Região Nordeste do Japão, foi o mais intenso registado na História
do país e um dos maiores do Mundo.
A causa foi
uma movimentação na zona de falha na zona de subducção onde se forma Fossa do
Japão, com epicentro
a 130 quilómetros (km) da costa japonesa e hipocentro a cerca de 25 km de
profundidade. O tremor ocasionou grandes ondas no litoral, entre elas o tsunami
de Fukushima, que desencadeou um dos piores acidentes nucleares da História.
As ilhas que
formam o país distribuem-se sobre quatro placas tectónicas: a do Pacífico, a das
Filipinas, a Eurasiática e a de Okhotsk (microplaca que integra a placa
Norte-Americana). A placa do Pacífico desloca-se horizontalmente na direção
oeste em relação à placa Norte-Americana, mergulhando sob a segunda placa e
causando soerguimento de parte dessa estrutura. A velocidade do movimento da
placa do Pacífico é de aproximadamente 83 milímetros (mm) por ano. Estima-se
que o movimento
na zona de falha que
gerou rutura e o tremor foi de 50 a 60 metros, em cerca de seis minutos, o que pesquisadores consideram o
maior do tipo. O processo estendeu-se por uma faixa de 400 km de comprimento e
150 km de largura, na direção do mergulho de uma placa sob a outra). A energia
total libertada equivale a 600 bombas atómicas como a de Hiroxima.
Dois dias
antes, foi sentida, a cerca de 40 km do epicentro do terremoto de 11 de março, uma
série de tremores com mais de 6 graus na escala Richter – o maior com 7,4.
O ponto da
superfície terrestre em que o terramoto teve origem fica a 130 km da Península
de Oshika, na Costa Leste da principal ilha do Japão, Honshu, onde fica a província
de Fukushima. O
hipocentro do sismo (local de origem no interior da crosta terrestre) estava à profundidade de 25 km, considerada rasa. Após o sismo principal,
foram sentidas, em outras regiões, centenas de réplicas de magnitude variando
de alta a moderada. A cidade de Sendai, a mais próxima do epicentro, foi uma
das mais devastadas pelo terramoto e pelo tsunami, que sucedeu aos tremores.
O sismo foi
responsável pelo deslocamento
da costa do Japão e pela alteração entre 10 e 25 centímetros (cm) no eixo de rotação
Terra, encurtando os dias em 1,8 microssegundos.
Além dos
reflexos na estrutura do arquipélago e na tectónica da área, os abalos sísmicos
de 2011 foram avassaladores para a população. Foi o sismo que ocasionou o maior
número de vítimas no país, deixando 18.428 mortos e desaparecidos. A sequência terramoto, tsunami e
acidente nuclear deixou enorme rasto de devastação. Os estragos incluem incêndios,
explosões, danos na rede elétrica e interrupção do fornecimento de energia e
destruição ou obstrução de estradas e vias. E uma das mais graves consequências do
sismo foi a sequência
de tsunamis que produziu na costa japonesa, atingindo ainda outros países do Pacífico.
As maiores ondas superaram os 10 metros (m) de altura, e as águas adentraram
dezenas de quilómetros pelo território japonês. A província de Fukushima foi atingida
por uma onda de cerca de 14 m, e o avanço das águas prejudicou os geradores de apoio que
estavam a ser usados para o resfriamento dos reatores da Central Nuclear de
Fukushima I (Daiichi), levando ao derretimento de três.
Os
desdobramentos do tsunami causaram o derretimento de três reatores da central a, levando à
retirada de 300 mil moradores dos arredores. No dia seguinte, 12 de março,
ocorreu a primeira de três explosões, tendo as outras ocorrido nos dias
posteriores (14 e 15 de março), libertando altos índices de radiação no ambiente. A área evacuada, inicialmente, foi
de 20 km. No entanto, tanto
os solos da região como a água do mar foram atingidos, e ambos passam, ainda, pelo
processo de descontaminação. Ao todo, foi evacuada a área de 1150 quilómetros
quadrados (km²), dos quais 330 km² estão vazios e mais de 40 mil pessoas
continuam longe das suas antigas residências.
