“No
caminho te encontrei” foi o lema da
primeira parte da vigília dos jovens de todo o Mundo com o Papa Francisco na
noite de 5 de agosto no Parque Tejo, em Lisboa-Loures, tendo a segunda parte
constado de adoração ao Santíssimo Sacramento e de Bênção eucarística, com momentos
de grande silêncio e de agradecimento ao Senhor.
O discurso
homilético, que se seguiu a momentos musicais, coreográficos (por exemplo, as mímicas
“falar de costas voltadas” e “avanços e recuos na caminhada de fé”) e de
testemunhos, foi marcado por alguns cortes no texto escrito, por interpelações
diretas, por momentos de silêncio, por segmentos de reflexão pessoal e por
asserções sentenciosas a repetir e a reter.
O tema é
recorrente na vida de cada pessoa, mas Francisco fê-lo mergulhar no Evangelho
para o fazer retornar à vida de cada pessoa, nomeadamente à de cada jovem.
É evidente
que o caminho se faz caminhando, ou seja viajando. Porém, viajar tanto pode ser
algo penoso como ser oportunidade de muita alegria. E, fixando-se na oportunidade
de alegria que a viagem comporta, pelo encontro que proporciona, o Papa
revelou: “Dá-me grande alegria ver-vos.” E, agradecendo por ele e por todos por
terem caminhado e estarem ali, considerou que Maria “teve de viajar para ver
Isabel”. Com efeito, segundo o Evangelho, “Ela partiu e foi sem demora” (Lc 1,39) – relação com “Nossa Senhora
Apressada”, referida em Fátima, na manhã do mesmo dia. Na verdade, acabara de
descobrir que a prima estava grávida, mas ela também estava. Não obstante, vai
sem que ninguém lho tenha solicitado.
É bom anotar
que “Maria realiza um gesto não solicitado, não obrigatório, Maria vai porque
ama”, e “quem ama voa, corre e alegra-se” (Imitação de Cristo, III, 5). É isso
que o amor faz em nós, sublinha o Papa, segundo o qual “a alegria de Maria é
dupla”, pois recebeu o anúncio do anjo de que iria receber o Redentor e a
notícia de que a prima, já anciã, está grávida. E, em vez de pensar em si, pensa
na outra. Isto acontece, na ótica de Francisco, porque “a alegria é missionária”,
não é para uma pessoa, mas para levar algo. É, do meu ponto de vista, uma lição
da alegria de pensar no outro e de combater o egoísmo e o egocentrismo.
A este
respeito, o Papa interpela os jovens: “Vós, que estais aqui, que viestes para
encontrar, para buscar a mensagem de Cristo, para buscar um belo sentido para a
vida, ides guardar isso para vós ou vão levar para os outros?” Evidentemente
que “é para levar aos outros, porque a alegria é missionária”. Por isso,
pretendeu que os jovens repetissem em coro, todos juntos: “A alegria é
missionária! E, então, eu tenho que levar essa alegria para os outros.”
Contudo, a
alegria que sentimos não surgiu espontânea ou por acaso: foram outros que nos
prepararam para a recebermos. Por isso, é necessário que olhemos para trás,
vendo “tudo o que recebemos”, o que os nossos maiores prepararam. O que eles
nos deram “preparou os nossos corações para a alegria”. Na verdade, “todos nós,
se olharmos para trás, temos pessoas que foram um raio de luz para toda a vida:
pais, avós, amigos, sacerdotes, religiosos, catequistas, animadores, professores”
– que “são como as raízes da nossa alegria”. Portanto, cada um deve “pensar
naqueles que nos deram algo na vida, que são como as raízes da alegria”.
É um dos
pontos interessantes de Francisco: dirige-se aos jovens, mas cria as
necessárias pontes intergeracionais; fala do futuro, mas vê-o alicerçado no
passado e calibrado pelo presente.
Aqueles
raios de luz que tivemos na nossa vida caminharam e cultivaram o encontro: “Encontraram
rostos, encontraram histórias”. Mais do que isso, encontraram “essa alegria que
veio dessas raízes”, que “é o que temos para dar, porque temos raízes de
alegria”. E isso dá-nos a responsabilidade de também sermos, para os outros, “raízes
de alegria”, não de alegria passageira, momentânea, mas de uma alegria que cria
raízes.
“Como
nos podemos tornar raízes de alegria?”, pergunta o Papa. Embora tenhamos de
estudar, “a alegria não está na biblioteca, trancada […], mas está em outro
lugar”, que “não é guardado a sete chaves”. De facto, “a alegria deve ser
procurada, deve ser descoberta”. E devemos descobrir o lugar onde ela se
encontra “no nosso diálogo com os outros, onde devemos dar aquelas raízes de
alegria que recebemos”.
O
Pontifice admite que isso, “às vezes, cansa”. Ora, quando uma pessoa está
cansada, “não tem vontade de fazer nada”, atira a toalha ao chão (diz-se em
Português), “porque não tem vontade de continuar e, depois, desiste, para de
andar e cai”. Porém, se a pessoa cai na vida, tem um fracasso, até comete erros
pesados, fortes, não está arrumada. Há que se levantar, há que ajudá-la a
levantar-se. E Francisco mencionou os Alpinos, que gostam de escalar montanhas
e têm uma cantiga: “Na arte de subir – a montanha –, o que importa não é não cair,
mas não permanecer caído.”
Quem
fica caído está retirado da vida, fechado, sem esperança. Ora, quando vemos um
dos nossos amigos que caíram, devemos levantá-lo ou ajudá-lo a levantar-se.
Para tanto, é preciso “olhar de cima para baixo”. Com efeito, no dizer de
Francisco, “a única oportunidade, o único momento em que é lícito olhar uma
pessoa de cima para baixo é quando é preciso ajudá-la a levantar-se. E nunca se
pode olhar uma pessoa por cima dos ombros, de cima a baixo.
Voltando
à mística da viagem e do caminho, o Papa preconiza a necessidade da
perseverança. Com efeito, na vida, é preciso treinar “ao longo do caminho”. E,
pegando em exemplos da vida dos jovens, refere: “Às vezes, não nos apetece
caminhar, não nos apetece fazer esforço, copiamos nos exames, porque não
queremos estudar, e não obtemos sucesso.” E, dando o exemplo do futebol, de que
gosta, sustenta que, por trás de um golo, “há muito treinamento”. Assim, por
trás de um sucesso, “há muito treinamento”.
Na
vida, “nem sempre se pode fazer o que se quer, mas o que a vocação que temos
dentro de nós – cada um tem a sua vocação – nos leva a fazer”. É preciso andar;
e, se cair, levante-se ou seja ajudado; não permaneça caído. E é preciso
treinar “ao longo do caminho”. Tudo é possível, não porque fazemos cursos no
caminho – “não há curso que nos ensine a caminhar na vida”. Isso aprende-se com
os pais, com os avós, com os amigos, tomando uns aos outros pela mão. Na vida,
aprende-se: e “isso é treinar ao longo do caminho”.
Por
fim, Francisco deixa esta multíplice ideia: “Andai. E, se cairdes,
levantai-vos. Andai com um objetivo: treinar todos os dias na vida. Na vida,
nada é de graça. É tudo pago. Só há uma coisa gratuita: o amor de Jesus. Assim,
com esta gratuidade que temos – o amor de Jesus – e com vontade de caminhar,
caminhemos na esperança, olhemos para as nossas raízes e sigamos em frente, sem
medo”.
De
facto, Jesus encontra-nos no caminho e no caminho O encontramos.
E
a deixa final é: “Não tenhais medo. Obrigado! Tchau!”
***
Francisco
não se afasta um milímetro do Evangelho, mas prima pelo discurso pedagógico, com
uma boa dose de antropologia, o discurso do (as raízes vêm do passado, mas
funcionam no presente, suportando o caule, os ramos, as folhas, as flores e os
frutos; e guardam as sementes) hoje para o futuro, um discurso que provém de
Cristo e para Ele nos orienta, sem muitas pretensões, bastando a essencial: Jesus
ama-nos, com um amor afetivo, efetivo e gratuito; o seu amor é a oblação permanente
ao Pai e às pessoas.
Mesmo
quem não é crente pode fruir do discurso deste Papa, um discurso que é lição de
vida!
2023.08.05 – Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário