O grupo BRICS é um bloco de países (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), as denominadas economias emergentes, que representa
mais de 42% da produção mundial e deve mudar a economia mundial até 2030, sendo
o maior parceiro comercial de África.
De 22 a 24 de agosto, decorreu em Sandton, no município metropolitano de Joanesburgo,
na África do Sul, a 15.ª cimeira de chefes de Estado e de Governo do BRICS. E o
presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, anunciou, a 24, em conferência de
imprensa conjunta, no âmbito das deliberações da cimeira, a entrada da Argentina, do Egito, da Etiópia, do Irão, da Arábia
Saudita e dos Emirados Árabes Unidos no grupo de economias BRICS. “Decidimos
convidar a República da Argentina, a República Árabe do Egito, a República
Federal da Etiópia, a República Islâmica do Irão, o Reino da Arábia Saudita e
os Emirados Árabes Unidos, para serem membros de pleno direito, efetivo a partir de 1 de janeiro de 2024”, declarou.
Cyril Ramaphosa
disse que os líderes BRICS adotaram a declaração “Joanesburgo II” da 15.ª
Cimeira dos BRICS. Com efeito, nos últimos dois dias da cimeira, chefes de Estado do Brasil, da Rússia, da Índia, da China e da África do Sul envolveram-se em
conversações sobre vários temas, incluindo o reforço da cooperação de
segurança, energética, comercial, económica e social. Brasil, Índia e África do Sul
estiveram representados pelos respetivos chefes de Estado. A Rússia, esteve representada pelo
ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergey Lavrov. E, segundo o líder sul-africano,
cerca de 1500 líderes
empresariais de vários países participaram no Fórum empresarial do bloco. O
presidente francês, Emanuel Macron, sugerira a sua participação neste fórum,
mas o convite não chegou ao Eliseu.
Já
no dia 23, Naledi
Pandor, chefe da diplomacia do país
anfitrião, avançava que o BRICS adotou um documento que “estabelece diretrizes
e princípios, e processos para considerar os países que desejam tornar-se
membros”. “Essencialmente, concordamos na questão da
expansão, temos um documento que adotámos que estabelece diretrizes e
princípios, e processos para considerar os países que desejam tornar-se membros
do BRICS, o anúncio mais detalhado será feito pelos líderes do BRICS
antes da conclusão da cimeira”, precisou.
A ministra das Relações Internacionais e Cooperação sul-africana, que falava
a um canal de rádio tutelado pelo seu ministério, disse que o bloco estabeleceu uma aliança de mulheres e um fórum para a
juventude dentro do BRICS. “É extremamente importante [como]
a formação da juventude. Pela primeira vez, tivemos dois jovens líderes a
dirigirem-se aos líderes do BRICS de forma muito positiva e inspiradora,
estabelecendo as aspirações dos jovens dos países BRICS, relativamente ao papel
que esperam que os BRICS desempenhem no desenvolvimento dos jovens”, salientou.
***
Esteve, pois, no centro do debate a expansão do grupo, cujo historial e
interesses se podem sintetizar como segue.
Em 2009, a Rússia teve a iniciativa de
formar um bloco de países que fizessem frente à ordem mundial liderada pelos
Estados Unidos da América (EUA) e às potências económicas do dito Ocidente.
Unindo-se ao Brasil, à Índia e à China, nasceu o BRIC, inspirado no acrónimo
cunhado, anos antes, por Jim O’Neill – ao tempo, economista-chefe do Goldman
Sachs – num trabalho de investigação que vincava o potencial de crescimento das
quatro economias.
Dois anos depois da sua oficialização na cimeira de
Ecaterimburgo, na Rússia, juntou-se ao grupo a África do Sul, assumindo o grupo
a designação de BRICS. E, em 2014, foi anunciada
a criação do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD),
instituição financeira que, desde a sua formalização, emprestou mais de 30 mil
milhões de dólares para projetos de infraestruturas, de energia renovável e de transportes
nos países-membros. E formou-se o Fundo de
Reservas do BRICS, com 100 mil milhões de dólares, para
preservar a estabilidade financeira em tempos de crise.
O BRICS não é organização formal como as Nações Unidas, o Banco
Mundial ou a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), ou nem bloco
económico, como a União Europeia (UE). Todavia, funciona por consenso, cada país assume a presidência rotativa
do grupo por um ano, e os membros integram o G20, que reúne as
20 principais economias.
Agora, o grande tema, na agenda da cimeira, foi a expansão do
grupo a mais países. O alargamento sempre esteve no escopo do BRICS
– de tal modo que a África do Sul entrou um ano e meio após a primeira cimeira
–, impulsionado sobretudo pela China, mas tem
enfrentado a resistência dos restantes membros. No entanto, o
contexto atual é diferente do de 2010, sobretudo se se tiver em conta a
pandemia de covid-19, que fez aumentar a insatisfação dos países em
desenvolvimento, face aos Estados mais ricos. Embora enfrente uma fase de
abrandamento económico, Pequim consolidou-se como potência e viu crescer a sua
capacidade de influência a nível internacional; Moscovo precisa de apoio de
outros países, quando está em guerra contra a Ucrânia e enfrenta pesadas sanções
dos EUA e dos aliados; e a África do Sul vê o seu papel de liderança em África
questionado perante economias em crescimento na região.
Foram debatidas
formas de acelerar o distanciamento do dólar norte-americano, pela
maior utilização de moedas locais no comércio entre os países membros. Porém, Jim
O’Neill considerou uma “loucura” a ideia de uma moeda comum do BRICS a superar
o dólar.
Além dos seis países admitidos, muitos outros queriam entrar. Entre
Irão, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Argentina, Argélia, Bolívia, Indonésia,
Egito, Etiópia, Cuba, República Democrática do Congo, Comores, Gabão e
Cazaquistão, contam-se mais de 40 que manifestaram interesse
em aderir, para os quais o BRICS é um sinal de esperança, já
que esperam que a adesão ao bloco lhes traga benefícios como o financiamento do
próprio desenvolvimento económico e o aumento do comércio e do investimento.
O Irão, que detém cerca de um quarto das reservas de petróleo do
Médio Oriente, espera que o mecanismo de adesão seja decidido “o mais
rapidamente possível”, ao passo que a Arábia
Saudita esteve entre os países que participaram nas
conversações dos “Amigos dos BRICS” na Cidade do Cabo, em junho, tendo recebido o apoio da Rússia e do Brasil.
Sobre a adesão da Arábia Saudita ao BRICS, Jim
O’Neill antecipa que seria “um grande negócio”, pois os laços estreitos do país
com os EUA e o seu papel como o maior produtor de petróleo do Mundo
acrescentariam peso ao bloco. Para o economista, a adesão de mais países ao BRICS será
economicamente importante, se a Arábia Saudita for um deles, ao
invés, é difícil ver o interesse.
A Argentina afirmou, ainda em julho de 2022, ter
recebido o apoio formal da China. O presidente da Bolívia, Luis
Arce, manifestou interesse em aderir ao BRICS, mostrando-se determinado a
reduzir a dependência do dólar no comércio externo. A Etiópia, uma das
economias de crescimento mais rápido de África, avançou, em junho, que pedira
para aderir ao bloco, com um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros
a dizer que o país continuará a trabalhar com instituições internacionais que
possam proteger os seus interesses.
Em julho, a Argélia anunciou que se candidatou a membro do
grupo, bem como a acionista do NBD. Este país, rico em recursos de petróleo e
gás, tenta diversificar a sua economia e reforçar a parceria com a China e com outros
países.
“É possível que as expectativas dos candidatos
ao BRICS sejam demasiado exageradas em relação ao que a sua adesão irá
realmente proporcionar na prática”, afirmou Steven Gruzd, do
Instituto Sul-Africano de Assuntos Internacionais.
Formando contrapeso ao Ocidente, face às
tensões entre a China e os EUA e às consequências da invasão da Ucrânia pela
Rússia, o aumento do número de membros dará força ao grupo e ao seu desejo de
reforma global. Mas as suas ambições de
se tornar ator político e económico global têm sido frustradas por divisões
internas e pela falta de visão coerente.
Enquanto se esperava que os líderes do BRICS discutissem um
quadro para a admissão de novos membros, verificava-se a diminuição dos
benefícios tangíveis da adesão. Por exemplo, o NBD está a
ser prejudicado pelas sanções contra a Rússia. Já a África do
Sul, apesar de ter visto o seu comércio com os países do grupo aumentar, de
forma constante, desde a sua adesão, segundo uma análise da Corporação de
Desenvolvimento Industrial do país, deve tal crescimento, em grande parte, às
importações da China, além de que o bloco representa só um quinto do total do
comércio bilateral sul-africano. Por seu turno, o Brasil e a Rússia, em
conjunto, absorvem só 0,6% das exportações da África do Sul. Em 2022, o défice
comercial do país com os seus parceiros do BRICS tinha quadruplicado para 14,9
mil milhões de dólares, face a 2010.
Estes resultados devem levar os candidatos a pensar duas vezes
antes de aderir ao grupo. “É difícil encontrar realizações concretas para
os BRICS”, apontou Steven Gruzd.
***
Há muitas formas de dividir o mundo e uma delas acabou de se
aprofundar: o BRICS vai acolher seis novos membros, num
conjunto de economias que contrasta com o G7, que agrega
os países mais industrializados do Mundo. A força que o bloco alargado é ainda
incerta, mas a inclusão de exportadores de petróleo reforça a “desdolarização”.
A expansão é novo ponto de partida para a
cooperação do BRICS. “Trará novo vigor ao mecanismo de cooperação e
fortalecerá a força para a paz mundial e para o desenvolvimento”, disse Xi Jinping, presidente
chinês, na cimeira. A escolha acabou por
recair em seis economias: Arábia Saudita, Argentina, Egito, Etiópia, Irão e
Emirados Árabes Unidos.
A escolha dos novos membros não se afigura
óbvia para os analistas, tendo Jim O’Neill apontado à BBC que não lhe parece ter havido um “critério objetivo para
determinar que países seriam convidados a aderir”. Porém, uma nota do banco ING,
com sede em Amsterdão, frisa que a inclusão destas economias “parece refletir
os crescentes laços comerciais com os países originais do BRICS”, pois, ao
longo dos anos, a sua participação nas importações dos novos
convidados aumentou de 23% para 30%, contra a Zona Euro, os EUA
e outras economias desenvolvidas.
O presidente do Brasil, Lula da Silva, defende
que o grupo “não quer ser contraponto” ao G7 ou ao G20, nem aos EUA, mas que os
países se organizem. Porém, vários os sinais apontam para esta ambição e
divisão. Um responsável da equipa chinesa disse ao “Financial Times” que, ao expandir
o BRICS para “representar uma fatia semelhante do PIB mundial ao G7, a voz coletiva no mundo
ficará mais forte”, o que insinua intuito de se
opor ao grupo ocidental.
***
Veremos se a capacidade de estabelecer consensos ultrapassará a
tendência capelina para as divergências (uns são democracias, outos não; uns
têm armas nucleares, outros não) e para o zelo pelos próprios interesses.
Teremos, aqui, nova fonte de paz, num tempo em que a guerra é também – e sobretudo
– económica? Teremos à disposição um novo foco de contrapeso, com vista ao
equilíbrio no Mundo? O futuro o dirá e nós o esperamos.
2023.08.30 – Louro de Carvalho
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