***
Em julho
deste ano, em comunicado, a “Comissão para o Meio Ambiente e Ecologia” e a “Comissão
de Justiça e Paz” da Conferência Episcopal Católica de Coreia do Sul, que, juntamente
com 45 organizações diocesanas e da sociedade civil coreana, propõem a busca de
alternativas ao despejo de água radioativa de Fukushima no oceano, referiam: “Na
era da crise climática, neste momento em que estamos a contemplar e a trabalhar
juntos para a transição rumo a um Mundo sustentável, o despejo de água
radioativa de Fukushima no oceano é uma ameaça ao ecossistema da nossa Casa
comum, a Terra.”
Doze anos após
o acidente na central nuclear decorrente do terramoto de 9,1 graus de magnitude,
estimada como a contaminação radioativa mais grave da História da Humanidade, a
central estava (em julho) a fazer os últimos preparativos para o lançamento de
mais de um milhão de toneladas de águas residuais radioativas no Oceano
Pacífico.
A TEPCO dizia
ter concluído o processo para diluir as águas residuais, contendo o isótopo
radioativo trítio com água do mar. O governo japonês, que contratou a Agência
Internacional de Energia Atómica (AIEA) para garantir a segurança dos procedimentos
de descarga, ia definir uma data de libertação para as águas. Naqueles dias, Rafael
Mariano Grossi, diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atómica
(IAEA) ou Agência Nuclear das Nações Unidas, estava no Japão, para se encontrar
com líderes do governo e para os auxiliar nos preparativos finais para o
lançamento de águas residuais radioativas no mar.
A água radioativa tratada, armazenada
em cerca de mil tanques com capacidade aproximada de 1,37 milhões de toneladas,
deve ser libertada para permitir que a central nuclear seja desativada. Segundo
o governo, a água tratada após a diluição é inofensiva para as pessoas e para a
vida marinha, mas a libertação planeada continua a dividir a comunidade
internacional, preocupando as empresas locais, em Fukushima, e alimentando
temores na indústria pesqueira do Japão.
Entre os inúmeros pareceres negativos
e alarmes das últimas semanas, a nível nacional e internacional, o governo
chinês pediu a suspensão do plano, por ser extremamente irresponsável, instando
o Japão a levar a sério as preocupações internacionais e internas.
Também foram manifestadas preocupações
pela Coreia do Sul, que não pretende remover as restrições à importação de
produtos pesqueiros de Fukushima e de outras oito províncias japonesas. Em
abril passado, o “Centro de Monitoramento de Radiação” e a “Federação Coreana
de Movimentos Ambientais” divulgaram um relatório, após a realização de
inspeções de produtos agrícolas e pecuários, a confirmar a extensa contaminação
radioativa em vários tipos de produtos alimentícios, como produtos marinhos,
produtos agrícolas, produtos de origem animal, alimentos processados. E, como
se disse, dois organismos da Conferência Episcopal Católica de Coreia do Sul
que, juntamente com um grupo de mais de 45 organizações diocesanas e da
sociedade civil coreana, propõem a busca ativa de “caminhos alternativos ideais”,
consideram o despejo de água radioativa de Fukushima no oceano como uma ameaça
ao ecossistema da nossa Casa comum, a Terra, e uma rutura da ordem do Mundo,
criado por Deus.
A sociedade civil pede ao Japão que “divulgue
todos os dados, de forma transparente”, e que “faça o melhor possível para
resolver o problema, reunindo sabedoria e força de países vizinhos amantes da
paz e de pessoas de todo o Mundo”, em “atitude mais aberta”. Com efeito, o acidente
da central nuclear de Fukushima está a espalhar poluição ambiental na Terra. Portanto,
a fim de eliminar o risco de acidente e o risco de lixo nuclear em nível
elevado, a Coreia e o Mundo devem-se empenhar, ativamente, na transição para
energias renováveis amigas do ambiente.
***
Resta encontrar a alternativa (que
ninguém especifica) ao escoamento das águas radioativas no Pacífico. Nos mares,
contaminam as águas; em aterros contaminam o solo, as culturas ou a vegetação selvagem,
podendo chegar aos lençóis freáticos; e, a céu aberto, contaminam os solos e o
ar. E estamos perante um acidente provocado por causas naturais, quando também
são graves (gravíssimos) os acidentes ecológicos provocados por guerras e por sabotagens
terroristas, de que resultam inúmeras vítimas.
2023.08.26 – Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário